Recorridos, Ministério Público e outros.
Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça:
Ilda Augusta, com os sinais dos autos, interpôs o presente recurso para tribunal pleno do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça proferido em 2 de Maio de 1962 no processo 30860, considerando-o em oposição com o lavrado pelo mesmo tribunal superior em 2 de Dezembro de 1959 no processo 30187 (Boletim do Ministério da Justiça, p. 337).
Processado nos termos do artigo 668.º, § único, do Código de Processo Penal, referido aos artigos 763.º e seguintes do Código de Processo Civil, lavrou-se a fl. 15 o acórdão preliminar do artigo 766.º, que mandou seguir o recurso por reconhecer que os dois arestos foram proferidos em processos diferentes, no domínio da mesma legislação, com trânsito do primeiro em data, e versando um e outro a mesma questão fundamental de direito.
Alegou a recorrente a fl. 21, nos termos que em resumo se indicam.
Para efectivar a responsabilidade civil nos acidentes de viação a lei prescreve dois processos completamente distintos com prazos diferentes.
O do artigo 67.º, n.º 2, apresenta-se como autónomo e independente do caso regulado no artigo 56.º, n.º 9, ambos do Código da Estrada de 1955.
É irrelevante a localização dos respectivos preceitos em capítulos diversos. Mas seria mais perfeito levar aquele artigo 56.º, n.º 9, para o artigo 68.º Conclui por propor o seguinte assento:
O Código da Estrada estabelece dois processos diferentes para ser deduzido o pedido de indemnização cível por acidente de trânsito - o exercício da acção cível em conjunto com a acção penal, nos termos do artigo 67.º, ou em acção própria destinada exclusivamente à efectivação da responsabilidade civil -, aquela caducando a sua propositura nos oito dias após a notificação ao arguido do despacho de pronúncia ou equivalente e esta no prazo de dois anos, a partir da data em que o lesado teve conhecimento (naturalístico ou judiciário) do dano e da pessoa do responsável.
Não houve contra-alegação. A fl. 35 o parecer do Exmo. Ajudante do Procurador-Geral da República apoia o acórdão preliminar da secção, entendendo com ele verificarem-se todos os pressupostos necessários para o julgamento em secções reunidas.
Quanto ao fundo, diz-nos que o prazo do artigo 56.º, n.º 9, norma substantiva situada no capítulo I do título VI do Código da Estrada de 1955, sob a rubrica «Responsabilidade civil», condiciona o tempo de vida do direito à indemnização nos acidentes de trânsito.
Não distingue. Aplica-se quer o formalismo usado para dar satisfação a esse direito, seja o do artigo 67.º ou o do artigo 68.º desse diploma.
Trata-se de normas estas, de carácter puramente adjectivo, incluídas no capítulo II do mesmo título, sob a rubrica «Processo».
E tais normas processuais não podem alterar a extensão e natureza dos direitos estabelecidos no direito substantivo.
Propõe um assento com a seguinte redacção:
O prazo do artigo 56 º, n.º 9, do Código da Estrada aplica-se tanto à acção cível intentada separadamente, nos termos do artigo 68.º, como à exercida em conjunto com a penal, nos termos do artigo 67.º do mesmo diploma.
Correram-se depois os vistos legais a todos os Srs. Juízes deste Supremo Tribunal de Justiça e o processo vem agora para decidir com as três secções reunidas.
Tudo visto e ponderado:
1. A decisão tomada no acórdão preliminar não obstaria a que o tribunal pleno resolvesse por maneira diversa (Código de Processo Civil, artigo 766.º, n.º 3.º).
Mas não é o caso, pois, na verdade, todos os aludidos pressupostos se verificam neste recurso por maneira que não consente hesitações.
Vamos, pois, conhecer do fundo do problema submetido à nossa resolução. É sumamente restrito.
Trata-se de determinar se o prazo do artigo 56.º, n.º 9, é aplicável aos casos previstos no artigo 67.º, n.º 2, ambos estes preceitos do Código da Estrada em vigor.
Encaremos a posição relativa dos dois acórdãos que se afrontam em presença.
