Sentença n.º 18/2014
Proc. n.º 27/2013 -PAM
2.ª Secção
SENTENÇA N.º 18/2014 - 2.ª SECÇÃO
I. RELATÓRIO
1 - Nos presentes autos vai o ex-presidente da junta de freguesia de Ervededo - Chaves, Álvaro José Madureira Pereira, indiciado pela prática de factos que preenchem uma infração prevista pela alínea a) do n.º 1 do artigo 66.º da Lei 98/97, de 26 de Agosto(1) [doravante LOPTC] «[p]ela falta injustificada de remessa de contas ao Tribunal, pela falta injustificada da sua remessa tempestiva[...]», relativamente à conta de gerência de 2011.
2 - No cumprimento do disposto no artigo 13.º da LOPTC, procedeu-se à citação para o contraditório do responsável, com a observância dos formalismos legais.
3 - Foi apresentada resposta.
4 - O Tribunal é competente, conforme o disposto nos artigos 202.º e 214.º da CRP e nos artigos 1.º n.º 1, 58.º, n.º 4 e 78.º, n.º 4, alínea e) da LOPTC.
5 - O processo está isento de nulidades que o invalidem, não existem outras nulidades, exceções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa, e que cumpra conhecer.
II. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 - Os Factos
Instruído o processo com os necessários elementos probatórios e notificado o responsável para o contraditório, resultam os seguintes:
2.1.1 - Factos Provados:
1 - Em 30 de Abril de 2012, o responsável, Álvaro José Madureira Pereira, era o presidente da junta de freguesia de freguesia de Ervededo - Chaves.
2 - Os documentos de prestação de contas da junta de freguesia de Ervededo - Chaves, referentes à gerência do ano de 2011, não deram entrada no Tribunal até ao dia 30.04.2012, conforme atesta o Departamento de Verificação Interna de Contas, no âmbito das suas legais competências, na Informação n.º 23/2012 - DVIC.2, de 31.10.2012 [cf. fls. 1,2, 3, 5, 10 a 11].
3 - Em 19.11.2012, através do ofício-circular n.º 17892, remetido via correio registado com AR, aquele Departamento informou o presidente da junta de freguesia de Ervededo-Chaves de que não havia cumprido o disposto no artigo 52.º n.º 4 da LOPTC, uma vez que não havia registo do envio da conta de gerência de 2011, pelo que se instou que informasse o que tivesse por conveniente e enviasse, em 5 dias úteis, a documentação de prestação de contas relativa ao ano de 2011, com a expressa advertência de que a «falta injustificada de remessa de contas ou a sua remessa intempestiva» constituía uma infração prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 66.º da LOPTC [cf. fls.11 a 12].
4 - Em 28.01.2013, em resposta ao mencionado ofício-circular n.º 17892, veio aquela autarquia responder, por ofício s/n, na pessoa do presidente da assembleia de freguesia, Alexandre Pereira, informando o Tribunal que «a prestação de contas relativa ao ano económico de 2011, foram apresentadas e aprovadas por unanimidade em reunião nos prazos legais, não percebendo o motivo dessas mesmas não terem chegado ao Tribunal de Contas» [cf. fls. 13].
5 - Ademais, acrescentou que o presidente da junta de freguesia se encontrava de «baixa médica até ao final do mês de janeiro, por motivo de saúde e a senhora tesoureira em licença de maternidade», pelo que protestou que "tomaria conta daquele assunto" para «podermos proceder ao seu envio o mais rápido possível» [ibidem].
6 - Em 05.02.2013, através do ofício n.º 1582, na sequência da resposta expendida por aquela autarquia, veio o Tribunal conceder prorrogação do prazo para apresentação de resposta ao ofíciocircular n.º 17892, por 10 dias úteis contados desde a data da assinatura do AR [cf. fls. 17 e 18].
7 - Decorrido o prazo concedido, apesar de regularmente notificado através do ofício n.º 1582, não foi remetida qualquer documentação ou prestada qualquer informação adicional ao Tribunal [cf. fls. 18].
