de 26 de Março
Considerando que a viabilização da perícia médico-legal e do exame médico referidos nos artigos 52.º e 43.º do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, depende da definição dos procedimentos de diagnóstico e dos exames periciais necessários à caracterização do estado de toxicodependência;Considerando que importa clarificar o modo de intervenção dos serviços médico-legais, dos serviços de saúde especializados e de médicos no apoio às autoridades policiais e judiciárias, designadamente no âmbito da realização daquelas perícias e exames e do cumprimento da obrigação de tratamento que seja imposta a toxicodependente ou da sujeição voluntária deste a tal tratamento;
Considerando que a definição prévia dos limites quantitativos máximos para cada dose média individual diária das plantas, substâncias ou preparações constantes das tabelas I a IV anexas ao Decreto-Lei 15/93, de consumo mais frequente, constitui elemento importante para a aplicabilidade do n.º 3 do artigo 26.º e do n.º 2 do artigo 40.º, ambos daquele diploma;
Considerando o disposto no n.º 1 do artigo 71.º do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro;
Ouvido o Conselho Superior de Medicina Legal:
Manda o Governo, pelos Ministros da Justiça e da Saúde, o seguinte:
I - Disposição geral
1.º
Objecto
A presente portaria tem como objecto a definição:a) Dos procedimentos de diagnóstico e dos exames periciais necessários à caracterização do estado de toxicodependência;
b) Do modo de intervenção dos serviços de saúde especializados no apoio às autoridades policiais e judiciárias;
c) Dos limites quantitativos máximos para cada dose média individual diária das plantas, substâncias ou preparações constantes das tabelas I a IV anexas ao Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, de consumo mais frequente.
II - Procedimentos de diagnóstico e exames periciais
2.º
Finalidades
1 - Para efeitos da perícia prevista no artigo 52.º do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, os procedimentos de diagnóstico e os exames periciais têm por finalidade determinar:a) O eventual estado de toxicodependência do arguido;
b) A natureza dos produtos consumidos pelo arguido;
c) O estado do arguido no momento da sua realização;
d) Os eventuais reflexos do consumo na capacidade do arguido para avaliar a ilicitude dos seus actos ou para se determinar de acordo com a avaliação feita.
2 - Para efeitos do exame médico previsto no artigo 43.º do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, os procedimentos de diagnóstico e os exames periciais têm por finalidade determinar:
a) O eventual estado de toxicodependência da pessoa a eles sujeita;
b) A existência de grave risco para a sua saúde ou de perigosidade social decorrentes daquele estado.
3.º
Enumeração
Os procedimentos de diagnóstico e os exames periciais que devem ser realizados tendo em vista as finalidades referidas no número anterior são os seguintes:a) Recolha da história pessoal, abrangendo o período pré-natal, a infância, a adolescência e a idade adulta;
b) Recolha da história familiar;
c) Recolha da situação actual;
d) Recolha da história clínica, abrangendo o eventual consumo de estupefacientes ou de substâncias psicotrópicas, os outros hábitos tóxicos e os antecedentes médico-cirúrgicos;
e) Exame objectivo, abrangendo a apresentação, o exame físico e o exame psiquiátrico;
f) Exames complementares, quando necessários, abrangendo os toxicológicos ao sangue, à urina ou a outros produtos biológicos, os serológicos e os psicológicos.
4.º
Intervenção do Conselho Superior de Medicina Legal
1 - O Conselho Superior de Medicina Legal pode, com respeito pelo disposto no número anterior, pormenorizar os conteúdos de cada procedimento e exame, bem como definir as respectivas metodologia e regras de realização.
2 - A pormenorização, metodologia e regras de realização referidas no número anterior são comunicadas aos institutos de medicina legal e, por intermédio do Conselho Superior da Magistratura, da Procuradoria-Geral da República e da Direcção-Geral da Saúde, aos tribunais judiciais, aos magistrados do Ministério Público junto deles e aos serviços de saúde especializados com competência para realizar aqueles procedimentos e exames.
3 - A pormenorização, metodologia e regras de realização são de observância obrigatória a partir do 1.º dia do mês seguinte ao da respectiva comunicação.
III - Intervenção dos serviços médico-legais, dos serviços de
saúde especializados e de médicos na realização de perícias
e de exames médicos e no tratamento de toxicodependentes.
5.º
Solicitações das autoridades judiciárias para realização
de perícias e de exames médicos
Depois de efectuadas as diligências necessárias ao apuramento das notícias ou dos indícios que dão o arguido ou outra pessoa como sendo toxicodependente e, no último caso, como existindo grave risco para a sua saúde ou perigosidade social decorrentes de tal estado, em termos tais que permitam presumir, com um razoável grau de segurança, pela confirmação de tais notícias ou indícios, as autoridades judiciárias competentes ordenam a realização de perícia ou de exame médico, aplicando-se-lhes, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 159.º do Código de Processo Penal, no artigo 37.º do Decreto-Lei 387-C/87, de 29 de Dezembro, e no Decreto-Lei 326/86, de 29 de Setembro.
6.º
Realização de exame médico
Sem prejuízo da aplicação das disposições legais referidas no número anterior, o exame médico previsto no artigo 43.º do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro:a) Pode também ser realizado pelo Serviço de Prevenção e Tratamento da Toxicodependência através das unidades especializadas de que dispõe ou que supervisiona;
b) Não pode ser realizado pelos serviços médico-legais.
