de 28 de Dezembro
O presente decreto procede à classificação como monumentos nacionais da Igreja do Sagrado Coração de Jesus, do edifício-sede e parque da Fundação Calouste Gulbenkian, do Jardim Botânico de Lisboa e do campo da Batalha de Aljubarrota e área envolvente.De acordo com os critérios e os pressupostos de classificação previstos na Lei 107/2001, de 8 de Setembro, que estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização cultural, os bens imóveis que o Governo classifica como monumentos nacionais revestem-se de excepcional interesse nacional, pelo que se torna imperativo que se lhes proporcione especial protecção e valorização, nos termos que a lei prevê.
O valor científico, patrimonial e cultural de cada um dos bens ora classificados articula-se segundo critérios como autenticidade, originalidade, raridade, singularidade e exemplaridade, que se revelam expressivamente no modo como foram apropriados pelos cidadãos e na relevância simbólica que adquiriram como lugares da ciência, das artes e da memória histórica e política.
A Igreja do Sagrado Coração de Jesus é um edifício de referência no âmbito da arquitectura portuguesa do século xx, localizada nas proximidades da Avenida da Liberdade. Prémio Valmor de Arquitectura de 1975, é uma obra dos arquitectos Nuno Teotónio Pereira e Nuno Portas, que integravam o Movimento de Renovação da Arte Religiosa (MRAR). Edificada na encosta ocidental da colina sobranceira à Rua de Santa Marta, a igreja inova decisivamente no plano da concepção do espaço litúrgico.
A nave cerimonial faz parte de um complexo paroquial que compreende espaços dedicados ao culto, cripta, capelas mortuárias, auditório, secretaria, cafetaria e ainda áreas para actividades sócio-culturais, sendo dominada pela imponente parede nua da cabeceira que realça o altar. A plateia e os balcões dispõem-se numa espécie de anfiteatro, visando a participação dos fiéis nos actos religiosos.
A opção integradora do objecto arquitectónico na estrutura do quarteirão foi a solução encontrada pelos autores para resolver a questão que lhes era colocada: igreja de grande capacidade versus um lote exíguo comprometido pela presença de grandes edifícios na sua envolvente, desmaterializando a igreja e o corpo dos anexos em vários níveis unidos por um espaço aberto central, articulador dos acessos em socalcos, ligando as diferentes cotas da Rua de Camilo Castelo Branco e da Rua de Santa Marta, através de um percurso urbano resolvido com escala e intimidade. O objecto arquitectónico desaparece como elemento isolado, dissolvendo-se na estrutura urbana do lote que se propunha completar. Em 1962, ano em que o projecto foi escolhido, esta atitude, que valorizava o urbano em detrimento do primado do «objecto arquitectónico», constituiu uma revolução no modo de pensar a arquitectura.
A qualidade ímpar da Igreja do Sagrado Coração de Jesus no panorama da arquitectura nacional pode ser reconhecida pela sua filiação numa estética neobrutalista, manifestada através do recurso a materiais como o betão armado, painéis e blocos pré-fabricados, que nos deu poucas obras, porém invariavelmente de enorme qualidade artística e cultural.
A relevância deste imóvel como testemunho de importantes orientações estéticas e arquitectónicas dos anos 60 faz dele um dos mais representativos para a cultura nacional, no âmbito da arquitectura portuguesa do século xx, justificando-se, assim, a sua integral salvaguarda.
No que concerne ao conjunto do edifício-sede e parque da Fundação Calouste Gulbenkian, constitui uma obra de dimensão, programa e competência técnica excepcionais, de importância e significado referenciais na arquitectura nacional e internacional. Prémio Valmor de 1975, juntamente com a Igreja do Sagrado Coração de Jesus, foi concebido pelos arquitectos Ruy Athouguia, Alberto Pessoa, Pedro Cid, Gonçalo Ribeiro Telles e António Viana Barreto.