8 - Em 17.06.2013, perante o injustificado incumprimento do dever legal de remessa de contas ao Tribunal, é proferido despacho judicial determinando a abertura de processo autónomo de multa [doravante PAM], com vista a apurar da responsabilidade pela prática da infração referenciada, cf. alínea a) do n.º 1 do artigo 66.º da LOPTC, sancionável com aplicação de uma multa compreendida entre o limite mínimo de 5 UC [(euro)510,00] e o limite máximo de 40 UC [(euro)4.080,00] cf. n.º 2 do artigo 66.º da LOPTC [cf. fls. 24 a 26].
9 - Em consequência da factualidade apurada, nesse mesmo despacho judicial é ordenada a citação nominal do responsável, Álvaro José Madureira Pereira, presidente da junta de freguesia de Ervededo - Chaves, em observância do princípio do contraditório [cf. artigo 13.º da LOPTC], para se pronunciar em 10 dias úteis acerca do imputado incumprimento do dever legal de remessa de contas concernentes à gerência de 2011, oferecendo a sua defesa ou efetuando o pagamento correspondente à infração prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 66.º da LOPTC, pelo valor mínimo legal de (euro)510,00 [ibidem].
10 - A citação do aludido despacho foi efetuada por correio registado com AR e menção de «confidencial», através do ofício n.º 9818 de 26.06.2013, tendo sido concretizada em 01.07.2013 [cf. fls. 27 a 31].
11 - Em 06.07.2013, por ofício s/n, expedido em 09.07.2013, no exercício do contraditório, veio o responsável pronunciar-se e «justificar que a remessa de contas de gerência do ano de 2011 foi aprovada em reunião de Junta de Freguesia e apresentadas em reunião de Assembleia de Freguesia dentro dos prazos legais», mais invocando que «esta junta de freguesia na noite de 6 de Fevereiro 2013 para o dia 7 de Fevereiro 2013 foi visitada por estranhos [...] foi alvo de assaltos onde foram furtados desse gabinete material informático, computadores, monitores, impressora, documentos (licenças de canídeos, atestados, ofícios, declarações, contabilidade...)». Solicitando, assim, ao Tribunal que «aceite esta justificação da falta da remessa de contas de gerência 2011», a qual protestou enviar «o mais rápido possível» [cf. fls. 32, 36, 37, 38].
12 - Como elementos probatórios veio juntar, em anexo: a participação criminal efetuada junto da GNR de Chaves, em 11.02.2013, e o correlativo termo de notificação [cf. artigo 75.º do CPP], realizado por aquele OPC, para efeitos de eventual dedução do pedido de indemnização cível [cf. fls. 36 e 37].
13 - Em 17.02.2014, através da Comunicação Interna n.º 42/2014 - DVIC.2, foi obtida a informação de que continuava omissa a remessa da conta de gerência da 2011 daquela autarquia [cf. fls. 40].
14 - Até à presente data, os documentos de prestação de contas da junta de freguesia de Ervededo-Chaves, referentes à gerência de 2011, não foram remetidos ao Tribunal de Contas pelo imputado responsável, apesar de ter protestado fazê-lo «o mais rápido possível».
15 - O responsável sabia ser sua obrigação pessoal, nos termos legais, remeter até 30 de abril de 2012, os documentos de prestação de contas, relativos à gerência de 2011, da referenciada autarquia.
16 - Agiu o responsável de forma livre e consciente, sabendo ser proibida por lei a sua conduta omissiva.
17 - Na atualidade, o responsável já não exerce funções como presidente da junta de Ervededo - Chaves, sendo o atual presidente daquela autarquia: Ilídio Jorge Chaves Correia, desde as eleições autárquicas realizadas a 29 de setembro de 2013.(2)
18 - Em 21.05.2014, foi notificada pessoalmente através de OPC a atual presidente daquela assembleia de freguesia, Stéphanie Lopes Soares, para que, no prazo máximo de 5 dia úteis, providenciasse pela remessa ao Tribunal de Contas das atas completas de apreciação dos documentos de prestação de contas relativos às gerências de 2011, 2012, e 2013, até porque de acordo com o teor do ofício do anterior presidente da assembleia de freguesia, Alexandre Pereira [vide facto provado 4], pelo menos relativamente a 2011, as contas foram apresentadas e apreciadas por unanimidade. Por outro lado, concebendo que aquele órgão apreciou e aprovou as aludidas contas, certamente, os originais das mesmas deveriam constar dos arquivos da assembleia de freguesia, pelo que se solicitava o envio ao Tribunal de cópia autenticada de cada uma delas [cf. fls. 50].
