Acórdão 353/2005/T. Const. - Processo 332/2005. - Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 - Tendo, pelo 3.º Juízo do Tribunal Tributário de 1.ª Instância do Porto, instaurado INPARVIR - Sociedade Gestora de Participações Sociais, S. A., impugnação judicial relativamente ao acto de liquidação adicional de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas referente ao exercício de 1997, o juiz daquele Juízo, por sentença de 26 de Maio de 2004, julgou procedente tal impugnação.
Pode ler-se nessa peça processual para o que ora importa:
"Dos elementos existentes nos autos apurou-se a seguinte matéria de facto com interesse para a discussão da causa:
a) Pelos serviços de inspecção tributária foi elaborado o relatório de fl. 25 a fl. 27 do processo administrativo apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
b) Daquele relatório consta que o impugnante foi notificado para exercer o direito de audição antes da elaboração do mesmo - cf. fl. 27 do processo administrativo apenso;
c) Com base naquele relatório a administração fiscal liquidou à impugnante com referência ao ano de 1997 o IRC a pagar no valor de Euro 2722,87 cuja data limite de pagamento ocorreu em 17 de Junho de 2002 - cf. fl. 29 do processo administrativo apenso;
d) Em 30 de Setembro de 2002 a impugnante deduziu a presente acção - cf. fls. 2-[...]
Compulsados os autos verifica-se que a liquidação impugnada foi efectuada com base no relatório dos serviços de fiscalização junto ao processo administrativo.
Quanto a vícios da liquidação invoca o impugnante dois tipos, a saber, vício de forma por preterição de formalidade legal essencial traduzido na omissão da concessão do direito de audição antes da liquidação, por falta de fundamentação e vício de violação de lei por erro nos pressupostos, uma vez que o crédito que a administração fiscal não aceitou como incobrável o é.
Vejamos então!
Quanto à preterição do direito de audição.
À semelhança do que ocorria com o artigo 100.º do CPA consagrava o artigo 60.º da LGT, na redacção vigente na data em que foram praticados os actos, a obrigatoriedade de audiência dos interessados nos seguintes momentos:
'a) Direito de audição antes da liquidação;
b) Direito de audição antes do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recurso ou petições;
c) [...]
d) Direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indirectos;
e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.'
Segundo o artigo 60.º, n.º 2, da LGT 'É dispensada a audição em caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe for favorável.'
Da sinopse dos autos não resulta ter sido dada ao contribuinte o direito de audição após o momento anterior à elaboração do relatório dos serviços de fiscalização tributária.
Posteriormente veio a lei a ser alterada, não havendo que conceder o direito de audição prévia antes da liquidação se o contribuinte já foi ouvido antes da elaboração do relatório dos serviços de fiscalização - Lei 16-A/2002, de 31 de Maio, que veio dar nova redacção ao n.º 3 do artigo 60.º da LGT, atribuindo-lhe o legislador efeito retroactivo.
Da letra do artigo 60.º, n.º 1, da LGT ao tempo em que os actos foram praticados, o que resulta é que em todas as fases que vão desde a inspecção e elaboração do subsequente relatório até à liquidação se tem de conceder ao contribuinte o direito de audição.
Ou seja, o legislador diz que o contribuinte deve ser ouvido 'antes da conclusão do relatório da inspecção tributária. No que a esta parte concerne, foi cumprida aquela disposição legal, tendo sido notificado o contribuinte para exercer o direito de audição, como resulta da factualidade apurada.
Posteriormente nunca mais foi concedido àquele o direito de audição.
A lei, no n.º 2 do artigo 60.º da LGT, apenas dispensa a audição nos casos já referidos supra, os quais aqui não ocorrem, ou seja, liquidação efectuada com base na declaração do contribuinte e ou a decisão do pedido ser-lhe favorável.
Sustenta o impugnante que ao atribuir carácter interpretativo ao artigo 13.º da Lei 16-A/2002, o qual introduziu a alteração ao artigo 60.º da LGT, o legislador violou o artigo 103.º da CRP uma vez que daí decorre a retroactividade da lei.
O artigo 103.º, n.º 3, da CRP refere que 'ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não tenham sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei' (sublinhado nosso).
Por sua vez, o n.º 2 daquele preceito consagra que não só os impostos como também as garantias dos contribuintes são criados por lei.
Assim sendo, não podemos entender que só a criação retroactiva de impostos é inconstitucional, mas também todas as normas que colidam com os direitos e garantias dos contribuintes.
