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Acórdão 83/2007, de 13 de Março

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Sumário

Revoga a decisão recorrida, na medida em que fez aplicação da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, constante do Acórdão n.º 34/2006 sem averiguar a real vontade do beneficiário, relativamente à remição da pensão

Texto do documento

Acórdão 83/2007

Processo 771/2006

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

1 - Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, o Tribunal da Relação do Porto proferiu o seguinte acórdão, datado de 5 de Junho de 2006:

"Nestes autos emergentes de acidente de trabalho, com processo especial, em que figuram como sinistrado Fernando Neves Pimenta e como entidade responsável a hoje denominada Companhia de Seguros Allianz Portugal, S. A., procedeu-se à reforma dos autos. A pensão fixada com base na incapacidade permanente parcial (IPP) de 30% e com início em 23 de Janeiro de 1991, era do montante anual de PTE 97 472$00 e encontrava-se actualizada em 1 de Janeiro de 2003 para o montante, também anual, de Euro 828,30. Promovida a respectiva remição, por despacho a fl. 48 foi a mesma autorizada. Mediante prévia promoção, por despacho a fl. 53, foi efectuada a actualização da pensão para o montante anual de Euro 844,87, desde 1 de Dezembro de 2003 e para o montante também anual de Euro 864,30, desde 1 de Dezembro de 2004, mantendo-se o despacho anterior quanto à autorização da remição."

Veio a seguradora pedir o esclarecimento do decidido, pois, segundo entende, a remição deve ser efectuada com base, se não no montante da pensão anual do valor de Euro 828,30, pelo menos com base no valor de Euro 844,87, mas nunca com base no valor de Euro 864,30, pois ela não deve suportar o atraso do Tribunal quanto à determinação da remição da pensão, que in casu se deve reportar à data de 1 de Janeiro de 2003.

Tendo sido mantido o despacho anterior, veio a seguradora interpor recurso de agravo, pedindo a revogação de tal decisão, tendo formulado a final as seguintes conclusões:

"A - A decisão de 28 de Abril 2005, e respectivo despacho complementar, pronunciou-se sobre as seguintes questões:

a) Actualizar a pensão da beneficiária para o montante de Euro 844,87, a partir de 1 de Dezembro de 2003, e para Euro 864,30, a partir de 1 de Dezembro de 2004;

b) Ordenar a notificação da recorrente para demonstrar o pagamento da pensão actualizada até à data da remição.

B - Atento o regime transitório de remição de pensões previsto no artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, na redacção que lhe veio a ser conferida pelo Decreto-Lei 382-A/99, de 23 de Setembro, até Dezembro de 2003, serão obrigatoriamente remidas as pensões de valor igual ou inferior a Euro 1995,19.

C - Este entendimento encontra-se inequivocamente expresso no despacho em apreço, uma vez que ordenou que se proceda ao cálculo do capital de remição da pensão, na sequência, aliás, do anterior despacho a fl. 48, que tinha considerado estarem verificados os pressupostos legais para a remição.

D - No caso em apreço, a pensão do beneficiário, no ano de 2003 e com a actualização legal, ascende ao montante de Euro 828,30, em razão do que deveria ter sido remida até Dezembro de 2003, uma vez que o ajuizado artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, faz corresponder a cada 'período' [de remição] o decurso do tempo que vai até ao fim de cada um dos anos indicados.

E - Assim, é durante esse período que a remição há-de ser feita e, enquanto esta não tiver lugar, a pensão existe como tal e continua a ser devida, salvo se se esgotar o período anual para o efeito, caso em que as entidades responsáveis não estarão obrigadas a suportar um encargo - pagamento da pensão - que foi substituído (novação), ope legis, por uma nova obrigação, qual seja a do pagamento do capital de remição.

F - Nos termos do disposto no artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa e no artigo 1.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, os tribunais são órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, sendo que, nos termos do disposto no artigo 85.º, alínea c), da citada LOFTJ, compete ao tribunais do trabalho conhecer das questões emergentes de acidente de trabalho.

G - Porém, se o Tribunal, por motivos do seu funcionamento, não exercer a função jurisidicional de acordo com o que a lei prescreve, designadamente não apreciando as questões de que deve conhecer nos prazos previstos na lei, certo é que não podem as partes ser responsabilizadas, por qualquer forma, por tal inércia, sob pena de violação dos princípios fundamentais em que assenta o Estado de Direito democrático e, nomeadamente, do princípio da igualdade.

H - O facto de o Tribunal recorrido não ter dado atempado cumprimento ao previsto no artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, isto é, ao não efectuar a remição da pensão devida ao beneficiário no período previsto no citado normativo - até Dezembro de 2003 -, não pode servir de argumento para que a recorrente continue a suportar o pagamento da pensão, uma vez que a mesma foi substituída, por força da lei, pelo encargo do pagamento do capital de remição.

