de 17 de Dezembro
A Lei 46/77, de 8 de Julho, estabelecia no artigo 5.º o princípio da interdição do acesso à indústria de armamento a empresas privadas.Com a revogação deste diploma, operada pela Lei 88-A/97, de 25 de Julho, esta situação foi alterada, deixando de estar vedado o acesso à actividade de empresas privadas na indústria de armamento.
Contudo, a Lei 88-A/97 também estabelece que o exercício da actividade está subordinado à salvaguarda dos interesses da economia e da defesa nacionais, à segurança e tranquilidade dos cidadãos e aos compromissos internacionais do Estado. Impondo-se, igualmente, que sejam assegurados factores de solidez, transparência e idoneidade.
Nesta conformidade, consagra-se no presente diploma o princípio da autorização prévia para o exercício da actividade mediante o preenchimento expresso de diversos requisitos, a supervisão da Direcção-Geral de Armamento e Equipamentos de Defesa do Ministério da Defesa Nacional sobre as empresas e a exigência de credenciação de segurança nacional.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º e do n.º 5 do artigo 112.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto
1 - O presente diploma regula as condições de acesso e de exercício da actividade de indústria de armamento por empresas privadas.2 - Está igualmente sujeito ao presente diploma o exercício da actividade de indústria do armamento por empresas públicas ou de capitais exclusivamente públicos, criadas nos termos da legislação portuguesa.
Artigo 2.º
Salvaguarda de interesses nacionais
O exercício da actividade mencionada no artigo anterior está subordinado à salvaguarda dos interesses da defesa e da economia nacionais, à segurança e tranquilidade dos cidadãos e aos compromissos internacionais do Estado.
Artigo 3.º
Definições
1 - Para efeitos do presente diploma, considera-se:a) Indústria de armamento: o complexo de actividades que tenha por objecto a investigação, planeamento, ensaio, fabrico, montagem, reparação, transformação, manutenção e desmilitarização de bens militares, bem como o relativo às tecnologias associadas;
b) Bens militares: os produtos, equipamentos e os respectivos componentes, especialmente concebidos, desenvolvidos e produzidos ou transformados para fins militares;
c) Tecnologia militar: toda a informação, qualquer que seja o suporte material, necessária ao desenvolvimento, produção, ensaio, transformação e uso para fins militares.
2 - Para efeitos do presente diploma, consideram-se ainda bens e tecnologias militares o material de guerra e o equipamento e tecnologia de mísseis susceptíveis de afectar os interesses estratégicos nacionais, conforme listagem aprovada nos termos da legislação em vigor.
Artigo 4.º
Decisão
1 - A constituição de empresas privadas ou a inclusão da actividade de indústria de armamento nos estatutos de empresas já constituídas depende de autorização a conceder, caso a caso, por despacho do Ministro da Defesa Nacional.2 - No caso das sociedades por acções, as acções representativas do capital social são obrigatoriamente nominativas ou ao portador registadas.
3 - O despacho de autorização é publicado no Diário da República.
4 - O Ministro da Defesa Nacional pode delegar no Secretário de Estado da Defesa Nacional, com faculdade de subdelegação, a competência a que se refere o n.º 1 do presente artigo.
5 - A decisão de autorização para o acesso e exercício da actividade na indústria de armamento abrange a prática dos actos comerciais inerentes àquela actividade.
6 - A celebração de escrituras públicas de constituição ou de alteração de estatutos de empresas que envolvam o exercício de indústria de armamento depende da autorização prevista no n.º 1 do presente artigo, sob pena de nulidade.
Artigo 5.º
Pedido de autorização
1 - O pedido de autorização é apresentado à Direcção-Geral de Armamento e Equipamentos de Defesa do Ministério da Defesa Nacional, doravante designada abreviadamente DGAED, sob a forma de requerimento, acompanhado dos seguintes elementos:a) Estatutos da empresa e projecto de alteração, no caso das empresas já constituídas;
b) Projecto de estatutos, no caso das empresas a constituir;
c) Certidão do registo comercial;
d) Identificação de todos os sócios, administradores, directores ou gerentes e certificado de registo criminal;
e) Informação, relativamente a todas as entidades referidas na alínea anterior, das participações sociais de que sejam titulares, directamente ou por intermédio das pessoas referidas no n.º 2 do artigo 447.º do Código das Sociedades Comerciais;
f) Informações detalhadas relativas à estrutura do grupo, com indicação das situações previstas nos artigos 482.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais;
g) Acta do órgão social competente, deliberando a participação na sociedade, quando os sócios revistam a natureza de pessoa colectiva;
h) Estrutura orgânica da empresa, com especificação dos meios técnicos e financeiros, bem como dos meios directos e indirectos de pessoal e material a utilizar;
i) Lista de bens militares e tecnologias associadas que a sociedade se propõe produzir e desenvolver;
j) Principais mercados que a empresa se propõe atingir.
