1 - O Provedor de Justiça requer ao Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 281.º, n.º 2, alínea d), da Constituição da República Portuguesa (CRP), a fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade das normas contidas nos artigos 13.º, n.º 3, e 14.º, n.º 2, do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (EPARAA), na redacção constante da Lei 39/80, de 5 de Agosto, e na numeração da Lei 61/98, de 27 de Agosto.
O pedido é fundamentado nos seguintes termos:
«1.º O artigo 13.º, n.º 3, do EPARAA prevê a existência de dois círculos adicionais para a eleição da Assembleia Legislativa Regional, um correspondendo aos 'açorianos' residentes noutras parcelas do território português e outro aos residentes no estrangeiro, cada um elegendo um deputado.
2.º O artigo 14.º, n.º 2, por sua vez, define que são eleitores naqueles círculos, ou seja, são 'açorianos' os cidadãos portugueses residentes na área em causa e que tenham nascido no território da Região Autónoma.
3.º Faz-se assim participar na identificação do âmbito subjectivo de uma pessoa colectiva de população e território não o critério da residência mas sim o da naturalidade, com a criação de um arremedo de dupla cidadania.
4.º Normas idênticas constavam da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa Regional dos Açores (Decreto-Lei 267/80, de 8 de Agosto), tendo sido declaradas inconstitucionais pela Resolução do Conselho da Revolução n.º 68/82 (Diário da República, 1.ª série, de 22 de Abril de 1982), com suporte em parecer no mesmo sentido da Comissão Constitucional (parecer 11/82, publicado em Pareceres da Comissão Constitucional, 19.º vol., pp. 57 e segs.).
5.º Contudo, pelo princípio do pedido, não é possível estender a eficácia dessa declaração de inconstitucionalidade às normas constantes do EPARAA, apesar de ser evidente que a mesma ratio decidendi é aplicável em ambas as situações.
6.º Norma de idêntico alcance, em decreto que aprovava o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, foi já objecto de uma pronúncia no sentido da inconstitucionalidade por esse Tribunal Constitucional, através do Acórdão 1/91 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 18.º vol., pp. 7 e segs.), tirado em fiscalização preventiva, considerando violados os artigos 4.º, 6.º e 227.º, n.os 1 e 3 (hoje o 225.º), da Constituição, com argumentação que se acompanha e que aqui se tem como reproduzida.
7.º Além das normas constitucionais que o citado acórdão considera como violadas, julga-se ainda estar a ser infringido o princípio da igualdade, visto se estar perante a atribuição de direitos políticos em função do local de nascimento, sem que haja norma constitucional que tal permita.
8.º No mesmo sentido aponta o parecer da Comissão Constitucional acima citado (cf. Pareceres da Comissão Constitucional, 19.º vol., pp. 75-76), que mereceu a concordância do Conselho da Revolução.
9.º É certo que as normas em causa nunca foram aplicadas, mercê da declaração de inconstitucionalidade das disposições do Decreto-Lei 267/80, de 8 de Agosto, a que se fez referência, o que no entanto em nada afecta o seu desvalor constitucional nem a possibilidade de serem sindicadas por esse Tribunal em sede de fiscalização abstracta sucessiva de constitucionalidade, importando expurgá-las do EPARAA.
Nestes termos, requeiro ao Tribunal Constitucional a declaração da inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, de acordo com o artigo 281.º, n.º 2, alínea d), e para os efeitos do artigo 282.º da Constituição, das normas contidas nos artigos 13.º, n.º 3, e 14.º, n.º 2, do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (EPARAA), na redacção constante da Lei 39/80, de 5 de Agosto, e na numeração da Lei 61/98, de 27 de Agosto, por violação do princípio da igualdade e das normas dos artigos 4.º, 6.º e 225.º, n.º 3, da Constituição.» Notificado o Presidente da Assembleia da República, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, ofereceu o merecimento dos autos.
2 - Dispõem as normas em causa:
«Artigo 13.º
1 - .......................................................................................................................2 - .......................................................................................................................
