Resolução do Conselho de Ministros n.º 106-B/2003
À semelhança do que ocorre noutros países, Portugal enfrenta actualmente uma vaga de calor, com temperaturas superiores a 40ºC, acompanhada de níveis de humidade na atmosfera muito baixos, que se mantêm há vários dias, acrescidas de ventos de grande intensidade e com a ocorrência de trovoadas secas.
Devido às condições meteorológicas e ao fumo libertado pelos incêndios, geraram-se condições semelhantes ao efeito de estufa, originando um sobreaquecimento que não permite, durante a noite, o abaixamento das temperaturas e o aumento da humidade para níveis favoráveis à extinção dos incêndios, e que inclusivamente tem impossibilitado a utilização regular de meios aéreos. Esta situação tem provocado uma rápida propagação dos incêndios e uma elevada intensidade das frentes de chama.
Perante a ocorrência de incêndios de grandes proporções que afectaram os concelhos de Sertã, Mação e Vila de Rei, o Governo decidiu, por resolução do Conselho de Ministros de 24 de Julho, mandar proceder a uma inventariação dos danos, fazer o levantamento de situações de necessidade de socorro imediato por carência de meios próprios e de apoio familiar e desencadear acções conducentes à rearborização das áreas ardidas.
Face ao excepcional agravamento da situação verificada em consequência da conjugação dos factores negativos descritos e expresso na proliferação e simultaneidade de incêndios de grandes proporções, dos quais resultaram lamentavelmente perdas de vidas humanas e prejuízos materiais elevados, o Governo entende ser necessária a adopção de medidas adequadas a esta nova situação.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 - Declarar a situação de calamidade pública, decorrente dos incêndios verificados desde 20 de Julho de 2003, em circunstâncias excepcionalmente gravosas, na área dos distritos de Bragança, Guarda, Castelo Branco, Coimbra, Santarém, Portalegre, Leiria e Setúbal, produzindo efeitos desde aquela data até ao restabelecimento da normalidade nas áreas afectadas.
2 - Constituir uma estrutura de coordenação e controlo, composta, para além dos governadores civis das áreas afectadas, por representantes dos seguintes Ministros:
a) Estado e das Finanças;
b) Administração Interna;
c) Economia;
d) Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas;
e) Saúde;
f) Segurança Social e do Trabalho;
g) Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente.
3 - Determinar que a estrutura referida no número anterior será presidida pelo Ministro da Administração Interna.
4 - Aprovar as medidas e apoios excepcionais previstos em anexo.
5 - Disponibilizar, desde já, um montante de 50 milhões de euros da dotação provisional do Ministério das Finanças para fazer face aos encargos decorrentes das medidas e apoios previstos na presente resolução.
6 - É revogada a Resolução do Conselho de Ministros n.º 106-A/2003, aprovada em Conselho de Ministros de 24 de Julho, ressalvando-se os efeitos já produzidos.
Presidência do Conselho de Ministros, 4 de Agosto de 2003. - O Primeiro-Ministro, José Manuel Durão Barroso.
ANEXO
1 - Atribuir a título de emergência:
a) Às famílias que perderam as suas fontes de rendimento um subsídio de sobrevivência imediato, de prestação única, no valor equivalente a um salário mínimo nacional por cada elemento do agregado familiar;
b) Aos pensionistas que perderam as suas fontes de rendimento um subsídio mensal complementar, durante um ano, no valor da pensão social;
c) Aos familiares das vítimas mortais prestações de natureza social complementar, para além das já previstas nas alíneas anteriores;
d) Em situações de comprovada carência de recursos em consequência dos incêndios verificados outros apoios sociais de natureza eventual, para além dos apoios previstos nas alíneas anteriores.
2 - Apoiar as actividades agrícolas e florestais nas regiões sinistradas da seguinte forma:
a) Proceder ao financiamento, no âmbito do Programa AGRO, da reposição do potencial produtivo agrícola destruído pelos incêndios (instalações, infra-estruturas e culturas permanentes);
b) Indemnizar os agricultores pelas perdas de animais através do seu valor médio de mercado;
c) Promover o financiamento, durante três meses, da alimentação dos animais cujas zonas de pastoreio tenham sido atingidas pelo incêndio;
d) Dar prioridade à análise e decisão dos projectos agrícolas e florestais localizados nas zonas mais afectadas pelos incêndios;
e) Antecipar, sempre que possível, o pagamento regular das ajudas relativas às regiões desfavorecidas (indemnizações compensatórias), dos prémios das medidas agro-ambientais e de outros prémios anuais aos quais os agricultores tenham direito.