Procurando a expressão de uma nova monumentalidade no âmbito do movimento moderno, recorreu a complexas tecnologias construtivas, articuladas por uma concepção plástica de grande simplicidade e limpidez estrutural, pela fluidez funcional dos espaços internos, pela inovação do design global do seu equipamento e pela ligação harmónica do edifício-sede ao parque envolvente, objecto de projecto autónomo que em definitivo consagrou, em Portugal, a disciplina da arquitectura paisagística, através do projecto de Gonçalo Ribeiro Telles e António Viana Barreto.
Para além dos valores arquitectónicos e paisagísticos nele inscritos e do valor que assume no contexto urbano de Lisboa, o conjunto do edifício-sede e parque da Fundação Calouste Gulbenkian simboliza toda a notável actividade cultural, social e cívica que aí se desenvolveu desde 1969, ano da sua inauguração, nomeadamente no apoio e incentivo à educação, à cultura, às artes, às letras e à ciência, a nível nacional e internacional, rememorando a figura ímpar do seu fundador, Calouste Gulbenkian.
A decisão de classificação deste conjunto acolhe também a recomendação do Conselho da Europa aos Estados membros relativamente à protecção do património arquitectónico do século xx, de acordo com os princípios definidos internacionalmente para a respectiva salvaguarda.
Relativamente ao jardim da Faculdade de Ciências importa realçar, em primeiro lugar, que se encontra, desde 1838, agregado à Escola Politécnica, tendo começado a ser plantado a partir de 1858 na antiga cerca do Colégio Real dos Nobres. Na sua génese aparece ligado ao desenvolvimento e ao ensino das ciências naturais, especialmente da botânica.
Os trabalhos de construção do Jardim Botânico de Lisboa tiveram início em 1873, sob a alçada dos professores Conde de Ficalho e Andrade Corvo. No mesmo ano, o jardineiro-paisagista alemão Edmond Goeze dirigiu os trabalhos de plantação no Jardim. O seu sucessor, o botânico francês Jules Daveau, desenvolveu, em 1876, a zona inferior do Jardim, tendo criado o traçado da Alameda das Palmeiras e inventado um sistema de rega dos riachos e cascatas.
Inaugurado em 1878, o Jardim Botânico de Lisboa conta com diversas espécies tropicais, oriundas da Nova Zelândia, da Austrália, da China, do Japão e da América do Sul, constituindo uma das mais valiosas colecções botânicas em Portugal.
A sua relevância pedagógica, a diversidade de espécies, com grande variedade de espécies exóticas, e a qualidade arquitectónica do edifício confinante da antiga Escola Politécnica ou as estruturas de apoio subsistentes no perímetro do Jardim fazem deste espaço monumental um dos mais representativos do património urbano da Lisboa romântica, justificando-se plenamente a sua integral salvaguarda.
A classificação do Jardim Botânico de Lisboa contribuirá para a preservação do microclima da área, o que constitui condição sine qua non da sua subsistência.
Por fim, e no que concerne à Batalha de Aljubarrota, a mesma representa um momento decisivo de afirmação de Portugal como reino independente, marcando pela sua força simbólica o imaginário de muitas gerações.
A Batalha Real, como ficou conhecida, ocorreu num planalto entre a ponte do Boutaca, concelho da Batalha, a norte, e o Chão da Feira, concelho de Porto de Mós, a sul, em dois pontos geográficos que correspondem aos posicionamentos dos exércitos português e castelhano no dia 14 de Agosto de 1385.
A área objecto de classificação abrange, desta forma, o local onde o contingente militar português montou praça pela primeira vez - um esporão sobre as ribeiras da Calvaria e Vale da Mata -, e o terreno, três quilómetros a sul, onde se deu efectivamente o confronto.
Além da sua importância histórica, que assinalou o fim da crise sucessória de 1383-1385, e coincidiu com a consolidação de D. João I como rei de Portugal, o primeiro da dinastia de Avis, e com uma orientação geopolítica dirigida para a expansão territorial fora da Europa, a batalha foi igualmente pretexto para o desenvolvimento de uma táctica militar inédita, apurada na Guerra dos 100 Anos e posta em prática por D. Nuno Álvares Pereira, de que é testemunho o complexo sistema defensivo, constituído por cerca de 800 covas-de-lobo e dezenas de fossos, posto a descoberto nas campanhas arqueológicas que decorrem desde 1958.
