Plenário
Ata
Aos vinte cinco dias do mês de setembro de dois mil e doze, encontrando-se presentes o Excelentíssimo Conselheiro Presidente Rui Manuel Moura Ramos e os Exmos. Conselheiros Maria de Fátima Mata-Mouros, João Cura Mariano, Ana Maria Guerra Martins, Catarina Sarmento e Castro, Joaquim de Sousa Ribeiro, Vítor Manuel Gonçalves Gomes, Fernando Vaz Ventura, Maria Lúcia Amaral, José da Cunha Barbosa, Maria João Antunes, Carlos Fernandes Cadilha e Maria José Rangel de Mesquita, foram trazidos à conferência os autos do processo em referência para apreciação.Após debate e votação, foi ditado pelo Excelentíssimo Conselheiro Presidente o seguinte:
1 - Um grupo de Deputados à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira veio, nos termos da alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição, requerer a apreciação abstrata sucessiva da constitucionalidade da norma do artigo 43.º, n.º 4, do Anexo (a que se refere o artigo 15.º), contido no Decreto Legislativo Regional 20/2012/M, "que altera o estatuto da carreira docente da Região Autónoma da Madeira, aprovado em sessão plenária pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, no dia 25 de julho de 2012, nos termos e com os fundamentos seguintes:
1.º
"A norma do n.º 4, do artigo 43.º, do Anexo (a que se refere o artigo 15.º), do Decreto Legislativo Regional acima citado remete a definição da regulamentação do sistema da avaliação do pessoal docente para decreto regulamentar regional.
2.º
Constituindo a avaliação do pessoal docente tema de acesa polémica e incisivo na vida profissional daquele, têm as associações representantes deste serem ouvidas, em consonância com o princípio de estado de direito democrático, mais concretamente o artigo 56.º, da Constituição da República Portuguesa.
3.º
Ademais, parece-nos desrazoável que, remetendo a definição da regulamentação de tal primordial questão para decreto regulamentar regional, esta fique privada da discussão democrática e exigível entre legislador e associações representativas do pessoal docente.
4.º
Concluindo, tal norma viola o artigo 56.º, n.º 2, alínea a), da Constituição da República Portuguesa, ferindo-a de inconstitucionalidade formal e material.Nestes termos, deve declarar-se inconstitucional a norma do n.º 4, do artigo 43.º, do Anexo (a que se refere o artigo 15.º) do Decreto Legislativo Regional 20/2012/M, que altera o estatuto da carreira docente da Região Autónoma da Madeira."
2 - O poder de requerer a declaração de inconstitucionalidade é conferido aos deputados regionais nos termos e nos limites do artigo 281.º, n.º 2, alínea g), da Constituição.
De acordo com esta disposição constitucional os "deputados regionais só têm legitimidade para requerer a fiscalização da constitucionalidade ou da legalidade nos casos que digam respeito às respetivas regiões, a saber, a inconstitucionalidade com fundamento em violação dos direitos das regiões e a ilegalidade com fundamento em violação do estatuto regional. Por «direitos das regiões» devem entender-se os direitos constitucionalmente reconhecidos às regiões face à República" (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. ii, 4.ª ed., Coimbra, 2010).
Deste modo, "não basta invocar simplesmente a inconstitucionalidade de uma norma jurídica, uma vez que o poder de impugnação está constitucionalmente circunscrito e pressupõe uma legitimidade qualificada pela violação de direitos da região. [...] Tais direitos são aqueles que, no próprio texto constitucional, configuram e concretizam o princípio da autonomia regional." (Jorge Miranda e Rui Medeiros Constituição Portuguesa Anotada, t. iii, Coimbra, 2007, p. 807).
O facto de o artigo 281.º, n.º 1, alínea g) da Constituição apenas conferir aos deputados regionais o poder de requerer a declaração de inconstitucionalidade de uma norma quando estejam em causa direitos das regiões vem, aliás, sendo reafirmado em jurisprudência uniforme e constante que remonta aos tempos da Comissão Constitucional e se manteve até aos mais recentes acórdãos.