I - Para a hipótese, que só como tal se equaciona, de se entender que a pensão é devida para além do último dia previsto no já citado artigo 74.º, entende a recorrente que os ulteriores pagamentos efectuados deverão ser considerados como adiantamentos por conta do respectivo capital de remição.

J - A douta decisão em crise fez uma desadequada interpretação e aplicação das disposições legais supracitadas, que violou, devendo por isso ser revogada e substituída por outra que, interpretando e aplicando devidamente o direito impendente, declare que a recorrente se encontra desobrigada do pagamento da pensão ao beneficiário, desde 1 de Janeiro de 2004, com todas as consequências legais, ou, em alternativa e se se entender que a pensão é devida para além do último dia previsto no já citado artigo 74.º, que considere os pagamentos como adiantamentos por conta do respectivo capital de remição."

O Sr. Procurador da República, no Tribunal a quo, apresentou a sua alegação, que concluiu no sentido de que se devem manter as actualizações ordenadas desde 1 de Dezembro de 2003 e desde 1 de Dezembro de 2004, devendo proceder-se ao cálculo do capital de remição com referência à data de 1 de Janeiro de 2005.

Sob prévia promoção e com a concordância do Tribunal a quo, a seguradora procedeu à entrega ao sinistrado do capital da remição da pensão que entendeu ser-lhe devido, no montante de Euro 11 844,41.

Admitido o recurso, foram colhidos os vistos legais.

Cumpre decidir.

Estão provados os factos constantes do relatório que antecede.

O direito. - Sendo pelas conclusões do recurso que se delimita o respectivo objecto (como referem Abílio Neto, in Código de Processo Civil Anotado, 2003, p. 972, e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Julho de 1986, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 359, pp. 522- 531), como decorre das disposições conjugadas dos artigos 684.º, n.º 3, e 690.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, ex vi do disposto no artigo 83.º do Código de Processo do Trabalho (de 1981, pois o de 1999 apenas se aplica aos processos instaurados depois da sua entrada em vigor, que ocorreu em 1 de Janeiro de 2000, conforme resulta do artigo 3.º do Decreto-Lei 480/99, de 9 de Novembro, sendo certo que os presentes autos foram instaurados em 28 de Janeiro de 1991), a única questão a decidir neste recurso de agravo consiste em saber se, para calcular o respectivo capital de remição, se deve atender ao montante em que se encontrava fixado o valor da pensão em 1 de Janeiro de 2003, ou seja, Euro 828,30, bem como a esta data.

Vejamos.

Como se vê do relatório supra, a seguradora procedeu à entrega ao sinistrado do capital da remição da pensão que entendeu ser-lhe devido, no montante de Euro 11 844,41.

A divergência está agora em saber se se deve atender ao valor da pensão resultante da actualização respectiva desde 12 de Janeiro de 2004 e reportar o cálculo à data de 1 de Janeiro de 2005, havendo então uma diferença de pensão a atender e um valor residual de capital a calcular e a entregar ao sinistrado.

Sucede, no entanto, que, pelo Acórdão 34/2006, processo 884/2005, do Tribunal Constitucional, de 11 de Janeiro de 2006, in Diário da República, 1.ª série-A, de 8 de Fevereiro de 2006, foi decidido:

a) Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, na redacção dada pelo Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro, interpretado no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes do trabalhador/sinistrado, nos casos em que estas incapacidades excedam 30%, por violação do artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da Constituição da República Portuguesa; e

b) Limitar os efeitos da inconstitucionalidade para que se produzam apenas a partir da publicação desta decisão no Diário da República, exceptuando, porém, os casos em que a remição da pensão se encontre pendente de impugnação judicial ou seja ainda susceptível dessa impugnação.

Assim, face a tal decisão, é de manter o despacho que ordenou a remição da pensão, no que respeita ao capital já entregue, dada a restrição de efeitos constantes da referida alínea b), e é de revogar o despacho no que respeita à parte da pensão não remida, face à declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro, constante da referida alínea a).

É que, embora o acórdão se reporte, formalmente, aos casos em que as incapacidades excedem 30%, quis naturalmente incluir também aqueles em que a incapacidade é igual a 30%; na verdade e conforme toda a nossa tradição jurídica na matéria, a distinção é feita entre as incapacidades iguais ou superiores a 30% e as inferiores, só aquelas sendo consideradas graves e dando origem a um relevante montante indemnizatório, como refere toda a fundamentação do aresto em aplicação [cf. o disposto nos artigos 2.º e 4.º, ambos do Decreto-Lei 668/75, de 24 de Novembro, e nos artigos 17.º, n.º 1, alíneas c) e d), e 33.º, n.º 2, ambos da Lei 100/97, de 13 de Setembro, estes dois últimos também citados no Acórdão do Tribunal Constitucional].

