de 19 de junho
O processo de Reforma Hospitalar, alicerçado nas iniciativas estratégicas constantes do Relatório elaborado pelo Grupo Técnico para a Reforma Hospitalar, criado pelo Despacho 10601/2011, de 16 de agosto, e apresentado em novembro de 2011, tem vindo a ser executada ao longo dos últimos dois anos.
Entre as medidas previstas nas referidas iniciativas encontra-se a revisão das Redes de Referenciação Hospitalar (RRH), que devem ser um instrumento de garantia de qualidade, fortemente indutor de eficiência, e contribuir para o quadro de sustentabilidade a médio e longo prazo do SNS.
A definição de RRH coerentes, atualizadas e desenhadas na perspetiva de servirem de garante da prestação de cuidados de saúde de qualidade em tempo oportuno, é pois um dos elementos essenciais para assegurar a adequada interligação entre as diferentes unidades de prestação de cuidados de saúde que integram o SNS, contribuindo assim para reforçar a coerência de todo o processo de reforma.
O processo de criação de RRH foi iniciado há mais de 13 anos, tendo por objetivo estabelecer, nas diferentes especialidades médicas e cirúrgicas, a articulação entre hospitais do SNS, de modo a garantir a prestação de cuidados adequados às necessidades dos doentes no local de atendimento que disponha de diferenciação profissional e tecnológica para disponibilizar, com garantia de efetividade, a resposta exigida por cada situação clínica.
Cada RRH deverá constituir um sistema integrado, coordenado e hierarquizado que vise satisfazer, de forma concertada, as necessidades de assistência hospitalar no diagnóstico e terapêutica, de formação, de investigação, de colaboração interdisciplinar e de garantia de qualidade no âmbito de determinada especialidade.
Analisando o atual quadro das RRH em Portugal pode constatar-se que das 41 especialidades predominantemente ou exclusivamente hospitalares definidas pela Ordem dos Médicos existem 19 redes aprovadas, 1 em revisão, 5 em regime de aprovação e 3 em elaboração, verificando-se que, das 19 redes aprovadas, 14 foram-no há mais de 8 anos. Constata-se que a atual situação se caracteriza pela ausência de definição de RRH para mais de 50% das especialidades, não atualização de grande parte das redes já aprovadas por falta de revisão, desajuste com a carteira de serviços existente e atual organização hospitalar, não integração entre RRH de diferentes especialidades que se interpenetram, redes que só integram recursos públicos não integrando operadores convencionados e privados nos casos em que se possa aplicar, desajuste entre lógica demográfica, de região e de distrito, não integração dos conceitos de centros de referência, desajustes provocados pela criação nos últimos anos de Centros Hospitalares e Unidades Locais de Saúde, desadequada articulação com os cuidados primários e continuados e não definição do prazo máximo de vigência de cada RRH.
A Portaria 82/2014, de 10 de abril, que veio estabelecer os critérios que permitem categorizar os serviços e estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde, define orientações estratégicas que permitirão construir uma rede hospitalar coerente, comunicante e capaz de responder às necessidades dos cidadãos, mas não determina quais as valências concretas que cada unidade hospitalar deverá disponibilizar. A carteira de valências a disponibilizar por cada unidade hospitalar é operacionalizada através do contrato-programa celebrado com a instituição em que está integrada, de acordo com o respetivo plano estratégico, considerados os vários elementos relevantes para o processo de reorganização da Rede Hospitalar, nomeadamente a localização geográfica, as acessibilidades, o nível de especialização, a capacidade instalada em edifícios, equipamentos pesados, camas de Unidades de Cuidados Intensivos e blocos operatórios, os recursos humanos, a procura potencial, a realidade sociodemográfica de cada região, e ainda a interligação de cada unidade com as outras unidades do SNS - Centros de Referência, outras unidades hospitalares, centros de cuidados de saúde primários, e unidades de cuidados continuados.
A atualização das RRH, e do seu conceito, constitui pois um imperativo, que tem obrigatoriamente de ser integrado na reorganização hospitalar, sem o qual poderiam criar-se redes desajustadas da oferta hospitalar disponível ou uma rede hospitalar incoerente e sem capacidade para satisfazer plenamente as necessidades dos cidadãos. Um exemplo bem claro das necessidades deste desenvolvimento integrado é o processo de organização da área da saúde materno-infantil e em especial das maternidades. A rede de maternidades tem vindo a ser desenhada em função dos níveis de procura e de resposta e dos ajustamentos desejáveis para a manutenção da excelência nos resultados e na segurança das crianças e das mães, devendo incorporar igualmente o processo técnico decorrente da presente portaria.