Ao atribuir efeito de interpretação autêntica a uma norma legal que retira garantias ao contribuinte o legislador está dissimuladamente a atribuir efeito interpretativo a uma norma que concede determinados direitos aos contribuintes no que concerne ao processo de liquidação de impostos no sentido de lhos retirar.
Não discutimos que o artigo 60.º da LGT, na sua redacção original, era excessivo no que concerne à atribuição do direito de audição, contudo isso não nos autoriza a que os direitos do contribuinte sejam coarctados sem qualquer correspondência na letra da lei.
Pelo facto de o contribuinte ter sido notificado para exercer o direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção, face à letra do n.º 1 do artigo 60.º da LGT - ao tempo em que se praticaram os actos -, não podemos admitir que já não é necessário notificá-lo para exercer o direito de audição antes da liquidação feita na sequência daquele acto.
Pelo que, ao atribuir o cariz de interpretação autêntica à redacção introduzida ao artigo 60.º da LGT pelo artigo 13.º da Lei 16-A/2002 e como tal efeito retroactivo, o legislador alterou retroactivamente o procedimento que conduz à liquidação do imposto e como tal violou o n.º 3 do artigo 103.º da CRP.
No princípio de audição prévia "estamos perante uma manifestação ao princípio do contraditório que, enquanto princípio geral do direito, não necessita de consagração expressa na lei.
Com a observância do princípio da audição dos interessados pretende-se consagrar o seu direito de defesa, por forma 'a reduzir o risco de que as sanções (no caso dos procedimentos sancionatórios) sejam tomadas com mau conhecimento dos factos ou por motivos não relevantes (cf. René Chapus, Droit Administratif Géneral', t. I, 5.ª ed., p. 766).
Trata-se da melhor garantia procedimental concedida aos interessados e que mais não é do que a aplicação ao procedimento administrativo do princípio segundo o qual ninguém deverá ser condenado sem ser previamente ouvido." - cf. CPA Anotado e citado supra, p. 378.
Não tendo sido concedido ao contribuinte o direito de audição antes da liquidação como naquela data [decorria] da letra da lei, enfermam os actos subsequentes, nomeadamente a liquidação aqui impugnada, de vício de forma por preterição de formalidade legal essencial traduzida na omissão da concessão daquele direito, o que gera a sua anulabilidade por força do disposto no artigo 135.º, com referência ao artigo 133.º, ambos do CPA."
Da sentença de que a parte relevante se encontra transcrita recorreu para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, o representante do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, por seu intermédio, visando a "apreciação da inconstitucionalidade do artigo 13.º da Lei 16-A/2002, de 31 de Maio, na medida em que" atribui "o cariz de interpretação autêntica à redacção que introduz ao artigo 60.º da lei geral tributária e, como tal, efeito retroactivo, alterando retroactivamente o procedimento que conduz à liquidação do imposto".
Determinada a feitura de alegações, rematou a entidade recorrente a por si produzida, com as seguinte "conclusões":
"1 - O princípio da não retroactividade da lei fiscal não se aplica no âmbito das normas de índole processual, apenas obstando que às normas substantivas, reguladoras do facto tributário - e da 'criação' do imposto - possa ser atribuída eficácia retroactiva, fazendo surgir uma obrigação fiscal com base em factos ocorridos antes de a lei nova vigorar.
2 - A norma constante do n.º 3 do artigo 60.º da LGT, na redacção emergente da Lei 16-A/2002, de 31 de Maio, interpretada como dispensando a audição do contribuinte, prévia ao acto de liquidação, quando este já teve oportunidade de se pronunciar sobre todos os elementos de facto, de direito e probatórios que condicionam a referida liquidação, configurada como mera operação de execução de precedentes actos ou decisões, não viola o direito de audição ou participação, previsto no artigo 267.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa.
3 - A atribuição de natureza interpretativa a tal regime de modo a articular tal direito de audição com as exigências do princípio da celeridade, aplicando-se imediatamente aos processos em curso, suprindo as dúvidas que poderiam verificar-se quanto ao cometimento de nulidades processuais não colide com qualquer preceito ou princípio constitucional.
4 - Na verdade, traduzindo a operação de liquidação mera concretização ou execução material de um precedente relatório de inspecção tributária, sobre o qual foi facultado o contraditório ao interessado (que o não exerceu) - e sem que tivessem ocorrido quaisquer factos, provas ou argumentos jurídicos novos -, a nova audição do contribuinte seria manifestamente desnecessária e injustificada, não afrontando a sua dispensa legal os princípios da confiança e do processo equitativo."