3 - Haverá ainda mais dois círculos, um compreendendo os açorianos residentes noutras parcelas do território português e outro os açorianos residentes no estrangeiro, cada um dos quais elegerá um deputado.
Artigo 14.º
1 - .......................................................................................................................2 - São eleitores nos círculos referidos no n.º 3 do artigo anterior os cidadãos portugueses residentes na área desses círculos e que tenham nascido no território da Região.» Estas normas correspondem, sem alteração de redacção, às que constavam, respectivamente, dos artigos 11.º, n.º 3, e 12.º, n.º 2, da Lei 39/80, de 5 de Agosto, mantidas com a mesma redacção e numeração na 1.ª revisão do Estatuto (Lei 9/87, de 26 de Março).
Como diz o requerente, normas substancialmente idênticas constavam também dos artigos 3.º, n.º 2, e 12.º, n.º 3, do Decreto-Lei 267/80, de 8 de Agosto (Lei Eleitoral da ALR dos Açores).
Cabe ainda referir que igual normação constava, ainda, dos artigos 17.º, n.º 4, e 18.º, alínea b), do decreto 322/I, de 27 de Junho de 1980 (Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira), e dos artigos 10.º, n.º 4, e 11.º, n.º 2, do decreto 293/V (Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira), ambos da Assembleia da República.
A convocação destas normas de diferentes diplomas justifica-se, no caso, pelo facto de sobre elas terem já incidido três juízos de inconstitucionalidade, os dois primeiros da Comissão Constitucional sobre as normas dos artigos 17.º, n.º 4, e 18.º, alínea b), do decreto 322/I da Assembleia da República (parecer 26/80, in Pareceres da Comissão Constitucional, 13.º vol., pp. 184 e segs., que deu lugar à Resolução do Conselho da Revolução n.º 293/80) e sobre os artigos 3.º, n.º 2, e 12.º, n.º 3, do Decreto-Lei 267/80 (parecer 11/82, in Pareceres da Comissão Constitucional, 19.º vol., pp.
57 e segs., que deu lugar à Resolução do Conselho de Revolução n.º 68/82) e o último do Tribunal Constitucional, em fiscalização preventiva, sobre os artigos 10.º, n.º 4, e 11.º, n.º 2, do decreto 293/V da Assembleia da República.
Estas normas criavam, para a eleição das Assembleias Legislativas Regionais dos Açores ou da Madeira, círculos eleitorais fora do território da Região, onde eram eleitores os cidadãos portugueses residentes na área desses círculos e naturais da Região (dois círculos eleitorais, um para os residentes no território nacional e outro para residentes no estrangeiro, salvo no caso do decreto 293/V, em que se previa um único círculo para todos os residentes fora da Região).
Em qualquer dos casos a Comissão Constitucional e o Tribunal Constitucional proferiram juízos de inconstitucionalidade: no parecer 26/80, por violação do princípio da unidade da cidadania consagrado no artigo 4.º da Constituição e, «segundo certa perspectiva», por infracção ao princípio da unicidade do recenseamento (artigo 116.º, n.º 2, da CRP, versão original), no parecer 11/82, por violação dos princípios da soberania popular, da unicidade da soberania e da igualdade, e, no Acórdão 1/91, por violação dos artigos 4.º (unidade da cidadania), 6.º (forma unitária do Estado) e 227.º, n.os 1 e 3 (incidência territorial da autonomia, limitação da autonomia pela integridade da soberania do Estado), da CRP, versão de 1989.
3 - As normas agora em causa, idênticas às que constavam do Decreto-Lei 267/80, e apesar do juízo de inconstitucionalidade formulado no parecer 11/82, ínsito na Resolução do Conselho da Revolução n.º 68/82, que declarou com força obrigatória geral tais normas, provindo já da Lei 39/80, de 5 de Agosto (EPARAA) - anterior, portanto, ao Decreto-Lei 267/80 , mantiveram-se incólumes na 1.ª revisão do Estatuto (Lei 9/87, de 26 de Março).