19 - Posteriormente, em 27.05.2014, foi notificado pessoalmente por OPC, o atual presidente daquela junta de freguesia, Ilídio Jorge Chaves Correia, para que, no prazo máximo de 5 dias, úteis viesse remeter os documentos de prestação de contas relativos às gerências de 2011, 2012 e 2013, daquela freguesia, e «informar se há ou não razões impeditivas para a prestação de contas, em virtude de o anterior executivo não ter transmitido quaisquer elementos relativos à contabilidade da Junta, quer em papel quer em suporte informático e bem assim de documentos justificativos das despesas, certidão das receitas, mapas de controlo orçamental da receita e de despesa, mapa de operações de tesouraria, mapa de fluxos de caixa, extratos bancários, reconciliações bancárias, inventário dos bens existentes na Freguesia e norma de controlo interno» [cf. fls. 51].
20 - Por ofício s/n datado de 27.05.2014, rececionado no Tribunal em 29.05.2014, veio Ilídio Jorge Chaves Correia, atual presidente da junta, informar que «apesar das várias diligências efetuadas, não nos foi possível receber da Junta cessante os documentos referente ao mandato anterior nem quaisquer outros. Em função dessa situação não nos é possível remeter os documentos de prestação de contas referentes aos anos que nos são solicitados. Continuamos a contactar os mandatários da Junta anterior no sentido de resolver esta situação, visto não ter obtido respostas dos mesmos» [cf. fls.52].
21 - No mesmo sentido, por ofício s/n datado de 27.05.2014, rececionado no Tribunal em 17.06.2014, veio, a atual presidente da assembleia de freguesia, Stéphanie Lopes Soares, informar que «apesar das várias diligências efetuadas, não nos foi possível receber da assembleia de freguesia cessante os arquivos contabilísticos referentes ao mandato anterior incluindo, o ano de 2011, e na qual não se encontra arquivado nenhum documento referente a este mandato na respetiva Junta. Em função dessa situação não nos é possível remeter os documentos de prestação de contas referentes aos anos que nos são solicitados. Continuamos a contactar os mandatários da Junta anterior no sentido de resolver esta situação, visto não ter obtido respostas dos mesmos» [cf. fls. 54].
2.1.2 - Factos não provados
Não damos como provado que o responsável tivesse agido com a intenção deliberada de não remeter a documentação de prestação de contas ao Tribunal.
2.2 - Motivação da decisão de facto
A factualidade provada resulta do conteúdo dos documentos juntos aos autos, nomeadamente:
- A Informação n.º 23/2012 - DVIC.2, de 31.10.2012, do Departamento de Verificação Interna de Contas, dando conta da omissão de remessa da conta de gerência de 2011, relativa à junta de freguesia de Ervededo - Chaves [cf. fls. 1 a 5].
- O ofício-circular n.º 17892, de 19.11.2012, remetido via correio registado com AR, notificando o responsável para que cumprisse o disposto no artigo 52.º n.º 4 da LOPTC, remetendo em 5 dias úteis a documentação de prestação de contas relativa ao ano de 2011 [cf. fls.11 a 12].
- O ofício s/n, remetido pelo presidente da assembleia [órgão deliberativo da autarquia],em 28.01.2013, em resposta ao supra mencionado ofício-circular n.º 17892, ao invés do responsável à data, presidente daquela junta de freguesia [órgão executivo], por alegada baixa médica [cf. fls. 13 e 15].
- O ofício n.º 1582, de 05.02.2013, através do qual o Tribunal veio conceder uma prorrogação do prazo inicial por 10 dias úteis, para apresentação da resposta ao ofício-circular n.º 17892 [cf. fls. 17 e 18].