Considerando que importa definir um quadro de reorganização das unidades hospitalares do continente no que se refere à sua carteira de serviços, aos seus modelos organizativos e ao(s) modelos(s) de integração de cuidados entre os diferentes níveis de cuidados de saúde;
Considerando que a carteira de valências a disponibilizar por cada unidade hospitalar é operacionalizada através do contrato-programa celebrado com a instituição em que está integrada, de acordo com o respetivo plano estratégico;
Considerando que as carteiras de valências das várias unidades têm de estar coordenadas entre si, através da definição de redes de referenciação hospitalar coerentes;
Considerando que a existência de mecanismos de referenciação deve estar baseada numa cobertura territorial adequada às necessidades das populações, tendo em conta a demografia e a acessibilidade geográfica, de forma a garantir um atendimento de doentes que assegure o cumprimento de tempos mínimos de resposta garantidos;
Assim:
Ao abrigo do artigo 12.º do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo Decreto-Lei 11/93, de 15 de janeiro, manda o Governo, pelo Ministro da Saúde, o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
A presente portaria tem por objeto estabelecer os critérios de criação e revisão de Redes Nacionais de Especialidades Hospitalares e de Referenciação, bem como as áreas que as mesmas devem abranger.
Artigo 2.º
Redes Nacionais de Especialidades Hospitalares e de Referenciação
1. As Redes Nacionais de Especialidades Hospitalares e de Referenciação, adiante designadas por RNEHR, devem garantir:
a) a distribuição das localizações, no mapa das instituições hospitalares do SNS, das especialidades predominantemente ou exclusivamente hospitalares;
b) um sistema que regule as relações de complementaridade e apoio técnico entre as instituições hospitalares, estabelecendo articulações funcionais entre hospitais e, eventualmente, outras unidades de saúde de forma a garantir o acesso dos doentes aos serviços e instituições prestadoras dos cuidados de saúde nas diversas especialidades.
2. As Redes deverão obedecer aos seguintes princípios:
a) Permitir o desenvolvimento harmónico e descentralizado dos serviços hospitalares envolvidos;
b) Eliminar duplicações e subutilização de meios humanos e técnicos, permitindo o combate ao desperdício;
c) Permitir a programação do trânsito dos utentes, garantindo a orientação correta para o centro indicado;
d) Contribuir para a melhoria global da qualidade e eficácia clínica pela concentração e desenvolvimento de experiência e competências;
e) Contribuírem para a diminuição dos tempos de espera, evitando a concentração indevida de doentes em localizações menos adequadas;
f) Definir um quadro de responsabilização dos hospitais face à resposta esperada e contratualizada;
g) Permitir a programação estratégica de investimentos, a nível nacional, regional e local;
h) Integrar os Centros de Referência.
Artigo 3.º
Criação de Redes
1. As Redes serão aprovadas mediante despacho do ministro responsável pela área da saúde.
2. Do despacho de aprovação de cada Rede constam obrigatoriamente os seguintes elementos:
a) Princípios orientadores, incluindo as perspetivas demográficas de cobertura;
b) Modelo Organizacional;
c) Tipologia dos serviços;
d) Localização de cada tipologia;
e) Arquitetura da Rede e da referenciação.
Artigo 4.º
Metodologia de Elaboração
1. As Redes Nacionais de Especialidades Hospitalares e de Referenciação devem integrar:
a) as especialidades ou subespecialidades reconhecidas pela Ordem dos Médicos;
b) os Centros de Referência do SNS que venham a ser criados.
2. Para a elaboração ou revisão das Redes, deverão ser consultados peritos refletindo a realidade nacional, incluindo os que forem indicados pelos Colégios da Ordem dos Médicos.
3. O processo global de criação das RNEHR deverá estar concluído até 30 de junho de 2015.
4. Cada rede será revista periodicamente, a cada cinco anos, após a sua aprovação, procedendo-se a uma avaliação da adequação da oferta de serviços existente, e da prevista na rede, às necessidades da população.
5. A responsabilidade da organização do processo de elaboração e de revisão das RNEHR compete à ACSS, a qual contará com a colaboração de peritos das diferentes especialidades médicas e das unidades hospitalares.
Artigo 5.º
Disposições Finais e Transitórias
1. A presente Portaria produz efeitos a partir do dia seguinte ao da sua publicação.
2. Até à aprovação de novas RNEHR, consideram-se em vigor as redes de referenciação nacional já criadas e implementadas, sem prejuízo de adaptação progressiva ao modelo de Rede que vier a ser aprovado.
O Ministro da Saúde, Paulo José de Ribeiro Moita de Macedo, em 19 de junho de 2014.