De seu lado, a recorrida finalizou a sua alegação concluindo:
"72 - O artigo 13.º, n.º 2, da Lei 16-A/2002, de 31 de Maio, é inconstitucional e ilegal.
73 - Desde logo, o novo n.º 3 do artigo 60.º da LGT não tem verdadeiramente 'carácter interpretativo'.
74 - É uma 'lei inovadora'.
75 - Pelo que, por força do disposto no artigo 13.º, n.º 1, do CC 'a contrario', não pode aplicar-se retroactivamente, não se pode 'integrar' na lei pretensamente interpretada.
Sem prejuízo.
76 - O disposto no artigo 13.º, n.º 2, da dita Lei 16-A/2002, de 31 de Maio, é inconstitucional por violação do princípio da não retroactividade das leis fiscais (artigo 103.º, n.º 3, da CRP).
77 - E da proibição da retroactividade resulta necessariamente a proibição de qualquer norma tributária (ainda que, por hipótese, verdadeiramente) interpretativa.
78 - Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos cuja liquidação e cobrança não se faça nos termos da lei (artigo 103.º, n.º 3, da CRP).
79 - O direito de audição antes da liquidação cabe no processo de liquidação do imposto (artigo 60.º, n.º 1, alínea a), da LGT).
80 - A questão da constitucionalidade e legalidade do disposto no artigo 13.º, n.º 2, da dita Lei 16-A/2002, de 31 de Maio, não deve nem pode ser vista apenas à luz da análise isolada do disposto no artigo 103.º, n.º 3, da CRP.
81 - Outrossim à luz do conjunto integrado de normas e princípios fundamentais emanados do 'todo' constitucional e legal vigente.
Assim,
82 - Nas 'garantias dos contribuintes' cabe o princípio constitucional fundamental da participação dos interessados nas decisões que lhes dizem respeito (artigo 267.º, n.º 5, da CRP).
83 - O artigo 13.º, n.º 2, da dita Lei 16-A/2002, de 31 de Maio, viola o princípio constitucional da legalidade, do qual é emanação a não retroactividade das leis fiscais (artigos 103.º, n.os 2 e 3, da CRP).
84 - Com efeito, aquele preceito reporta-se e contende com as 'garantias dos contribuintes'.
85 - As 'garantias dos contribuintes' e a 'liquidação e cobrança' dos impostos constituem 'elementos essenciais' dos impostos, incluídos no princípio da legalidade.
86 - Pelo que a lei aplicável às 'garantias dos contribuintes' e à 'liquidação e cobrança' dos impostos não pode deixar de ser senão a lei em vigor à data dos factos.
87 - O artigo 13.º, n.º 2, da dita Lei 16-A/2002, de 31 de Maio, é ilegal por violação do disposto nos artigos 8.º, n.os 1 e 2, alínea a), da LGT, segundo os quais estão sujeitas ao princípio da legalidade tributária as garantias dos contribuintes e a liquidação e cobrança dos tributos.
88 - E é ilegal por violação do disposto no artigo 12.º, n.º 1, da LGT, segundo o qual as normas tributárias aplicam-se aos factos posteriores à sua entrada em vigor (cf. também o artigo 12.º, n.º 1, do CC).
89 - O direito de audição prévia não se insere no conjunto de regras ditas de natureza processual, procedimental ou adjectiva.
90 - Insere-se, outrossim, no conjunto de direitos de natureza material, substantiva.
91 - Pelo que as disposições legais que regulem sobre o direito de audição prévia só podem ter-se por normas materiais, substantivas.
92 - O novo n.º 3 do artigo 60.º da LGT veio restringir ou limitar o conteúdo do direito de participação dos administrados nas decisões que lhes dizem respeito (artigo 267.º, n.º 5, da CRP).
93 - Pretensamente com carácter retroactivo.
94 - O que atropela o princípio constitucional da segurança jurídica ou da certeza do direito e da confiança dos cidadãos, princípio basilar do próprio Estado de direito democrático (cf. artigos 2.º e 9.º, alínea b), da CRP).
95 - O pretendido carácter retroactivo da nova lei tem por consequência liquidações efectivadas sob a égide do mesmo quadro legislativo, mas com um tratamento jurídico oposto em função da maior ou menor celeridade na sua apreciação judicial definitiva.
96 - Com efeito, com esse carácter retroactivo tudo fica dependente de a decisão judicial ser ou não proferida antes da entrada em vigor da Lei 16-A/2002, de 31 de Maio.