- O despacho judicial proferido em 17.06.2013, imputando a indiciada prática de infração processual financeira [cf. fls. 24 a 26].
- O ofício n.º 9818, de 26.06.2013, remetido via correio registado com AR, e menção de «confidencial», através do qual se cita nominalmente o responsável, nos termos do despacho judicial de 17.06.2013, para efeitos do disposto no artigo 13.º da LOPTC, e que é concretizada em 01.07.2013 [cf. fls. 27 a 31].
- O ofício s/n, de 06.07.2013, expedido em 09.07.2013, através do qual o responsável, em sede do contraditório, vem responder à citação do Tribunal [cf. fls. 32, 36, 37 e 38].
- A informação prestada pelo Departamento de Verificação Interna de Contas, através da Comunicação Interna n.º 42/2014 - DVIC.2, de 17.02.2014, comunicando que a remessa da conta de gerência da 2011 daquela autarquia continuava omissa no Tribunal [cf. fls. 40].
- A notificação pessoal, por OPC [GNR de Chaves], em 21.05.2014, de Stéphanie Lopes Soares, atual presidente daquela assembleia de freguesia, para que, no prazo máximo de 5 dia úteis, providenciasse pela remessa ao Tribunal de Contas das atas completas de apreciação dos documentos de prestação de contas relativos às gerências de 2011, 2012, e 2013, e prestasse esclarecimentos [cf. fls. 50].
- A notificação pessoal, por OPC [GNR de Chaves], em 27.05.2014, do atual presidente daquela junta de freguesia, Ilídio Jorge Chaves Correia, para que, no prazo máximo de 5 dias úteis, viesse remeter os documentos de prestação de contas relativo à gerência de 2011, 2012 e 2013 e esclarecer o Tribunal sobre outros elementos documentais pertinentes [cf. fls. 51].
- O ofício s/n datado de 27.05.2014, rececionado no Tribunal em 29.05.2014, através do qual veio Ilídio Jorge Chaves Correia, presidente da junta, dar conta do insucesso relativo à obtenção dos documentos de prestação de contas solicitados junto do executivo cessante [cf. fls. 52].
- O ofício s/n datado de 27.05.2014, rececionado no Tribunal em 17.06.2014, veio a atual presidente da assembleia de freguesia, Stéphanie Lopes Soares, informar no mesmo sentido, dando conta do insucesso na obtenção dos documentos de prestação de contas solicitados junto da assembleia de freguesia cessante [cf. fls. 54].
III. ENQUADRAMENTO JURÍDICO
1 - Os factos geradores de responsabilidade financeira sancionatória encontram-se tipificados no artigo 65.º da LOPTC, elencando o artigo 66.º as denominadas «Outras Infracções», são condutas que devido à sua censurabilidade o legislador entendeu cominar com uma sanção pecuniária [multa], constituindo infrações processuais financeiras puníveis pelo Tribunal, nomeadamente nas seguintes situações:
. Falta injustificada de remessa de contas ao Tribunal (artigo 66.º, n.º 1 al. a), da Lei 98/97, de 26 de Agosto);
. Falta injustificada da sua remessa tempestiva ao Tribunal (artigo 66.º, n.º 1 al. a), da mesma Lei);
. Apresentação das contas ao Tribunal com deficiências tais que impossibilitem ou gravemente dificultem a sua verificação (artigo 66.º, n.º 1 al. a), da mesma Lei);
. Falta injustificada de prestação tempestiva de documentos que a lei obrigue a remeter (artigo 66.º, n.º 1 al. b), da mesma Lei);
. Falta injustificada de prestação de informações pedidas, de remessa de documentos solicitados ou de comparência para prestação de declarações (artigo 66.º, n.º 1 al. c), da mesma Lei);
. Falta injustificada da colaboração devida ao Tribunal (artigo 66.º, n.º 1 al. d), da mesma Lei).
