de 17 de junho
O Regulamento (UE) n.º 2018/302, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2018, que visa prevenir o bloqueio geográfico injustificado e outras formas de discriminação baseadas na nacionalidade, no local de residência ou no local de estabelecimento dos clientes no mercado interno (Regulamento), tem por objetivo evitar que os comerciantes que operam num Estado-membro bloqueiem ou restrinjam de forma injustificada o acesso às suas interfaces em linha, nomeadamente sítios eletrónicos e aplicações móveis.
O Regulamento visa evitar que os comerciantes apliquem condições gerais de acesso diferentes aos seus bens e serviços a clientes de outros Estados-membros que pretendam realizar transações transfronteiriças, proibindo a discriminação relacionada com meios de pagamento, e declarando nulos os acordos de distribuição que proíbam vendas passivas nas situações específicas abrangidas pelo seu âmbito.
A noção de cliente, estabelecida no Regulamento, abrange os consumidores, individualmente considerados, e as empresas que tenham por objetivo exclusivo a utilização final do bem ou serviço pretendido.
De acordo com o Regulamento, as empresas podem continuar a aplicar condições de acesso diferenciadas, mas estas têm de ser objetivamente justificadas, podendo esta justificação ser encontrada, designadamente, nas diferenças de legislação entre os Estados-membros, na insegurança jurídica envolvida, nas dificuldades associadas à aplicação da legislação relativa à proteção dos consumidores, ao ambiente ou à rotulagem, nas questões tributárias ou fiscais, nos custos de entrega ou nos requisitos linguísticos.
A Diretiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno, comummente designada por Diretiva Serviços, contém no seu artigo 20.º uma cláusula de não-discriminação baseada na nacionalidade, no local de residência ou no local de estabelecimento. O Regulamento vem, no fundo, clarificar esta disposição da Diretiva estabelecendo as circunstâncias em que a disparidade de tratamento com base na nacionalidade, no local de residência ou no local de estabelecimento não pode ser justificada.
A Diretiva Serviços foi transposta para o ordenamento jurídico nacional através do Decreto-Lei 92/2010, de 26 de julho, que estabelece os princípios e as regras que simplificam o livre acesso e exercício das atividades de serviços. Deste modo, considerando o âmbito de aplicação material do referido Regulamento, por uma razão de coerência e de uniformidade de regimes, entende-se que as normas de execução deste devem ser inseridas no decreto-lei que transpõe a Diretiva Serviços.
Concretamente, o Regulamento contém duas disposições que exigem a adoção de atos de execução pelo legislador nacional: a designação das entidades responsáveis pela aplicação, fiscalização e prestação de assistência aos consumidores; e a definição de um regime sancionatório que, de uma forma efetiva, proporcionada e dissuasora, garanta o seu cumprimento. Neste contexto, atendendo a que algumas das condutas proibidas pelo Regulamento podem consubstanciar indícios de uma infração ao regime jurídico da concorrência, aprovado pela Lei 19/2012, de 8 de maio, nomeadamente as respeitantes aos acordos de distribuição que proíbam vendas passivas (referidos no artigo 6.º do Regulamento), é atribuído aos organismos responsáveis pela execução do Regulamento o dever de comunicarem à Autoridade da Concorrência a existência de indícios suscetíveis de determinar a abertura de um processo contraordenacional.
O presente decreto-lei designa o Centro Europeu do Consumidor como organismo competente para prestar assistência prática aos consumidores em caso de litígios entre um consumidor e um comerciante decorrentes da aplicação do Regulamento. Uma vez que as empresas não são consideradas consumidores, mas podem agir enquanto tal, qualquer assistência às empresas no contexto do Regulamento será prestada pela Direção-Geral das Atividades Económicas, nos termos gerais.
Por fim, a experiência adquirida com a aplicação do Decreto-Lei 92/2010, de 26 de julho, revelou a necessidade de clarificar o processo de notificação à Comissão Europeia de novas disposições legislativas, regulamentares e administrativas, realizado pela Direção-Geral das Atividades Económicas, visando a deteção, simplificação ou eliminação de requisitos e encargos desproporcionais, excessivos e onerosos aos operadores económicos.
Foi ouvida a Autoridade da Concorrência.
Foi promovida a audição do Conselho Nacional de Consumo e da Autoridade Nacional de Comunicações.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
1 - O presente decreto-lei procede à execução, na ordem jurídica interna, das obrigações decorrentes do Regulamento (UE) n.º 2018/302, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2018, que visa prevenir o bloqueio geográfico injustificado e outras formas de discriminação baseadas na nacionalidade, no local de residência ou no local de estabelecimento dos clientes no mercado interno, e que altera os Regulamentos (CE) n.os 2006/2004, de 27 de outubro, e (UE) 2017/2394, de 12 de dezembro, e a Diretiva n.º 2009/22/CE, de 23 de abril.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o presente decreto-lei procede à primeira alteração ao Decreto-Lei 92/2010, de 26 de julho, que transpõe para o ordenamento jurídico interno a Diretiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro, relativa aos serviços no mercado interno.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei 92/2010, de 26 de julho
Os artigos 11.º, 19.º, 21.º e 23.º a 25.º do Decreto-Lei 92/2010, de 26 de julho, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 11.º
Pressupostos, requisitos e condições proibidas e sujeitas a avaliação
1 - [...]
2 - [...]