Procedem, assim, parcialmente as conclusões do recurso.

O Ministério Público interpôs recurso de constitucionalidade, do seguinte modo:

"O Magistrado do Ministério Público, vem, ao processo em epígrafe, interpor recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão de fl. 95 a fl. 99, nos termos dos artigos 280.º, n.os 1, alínea a), e 3, da Constituição da República Portuguesa, 70.º, n.º 1, alínea a), e 72.º, n.os 1, alínea a), e 3, da Lei 28/82, de 15 de Novembro, uma vez que, no mesmo, não foi aplicada, com fundamento na sua inconstitucionalidade, a norma do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, na redacção dada pelo Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro, interpretado no sentido de impor a remição obrigatória de pensões vitalícias atribuídas por incapacidades permanentes parciais do trabalhador/sinistrado, nos casos em que estas incapacidades são iguais a 30%, por violação do disposto no artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da Constituição da República Portuguesa."

Junto do Tribunal Constitucional, o recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões:

"1 - A norma constante do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, apenas padece de inconstitucionalidade na medida em que imponha - independentemente da vontade do trabalhador-sinistrado - a remição obrigatória de pensões vitalícias, atribuídas por incapacidades parciais permanentes do trabalhador iguais ou superiores a 30%.

2 - Não se mostrando averiguado, no caso dos autos, qual a vontade real do trabalhador (e indiciando o recebimento do capital de remição de Euro 11 844,41 uma vontade presumível de optar pela via do recebimento do capital de remição) justifica-se a prolação de decisão interpretativa do decidido no Acórdão 34/2006, no sentido atrás especificado."

Cumpre apreciar.

2 - O acórdão recorrido fez aplicação da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, constante do Acórdão 34/2006.

O Tribunal Constitucional, no mencionado aresto, declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, na redacção dada pelo Decreto-Lei 383-A/99, de 22 de Setembro, interpretado no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes do trabalhador/sinistrado, nos casos em que estas incapacidades excedam 30%.

Nos presentes autos, a incapacidade é de 30%. Admite-se, porém, que tal circunstância não fundamenta a não aplicação da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral constante do Acórdão 34/2006, já que o limite da relevância da incapacidade para o efeito de remição da pensão é precisamente 30%.

Contudo, verifica-se que no presente processo o sinistrado aceitou a parte da pensão já remida, o que sem qualquer declaração de reserva, indicia que aceitará o montante em falta.

Ora, a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral abrange apenas os casos em que a remição ocorre independentemente da vontade do beneficiário. Desse modo, tal declaração não é aplicável sem mais no caso dos autos, já que importa averiguar se o beneficiário quer receber o montante remanescente, averiguação que naturalmente compete às instâncias.

3 - O presente recurso é portanto precedente.

4 - Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide revogar a decisão recorrida, na medida em que fez aplicação da declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, constante do Acórdão 34/2006 sem averiguar a real vontade do beneficiário, relativamente à remição da pensão.

Lisboa, 6 de Fevereiro de 2007. - Maria Fernanda Palma - Paulo Mota Pinto - Mário José de Araújo Torres - Benjamim Rodrigues - Rui Manuel Moura Ramos.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1553193.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1975-11-24 - Decreto-Lei 668/75 - Ministérios das Finanças e dos Assuntos Sociais

    Define normas sobre o cálculo das pensões devidas por acidentes de trabalho e doenças profissionais.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1997-09-13 - Lei 100/97 - Assembleia da República

    Aprova o novo regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais.

  • Tem documento Em vigor 1999-04-30 - Decreto-Lei 143/99 - Ministério das Finanças

    Regulamenta a Lei 100/97, de 13 de Setembro, no que respeita à reparação de danos emergentes de acidentes de trabalho.

  • Tem documento Em vigor 1999-09-22 - Decreto-Lei 382-A/99 - Ministério das Finanças

    Altera para 1 de Janeiro de 2000 as datas de entrada em vigor dos Decretos-Leis n.ºs 142/99 e 143/99, de 30 de Abril, e do Decreto-Lei n.º 159/99, de 11 de Maio.

  • Tem documento Em vigor 1999-11-09 - Decreto-Lei 480/99 - Ministério da Justiça

    Aprova o Código de Processo do Trabalho.

  • Tem documento Em vigor 2006-02-08 - Acórdão 34/2006 - Tribunal Constitucional

    Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 74.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 382-A/99, de 22 de Setembro, interpretado no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes do trabalhador/sinistrado, nos casos em que estas incapacidades excedam 30%.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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