2. O Acórdão de 2 de Dezembro de 1959, lavrado no processo 30187 e publicado no Boletim do Ministério da Justiça, pp. 92-337, havia decidido estabelecer o Código da Estrada vigente dois processos diferentes para deduzir o pedido de indemnização civil por acidente de trânsito:
Em conjunto com a acção penal, e no prazo de oito dias, após a notificação do despacho de pronúncia ao arguido (Código da Estrada, artigo 67.º, n.º 2);
Propondo acção cível em separado, conforme ao disposto nos artigos 68.º e 56.º, n.º 9, no prazo de dois anos, a partir da data em que o lesado teve conhecimento do dano e da pessoa do responsável.
Na primeira modalidade, isto é, quando se cumula o pedido de indemnização cível no processo cível, o prazo para requerer é sempre e apenas o de oito dias do artigo 67.º, n.º 2, quer estejamos ainda dentro do prazo de dois anos do outro preceito legal, quer este tenha já decorrido.
Posteriormente, o Acórdão de 2 de Maio de 1962, proferido no processo 30860, ainda não publicado, veio deliberadamente encarar o problema sob outro prisma.
O artigo 56.º, n.º 9, tem o manifesto aspecto de uma regra geral.
O preceito do artigo 67.º, n.º 2, funciona não como uma excepção à regra, mas constituindo apenas uma restrição imposta aos interessados que pretendam utilizar as maiores facilidades que lhes dá o servirem-se do processo crime.
Mas para que tal fórmula seja possível é essencial que o respectivo direito não haja caducado em face da regra do artigo 56.º, n.º 9.
3. Manifestamente, o acórdão de 1962 dá-nos a solução mais legal e justa que a lei e os princípios impõem.
O direito do lesado em acidentes de trânsito a ser indemnizado está no artigo 56.º, n.os 1 a 8.
O prazo dentro do qual lhe é lícito pedir a indemnização vem fixado no seu n.º 9. São dois anos, a partir da data em que teve conhecimento do dano e da pessoa do responsável.
Trata-se de preceitos de carácter substantivo, uma regra substantiva de prescrição ou caducidade, cuja projecção não pode ser afectada pela norma adjectiva do artigo 67.º, n.º 2.
4. Temos presente a história do preceito que vai facilitar-nos o esclarecimento do problema.
Anteriormente, a indemnização civil por acidentes de viação resultantes do facto punível tinha de ser pedida aos agentes da infracção no processo em que corresse a acção penal.
Poderia verificar-se em acção intentada nos tribunais civis nos casos previstos no respectivo código.
E só este meio era aceitável quando o pedido se dirigisse a pessoas não responsáveis pela infracção penal (Código de Processo Penal, artigo 29.º, e Código da Estrada, Decreto 18406, de 1930, artigo 143.º, § único).
Nada se dizia, porém, expressamente quanto a prazos e na jurisprudência divergia-se entre o ano do artigo 539.º, n.º 6.º, do Código Civil e os 20 ou 30 anos (consoante a boa ou má fé) do artigo 535 º do mesmo código.
Os tribunais dividiam-se entre as duas correntes, mas a segunda tinha melhor apoio na doutrina.
Entretanto, o assento de 26 de Janeiro de 1937 veio acabar com as dúvidas, Fixando para o efeito a aplicabilidade do segundo desses preceitos.
Mas o que não havia então era qualquer modalidade especial para o caso de o pedido ser enxertado no processo crime.
O prazo era sempre o mesmo.
A publicação de um novo Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei 39672, de 20 de Maio de 1954, alterou sensìvelmente esta posição.
Trouxe ao lesado à possibilidade de cumular também no processo penal o pedido cível contra os só civilmente responsáveis, no propósito consignado no relatório de evitar tanto quanto possível a verificação de julgamentos contraditórios e a incerteza na ordem jurídica.
Quanto a prazos, ficaram de pé os do artigo 535.º do Código Civil, sob pena de prescrição, estabelecendo-se apenas que o pedido cível cumulado no processo penal será apresentado com a acusação provisória (artigo 67.º, n.º 2).
5. Deixou, porém, sem disciplina precisa, concreta e clara o enquadramento processual do assunto, o que veio levantar as naturais dificuldades.
Estas foram encaradas a breve trecho pelo Decreto-Lei 40275, de 8 de Agosto de 1955, que corrigiu e alterou algumas das deficiências, nomeadamente e para o aspecto sobre o qual nos debruçamos a redacção dos artigos 56.º, n.º 9, e 67.º Substituiu o texto daquele n.º 9, estabelecendo que o direito a pedir indemnização civil por acidentes de trânsito caduca no prazo de dois anos, a partir da data em que o lesado teve conhecimento do dano e da pessoa do responsável.