Tal jurisprudência encontra-se, de forma mais exaustiva, indicada no acórdão 136/2011. Aqui salientam-se apenas alguns dos acórdãos que a constituem.
No Acórdão 403/89 esclarece-se: [...] o exercício pelos órgãos regionais da faculdade de impugnação da inconstitucionalidade de normas dimanadas de órgãos de soberania pressupõe uma legitimidade qualificada pela violação de direitos das regiões. É precisamente a circunstância de ser acionado, por esta via, um poder de garantia dos poderes das regiões, que fornece o critério de determinação do âmbito do pedido. Só têm de (devem) ser consideradas as normas que [...] violem direitos constitucionalmente conferidos às regiões e na medida em que essas normas se destinem a nelas ser aplicadas [...]".
No mesmo sentido, o Acórdão 198/2000 diz: "Constituindo a norma constitucional uma atribuição de legitimidade para suscitar os mecanismos da fiscalização abstrata pelos deputados regionais, em função da defesa dos direitos constitucionais das regiões, não se verificará tal legitimidade quando as normas questionadas não interfiram diretamente com tal razão defensiva".
E também o Acórdão 615/03 reitera a mesma posição: "Só com fundamento em normas constitucionais que definam poderes jurídicos conferidos às regiões autónomas enquanto pessoas coletivas territoriais, em concretização do princípio da autonomia político-administrativa regional, podem as entidades mencionadas no artigo 281.º, n.º 2, alínea g), da Constituição, requerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade de quaisquer normas".
Por fim, no acórdão 75/2004, conclui-se (citando os dois acórdãos anteriores) que "o poder conferido aos deputados às assembleias legislativas regionais [...] pressupõe que esteja necessariamente em causa uma eventual violação de direitos das regiões em face do Estado nacional, na medida em que esses direitos tiverem consagração constitucional, isto é, conformarem constitucionalmente de modo direto a autonomia político-administrativa das regiões".
No caso, o Requerente não suscitou qualquer questão de inconstitucionalidade fundando-se em violação dos direitos autonómicos da Região.
Na verdade, o requerente procede à impugnação da norma do artigo 43.º, n.º 4, do Anexo contido no Decreto Legislativo Regional 20/2012/M, "que altera o estatuto da carreira docente da Região Autónoma da Madeira" afirmando que tal norma viola o artigo 56.º, n.º 2, alínea a), da Constituição da República Portuguesa, ferindo-a de inconstitucionalidade.
Sucede, porém, que tal artigo 56.º, n.º 2, alínea a), da Constituição é uma norma relativa a direitos das associações sindicais e não a poderes ou direitos autonómicos das regiões. Não é uma norma constitucional que defina "poderes jurídicos conferidos às regiões autónomas enquanto pessoas coletivas territoriais, em concretização do princípio da autonomia político-administrativa regional", ou seja, não define qualquer direito autonómico regional.
Deste modo, tem de se concluir, nos termos da alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º, pela ilegitimidade do requerente.
3 - De harmonia com o estabelecido no artigo 52.º, n.º 1, da lei do Tribunal Constitucional, "o pedido não deve ser admitido quando formulado por pessoa ou entidade sem legitimidade".
Em conformidade, decide-se não admitir o pedido.
Lisboa, 25 de setembro de 2012. - Maria de Fátima Mata-Mouros - João Cura Mariano - Ana Guerra Martins - Catarina Sarmento e Castro - Joaquim de Sousa Ribeiro - Vítor Gomes - Fernando Vaz Ventura - Maria Lúcia Amaral - J. Cunha Barbosa - Maria João Antunes - Carlos Fernandes Cadilha - Maria José Rangel de Mesquita - Rui Manuel Moura Ramos.
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