Já então, aquando da discussão parlamentar sobre o Estatuto, alguns deputados formularam reservas quanto à possibilidade de a matéria eleitoral constar dos Estatutos das Regiões Autónomas e «quanto ao que poderá ser considerado como uma criação de uma nova nacionalidade, ou melhor, de uma subnacionalidade de cidadãos residentes no território continental ou no estrangeiro» (deputado Luís Catarino, do MDP/CDE (Diário da Assembleia da República, 1.ª série, n.º 70, de 26 de Junho de 1980, p. 3362).
Mas as reservas não encontraram eco na maioria dos parlamentares e foram rejeitadas propostas de eliminação das normas e mesmo de substituição por outra que limitava os círculos eleitorais fora do território da Região aos residentes no estrangeiro (propostas do PCP e do PS, respectivamente).
Não obstante a evidência dada à matéria na intervenção do deputado Mota Amaral, aquando da discussão parlamentar da proposta de lei 163/VII, que dá lugar à Lei 61/98, onde se inseriam as normas em apreciação («Quanto à manutenção dos círculos de não residentes coberta pela mesma força soberana, a opção do parlamento açoriano merece o seu entusiástico apoio.
Quando a Constituição passou a reconhecer já um grau de cidadania dos portugueses emigrantes, admitindo-os à eleição do Presidente da República, impõe-se manter a reivindicação açoriana para a participação dos não residentes nas eleições para a assembleia legislativa regional» - Diário da Assembleia da República, 1.ª série, n.º 53, de 27 de Março de 1998, p.
1810), nenhuma proposta de alteração ou de substituição dessas normas veio agora a ser apresentada.
A verdade, porém, é que o Tribunal Constitucional não vê razões para abandonar a tese subjacente ao juízo de inconstitucionalidade que, em parte na linha do parecer 11/82 da Comissão Constitucional sobre as normas similares dos artigos 3.º, n.º 2, 12.º, n.º 3, e 13.º, n.º 2, do Decreto-Lei 267/80, formulou no citado Acórdão 1/91, não tendo, entretanto, ocorrido qualquer alteração constitucional que substancialmente legitime uma mudança de orientação.
4 - A questão de inconstitucionalidade material que o requerente suscita visa, fundamentalmente, a atribuição de capacidade eleitoral activa aos cidadãos residentes fora do território da Região mas naturais do arquipélago dos Açores nas eleições para a respectiva Assembleia Legislativa Regional.
É no artigo 14.º, n.º 2, do EPARAA que a norma se contém, traduzindo a norma do artigo 13.º, n.º 3, do mesmo diploma num mero instrumento para a exercitação da referida capacidade eleitoral activa.
O juízo de constitucionalidade incidirá pois sobre aquela primeira norma com necessária projecção na segunda.
5 - Do artigo 225.º da CRP (anteriormente artigo 227.º) resulta que o regime político-administrativo dos Açores e da Madeira (a sua autonomia) se funda em razões específicas atinentes à realidade económica, social e cultural do respectivo território e visa, em primeira linha, a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico-social e a promoção e defesa dos interesses da Região.
Aquelas razões e estes fins surgem, assim, intimamente conexionados com o espaço territorial da Região e a população que aí reside.
São os interesses próprios da comunidade regional, constitucionalmente reconhecidos, que fazem elevar a Região ao estatuto de autonomia político-administrativa.
Se dúvidas houvesse sobre a correcta caracterização das Regiões, elas estão hoje resolvidas pelo disposto no artigo 227.º, n.º 1, da CRP, que as qualifica de «pessoas colectivas territoriais» (anteriormente, o correspondente artigo 229.º, n.º 1, qualificava-as apenas como «pessoas colectivas de direito público»).
O limite dos poderes dos órgãos próprios regionais define-se, pois, pelo território, constituindo o substrato humano da pessoa colectiva os cidadãos, naturais ou não da Região, que residam nesse território (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed., nota IV ao artigo 227.º, p. 845).
Desde logo e por isto não se conforma à natureza de pessoa colectiva territorial a eleição de deputados à Assembleia Legislativa Regional por naturais da Região residentes fora do território.
6 - O princípio da unidade do Estado é afirmado no artigo 6.º, n.º 1, da CRP.