Segundo o relatório, teve-se em vista evitar os inconvenientes de um prazo tão longo como o do artigo 535.º, sem cair no exagero contrário e nos inconvenientes do artigo 539.º Visou-se assim manter um justo equilíbrio entre a satisfação dos interesses do lesado e do agente da infracção. Atribui-se um prazo razoável de dois anos, sem deixar aquele por largo tempo na incerteza da liquidação das suas responsabilidades nem sujeito aos inconvenientes da dificuldade da prova ao cabo de período largo.
E alterou-se ainda a redacção do artigo 67.º, n.º 2, no sentido de concretizar para os processos crimes que a pretensão terá de ser deduzida até oito dias depois de notificado ao arguido o despacho de pronúncia ou equivalente.
Foi exactamente nestes termos que vieram à luz as regras que estamos discutindo.
6. Acrescenta-se ainda que esta matéria da responsabilidade aparece no Código da Estrada de 1954, corrigido em 1955, englobada no título VI e abrangendo dois capítulos.
O primeiro subordinado à rubrica «Responsabilidade civil», embora dela se ocupem apenas os artigos 56.º e 57.º, versando os artigos 58.º a 63.º matéria penal.
O segundo sob a rubrica «Processo», onde no artigo 67.º se regulam os termos em que pode exercer-se a acção civil cumulada com a penal e no artigo 68.º se regulam os termos da acção civil quando proposta separadamente.
O relatório do decreto de 1955 diz ter-se norteado pelo desejo de procurar a maior economia processual e aproximar tanto quanto possível os termos da acção cível enxertada na penal do formalismo próprio do processo sumário do artigo 68.º No artigo 67.º estabelece que o lesado pode cumular o pedido cível na acção penal se o fizer dentro dos apontados oito dias.
No artigo 68.º nada diz quanto a prazos.
Claro que, embora estruturados, como vimos, no propósito de aproximar o mais possível os seus termos, as duas fórmulas processuais não podem coincidir inteira e totalmente e têm de considerar-se como dois processos distintos.
Mas nem daí pode concluir-se que o legislador tenha estabelecido prazos diversos para um e outro ou pela impossibilidade de a um e outro se aplicar o mesmo prazo.
7. A evolução legislativa que vimos de desenhar acentua que não devem considerar-se dois prazos de caducidade ou prescrição, mas apenas um, o do artigo 56.º, n.º 9.
Numa altura em que era duvidoso qual devesse ser esse prazo, veio o assento de 1937 fixar-nos no do artigo 535.º, regra que o decreto de 1954 manteve, falando em prescrição.
Depois, o decreto de 1955 alterou-o para dois anos, referindo-se a caducidade.
E assim esse prazo agora representa e corresponde aos que anteriormente haviam sido encarados como únicos, os do artigo 539.º, n.º 6, e do artigo 535.º do Código Civil.
Quando, porém, no decreto de 1954 surgiu a possibilidade de exercer esse direito no processo crime, houve que condicioná-la às circunstâncias especiais e peculiares dessa forma de proceder.
O andamento de tais processos não se compadecerá com grandes dilações.
E, dada a sua peculiar estrutura, não será possível escolher outro momento tão adequado. Admiti-lo depois do trânsito da pronúncia era perturbar gravemente a marcha do respectivo processado.
Assim, se o lesado quer aproveitar as facilidades que o enxerto no processo crime é susceptível de proporcionar-lhe, terá de sujeitar-se ao prazo do artigo 67.º, n.º 2.
Não se atribua a escolha desse momento ao facto de só nessa altura o lesado poder avaliar com segurança a projecção das lesões e prejuízos, bem como quem seja a pessoa do responsável.
Não é essa a razão.
O artigo 67.º não obriga a deduzir o pedido nos oito dias posteriores à notificação aludida, mas, sim, até oito dias depois desse momento.
É diverso.
Pode o lesado formulá-lo antes mesmo da pronúncia, desde que tenha já conhecimento exacto da pessoa do responsável e dos danos.
Nada impede o faça para evitar o esgotamento do prazo de dois anos.