2 - No caso das empresas em nome individual, o requerimento deve ser acompanhado de certificado do registo criminal, bem como dos elementos referidos nas alíneas h), i) e j) do número anterior.
3 - Os requerentes devem ainda designar quem os represente perante as autoridades encarregadas de apreciar o processo de autorização.
Artigo 6.º
Deficiências do requerimento
Sempre que o requerimento não se encontre em conformidade com o disposto no artigo anterior, são notificados os requerentes, ou os seus representantes legais, para, no prazo de 30 dias, suprir as deficiências detectadas, sob pena de arquivamento do pedido.
Artigo 7.º
Diligências complementares
1 - A DGAED envia para parecer da Direcção-Geral da Indústria do Ministério da Economia uma cópia do requerimento devidamente instruído.2 - A DGAED pode solicitar quaisquer esclarecimentos ou elementos adicionais relevantes para a análise e a decisão do processo.
Artigo 8.º
Autorização
1 - A autorização é concedida desde que se verifiquem, cumulativamente, os seguintes requisitos:a) Adequação e suficiência dos meios humanos ao objectivo a atingir;
b) Adequação e suficiência de meios técnicos e recursos financeiros ao exercício da actividade;
c) Qualificação e idoneidade reconhecidas aos empresários, sócios e membros dos órgãos sociais;
d) Transparência da estrutura do grupo que permita o exercício, sem entraves, da supervisão, sempre que a empresa fizer parte de um grupo empresarial;
e) Credenciação de segurança, nos termos previstos no artigo 13.º do presente diploma.
2 - A decisão final deve ser proferida no prazo de 60 dias, findo o qual o interessado tem a faculdade de presumir indeferida a sua pretensão.
Artigo 9.º
Caducidade e renúncia da autorização
1 - A autorização caduca se a constituição da empresa não se realizar no prazo de 3 meses ou a empresa não iniciar a sua actividade no prazo de 12 meses contados a partir da data da publicação do despacho de autorização.
2 - As empresas podem renunciar expressamente à autorização, sem prejuízo das relações contratuais e comerciais que hajam entretanto estabelecido.
Artigo 10.º
Comunicações obrigatórias das empresas
1 - As empresas autorizadas nos termos do artigo 4.º do presente diploma devem comunicar à DGAED:
a) Anualmente, a identidade de todos os sócios, bem como o montante das respectivas participações, com base, nomeadamente, nos registos da assembleia geral anual;
b) A composição dos seus órgãos de administração e de fiscalização, no prazo máximo de 15 dias após a sua designação, justificando a sua adequada qualificação e idoneidade;
c) As alterações aos estatutos, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o estabelecido para a autorização inicial.
2 - As empresas referidas no n.º 1 do presente artigo devem ainda comunicar todas as alterações ocorridas nas situações previstas nas alíneas e) e f) do n.º 1 do artigo 5.º do presente diploma, quando relevantes à luz dos artigos 482.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais.
3 - No caso das empresas em nome individual, deve ser comunicada qualquer alteração relativa à titularidade, bem como à exploração da empresa.
Artigo 11.º
Comunicações obrigatórias dos sócios
1 - As transmissões de participações sociais que impliquem alterações da situação prevista nas alíneas e) e f) do n.º 1 do artigo 5.º do presente diploma devem ser comunicadas previamente à DGAED, sob pena de nulidade da operação.
2 - O Ministro da Defesa Nacional pode, no prazo de três meses a contar da data da respectiva comunicação, opor-se à transmissão da participação, notificando expressamente a pessoa singular ou colectiva da impossibilidade de proceder à operação pretendida, sob pena de nulidade e sem prejuízo da suspensão do exercício dos direitos de voto correspondentes às participações a que a mesma operação se refere.