97 - Decidir sobre a mesma matéria de forma diferente em função da maior ou menor celeridade do respectivo processo significa introduzir elementos aleatórios que atentam contra os princípios constitucionais da igualdade e justiça, consagrados nos artigos 55.º da LGT, 5.º e 6.º do CPA e 266.º da CRP.
Sem prejuízo,
98 - Quer na generalidade dos casos, quer no caso concreto 'sub judice', o acto de liquidação não é um mero 'acto de execução material' do projecto de conclusões do relatório de inspecção tributária que anteriormente haja sido dado a conhecer ao contribuinte.
99 - O acto de liquidação compreende em si um conjunto de operações de cálculo e apuramento, designadamente ao nível dos juros compensatórios e da derrama, entre outras, sobre os quais, as mais das vezes, não é dado ao contribuinte oportunidade de sobre eles se pronunciar antecipadamente.
100 - Pelo que a nova audição antes da liquidação, porque reportada a um acto administrativo diferente e diferenciado do projecto de correcções que esteve na sua génese, não se afigura inútil nem contende com a desejada celeridade processual.
101 - No caso concreto, o contribuinte, para efeitos do exercício do direito de audição, apenas foi notificado do projecto de correcções ao lucro tributável consolidado.
102 - Quando a liquidação incorpora, além de correcções à matéria colectável consolidada, a liquidação de juros compensatórios e a correcção da derrama, sobre as quais nunca foi concedido ao contribuinte oportunidade de sobre elas se pronunciar."
Cumpre decidir.
2 - Na sua redacção originária, prescrevia-se no artigo 60.º da lei geral tributária, aprovada pelo Decreto-Lei 398/98, de 17 de Dezembro:
"Artigo 60.º
Princípio da participação
1 - A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, por qualquer das seguintes formas:
a) Direito de audição antes da liquidação;
b) Direito de audição antes do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições;
c) Direito de audição antes da revogação de qualquer benefício ou acto administrativo em matéria fiscal;
d) Direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indirectos;
e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.
2 - É dispensada a audição no caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe for favorável.
3 - O direito de audição deve ser exercido no prazo a fixar pela administração tributária em carta registada a enviar para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte.
4 - Em qualquer das circunstâncias referidas no n.º 1, para efeitos do exercício do direito de audição, deve a administração tributária comunicar ao sujeito passivo o projecto da decisão e sua fundamentação.
5 - O prazo do exercício oralmente ou por escrito do direito de audição não pode ser inferior a 8 nem superior a 15 dias.
6 - Os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão."
Por intermédio do n.º 1 artigo 13.º da Lei 16-A/2002, de 31 de Maio, aquele artigo 60.º passou a ter nova redacção.
Assim, manteve-se inalterada a redacção dos seus n.os 1 e 2 [vindo, posteriormente, a alínea d) do n.º 1 a ser alterada pela Lei 55-B/2004, de 30 de Dezembro], foi conferida nova redacção ao n.º 3 e os anteriores n.os 3, 4, 5 e 6 passaram a n.os 4, 5, 6 e 7.
O n.º 3 do aludido artigo 60.º passou, a partir daí, a rezar assim:
"3 - Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais ainda se não tenha pronunciado."
Por outro lado, o n.º 2 do artigo 13.º da Lei 16-A/2002 determinou que o disposto no n.º 1 do presente artigo tem carácter interpretativo.
3 - Segundo a decisão ora impugnada, a circunstância de à nova redacção dada ao n.º 3 do artigo 60.º da lei geral tributária ser conferido carácter interpretativo, consequentemente aplicando-se aos "procedimentos" incidentes sobre situações cuja ocorrência se verificou antes da vigência daquela redacção, fazia com que a nova disposição se revestisse de características retroactivas e, ainda de harmonia com tal decisão, em face de uma leitura que efectuou quanto ao disposto no n.º 3 do artigo 103.º da lei fundamental, leitura essa de harmonia com a qual esse preceito não só proibia a criação retroactiva de impostos, mas também a edição de normativos dotados de eficácia retroactiva que colidissem com os direitos e garantias dos contribuintes, o indicado n.º 3 do artigo 60.º padeceria de inconstitucionalidade material.
É, pois, com este entendimento, perfilhado na decisão recorrida, que o Tribunal tem de ser confrontado, sendo certo que lhe não compete curar sobre maior ou menor propriedade da interpretação que as decisões judiciais submetidas ao seu escrutínio efectivaram tocantemente às regras legais, por isso aquilo que o mesmo tem de aferir é se a norma (alcançada por via interpretativa de determinado preceito) é, ou não, conflituante com a lei fundamental.