A extraordinária singularidade material deste conjunto, que inclui a capela trecentista dedicada à Virgem Maria e a São Jorge e os vestígios arqueológicos, contemporâneos e outros, testemunho da vivência do sítio ao longo dos tempos, acolhe, também, a dimensão imaterial e memorial associada às implicações simbólicas e políticas da Batalha de Aljubarrota, bem como os seus inerentes valores paisagísticos, nos princípios definidos internacionalmente para a salvaguarda do património através da implementação de medidas que assegurem a sua protecção legal.
Determinada a classificação como monumentos nacionais destes bens, e para assegurar, enquadrar e disciplinar o ordenamento das áreas em causa, as entidades envolvidas devem contemplar nos instrumentos urbanísticos, designadamente em planos de pormenor de salvaguarda, normas que sirvam de base ao processo da regeneração das áreas, contrariando a deterioração progressiva destes locais, por forma que se obtenha a reconstituição das características existentes à época.
De todo o modo, quer a Igreja do Sagrado Coração de Jesus quer o Jardim Botânico de Lisboa, agora classificados como monumentos nacionais, já se encontram abrangidos pela zona especial de protecção conjunta dos imóveis classificados da Avenida da Liberdade e área envolvente, nos termos da Portaria 529/96, de 1 de Outubro.
As zonas especiais de protecção do edifício-sede e parque da Fundação Calouste Gulbenkian e do campo da Batalha de Aljubarrota e área envolvente serão fixadas por portaria, nos termos do disposto no artigo 43.º da Lei 107/2001, de 8 de Setembro, sendo que, para permitir a manutenção da sua unidade e a sua integração na paisagem, o campo da Batalha de Aljubarrota poderá vir a ser dotado de uma área non aedificandi apropriada à protecção da sua envolvente e integrada numa zona especial de protecção, a fixar por portaria, nos termos estabelecidos no n.º 3 do mesmo artigo.
Assim:
Ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 28.º da Lei 107/2001, de 8 de Setembro, e nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo único
Classificação
São classificados como monumento nacional os bens imóveis a seguir identificados:a) A Igreja do Sagrado Coração de Jesus, sita na Rua de Camilo Castelo Branco, freguesia do Sagrado Coração de Jesus, concelho e distrito de Lisboa, conforme planta constante do anexo i do presente decreto, do qual faz parte integrante;
b) O edifício-sede e parque da Fundação Calouste Gulbenkian, sitos na Avenida de Berna, na Avenida de António Augusto Aguiar, na Rua do Dr.
Nicolau Bettencourt e na Rua do Marquês Sá da Bandeira, freguesia de Nossa Senhora de Fátima, concelho e distrito de Lisboa, conforme planta constante do anexo ii do presente decreto, do qual faz parte integrante;
c) O Jardim Botânico de Lisboa, com acesso pela Rua da Escola Politécnica, 58, em Lisboa, freguesia de São Mamede, concelho e distrito de Lisboa, conforme planta constante do anexo iii do presente decreto, do qual faz parte integrante;
d) O campo da Batalha de Aljubarrota e área envolvente, também designado Campo Militar de São Jorge de Aljubarrota, a que correspondem duas posições, estando a primeira situada no lugar da Quinta do Fidalgo, da freguesia e concelho da Batalha, e a segunda no lugar de São Jorge, freguesia da Calvaria de Cima e concelho de Porto de Mós, conforme plantas constantes dos anexos iv e v do presente decreto, do qual fazem parte integrante.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 4 de Novembro de 2010. - José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa - Maria Gabriela da Silveira Ferreira Canavilhas.
Assinado em 14 de Dezembro de 2010.
Publique-se.
O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.Referendado em 16 de Dezembro de 2010.
O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
ANEXO I
[alínea a) do artigo único]
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ANEXO II
[alínea b) do artigo único]
(ver documento original)
ANEXO III
[alínea c) do artigo único]
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ANEXO IV
[alínea d) do artigo único]
(ver documento original)
ANEXO V
[alínea d) do artigo único]
(ver documento original)