3 - Apoiar a reflorestação urgente das áreas ardidas:
Criar uma comissão de urgência para a reflorestação das áreas ardidas, coordenada pelo director-geral das Florestas e da qual farão parte os responsáveis pelos serviços florestais regionais, as autarquias locais e as associações e ou cooperativas de proprietários florestais. Esta comissão, que poderá criar subcomissões de planeamento e execução regional, definirá os programas e as condições de reflorestação das áreas ardidas, incluindo todas as simplificações processuais, cujos apoios públicos ao abrigo da legislação em vigor (Programa AGRO) podem atingir 95% dos investimentos, quando aplicados a áreas agrupadas e promovidas e geridas por associações de proprietários, e 100% no caso da administração local e dos baldios. No caso das áreas protegidas afectadas, as respectivas medidas de reflorestação serão coordenadas e apoiadas financeiramente pelo Instituto da Conservação da Natureza.
4 - Disponibilizar os meios públicos necessários, sob a coordenação dos directores regionais de Agricultura e em colaboração com as autarquias locais e com as associações de produtores florestais, para a identificação, a avaliação e a venda do material lenhoso atingido pelo incêndio, cuja concentração se deverá fazer em parques especiais organizados para o efeito em locais apropriados, ou encaminhado directamente para queima com finalidade de valorização energética. O Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas procurará, junto dos grandes compradores industriais e das respectivas associações, estabelecer sistemas de venda justos e apropriados à situação, de forma a proteger essencialmente os pequenos proprietários.
5 - Estabelecer, no âmbito dos Ministérios da Economia e da Segurança Social e do Trabalho, um mecanismo de apoio financeiro às pequenas e médias empresas afectadas com vista, designadamente, à reposição de equipamentos destruídos ou danificados, bem como de apoio à manutenção dos respectivos postos de trabalho durante o período de eventual paralisação provocado, directa ou indirectamente, pelos incêndios.
6 - Conceder, através do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil, apoio financeiro imediato às associações detentoras dos corpos de bombeiros com as seguintes finalidades:
a) Reposição das viaturas destruídas no combate aos incêndios;
b) Contribuição para as despesas excepcionais de combustíveis e alimentação resultantes da sua intervenção no combate aos incêndios.
7 - Atribuir uma dotação para apoio financeiro a fundo perdido, a conceder às autarquias locais nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei 363/88, de 14 de Outubro, com vista a reparações ou aquisições imediatas e inadiáveis, respectivamente em infra-estruturas ou equipamentos municipais afectados pelos incêndios.
8 - Garantir uma linha de crédito extraordinária e bonificada para apoio à reparação dos danos provocados pelo incêndio em infra-estruturas municipais de relevante interesse público.
9 - Determinar a preparação urgente de legislação que contemple as seguintes orientações:
a) Um reforço das competências de fiscalização das autarquias locais na aplicação das contra-ordenações relativas às más práticas florestais e a todas as disposições relativas à prevenção contra incêndios e reforço da sua participação nas receitas;
b) Inclusão na reflorestação das áreas ardidas da obrigatoriedade de os proprietários florestais individuais se sujeitarem a uma disciplina e a regras gerais de gestão florestal colectiva, incluindo a utilização de espécies florestais de protecção, tipos de ordenamento, infra-estruturas e boas práticas silvícolas.
10 - Atribuir aos governadores civis dos distritos atingidos a responsabilidade de, em conjugação com os departamentos sectoriais envolvidos e as Câmaras Municipais, proceder à rápida avaliação dos danos verificados e participar na gestão global dos apoios a que houver lugar, de acordo com os critérios a estabelecer por despacho normativo dos Ministros das Finanças e da Administração Interna, nos termos do n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei 477/88, de 23 de Dezembro.
11 - Solicitar às autoridades competentes a maior urgência na investigação rigorosa das causas dos incêndios verificados.