Este princípio, nos termos do mesmo preceito, coexiste na sua organização e funcionamento com o regime autonómico insular que o Estado deve respeitar.
Por outro lado, o artigo 25.º, n.º 3, estabelece que a autonomia político-administrativa regional não afecta a integridade da soberania do Estado; a autonomia é exercida no «quadro da Constituição».
Isto significa, tal como se afirma no Acórdão 1/91, que «a Constituição garante a descentralização política das Regiões, mas proíbe qualquer forma de pluralismo estadual, de autonomia constitucional».
Ora, ao atribuir capacidade eleitoral activa a naturais dos Açores mas residentes fora do território da Região, a norma do artigo 14.º, n.º 2, do EPARAA confere direitos políticos de «cidadania» a um conjunto de cidadãos em razão do seu nascimento em determinado território.
É o que faz o Acórdão 1/91 dizer, então reportado a norma idêntica do supracitado decreto 293/V, que «as normas em apreço supõem a existência de novas categorias jurídico-políticas, como as de 'povo madeirense' ou 'cidadão madeirense' [aqui 'povo açoriano' ou 'cidadão açoriano'], dando lugar à atribuição de direitos políticos a um determinado conjunto de cidadãos em razão do seu nascimento na Região da Madeira [aqui 'Região dos Açores']. Assumem o entendimento de uma comunidade normal 'fragmentada', de todo incompatível com a estrutura constitucional do Estado, operam em sentido contrário ao que Rudolf Smend chama 'efeito de integração'».
Citando Jorge Miranda («O direito eleitoral na Constituição», in Estudos sobre a Constituição, 2.º vol., p. 484), «admitir o voto de cidadãos não residentes equivaleria a criar uma qualidade pessoal, uma espécie de subcidadania regional, incompatível com a unicidade da cidadania portuguesa (artigo 4.º) e com a unidade do Estado».
Acrescenta-se que não pode justificar-se qualquer analogia com o que, a partir da revisão constitucional de 1997, se passa com a atribuição de capacidade eleitoral activa nas eleições para o Presidente da República aos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro (artigo 121.º, n.º 1).
Para além de constar do texto constitucional, não há aqui nem «alargamento» nem «fragmentação» do conceito de cidadania - o Presidente da República é um órgão de soberania do Estado que representa todos os cidadãos, não em função da sua residência em território português mas da sua nacionalidade, sendo ainda de salientar que, mesmo neste caso, a Constituição manda atender, na regulamentação do exercício de direito de voto, à «existência de laços de efectiva ligação à comunidade nacional».
Também no parecer 11/82 se defendeu e agora se reitera:
«Alargou-se a população dos Açores, juridicamente definível em função da residência no território que lhe concerne, e criou-se artificialmente um outro vínculo - idêntico ao que vincula os cidadãos ao Estado -, e através dele captaram-se para a Região portugueses dali naturais, mas nela não residentes.» Assim violado o princípio constitucional da unicidade da cidadania, reflexamente se põe também em causa o princípio da unidade do Estado, afectando a situação jurídica de um dos seus elementos estruturais - a população.
Na verdade, e voltando a citar o parecer 11/82 da Comissão Constitucional, a «criação de um vínculo de cidadania regional, em tudo semelhante ao vínculo da cidadania estadual, como que duplicou o posicionamento político de certos cidadãos portugueses dentro do Estado, solicitados então, quase que com a mesma intensidade, por dois pólos diferentes de poder», cidadania essa que «não só se sobrepõe ao vínculo que já ligava os açorianos não residentes na região do Estado, como ainda, pela sua simples presença, delimita este último nexo jurídico».
Mostram-se, pois, violados pela norma do artigo 14.º, n.º 2, da Lei 39/80, com a numeração dada pela Lei 61/98 - e, consequentemente, pela norma do artigo 13.º, n.º 3, da mesma lei -, os princípios da unicidade da cidadania e da unidade do Estado, tendo em conta a incidência territorial da autonomia e a limitação desta pela integridade da soberania do Estado (artigos 4.º, 6.º e 225.º da CRP).
