Lei 63/93
de 21 de Agosto
Autorização ao Governo para aprovar um novo Código da Estrada
A Assembleia da República decreta, nos termos dos artigos 164.º, alínea e), 168.º, n.º 1, alíneas b), c) e d), e 169.º, n.º 3, da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto
Fica o Governo autorizado a aprovar um novo Código da Estrada, a revogar a legislação vigente sobre essa matéria e a proceder à adaptação da legislação complementar.
Artigo 2.º
Sentido e extensão
1 - O Código a aprovar ao abrigo da presente lei adoptará, em matéria de trânsito nas vias abertas ao público, um regime jurídico em conformidade com as normas constantes de instrumentos internacionais a que Portugal se encontra vinculado e as recomendações dos organismos internacionais especializados, tendo essencialmente em vista a segurança dos utentes.
2 - A autorização referida no artigo anterior contemplará:
a) A punição, como actos ilícitos de mera ordenação social, da violação das normas disciplinadoras do trânsito nas vias abertas ao trânsito público;
b) A adaptação, em relação às contra-ordenações em matéria de trânsito, dos princípios gerais do regime jurídico geral, previstos no Decreto-Lei 433/82, de 27 de Outubro, simplificando o processo na fase administrativa, sem prejuízo de assegurar aos arguidos os direitos de audiência e de defesa;
c) A fixação ao limite máximo das coimas em 200000$00, salvo tratando-se da organização de provas ou manifestações desportivas de veículos nas vias abertas ao trânsito público em que esse montante poderá ser elevado até 750000$00, aplicável aos organizadores, acrescida do que for aplicável a cada um dos condutores participantes ou concorrentes;
d) A consagração da sanção acessória de inibição de conduzir, com o limite máximo de um ano de inibição por cada infracção;
e) A previsão da punição a título de negligência das contra-ordenações em matéria de trânsito;
f) A adopção do princípio do cúmulo material das sanções aplicáveis às infracções em concurso;
g) A admissão da possibilidade de pagamento voluntário pelo valor mínimo da coima aplicável até ao momento da aplicação administrativa das sanções;
h) A atribuição ao pagamento voluntário da coima do efeito de aceitação da aplicação da sanção acessória de inibição, pelo mínimo;
i) A previsão da faculdade de não aplicação da sanção acessória de inibição de conduzir, ou a sua atenuação especial, pela redução dos seus limites a metade, em atenção às circunstâncias da infracção e ao facto de o infractor não ter praticado contra-ordenação punível com a sanção acessória de inibição nos últimos três anos;
j) A consagração da faculdade de suspensão da sanção acessória de inibição de conduzir, entre seis meses e dois anos, verificando-se os pressupostos de que a lei penal geral faz defender a suspensão da execução das penas criminais;
l) A consagração do princípio de que a suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir possa ser condicionada à prestação de caução de boa conduta a fixar entre 20000$00 e 200000$00, tendo em conta a medida da sanção e a situação económica do condutor;
m) A obrigação do cumprimento da sanção acessória cuja execução foi suspensa na sua execução e perda de caução a favor do Estado se, durante o período de suspensão, o arguido for condenado por contra-ordenação punível com sanção acessória de inibição de conduzir ou praticar actos a que seja aplicável a medida de segurança de inibição de conduzir;
n) A graduação das sanções tendo em conta as circunstâncias da infracção, a culpa do agente e os antecedentes do infractor;
o) A adopção, como medida de segurança, da cassação da carta ou licença de condução quando, em face da gravidade das contra-ordenações praticadas e da personalidade do agente, este deva ser julgado inapto para a condução de veículo motorizado;
p) A interdição de obtenção de carta ou licença de condução, por período até três anos, em caso de cassação da carta ou licença e condenação por condução de veículo motorizado sem habilitação legal;
q) A atribuição de fé pública aos factos constantes de auto de notícia levantado pelas autoridades ou agentes de autoridade no exercício das suas funções de fiscalização do trânsito, até prova em contrário;
r) A atribuição de fé pública, até prova em contrário, aos elementos de prova obtidos através de aparelhos ou instrumentos aprovados nos termos legais e regulamentares;
s) A dispensa da obrigação de indicação de testemunhas relativamente aos factos constantes de autos de notícia levantados pelas autoridades ou agentes de autoridade;
t) O dever do proprietário, usufrutuário, comodatário, usuário, depositário, mero possuidor ou locatário de proceder à identificação do condutor do veículo, salvo provando a sua utilização abusiva, estabelecendo-se a punição com as sanções aplicáveis à infracção quando a pessoa obrigada a identificar o condutor não o fizer;
u) A responsabilização do condutor do veículo pelas infracções cometidas com a circulação do mesmo e a responsabilização da pessoa que tiver a sua posse efectiva pelas infracções relativas às disposições que condicionam a admissão do veículo ao trânsito nas vias abertas ao trânsito público;
v) A responsabilização, como autores das contra-ordenações, dos comitentes que exijam dos condutores um esforço inadequado à prática segura da condução ou os sujeitem a horários incompatíveis com a necessidade de repouso, quando as infracções sejam consequência do estado de fadiga do condutor;
x) A responsabilização dos instrutores relativamente às infracções cometidas pelos instruendos, que não resultem de desobediência às indicações de instrução;