Daí que se não possa enfrentar a questão, colocada pela recorrida, de saber se a nova redacção ao n.º 3 do artigo 60.º da lei geral tributária constitui, a se, uma norma inovatória ou se se reveste de carácter interpretativo.
De outra banda, sendo o vertente recurso um recurso de constitucionalidade, é por demais óbvio que no mesmo não poderão ser equacionadas questões que unicamente seriam atinentes num recurso de ilegalidade normativa [e isto sem embargo de se fazer notar que aquilo que, neste particular, é sustentado pela recorrida - violação, pela norma sub specie constitutionis, do disposto nos artigos 8.º, n.os 1 e 2, alínea a), da lei geral tributária e 12.º, n.º 1, do Código Civil - não poderia estear a impugnação a que se reportam as alíneas c), d), e) e f) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82.
4 - Situando-nos, como nos situamos, perante um processo de fiscalização concreta da constitucionalidade, não poderá o Tribunal arredar-se dos concretos contornos da situação que veio a ser decidida pela sentença recorrida e na qual se recusou a aplicação do normativo sub iudicio.
Assim, não poderá passar em claro que, in casu, à contribuinte impugnante tão-só não foi facultado o direito de se pronunciar depois de elaborado o relatório dos serviços da inspecção tributária, tendo, porém, antes da sua elaboração, sido notificado para exercer o direito de audição [cf. a matéria de facto dada por assente na alínea b) da sentença em crise].
Assim sendo, o que há que enfrentar é a questão de saber se a nova redacção conferida ao n.º 3 do artigo 60.º da lei geral tributária pelo n.º 1 do artigo 13.º da Lei 16-A/2002 - tendo em conta que pelo n.º 2 deste último artigo se consagrou que o disposto no número anterior tinha carácter interpretativo e que, de qualquer modo, continuou a lei a prever a participação do contribuinte na formação da decisão por intermédio da sua audição por alguma das formas a que se reportam as alíneas b) a e) do n.º 1 daquele artigo 60.º - é claudicante, do ponto de vista da sua conformidade constitucional, designadamente por ofensa do n.º 3 do artigo 103.º do diploma básico.
5 - Comecemos, pois, por este último vício, que, como se viu, foi surpreendido na decisão recorrida como tendo ocorrido, constituindo ele a razão da recusa de aplicação do preceito em causa.
De harmonia com o já aludido n.º 3 do artigo 103.º da Constituição, ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei.
Com a redacção de tal preceito, introduzida pela Quarta Revisão Constitucional operada pela Lei Constitucional 1/97, de 20 de Setembro, torna-se nítido que o legislador constituinte teve por desiderato, até ponderando as dúvidas que parte da doutrina e a própria jurisprudência constitucional suscitavam a tal respeito, consagrar expressamente a proibição de o legislador editar normação da qual decorresse, pelo menos em face do seu teor literal, a obrigação de pagamento de impostos cuja previsão não existia à data das situações que haveriam de constituir a respectiva matéria de incidência, assim se salvaguardando as expectativa, segurança e certeza inerentes aos direitos dos contribuintes em matéria fiscal.
Com a imposição de uma tal regra, uma norma de direito ordinário a que, no indicado domínio, for conferida eficácia interpretativa, deve ser perspectivada como podendo (aliás, devendo) reger para situações que eram reguladas por aqueloutra norma interpretada e que ocorreram antes da entrada em vigor do preceito interpretativo. E, desta sorte, será perante a dimensão normativa que àquela anterior norma veio a ser dada pelo normativo que, "autenticamente", a interpretou, que irão ser reguladas situações cuja ocorrência sucedeu antes de essa dimensão ter sido fixada pelo legislador.
Por isso, poder-se-á sustentar que, nesses casos, o sentido normativo atribuído pela norma interpretativa tem uma eficácia retroactiva ou, no mínimo, uma eficácia retrospectiva.
Na situação em causa, a conjugação dos n.os 1 e 3 do artigo 13.º da Lei 16-A/2002 aponta para que, mesmo relativamente a procedimentos iniciados antes da sua entrada em vigor, a participação dos contribuintes na formação da decisão - nos casos em que tivesse já sido possibilitada a sua audição por qualquer das formas previstas nas já indicadas alíneas b) a e) do n.º 1 do artigo 60.º da lei geral tributária - não vai implicar que, no momento procedimental imediatamente anterior à liquidação, haja o sujeito passivo de exercer o direito de audição.