3 - Os requisitos identificados nas alíneas i) a q) do n.º 1 e nas alíneas a) a i) do número anterior podem excecionalmente, por razões justificadas de interesse público, ser impostos a prestadores de serviços estabelecidos em território nacional, ou a prestadores legalmente estabelecidos noutros Estados-membros que se desloquem a Portugal em regime de livre prestação de serviços, e desde que observem cumulativamente os seguintes princípios:
a) Não discriminação - os requisitos não podem ser, direta ou indiretamente, discriminatórios em razão da nacionalidade, ou tratando-se de pessoas coletivas, do local da sede;
b) Necessidade - os requisitos devem ser justificados por uma razão imperiosa de interesse público:
i) Para efeitos de liberdade de estabelecimento, as razões de interesse público são as elencadas no n.º 8 do artigo 4.º da Diretiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno;
ii) Para efeitos de livre prestação de serviços, consideram-se razões de interesse público as relativas exclusivamente à ordem pública, segurança pública, saúde pública e proteção do ambiente;
c) Proporcionalidade - os requisitos devem ser adequados a garantir a prossecução do objetivo visado, não indo além do necessário para atingir este objetivo e não sendo possível obter o mesmo resultado através de outras medidas menos restritivas.
4 - A Direção-Geral das Atividades Económicas (DGAE) é a entidade responsável pela notificação à Comissão Europeia prevista no n.º 7 do artigo 15.º e no n.º 5 do artigo 39.º da Diretiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno.
Artigo 19.º
Não discriminação dos destinatários e dos clientes
1 - Os destinatários dos serviços não podem ser discriminados em virtude da sua nacionalidade, do seu local de residência ou do seu local de estabelecimento.
2 - As condições gerais de prestação do serviço definidas pelo prestador de serviços não podem ser discriminatórias em função da nacionalidade, do local de residência ou do local de estabelecimento do destinatário dos serviços, exceto se a diferenciação for diretamente justificada por critérios objetivos, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 3.º, nos n.os 2 a 5 do artigo 4.º e nos n.os 2 e 3 do artigo 5.º do Regulamento (UE) n.º 2018/302, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2018, que visa prevenir o bloqueio geográfico injustificado e outras formas de discriminação baseadas na nacionalidade, no local de residência ou no local de estabelecimento dos clientes no mercado interno.
3 - [...]
4 - [...]
Artigo 21.º
Assistência aos destinatários e clientes
1 - [...]
2 - [...]
3 - [...]
4 - O Centro Europeu do Consumidor é, nos termos do artigo 8.º do Regulamento (UE) n.º 2018/302 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2018, o organismo responsável pela prestação de assistência prática aos consumidores em caso de litígios entre um consumidor e um comerciante decorrentes da aplicação desse regulamento.
Artigo 23.º
Fiscalização e monitorização
1 - A fiscalização do cumprimento das normas do presente decreto-lei compete à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), bem como às autoridades administrativas que tenham competências de fiscalização decorrentes de regimes jurídicos específicos reguladores de atividades de serviços relativamente aos prestadores desses serviços, e abrange as seguintes ações de fiscalização:
a) [...]
b) [...]
2 - [...]
3 - Para efeitos de aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 7.º do Regulamento (UE) n.º 2018/302, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2018, a ASAE é a entidade responsável pela respetiva execução.
4 - No âmbito da fiscalização do regulamento referido no número anterior, a deteção, pela ASAE, de condutas suscetíveis de originar a abertura de um processo contraordenacional, ao abrigo das alíneas e) a g) do n.º 1 do artigo 24.º, deve ser comunicada à Autoridade da Concorrência.
5 - Compete à DGAE elaborar e publicar, até ao final de 2022 e, posteriormente, com uma periodicidade trienal, um relatório relativo à aplicação do Regulamento (UE) n.º 2018/302, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2018, com base nos dados e informações fornecidos pelo Centro Europeu do Consumidor e pela ASAE.
6 - Os organismos referidos nos números anteriores prestam aos organismos congéneres de outros Estados- -membros as informações que estes lhes solicitem no âmbito da aplicação do Regulamento (UE) n.º 2018/302, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2018, com a maior brevidade possível.
Artigo 24.º
[...]
1 - Constitui contraordenação grave a violação ao disposto:
a) Nos n.os 1 e 2 do artigo 19.º;
b) Nos n.os 1, 3, 4 e 5 do artigo 20.º;
c) Nos n.os 2 e 3 do artigo 22.º;
d) No n.º 2 do artigo 23.º;
e) Nos n.os 1, 2 e na segunda parte do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento (UE) n.º 2018/302, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2018;
f) No n.º 1 do artigo 4.º do Regulamento (UE) n.º 2018/302, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2018;
g) No n.º 1 do artigo 5.º do Regulamento (UE) n.º 2018/302, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2018.
2 - [...]
Artigo 25.º
[...]
1 - [...]
2 - [...]
3 - [...]
4 - [...]
5 - [...]
6 - [...]
7 - A aplicação das sanções previstas nos n.os 1 e 2 compete à ASAE.
8 - [...]
a) [...]
b) 30 % para a entidade que procedeu à instrução do processo;
c) 10 % para a entidade que aplicou a coima.
9 - [...]»
Artigo 3.º
Alteração sistemática
A epígrafe do capítulo iii passa a designar-se «Permissões administrativas e outros requisitos para acesso ou exercício de atividades de serviços».
Artigo 4.º
Norma revogatória
É revogada a alínea d) do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 30.º do Decreto-Lei 92/2010, de 26 de julho.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
O presente decreto-lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 16 de maio de 2019. - António Luís Santos da Costa - Augusto Ernesto Santos Silva - Mariana Guimarães Vieira da Silva - Pedro Gramaxo de Carvalho Siza Vieira.
Promulgado em 6 de junho de 2019.
Publique-se.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Referendado em 10 de junho de 2019.
O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa.
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