z) A responsabilização dos que facultem a utilização de veículos a pessoas que saibam não estarem devidamente habilitadas para conduzir, estejam sob a influência do álcool, de estupefacientes ou se encontrem sujeitos a qualquer outra forma de redução das faculdades físicas ou psíquicas necessárias ao exercício da condução;
aa) A imposição aos infractores não domiciliados em Portugal da obrigação de efectuarem o pagamento voluntário da coima ou depósito do valor máximo da coima aplicável à infracção cometida, quando lhe for aplicável a sanção de inibição, para poderem prosseguir viagem, sob pena de apreensão do veículo, que responderá pelo pagamento das coimas devidas e se manterá até à efectivação do pagamento da coima ou à decisão obsolutória;
bb) A obrigação de sujeição dos condutores a provas para detecção de intoxicação pelo álcool, estupefacientes ou substâncias equiparadas por legislação especial;
cc) A imposição aos utentes da via pública, suspeitos de terem contribuído para acidentes de trânsito, do dever de sujeição a provas para detecção de possíveis intoxicações pelo álcool, estupefacientes ou substâncias legalmente equiparadas;
dd) A possibilidade de apreensão preventiva pelas autoridades de fiscalização do trânsito ou seus agentes, das cartas ou licenças de condução quando existam suspeitas fundadas da sua contrafacção ou viciação fraudulenta, designadamente para cumprimento da sanção de inibição de conduzir ou cassação da carta ou licença;
ee) A apreensão pelas autoridades ou agentes de autoridade de fiscalização do trânsito, da carta de condução quando determinada pelas entidades competentes, designadamente pelo facto de o condutor ter sido, em exame a que se haja submetido, considerado incapaz para conduzir com segurança ou de não se apresentar, sem justificação, aos exames regulamentares estabelecidos para revalidação da carta ou licença, ou, ainda, para comprovar a sua capacidade técnica, física ou psíquica para a condução;
ff) A apreensão preventiva, pelas autoridades de fiscalização do trânsito ou seus agentes, do livrete e demais documentos que ao veículo respeitem, quando haja fundada suspeita da sua contrafacção ou viciação, quando as características do veículo a que respeitam não confiram com as nele mencionadas, quando o veículo, em consequência de acidente, se mostre inutilizado, quando o veículo for apreendido, quando o veículo não oferecer condições de segurança ou quando, estando afecto a transporte público de passageiros, não tenha suficiente comodidade;
gg) A apreensão preventiva dos veículos, até decisão da autoridade judiciária, quando transitem com números de matrícula que não lhes correspondam, circulem sem chapas de matrícula ou não se encontrem matriculados;
hh) A apreensão de veículos pelas autoridades de fiscalização de trânsito ou seus agentes, quando transitem com números de matrícula que não sejam válidos para território nacional, circulem sem livrete ou documento equivalente, não tenha sido efectuado o respectivo seguro de responsabilidade civil, nos termos da lei, ou o registo de propriedade não tenha sido regularizado no prazo legal;
ii) A previsão da perda a favor do Estado do veículo apreendido se o facto que deu origem à apreensão não for por negligência do proprietário, regularizado no prazo de 90 dias;
jj) A previsão da possibilidade de manutenção da apreensão de veículo, sem aplicação do disposto na alínea anterior, até que se mostrem satisfeitas as indemnizações devidas por acidente ou seja prestada caução por montante equivalente ao valor mínimo do seguro obrigatório, relativamente aos veículos apreendidos em virtude de se encontrarem a circular sem seguro de responsabilidade civil;
ll) A remoção de veículos em caso de estacionamento abusivo ou que constitua perigo ou grave perturbação para o trânsito e, ainda, quando se encontrem estacionados na berma de auto-estrada ou via equiparada, responsabilizando-se solidariamente, em qualquer caso, os proprietários, usufrutuários e adquirentes com reserva de propriedade ou locatários em regime de locação financeira por todas as despesas ocasionadas pela remoção;
mm) A presunção de abandono, a favor do Estado, do veículo que, tendo sido removido, não seja reclamado e levantado no prazo de 90 dias após a notificação aos interessados.
3 - O Governo procederá à revisão da legislação vigente sobre imobilização de veículos, constante do Decreto-Lei 110/90, de 3 de Abril, adaptando-a ao novo Código da Estrada.
4 - O Governo poderá proceder à revisão ou revogação das normas penais incriminadoras relativas à violação das normas sobre o trânsito, visando a sua adaptação às normas do Código da Estrada, desde que não sejam alterados os tipos de crime ou agravados os limites das sanções aplicáveis.
5 - O Governo poderá proceder à revisão das normas penais incriminadoras relativas à condução sobre influência do álcool constantes do Decreto-Lei 124/90, de 14 de Abril, podendo alargar os pressupostos de punição à condução sob influência de estupefacientes, psicotrópicos, estimulantes ou outras substâncias similares e do procedimento para sua detecção e controlo, observando os limites máximos da punição estabelecidos nesse decreto-lei e assegurando aos suspeitos garantias de controlo dos testes de detecção da influência das referidas substâncias.
Artigo 3.º
Duração
A autorização legislativa concedida pela presente lei tem a duração de 180 dias.
Aprovada em 2 de Julho de 1993.
O Presidente da Assembleia da República, António Moreira Barbosa de Melo.
Promulgada em 28 de Julho de 1993.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendada em 3 de Agosto de 1993.
Pelo Primeiro-Ministro, Joaquim Fernando Nogueira, Ministro da Presidência.