de 15 de Outubro
Adormecido ao longo de vários anos, o mercado de valores mobiliários - sobretudo no segmento accionista - tem estado, em 1986 e 1987, numa fase de intenso crescimento. Para que este crescimento seja saudável, e para que a maturidade seja atingida sem incidentes de percurso, há que preencher lacunas do quadro legal, aperfeiçoar as suas regras de funcionamento e modernizar as suas estruturas.E há que procurar amortecer o desequilíbrio entre a escassez da oferta e o excesso da procura.
Em relação à moderação da procura, foram abolidos incentivos fiscais; e tem-se reforçado a sua orientação e estabilização através de novos instrumentos e melhor informação sobre o mercado. Neste domínio, merecem uma referência especial os fundos de investimento mobiliário e o «tesouro familiar», e ainda a obrigação de as empresas cotadas publicarem elementos contabilísticos e de apreciação relativos ao 1.º semestre.
Quanto à oferta, é visível o interesse despertado nas empresas privadas que têm vindo a ponderar a abertura do capital social. Além disso, a transformação de empresas públicas em sociedades anónimas de economia mista, a carecer de legislação especial - como figura no Programa do Governo -, virá, por certo, incrementar significativamente a oferta.
O presente diploma procura também preencher algumas necessidades face ao quadro legal vigente.
Uma delas é a de uma efectiva inspecção e supervisão do mercado. Para a suprir é criada, na dependência directa do Ministro das Finanças, a figura do auditor-geral do Mercado de Títulos, com poderes e meios bastantes para preencher essa importantíssima função e constituir mais um passo no sentido da desgovernamentalização, modernização e profissionalização do mercado.
E não deixa de revestir especial significado o facto de se personalizar a função e as responsabilidades do Auditor-Geral.
Outra lacuna consiste na inexistência de um órgão consultivo do Ministro das Finanças para os problemas específicos da actividade das bolsas e para a modernização do mercado. Para tanto é reactivado o Conselho Nacional das Bolsas de Valores, revendo-se a sua composição de molde a garantir uma mais efectiva presença das instituições directamente interessadas.
Aproveita-se a oportunidade para actualizar valores fixados pelo Decreto-Lei 8/74, de 14 de Janeiro, manifestamente desajustados: é o caso da caução dos corretores e também o das sanções por incumprimento da lei.
Por último, a dispensa de autorização ministerial para a oferta pública de transacções a efectuar através das bolsas é restringida aos casos em que não seja visada a obtenção de benefícios fiscais para a empresa. Esta competência, como outras aliás, passa da esfera ministerial para o domínio do Auditor-Geral.
Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º
Supervisão do mercado de valores mobiliários
1 - É criado, na dependência do Ministro das Finanças, o lugar de Auditor-Geral do Mercado de Títulos.
2 - O Auditor-Geral do Mercado de Títulos é nomeado, para um mandato de cinco anos renováveis, por despacho conjunto do Primeiro-Ministro e do Ministro das Finanças.
3 - Para todos os efeitos, incluindo os remuneratórios, o estatuto do Auditor-Geral do Mercado de Títulos é equiparado ao de presidente de conselho de gestão de empresa pública do grupo A.
4 - O lugar de Auditor-Geral do Mercado de Títulos não confere ao seu titular quaisquer direitos como funcionário ou agente da Administração Pública.
5 - Compete ao Auditor-Geral do Mercado de Títulos:
a) Acompanhar a evolução dos mercados primário e secundário, de acções, obrigações e outros valores mobiliários;
b) Verificar, nas empresas cotadas nas bolsas de valores, o respeito pelo disposto no Código das Sociedades Comerciais, nomeadamente nos seus artigos 509.º a 529.º;
c) Verificar o cumprimento das obrigações de informação ao público que impendem sobre as empresas cotadas nas bolsas de valores;
d) Informar o público sobre a situação económica e financeira das empresas cotadas nas bolsas de valores ou que procedam a ofertas públicas de subscrição ou de transacção de valores mobiliários;
e) Inspeccionar as actividades das bolsas de valores e dos corretores;
f) Realizar todas as diligências que permitam o apuramento de responsabilidades e a instauração de competentes procedimentos disciplinares, bem como participar às autoridades judiciárias competentes as irregularidades passíveis de procedimento criminal no funcionamento do mercado de valores mobiliários;
g) Exercer as competências previstas nos artigos 1.º e 11.º do Decreto-Lei 23/87, de 13 de Janeiro;
h) Aplicar as coimas a que se referem o Decreto-Lei 8/74, de 14 de Janeiro, e o Decreto-Lei 23/87, de 13 de Janeiro.
6 - Ao Auditor-Geral do Mercado de Títulos é aplicável o disposto no artigo 126.º do Decreto-Lei 8/74, de 14 de Janeiro.
Artigo 2.º
Modernização do mercado de valores mobiliários
1 - É reposto em funcionamento o Conselho Nacional das Bolsas de Valores, criado pelo artigo 6.º do Decreto-Lei 8/74, de 14 de Janeiro, com as competências previstas nessa mesma disposição legal.