2 - Encontra-se o responsável indiciado da prática de uma infração processual financeira «pela falta injustificada de remessa de contas ao Tribunal, pela falta injustificada da sua remessa tempestiva...», conforme a alínea a) do n.º 1 do artigo 66.º da LOPTC. É em face da citada disposição legal e da matéria fáctica apurada que importa subsumir juridicamente a sua conduta.
3 - Não é tão só um problema de prestação de contas e informações ao Tribunal. Com efeito, tal como se pode ler no artigo 15.º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de Agosto de 1789, «A sociedade tem o direito de pedir contas a todo o agente público pela sua administração». Trata-se, na verdade, de um princípio de direito constitucional positivo em vigor em França, mas que se integra na matriz constitucional europeia afirmada e rececionada no Tratado da União Europeia na parte relativa ao princípio da transparência e prestação de contas por parte de todos os que estando investidos no exercício de funções públicas, administrem dinheiros e ativos públicos, que lhes são postos à sua disposição, para a satisfação de necessidades coletivas, por forma legal e regular, em obediência aos princípios da vontade geral, da soberania popular, da juridicidade dos comportamentos dos agentes públicos e da boa gestão dos recursos públicos.
4 - O sancionamento das condutas elencadas no artigo 66.º da LOPTC faz impender os responsáveis das instituições sujeitas à jurisdição do Tribunal de Contas no cumprimento dos deveres funcionais de colaboração, permitindo assim o exercício do controlo da legalidade e regularidade financeira da Administração e do dispêndio dos dinheiros públicos.
5 - Destarte, o mecanismo sancionatório elencado no artigo 66.º da LOPTC reveste-se de crucial importância, uma vez que constitui o instrumento legal à disposição do Tribunal para que este possa reagir por si aos bloqueios e obstáculos que possam ser criados à sua ação, pelas condutas ilícitas e culposas dos responsáveis obrigados à prestação de contas ao Tribunal.
6 - A obrigatoriedade de prestação de contas é um dever jurídico que opera ope legis [cf. alínea a) do n.º 1 do artigo 66.º da LOPTC], ou seja, a infração verifica-se a partir do momento em que o responsável, injustificadamente, não cumpre, o inequívoco dever legal de remessa das contas ao Tribunal, seja na forma omissiva ou comissiva, uma vez que naquela disposição sanciona-se não só a «falta [injustificada] de remessa, a falta de remessa tempestiva», mas também, «a prestação de contas com deficiências que impossibilitem gravemente a sua verificação».
7 - Por outro lado, constitui um imperativo legal que deve ser, obrigatoriamente, concretizado pelos responsáveis ao abrigo de especificas Instruções e Resoluções do Tribunal de Contas, «órgão supremo de fiscalização da legalidade das despesas públicas e de julgamento das contas que a lei mandar submeter-lhe» [cf. n.º 1 do artigo 214.º da Constituição]. In casu, conforme a resolução 23/2011, 2.ª Secção, de 30 de novembro, publicada no DR 2.ª série n.º 239 de 15.12.2011 - e nos termos das Instruções 1/2001, 2.ª Sec., aprovadas pela Resolução 4/2001, 2.ª Sec., de 12 de julho.
8 - Atendendo ao preceituado na alínea e) do n.º 2 do artigo 34.º da Lei 169/99, de 18 de setembro(3) - diploma que «[e]stabelece o quadro de competências e regime jurídico de funcionamento, dos órgãos dos municípios e das freguesias» - e conforme resulta do disposto na alínea m) do n.º 1 do artigo 51 da LOPTC, as juntas de freguesias prestam contas estando legalmente obrigadas remeter as mesmas ao Tribunal de Contas, até ao dia 30 de abril do ano seguinte àquele a que respeitam [cf. n.º 4 do artigo 52.º da LOPTC].
9 - No que concerne à específica responsabilidade do aludido autarca, o n.º 1 do artigo 38.º da Lei 169/99, de 18 de Setembro(4) vem enumerar as competências do presidente da junta de freguesia, sendo que lhe compete, nos termos da al. a)«representar a junta em juízo e fora dele»; nos termos da alínea g) «executar as deliberações da junta e coordenar a respetiva atividade»; e da alínea n) «assinar em nome da junta de freguesia toda a correspondência».