Posta a questão nestes parâmetros, está bem de ver que a questão a apreciar, no particular de que ora se cura, consistirá em saber se da proibição constitucional constante do n.º 3 do artigo 103.º (que, viu-se já, incide na não obrigação de pagamento de impostos que tenham natureza retroactiva) resulta também a impossibilidade de o legislador ordinário, na regulação dos actos atinentes ao procedimento tributário, gizar normativos de cariz retroactivo.
Em primeiro lugar, da letra do preceito constitucional isso não resulta minimamente.
Depois, e decisivamente, como no caso sucede, desde que as normas procedimentais ou adjectivas a que é conferido efeito retroactivo ou retrospectivo não impliquem de todo, directa ou indirectamente, uma repercussão nos elementos essenciais do imposto, ou seja, na incidência (objectiva e subjectiva) e na fixação da respectiva taxa, não se vislumbra em que ponto possa ser "tocada" a proibição constitucional em apreço.
A decisão impugnada, porém, firmou-se no entendimento de que, prescrevendo-se no n.º 2 do artigo 106.º que os impostos e as garantias dos contribuintes são criados por lei e, no n.º 3, que ninguém pode ser obrigado a pagar impostos cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos dessa mesma lei, todas as normas respeitantes às garantias dos contribuintes também estariam atingidas pela proibição da retroactividade.
É evidente a falta de suporte de um tal raciocínio.
Efectivamente, o n.º 2 do artigo 103.º garante aquilo que, comummente, se designa por "princípio da legalidade fiscal", ou seja, nas palavras de Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed., p. 458), o princípio que se traduz "desde logo na regra da reserva de lei para a criação e determinação dos elementos essenciais dos impostos, não podendo eles deixar de constar de diploma legislativo" (não sendo necessário entrar aqui na discussão se tal "reserva" haverá de ser entendida como "reserva" de competência legislativa parlamentar).
Ora, são realidades diversas a imposição da "reserva de lei" quanto ao estabelecimento das garantias dos contribuintes, a proibição de pagamento de impostos cuja liquidação e cobrança se não faça nos termos da lei (o que identicamente se extrai do "princípio da legalidade fiscal") e a proibição de existência de impostos de natureza retroactiva.
Sendo isto assim, haverá de concluir-se que, expressamente, não veda a lei fundamental que às regras referentes ao procedimento tributário não possa ser conferido carácter retroactivo, ainda que elas incidam sobre as garantias dos contribuintes.
De facto, como diz a entidade recorrente na sua alegação, os regimes "das normas procedimentais ou adjectivas, mesmo que reguladoras das garantias dos contribuintes", "estão sujeitos a reserva de lei, nos termos do n.º 2 do artigo 103.º da Constituição, nada impedindo, porém, que a lei que os regula seja aplicável de imediato aos processos em curso, nos termos, aliás, expressamente consentidos pelo n.º 3 do artigo 12.º da LGT, e nada impedindo que, perante dúvidas objectivas acerca do preciso âmbito de aplicação de determinada norma procedimental, o legislador possa legitimamente editar uma norma interpretativa, aplicável a factos processuais ocorridos no processo ainda em curso".
Quanto ao ponto, cf., designadamente, Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, vol. II, Saldanha Sanches, "A segurança jurídica no Estado social de direito Conceitos indeterminados, analogia e retroactividade no direito tributário", Lisboa, 1995, Jorge Bacelar de Gouveia, "A irretroactividade da norma fiscal na Constituição Portuguesa", in Direito e Cidadania, ano I, n.º 3, Março-Junho de 1998; Cardoso da Costa, "O enquadramento constitucional do direito dos impostos em Portugal: A jurisprudência do Tribunal Constitucional", in Perspectivas Constitucionais - Nos 20 Anos da Constituição Portuguesa, Coimbra, 1997, que diferenciam, no âmbito do direito tributário, as normas que estão e não estão sujeitas à proibição da retroactividade.
A doutrina, contudo, não deixa, em abstracto (e diz-se em abstracto, já que são hipotisáveis situações em que, mesmo em sede procedimental, se estabeleçam regras visando as garantias do contribuinte), de ser maioritariamente concordante em afirmar que normativos do âmbito do direito fiscal que não impliquem a determinação do pagamento de impostos (que, segundo Jorge Bacelar Gouveia, ob. cit., p. 23, compreendem "as seguintes categorias: normas de soberania, de incidência positiva e negativa, de liquidação de cobrança, de organização dos serviços, de punição, de carácter processual e procedimental") não estão abrangidas pela mencionada proibição.