2 - O Conselho Nacional das Bolsas de Valores é presidido pelo Ministro das Finanças e terá a seguinte composição:
a) Um membro do conselho de administração do Banco de Portugal, por este designado;
b) O presidente do Instituto de Seguros de Portugal;
c) O Auditor-Geral do Mercado de Títulos;
d) O director-geral do Tesouro;
e) O director-geral da Junta do Crédito Público;
f) Os presidentes das comissões directivas das bolsas de valores;
g) Os síndicos das câmaras de corretores das bolsas de valores;
h) O presidente da Associação Portuguesa de Bancos;
i) Dois representantes de empresas não financeiras com acções cotadas nas bolsas de valores, designados pelo Ministro das Finanças por um período de um ano, prorrogável;
j) Um representante dos fundos de investimento mobiliário, por ordem de antiguidade da constituição, por um período de um ano.
3 - Poderão também tomar parte nas reuniões do Conselho Nacional das Bolsas de Valores individualidades de reconhecida competência, quando, para o efeito, sejam convidadas.
4 - O Conselho Nacional das Bolsas de Valores reunirá, sempre que necessário, mediante convocação do Ministro das Finanças.
5 - O Conselho Nacional das Bolsas de Valores poderá constituir secções especializadas, em condições a definir, caso a caso, por despacho do Ministro das Finanças.
Artigo 3.º
Serviços do Auditor-Geral do Mercado de Títulos
1 - O Auditor-Geral do Mercado de Títulos será apoiado por um corpo de consultores, em número não superior a doze, a prover por despacho do Ministro das Finanças de entre titulares de licenciaturas que se mostrem adequadas às funções a desempenhar.
2 - Os consultores são equiparados à letra A da tabela de vencimentos da função pública e são providos pelo período de um ano, renovável, e nas seguintes modalidades:
a) Em comissão de serviço, para os não vinculados à função pública, desde que não tenham uma relação jurídico-laboral com empresas públicas ou privadas;
b) Em comissão de serviço ou em requisição, para os vinculados à função pública;
c) Em requisição, para trabalhadores de empresas públicas ou privadas, no âmbito do regime geral aplicável.
3 - A equiparação à letra A da tabela de vencimentos da função pública referida no número anterior não invalida que os nomeados optem pelo vencimento do lugar de origem.
4 - A nomeação referida no n.º 2 pode ser feita cessar a qualquer momento por conveniência de serviço.
5 - O exercício de funções de consultor do Auditor-Geral do Mercado de Títulos é contado, para todos os efeitos legais, designadamente para a progressão nas respectivas carreiras, como prestado nos lugares de origem.
6 - É vedado aos consultores do Auditor-Geral do Mercado de Títulos:
a) O exercício de qualquer outra função remunerada, seja por conta própria, seja por conta de outrem, com excepção de funções docentes;
b) A realização por conta própria, directamente ou por interposta pessoa, de quaisquer operações da bolsa.
7 - O apoio logístico e administrativo ao Auditor-Geral do Mercado de Títulos será assegurado, a título permanente, pela Secretaria-Geral do Ministério das Finanças.
Artigo 4.º
Caução dos corretores
1 - Os montantes referidos nos n.os 1 e 2 do artigo 101.º do Decreto-Lei 8/74, de 14 de Janeiro, são elevados, respectivamente, para 25000000$00 e 50000000$00 contos.2 - Os actuais corretores das bolsas de valores, incluindo as sociedades corretoras, deverão proceder à actualização da caução referida no número anterior no prazo de 180 dias a contar da data da entrada em vigor do presente decreto-lei.
Artigo 5.º
Coimas
O artigo 133.º do Decreto-Lei 8/74, de 14 de Janeiro, passa a ter a seguinte redacção:
Artigo 133.º
1 - É punido com coima de 50000$00 a 5000000$00:a) ...
b) ...
c) ...
2 - Incorrerão em coima de 500000$00 a 250000000$00 as pessoas que:
a) ...
b) ...
c) ...
3 - ...
4 - ...
Artigo 6.º
Dispensa de autorização
O artigo 2.º do Decreto-Lei 23/87, de 13 de Janeiro, passa a ter a seguinte redacção:
Artigo 2.º
Dispensa de autorização
1 - ...a) ...
b) ...
c) Quando a oferta pública da transacção se efectuar através da bolsa de valores, sempre que da realização da operação em causa não decorra para a empresa a obtenção de benefícios fiscais que estão previstos para a oferta pública.
2 - ...
Artigo 7.º
Norma revogatória
É revogado o n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei 23/87, de 13 de Janeiro.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 24 de Setembro de 1987. - Aníbal António Cavaco Silva - Eurico Silva Teixeira de Melo - Miguel José Ribeiro Cadilhe.
Promulgado em 9 de Outubro de 1987.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 12 de Outubro de 1987.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.