10 - Assim, e sendo que à data limite para a prestação de contas relativas à gerência de 2011, o dia 30 de abril de 2012 [cf. n.º 4 do artigo 52.º da LOPTC], o responsável era presidente em funções da mencionada junta de freguesia, logo, impendia sobre si o dever de enviar ao Tribunal os documentos de prestação de contas, pelo que, nos termos artigos 67.º, n.º 3, 61.º, n.º 1 e 62.º, n.º 2 todos da LOPTC, é-lhe imputada a responsabilidade pela prática da infração.
11 - A referida infração é sancionada com a aplicação de uma multa compreendida entre o limite mínimo de 5 UC, a que corresponde o valor de (euro) 510,00 e o limite máximo de 40 UC a que corresponde o valor de (euro) 4.080,00 [cf. n.º 2 do artigo 66.º da LOPTC].
12 - Atenta a matéria de facto dada como provada [facto n.º 3], foi o responsável notificado, uma vez que não havia cumprido o disposto no artigo 52.º n.º 4 da LOPTC, para que informasse o que tivesse por conveniente e remetesse, em 5 dias úteis, a documentação de prestação de contas relativa ao ano de 2011, e expressamente advertido de que a «falta injustificada de remessa de contas ou a sua remessa intempestiva» constituíam infração prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 66.º da LOPTC.
13 - Foi-lhe, ainda, posteriormente concedido um prazo adicional de 10 dias úteis [facto n.º 6], para apresentação de resposta ao teor do oficio-circular 17892, em razão dos argumentos invocados pelo presidente da assembleia de freguesia [factos provados n.os 4 e 5].
14 - Decorrido aquele prazo adicional [facto provado n.º 7] e mantido o incumprimento, mesmo após solicitação do Tribunal, foi instaurado Processo Autónomo de Multa [PAM] e proferido merecido despacho judicial, em 17.06.2013 [facto provado n.º 7 e 8], com vista à citação nominal do responsável, para efeitos de exercício do contraditório [cf. artigo 13.º da LOPTC] relativamente ao incumprimento do dever legal de prestação da conta de gerência de 2011, para que viesse pronunciar-se, oferecendo a sua defesa ou efetuando o pagamento relativamente à imputada infração da alínea a) do n.º 1 artigo 66.º da LOPTC, pelo valor mínimo legal de (euro)510,00 [factos provados n.os 8 e 9].
15 - A citação do responsável foi efetuada por correio registado com AR e menção de «confidencial», através do ofício n.º 9818 de 26.06.2013, tendo sido concretizada em 01.07.2013 [facto provado n.º 10].
16 - Conforme os factos provados n.os 11 e 12, o responsável apresentou argumentos para justificação da não remessa da prestação de contas da gerência de 2011, todavia, sem o lograr alcançar uma vez que, independentemente de ter sido aprovada [ou não] a conta de gerência de 2011 pelos órgãos autárquicos, não foi cumprido o dever legal de remessa dessa conta ao Tribunal, nem apresentada justificação plausível para esse facto.
17 - Por outro lado, o furto ocorrido nas instalações na noite de 6 para 7 de fevereiro de 2013 e comunicado em 11.02.2013 ao OPC [factos provados n.º 11 e 12], não afasta o ilícito decorrente da não oportuna apresentação da conta de gerência de 2011, a qual deveria ter ocorrido até 30 abril de 2012 [cf. alínea a) do n. 1 do artigo 66.º e n.º 4 do artigo 52.º da LOPTC], mas tão só, e atenta a data, explica o facto de aquela permanecer omissa mesmo após ter sido citado nominalmente para o efeito e advertido das consequências dessa omissão; tendo, porém, aquele responsável protestado remetê-la o «mais rápido possível», sem nunca o fazer [factos provados n.os 11 a 13].