3 - Para os efeitos do número anterior, o Ministro da Defesa Nacional pode exigir que lhe sejam fornecidas as informações que considere necessárias.
4 - Devem igualmente ser comunicados à DGAED os acordos parassociais entre sócios de empresas de indústria de armamento relativos ao exercício do direito de voto, sob pena de ineficácia.
5 - O Ministro da Defesa Nacional pode delegar as competências previstas neste artigo no Secretário de Estado da Defesa Nacional, com faculdade de subdelegação.
Artigo 12.º
Revogação da autorização
1 - A autorização pode ser revogada quando se verifique alguma das seguintes situações:a) Ter sido obtida por meio de falsas declarações ou por outros meios ilícitos, independentemente das sanções penais que ao caso couberem;
b) Deixar de se verificar alguma das condições de acesso ou de exercício da actividade exigidas no presente diploma;
c) Não serem efectuadas as comunicações previstas nos artigos 10.º e 11.º do presente diploma;
d) Irregularidades graves na administração, organização contabilística ou fiscalização interna da empresa;
e) Incumprimento das recomendações previstas na alínea c) do n.º 2 do artigo 15.º do presente diploma.
2 - A revogação da autorização compete ao Ministro da Defesa Nacional, que pode delegar esta competência no Secretário de Estado da Defesa Nacional, com faculdade de subdelegação.
3 - O despacho de revogação é notificado à empresa e publicado no Diário da República.
Artigo 13.º
Credenciação de segurança
1 - As empresas que, nos termos do n.º 1 do artigo 5.º, se candidatam à concessão de autorização para o exercício da actividade na indústria de armamento são objecto de processo de credenciação de segurança nacional a submeter à autoridade nacional de segurança.2 - Para efeitos do número anterior e a requerimento do interessado, a habilitação para a credenciação é apresentada pela DGAED junto do Gabinete Nacional de Segurança da Presidência do Conselho de Ministros.
3 - A decisão relativa à credenciação deve ser comunicada à DGAED até ao termo do prazo previsto no n.º 2 do artigo 8.º, sob pena de dever o pedido ter-se por indeferido.
Artigo 14.º
Legislação complementar
A importação, exportação e reexportação pelas empresas privadas, de produtos acabados e semiacabados, matérias-primas, bens militares e tecnologias associadas, no âmbito do n.º 5 do artigo 4.º do presente diploma, está sujeita à obtenção da documentação exigível nos termos do Decreto-Lei 371/80, de 11 de Setembro.
Artigo 15.º
Supervisão do exercício da indústria de armamento
1 - O exercício da actividade das empresas autorizadas nos termos do presente diploma fica sujeito à supervisão da DGAED.
2 - No exercício das funções de supervisão a DGAED dispõe de poderes para:
a) Obter informações pormenorizadas sobre a situação das empresas através, nomeadamente, da recolha de dados, da exigência de documentos relativos ao exercício da actividade ou de inspecções a efectuar nas instalações das empresas;
b) Acompanhar e vigiar a observância das disposições legais e regulamentares aplicáveis às empresas pelos seus dirigentes, responsáveis ou pessoas que as controlam;
c) Recomendar todas as medidas adequadas e necessárias para garantir o cumprimento das normas referidas na alínea anterior.
Artigo 16.º
Norma transitória
1 - As empresas privadas que actualmente exercem actividade no sector da indústria do armamento consideram-se autorizadas, sem prejuízo de lhes ser aplicável o preceituado no presente diploma.2 - As empresas referidas no número anterior estão, nomeadamente, obrigadas a prestar a informação a que se referem os artigos 5.º, 10.º e 11.º do presente diploma no prazo de 30 dias a contar da data da respectiva entrada em vigor, sob pena de revogação da autorização para o exercício da actividade de indústria de armamento.
Artigo 17.º
Norma revogatória
É revogada a alínea c) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto--Lei 214/86, de 2 de Agosto, no que se refere à matéria abrangida pelo presente diploma.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 14 de Outubro de 1998. - António Manuel de Oliveira Guterres - José Veiga Simão - José Eduardo Vera Cruz Jardim - Joaquim Augusto Nunes de Pina Moura.
Promulgado em 17 de Novembro de 1998.
Publique-se.O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 3 de Dezembro de 1998.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.