7.º
Realização de exames complementares
1 - Relativamente aos exames complementares, designadamente toxicológicos ao sangue, à urina ou a outros produtos biológicos, podem as autoridades judiciárias que tenham ordenado a realização de perícia ou de exame médico:a) Ordenar a sua realização quando recebam dos peritos solicitação expressa para o efeito;
b) Ordenar ou autorizar a sua realização antecipada e conjuntamente com a ordem de realização da perícia ou do exame médico; ou c) Ordenar directa e imediatamente a sua realização a serviços médico-legais, a serviços de saúde especializados ou a médicos cujo centro de actividade se localize na comarca sede daquelas autoridades.
2 - A listagem dos serviços e dos médicos com certificação de qualidade para a realização dos exames complementares toxicológicos é comunicada pelo Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge aos serviços de saúde especializados com competência para realizar perícias e exames médicos e, por intermédio do Conselho Superior da Magistratura, da Procuradoria-Geral da República e do Conselho Superior de Medicina Legal, aos tribunais judiciais, aos magistrados do Ministério Público junto deles e aos institutos de medicina legal.
3 - As conclusões dos exames complementares, quando não sejam realizados pelos serviços ou médicos que tenham realizado a perícia ou o exame médico, são a estes comunicadas directamente ou por intermédio da autoridade judiciária que os tenha ordenado ou autorizado.
8.º
Solicitações das autoridades judiciárias para tratamento
de toxicodependente
1 - Quando a pena ou a medida processual penal aplicadas a toxicodependente não sejam privativas da liberdade e se encontrem subordinadas ao cumprimento da obrigação de tratamento, a autoridade judiciária determina que tal obrigação seja preferencialmente cumprida em serviço de saúde especializado público situado na área do respectivo círculo judicial ou, quando os custos correspondentes possam ser suportados pelo toxicodependente ou por outra entidade com recursos para o efeito, em serviço privado, situado na mesma área, que tenha sido devidamente licenciado pela entidade competente.2 - O disposto no número anterior é aplicável, com as devidas adaptações, à sujeição voluntária a tratamento prevista no n.º5 do artigo 43.ºdo Decreto-Lei n.º5/93, de 22 de Janeiro.
IV - Limites quantitativos máximos para cada dose média individual
diária das plantas, substâncias ou preparações de consumo
mais frequente e intervenção de entidades especializadas na
realização do respectivo exame laboratorial.
9.º
Limites
Os limites quantitativos máximos para cada dose média individual diária das plantas, substâncias ou preparações constantes das tabelas I a IV anexas ao Decreto-Lei n.º15/93, de 22 de Janeiro, de consumo mais frequente, são os referidos no mapa anexo à presente portaria, da qual faz parte integrante.
10.º
Intervenção de entidades especializadas
1 - Na realização do exame laboratorial referido nos n.º1 e 2 do artigo 62.º do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro, o perito identifica e quantifica a planta, substância ou preparação examinada, bem como o respectivo princípio activo ou substância de referência.
2 - Os métodos analíticos adoptados e a listagem das entidades especializadas na realização do exame laboratorial referido no número anterior são comunicados conjuntamente pelo Conselho Superior de Medicina Legal e pelo Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge às próprias entidades especializadas e, por intermédio do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República, aos tribunais judiciais e aos magistrados do Ministério Público junto deles.
V - Disposição final
11.º
Início de vigência
A presente portaria, com excepção dos n.º 2 dos seus n.º 7.º e 10.º, entra em vigor no 1.º dia do 2.º mês seguinte ao da sua publicação.
Ministérios da Justiça e da Saúde.
Assinada em 27 de Fevereiro de 1996.
O Ministro da Justiça, José Eduardo Vera Cruz Jardim. - A Ministra da Saúde, Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina.
MAPA A QUE SE REFERE O N.º 9.º
Plantas, substâncias ou preparações
Tabela
Limite quantitativo
constantes das tabelas I a IV de
máximo
consumo mais frequente
(1)
Heroína (diacetilmorfina)
I-A
(2) 0,1
Metadona
I-A
(2) 0,1
Morfina
I-A
0,2
Ópio (suco)
I-A
(3-b) 1
Cocaína (cloridrato)
I-B
(2) (4) 0,2
Cocaína (éster metílico de benzoilecgo- nina)I-B
(2) (4) 0,03
Canabis (folhas e sumidades floridas ou frutificadas)I-C
(3-c e d) 2,5
Canabis (resina)
I-C
(3c e e) 0,5
Canabis (óleo)
I-C
(3-f) 0,25
Fenciclidina (PCP)
II-A
(3-a) 0,01
Lisergida (LSD)
II-A
50 mg
MDMA
II-A
(2) (3-g) 0,1
Anfetamina
II-B
0,1
Tetraidrocanabinol (A9TIIC)
II-B
0,05
(1) Os limites quantitativos máximos para cada dose média individual diária são expressos em gramas, excepto quando expressamente se indique unidade diferente.(2) Os limites referidos foram estabelecidos com base em dados epidemiológicos referentes ao uso habitual.
(3) As quantidades indicadas referem-se:
a) Às doses diárias mencionadas nas farmacopeias oficiais;
b) Às doses equipotentes à da substância de abuso de referência;
c) À dose média diária com base na variação do conteúdo médio do TIIC existente nos produtos da Canabis;
d) A uma concentração média de 2% de A9TIIC;
e) A uma concentração média de 10% de A9TIIC;
f) A uma concentração média de 20% de A9TIIC;
g) Às doses médias habituais referidas na literatura, que variam entre 80 mg e 160 mg (ca. 2 mg/kg) da substância pura. No entanto, pode aparecer misturada com impurezas (por exemplo, MDA, cafeína) ou ainda em associação com heroína.
(4) Para a cocaína são especificados limites quantitativos diferentes, respectivamente para o cloridrato e para o éster metílico de benzoilecgonina, uma vez que o potencial aditivo das duas formas químicas é muito diferente.