18 - Recentemente [cf. factos provados 20 a 23] veio-se a constatar através de informação obtida junto dos presidentes dos atuais órgãos executivo e deliberativo daquela freguesia, respetivamente Ilídio Jorge Chaves Correia e Stéphanie Lopes Soares, que não foram localizados quaisquer documentos contabilísticos relativamente à gerência de 2011, daquela freguesia, havendo claros indícios de falta de colaboração dos anteriores responsáveis para com o atual executivo não lhe fornecendo respostas.
19 - Ainda, assim da matéria fático-probatória vertida nos autos, não fica demonstrado que o responsável, ex-presidente da junta, Álvaro José Madureira Pereira, tenha agido com dolo, id est, que a sua conduta omissiva, relativa à remessa da conta de gerência 2011, tivesse sido premeditada e intencional.
20 - Provou-se, no entanto, não poder aquele responsável desconhecer a sua obrigação legal de remessa, até 30 de abril de 2012, da conta de gerência do ano de 2011 daquela autarquia [factos provados n.º 3, 6, 8 a 12].
21 - A sua conduta é censurável a título de negligência por violação de deveres de diligência e cuidado objetivo o que, por si só, não é suficiente para afastar a ilicitude.
22 - A responsabilidade pela não observância do mencionado dever legal é direta e pessoal, in casu, imputável ao ex-titular do cargo de presidente da junta de freguesia de Ervededo - Chaves, o infrator, Álvaro José Madureira Pereira, conforme o disposto nos artigos 61.º e 62.º da LOPTC, aplicável por remissão do n.º 3 do artigo 67.º, da referida lei.
IV. ESCOLHA E GRADUAÇÃO CONCRETA DA SANÇÃO
1 - Feito pela forma supra descrita o enquadramento jurídico da conduta do responsável, importa agora determinar a sanção a aplicar e a sua medida concreta.
2 - Em primeiro lugar há que considerar o grau geral de incumprimento da norma violada «falta de injustificada de remessa de contas ao Tribunal, pela falta injustificada da sua remessa tempestiva [...]», sendo que a infração cometida faz parte do objeto da grande maioria das punições decididas pela 2.ª Secção do Tribunal de Contas, punições essas em que infratores, maioritariamente, são titulares de órgãos do poder local.
3 - O artigo 67.º da LOPTC, contem o regime segundo o qual o julgador se deve orientar na graduação das multas a aplicar, sendo que deve ser tido em linha de conta:
i) A gravidade dos factos;
ii) As consequências;
iii) O grau da culpa;
iv) O montante material dos valores públicos lesados ou em risco;
v) A existência de antecedentes;
vi) O grau de acatamento de eventuais recomendações do Tribunal.
4 - Na situação sub judicio estamos perante factos de gravidade e consequências medianos, sendo os valores normais, tomando em consideração o universo geral conhecido das infrações.
5 - Na verdade, tendo por base a infração praticada, o responsável agiu de forma negligente, conforme descrito nos pontos 11 a 22 da apreciação jurídica, pelo que o limite máximo das multas a aplicar será reduzido a metade (20 UC), conforme o disposto no n.º 3 do artigo 66.º da LOPTC.
6 - Não foram identificados antecedentes e condenações anteriores, nem foram formuladas recomendações ao infrator pelo Tribunal.
7 - A sanção a aplicar situa-se entre o limite mínimo de (euro) 510,00 (5 UC) e o limite máximo de (euro) 2.040,00 (20 UC), conforme o disposto no n.º 2 e n.º 3 do artigo 66.º da LOPTC.
8 - Tendo em consideração o desvalor da infração praticada, das situações concretas que enformaram a sua ocorrência, a falta de antecedentes e a condição social do infrator, julga-se a condenação com um montante próximo do mínimo legal, adequado e proporcional face à gravidade dos factos e a necessidade da sua punição.
V. DECISÃO
Nestes termos e face ao exposto, tendo em consideração os factos dados como provados decidimos:
a) Condenar Álvaro José Madureira Pereira na sanção de (euro) 714,00 (7 UC), pela prática da infração consubstanciada na falta injustificada de remessa de contas ao Tribunal até ao dia 30.04.2012, conforme o previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 66.º da LOPTC e punido no n.º 3 da referida norma;
b) Condenar ainda o infrator no pagamento dos emolumentos do processo, no valor de (euro) 107,10, conforme o previsto no n.º 1 do artigo 14.º do Regime Jurídico dos Emolumentos do Tribunal de Contas(5).