8. Nenhum dos acórdãos em presença tomou posição quanto a certos problemas que com este se relacionam, entre os quais a natureza do prazo do artigo 56.º, n.º 9, caducidade ou prescrição e momento em que deve iniciar-se a contagem desse prazo.
Tais aspectos não haviam sido agitados nos respectivos processos.
E, embora se trate de problemas instantes que pedem solução adequada, esta não pode dar-se-lhe neste lugar.
Quanto ao início do prazo, a corrente dominante na jurisprudência é que terá de verificar-se no momento em que o lesado adquira conhecimento exacto da pessoa do responsável e dos danos. Veja-se o disposto no artigo 68.º, n.º 6, do Código da Estrada e Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 95, a fl. 233.
Dentro dessa orientação e nos casos de desenlace letal, tais danos ficam logo esclarecidos a partir do evento.
Mas quando se trate de ferimentos ou outras lesões, só quando estas devam ter-se por curadas ou incuráveis será possível avaliar a sua extensão.
E a situação será idêntica tanto para a acção cível autónoma como para o enxerto na penal.
No que respeita à natureza do prazo, apesar de o decreto de 1955 haver substituído a expressão «prescrição», usada no decreto de 1954, pela de «caducidade», o Sr. Dr.
Vaz Serra, no longo e exaustivo estudo que vem fazendo sobre tais problemas naquela Revista, ano 94, fl. 316, e ano 95, de fl. 156 a fl. 357, duvida que deva considerar-se realmente de caducidade, parecendo-lhe que deve ser antes tida como prescrição.
Mas nada disto faz objecto deste recurso para tribunal pleno nem interessa demasiadamente à respectiva solução.
Como bem diz o mesmo ilustre professor, seja de caducidade ou prescrição, não se trata de prazo judicial, mas de um prazo substantivo (Revista citada, ano 95, p. 335).
Tal regra substantiva substituiu, como atrás referimos, a do artigo 535.º, e, portanto, é de aplicar a todos os casos, como esta o era antes do actual preceito do artigo 67.º, n.º 2.
E isso é que importa, pois, não sendo possível atribuir igual carácter ao prazo do artigo 67.º, n.º 2, iniludìvelmente de direito adjectivo, constituindo mera restrição a condicionar a utilização do processo crime, nunca este poderá alterar a projecção daquele.
No sentido que estamos trilhando se tem pronunciado acentuadamente este Supremo Tribunal de Justiça e a doutrina (cf., além da Revista de Legislação e Jurisprudência nos lugares apontados, a Revista dos Tribunais, ano 78, pp. 110 v.º, 111 e 200).
9. Nestes termos, e cingindo-nos aos limites exactos em que este recurso para tribunal pleno vem movimentado, se acorda, em conferência, no seguinte: negar provimento ao recurso, com o mínimo de imposto de justiça, e firmar o assento:
O prazo do n.º 9 do artigo 56.º do Código da Estrada é aplicável aos casos previstos no n.º 2 do artigo 67.º do mesmo código.
Lisboa, 24 de Abril de 1963. - F. Toscano Pessoa - Barbosa Viana - Cura Mariano - Eduardo Coimbra [vencido pelas razões constantes do acórdão invocado em oposição, às quais, resumidamente, acrescentarei: o pedido de indemnização enxertado na acção penal, nos termos do n.º 2 do artigo 67.º do Código da Estrada, deve ser formulado até oito dias depois de o arguido ser notificado do despacho de pronúncia ou equivalente, pois o legislador entendeu que para maior garantia do lesado só depois de completada a instrução do processo penal ele estará em condições de saber com precisão o que pode pedir, tendo em vista os efeitos do acidente e a quem deve pedir a indemnização. A lei exige que se indique o quantitativo que se pede e estabelece, no n.º 6 do artigo 68.º, a grave sanção de condenação como litigantes de má fé para os que tenham exagerado indesculpàvelmente o montante do pedido. A evolução legislativa dos preceitos mostra com clareza que o n.º 9 do artigo 56.º não contém uma regra geral, à qual fica subordinado o prazo do n.º 2 do artigo 67.º Assim, na primitiva redacção do actual Código da Estrada (Decreto-Lei 39672, de 20 de Maio de 1954) dispunha-se, no n.º 9 do artigo 56.º, que o direito de pedir a indemnização prescrevia nos termos estabelecidos no artigo 535.º do Código Civil, isto é, no espaço de 20 anos, se o responsável não tivesse conhecimento de estar constituído em obrigação de indemnizar, e no de 30 anos, no caso contrário. E, no n.º 2 do artigo 67.º, preceituava-se que o requerimento a provocar a intervenção dos responsáveis civilmente seria apresentado com a acusação provisória. Isto já revelava com a maior clareza que se tratava de um preceito que nada tinha de comum com o do n.º 9 do artigo 56.º nem lhe estava subordinado.