Resta acrescentar que nos termos em que se formula o juízo de inconstitucionalidade se «absorve» um outro, com o mesmo sinal, relativo à criação de uma situação de desigualdade entre os cidadãos portugueses em razão do território de origem.
7 - O juízo que se acaba de formular, aliado ao facto de o requerente não suscitar outros fundamentos de inconstitucionalidade, dispensa o Tribunal de ponderar a questão da inconstitucionalidade formal das normas por excesso ou desvio de forma.
Poderia, na verdade, colocar-se a questão - já equacionada no Acórdão 1/91 - relativa à constitucionalidade formal das normas em causa, enquanto inseridas em lei estatutária da Região Autónoma dos Açores.
Com efeito, tratando-se de regime eleitoral regional e integrando-se na reserva absoluta de competência da Assembleia da República legislar sobre eleições dos deputados às Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da Madeira [artigo 164.º, alínea j), da CRP], poderia objectar-se à inclusão de tais normas em lei estatutária com o regime de iniciativa procedimental, aprovação e alteração a que esta está sujeita (artigo 226.º da CRP), conferindo-lhe um valor formal agravado.
Afirmando-se no Acórdão 1/91 a «natureza marcadamente organizatória» dos estatutos e uma «vertente organizatória» das normas sobre eleições regionais «que afirma a sua conexão funcional com a matéria do Estatuto», ele não responde - e nem era necessário no caso - à questão de saber qual a força jurídica e o regime de aprovação e alteração dessas normas, muito embora se deixe apontado que a inclusão das mesmas normas nos estatutos «não implica necessariamente uma identidade de força jurídica e de regime de aprovação e alteração».
A questão merecia, e merece ainda, respostas de sinal divergente (Jorge Miranda, Funções, Órgãos e Actos do Estado, pp. 301 e segs., Manual de Direito Constitucional, t. V, pp. 364 e segs.; Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit., 3.ª ed., nota V ao artigo 228.º; Rui Medeiros, Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores Anotado, pp. 19 e 20;
desenvolvidamente, Carlos Blanco de Morais, As Leis Reforçadas..., pp. 919 e segs.), sendo maioritária a tese de que a matéria eleitoral não é matéria de estatuto regional, mas dividindo-se quanto ao (des)valor de norma de estatuto que a inclua e aos efeitos desse (des)valor relativamente a posterior lei ordinária comum que a revogue.
Não se encerra esta nota final sem dar conta de que, posteriormente ao Acórdão 1/91, já a nova 1.ª Secção deste Tribunal, de algum modo na esteira das posições mais recentes de Jorge Miranda (citado Manual..., t. V, p.
367), se pronunciou - aqui sem qualquer ambiguidade - no sentido de que a norma «em excedência de Estatuto» (que o legislador teria qualificado erradamente como norma estatutária) com valor ou força formalmente superior ao da norma incluída em apropriado acto legislativo comum, carece de valor formal agravado, não vinculando, assim, o legislador sucessivo competente, que não incorrerá em ilegalidade se dispuser em contrário (Acórdão 460/99, de 13 de Julho de 1999, ainda inédito).
De todo o modo e tendo até em conta o que sobre a forma dos actos se estabelece no artigo 166.º, n.º 2, da CRP relativamente às leis eleitorais para as Assembleias Legislativas Regionais, esta é uma questão que se deixa aqui inteiramante em aberto.
8 - Decisão.
Pelo exposto e em conclusão, o Tribunal decide declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas dos artigos 13.º, n.º 3, e 14.º, n.º 2, do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, na redacção da Lei 39/80, de 5 de Agosto, e na numeração da Lei 61/98, de 27 de Agosto, por violação dos princípios da unicidade da cidadania portuguesa e da unidade do Estado (artigos 4.º, 6.º e 225.º da CRP).
Lisboa, 17 de Novembro de 1999. - Artur Maurício - Messias Bento - Guilherme da Fonseca - Vítor Nunes de Almeida - Paulo Mota Pinto - Alberto Tavares da Costa - Maria Fernanda Palma - Bravo Serra - Maria dos Prazeres Beleza - Luís Nunes de Almeida - Maria Helena Brito - José Manuel Cardoso da Costa.