6 - Isto, todavia, por si só, não resolve a questão.
É que, mesmo aceitando a possibilidade de edição de normas daquele jaez retroactivo, ou, por outro lado, ainda que se sustente que em causa estará tão-só uma mera retrospectividade, mister é que, de uma banda, a objectiva "constrição" da amplitude do direito de audição, que foi levada a cabo pela nova redacção introduzida no n.º 3 do artigo 60.º da lei geral tributária, não representa uma afectação daquilo que o n.º 5 do artigo 267.º da Constituição prescreve como a garantia da participação dos interessados na formação das decisões ou deliberações administrativas, garantia essa sem a qual, na óptica de Gomes Canotilho e Vital Moreira (ob. cit., p. 931), são "inválidas as decisões tomadas sem que os interessados tenham sido chamados a pronunciarem-se sobre elas".
Neste ponto, não pode ser ocultado que os autos não nos dão a mínima indicação de onde resulte que, no procedimento concreto, na liquidação que se efectuou após o relatório elaborado pelos serviços de inspecção tributária foram atendidos quaisquer factos novos ou diversos, novas questões de direito ou foram realizadas novas diligências que apontassem no sentido de serem tidos em conta novas realidades que, inclusivamente, poderiam, ainda que não invocadas pela administração tributária, sê-lo pelo contribuinte como sustentáculo da sua pretensão. E, em face desse não atendimento, não se poderá considerar que sobre os factos, realidades, diligências e questões de direito baseadores da liquidação não teve a impugnante oportunidade de se pronunciar.
E esta circunstância releva no caso, especialmente se se tiver em conta as dúvidas que são expressas por Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (in Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 3.ª ed.) sobre a constitucionalidade material da alteração introduzida pela Lei 16-A/2002, quando referem:
"Porém, a Lei 16-A/2002 veio introduzir o actual n.º 3 [do artigo 60.º da lei geral tributária], atribuindo-lhe natureza interpretativa, em que se dispensa a audição antes da liquidação quando o interessado já tenha sido ouvido no procedimento e não sejam invocados factos novos sobre os quais ele ainda não se tenha pronunciado.
Esta solução restringe ainda mais o direito de audição que aquela alínea a) do n.º 2 do artigo 103.º do CPA, uma vez que ao não dispensar o direito de audiência apenas quando forem invocados, pela administração tributária, factos novos sobre os quais o contribuinte ainda não se tenha pronunciado, dispensa-o quando forem suscitados pela administração tributária novas questões de direito e quando forem realizadas diligências que demonstrem factos novos, que não sejam invocados pela administração tributária, mas que poderiam ser invocados pelo interessado em abono da sua pretensão.
Com este alcance, parece que este n.º 3 elimina em grande parte a essência do direito de audiência, pois este não pode deixar de consubstanciar-se em possibilidade de pronúncia pelo interessado sobre todas as questões, de facto ou de direito, que possam relevar para a decisão. Por outro lado, a possibilidade de audição sobre as provas não se pode reduzir aos casos em que são invocados novos factos pela administração tributária, pois pode haver novos factos que a administração não invoque na decisão mas que possam ser favoráveis ao interessado.
Por isso, parece que este n.º 3 será materialmente inconstitucional, por afectar o conteúdo essencial do direito de audiência, constitucionalmente garantido pelo artigo 267.º, n.º 5, da CRP e concretizado nos artigos 8.º e 100.º a 103.º do CPA, sempre que, não se tratando de uma situação enquadrável no n.º 2 deste artigo 60.º, a decisão não totalmente favorável ao interessado seja proferida sem que ele tenha tido oportunidade de se pronunciar sobre qualquer questão de direito apreciada na decisão ou haja realização de diligências que produzam prova sobre factos que lhe possam aproveitar e sobre os quais não tenha podido pronunciar-se."
Ora, no contexto do caso, não se pode dizer que a "constrição" acima aludida (adveniente do confronto com o sistema que resultava da não existência da regra hoje precipitada no n.º 3 do artigo 60.º da lei geral tributária) tenha defraudado o conteúdo mínimo da garantia de participação concretizado na efectivação do direito de audição.
Acresce que não pode ser deixado passar em claro que, conquanto a Constituição, no já referido n.º 5 do artigo 267.º, imponha que o processamento da actividade administrativa haverá de garantir a participação dos cidadãos na formação das decisões que lhe disserem respeito, a concretização desse "direito" é relegada para a lei.