VI. DILIGÊNCIAS SUBSEQUENTES
Conforme o disposto no artigo 25.º do Regulamento Interno de Funcionamento da 2.ª Secção(6) deverá a secretaria do Tribunal relativamente à presente decisão:
- Numerar, registar e registar informaticamente no cadastro da entidade;
- Notificar o infrator condenado e o Ministério Público;
- Dar conhecimento da presente decisão aos atuais membros da junta de freguesia e ao presidente da assembleia de freguesia;
- Remeter cópia ao Departamento de Verificação Interna de Contas;
- Providenciar, após o prazo de recurso, pela publicação para página de internet do Tribunal, sendo que caso ocorra a interposição de recurso a publicação deverá ser efetuada com a indicação de "não transitada em julgado";
- Providenciar pela publicação na 2.ª série do Diário da República, após o trânsito em julgado(7);
- Advertir o infrator condenado que a responsabilidade financeira é pessoal, não podendo por isso serem usados dinheiros públicos no pagamento das condenações, consubstanciando tal conduta infração de natureza financeira e criminal;
A presente sentença foi elaborada por recurso a meios informáticos e por mim integralmente revista.
(1) Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, Lei 98/97, de 26 de agosto, com as alterações introduzidas pelas Leis n.os 48/2006, de 29 de agosto; 35/2007, de 13 de agosto; 3-B/2010, de 28 de abril; 61/2011, de 07 de dezembro; e 2/2012, de 06 de janeiro, abreviadamente designada como LOPTC.
(2) Cf. Acedido em www.chaves.pt.
(3) Esta disposição da Lei 169/99, de 18 de Setembro, alterada e republicada pela Lei 5-A/2002, de 11 de janeiro, pela Lei 67/2007, de 31 de dezembro, e pela Lei Orgânica 1/2011, de 30 de novembro, aplicável à data da verificação dos factos, encontra-se, hoje, revogada e substituída pela alínea vv) do n.º 1 do artigo 16.º da Lei 75/ 2013, de 12 de setembro, ex vi n.º 1 alínea d) do seu artigo 3.º, do mencionado diploma, que entrou em vigor em 30 de setembro de 2013 mantendo intacta a obrigação das juntas de freguesia remeterem as respetivas contas, nos prazos legais estabelecidos, ao Tribunal de Contas.
(4) Esta disposição, aplicável à data de verificação dos factos, encontra-se, hoje, revogada e substituída pelo disposto na Lei 75/ 2013, de 12 de setembro, ex vi n.º 1 alínea d) do artigo 3.º do mencionado diploma, que entrou em vigor em 30 de setembro de 2013, mantendo intactas as competência/responsabilidades aqui referenciadas.
(5) Publicado em anexo ao Decreto-Lei 66/96 de 31 de Maio, com as alterações introduzidas pela Lei 139/99, de 28 de Agosto, e pela Lei 3-B/2000, de 4 de Abril.
(6) Publicado em anexo à Resolução da 2.ª Secção do Tribunal de Contas n.º 3/1998, de 4 de Junho, publicada na 2.ª série do DR, n.º 139 de 19/06/1998, com as alterações introduzidas pela Resolução da 2.ª Secção n.º 2/2002, de 17 de Janeiro, publicada na 2.ª série do DR n.º 28 de 02/02/2002 e pela Resolução da 2.ª Secção n.º 3/2002, de 05 de Junho, publicada na 2.ª série do DR n.º 129, de 05/06/2002.
(7) Publicação no Diário da República, conforme o previsto na al ao) do n.º 1 do artigo 7.º do Regulamento de publicação de actos no Diário de República, republicado em anexo ao despacho normativo 13/2009 de 1 de Abril, 2.ª série.
Lisboa, 9 de julho de 2014. - O Juiz Conselheiro, Ernesto Luís Rosa Laurentino da Cunha.
208282229