Ora o Decreto-Lei 40275, de 8 de Agosto de 1955, alterando, entre outros, esses preceitos, dispôs, quanto ao n.º 9 do artigo 56.º, que o direito de pedir a indemnização caduca no prazo de dois anos, a partir da data em que o lesado teve conhecimento do dano e da pessoa do responsável. Esclareceu-se, no relatório que o precede, ter-se considerado cabido o reparo feito quanto ao prazo concedido para exigir a indemnização civil, fixando-se um prazo de caducidade bastante mais breve. Em relação ao n.º 2 do artigo 67.º, preceituou-se que o lesado pode na acção penal deduzir o pedido de indemnização contra as pessoas que só sejam civilmente responsáveis pelo facto imputado ao arguido até oito dias depois de este ser notificado do despacho de pronúncia ou equivalente. Como é óbvio, esta disposição é independente da do n.º 9 do artigo 56.º, não estando, por isso, subordinada ao prazo de dois anos nela fixado. Este preceito não funciona, portanto, como regra geral para formular o pedido de indemnização. Com ele a lei pretende que o responsável pela indemnização não fique por longo tempo em incerteza acerca do pedido da mesma e sem saber se lhe é exigida. Procura, por isso, defendê-lo, estabelecendo um prazo curto contra uma prolongada incerteza acerca da sua situação em face do lesado.
Afastou, para tanto, a aplicabilidade das regras gerais de prescrição. Por isso, é razoável que, no caso em que a responsabilidade é objectiva ou baseada no risco, se estabeleça um prazo curto para o exercício do direito de crédito da indemnização, acautelando-se dessa forma e na medida do possível os interesses do responsável. Já se não justificaria, porém, que, sendo a responsabilidade baseada na culpa, o responsável merecesse a mesma consideração por parte da lei, sacrificando-se porventura gravemente o direito de indemnização do lesado, impondo-lhe que só pudesse exercer o direito se não tivesse decorrido aquele curto prazo. No caso de responsabilidade por culpa, o conhecimento do dano e da pessoa do responsável dependem do andamento do processo crime, quando instaurado; só pelo despacho de pronúncia fica bem determinado o responsável e em que medida o é. Se está em causa apenas a protecção do interesse particular do abrigado a indemnizar, procurando a lei defendê-lo contra um pedido feito tardiamente, torna-se evidente que os prazos estabelecidos nos artigo 125.º, § 2.º, do Código Penal para a prescrição do procedimento criminal bem asseguram aquela protecção. Não é também lícito argumentar com a localização dos preceitos dos artigos 56.º, 67.º e 68.º no Código da Estrada para concluir conter o n.º 9 do artigo 56.º uma regra geral a que está subordinado o preceito do n.º 2 do artigo 67.º Se esses preceitos estão insertos em capítulos diferentes, estes fazem parte do mesmo título VI, designado «Responsabilidade». Demais, se é a lei substantiva que declara quando há lugar a indemnização, a forma por que há-de ser pedida e o meio em que o deve ser são determinados na lei adjectiva ou processual, uma vez que é nesta que se regula o exercício desse direito]. - Têm votos de conformidade, conforme consta do livro de lembranças, dos seguintes Exmos. Conselheiros, que não assinam por não estarem presentes: Bravo Serra, José Osório, Alberto Toscano, Arlindo Martins, Cardoso de Meneses, Fragoso de Almeida, Abreu Lobo e ainda do Exmo. Conselheiro Amorim Girão, que já não faz parte deste Tribunal - F. Toscano Pessoa.
Está conforme.
Secretaria do Supremo Tribunal de Justiça, 2 de Maio de 1963. - O Secretário, Joaquim Múrias de Freitas.