7 - Um último ponto releva ainda tratar.
É que, muito embora se tendo concluído não estar abrangida pela proibição constitucional ínsita no n.º 3 do artigo 103.º da lei fundamental a conferência de efeitos retroactivos a normas meramente procedimentais ou adjectivas de âmbito fiscal, mesmo que estabelecedoras de garantias dos contribuintes no procedimento tributário, necessário se torna, porém, equacionar se, perspectivados os princípio da segurança e certeza que deflui da ideia de Estado de direito democrático consagrado no artigo 2.º do diploma básico, uma retroactividade tal como aquela que se surpreende pela norma do n.º 3 do artigo 60.º da lei geral tributária é passível de ser entendida como, acentuadamente, abalando as expectativas que os cidadãos teriam na manutenção do sistema tal como foi gizado na primitiva redacção daquela lei e que, afinal, só dispensava do direito de audição previsto nas alíneas a) a e) do n.º 1 do mesmo artigo quando a liquidação se efectuasse com base na declaração do contribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe fosse favorável.
Efectivamente, como este Tribunal, por tantas vezes, tem sustentado, o princípio condensado no artigo 2.º da Constituição postula "uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e de segurança no direitos das pessoas e nas expectativas que a elas são juridicamente criadas" (cf., por entre muitos outros, o Acórdão 303/90, publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 17.º vol., pp. 65 a 95).
E para se continuarem a utilizar as palavras do citado aresto, em face daquela ideia, "a normação que, por sua natureza, obvie de forma intolerável, arbitrária ou demasiado opressiva, àqueles mínimos de certeza e segurança que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar, como dimensões essenciais do Estado de direito democrático, terá de ser entendida como não consentida pela lei básica".
Também teve o Tribunal ocasião de dizer, no Acórdão 17/84 (citados Acórdãos do Tribunal Constitucional, 2.º vol., pp. 375 a 382), que "o cidadão deve poder prever as intervenções que o Estado poderá levar a cabo sobre ele ou perante ele e preparar-se para se adequar a elas. Ele deve poder confiar em que a sua actuação de acordo com o direito seja reconhecida pela ordem jurídica e assim permaneça em todas as suas consequências jurídicas relevantes".
Porém, porque a ordem jurídica não é, nem pode ser, imutável, há que reconhecer ao legislador uma ampla margem de liberdade conformadora, como será o caso da adopção de medidas que, no domínio procedimental ou adjectivo, tornem este mais eficaz e célere, com os inerentes benefícios para a prossecução da própria actividade do Estado, medidas essas que, sob pena de perder de vista a consecução desses objectivos, haverão de aplicar-se a situações já passadas ou em curso.
Ponto é que, como se depara límpido e resulta da jurisprudência deste Tribunal, a normação posterior (cf., por exemplo, o Acórdão 86/84, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 4.º vol., pp. 81 a 133) não venha, acentuada ou patentemente, a alterar o conteúdo das situações de facto já alcançadas como consequência do direito anterior.
Nesta parametrização não se lobriga que a norma em análise se revista de uma retroactividade ou retrospectividade intolerável ou demasiado opressiva.
Na verdade, como acima se expôs, a alteração procedimental, acarretada pela introdução, pela Lei 16-A/2002, da regra hoje constante do n.º 3 do artigo 60.º da lei geral tributária, não "tocou" o conteúdo mínimo do direito de participação do contribuinte; por outro lado, não se pode dizer que os cidadãos e a comunidade em geral devam contar com uma imutabilidade de regras procedimentais ou adjectivas, ainda que com incidência nos processos em curso (sendo certo, até, que o comum é serem as normas dessa natureza imediatamente aplicáveis), o que o mesmo é dizer que a uns e a outra não deve ser reconhecida a legítima expectativa de manutenção dos normativos regentes do procedimento tributário, mesmo em relação ao concreto procedimento em curso; finalmente, não se vê em como é que a situação de facto do contribuinte (e pesando a circunstância continuar a desfrutar do direito de participação na formação da decisão da administração tributária) foi, em virtude da norma em causa, com as suas assinaladas características, patentemente alterada.
8 - Em face do que se deixa dito, concede-se provimento ao recurso, em consequência se determinando a reforma da sentença impugnada em consonância com o juízo ora formulado sobre a questão e constitucionalidade.
Lisboa, 5 de Abril de 2005. - Bravo Serra - Gil Galvão - Maria dos Prazeres Pizarro Beleza - Vítor Gomes - Artur Maurício.