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Acórdão 259/2004/T, de 26 de Maio

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Texto do documento

Acórdão 259/2004/T. Const. - Processo 396/2004:

A - O relatório. - 1 - O presidente da Assembleia de Freguesia de Gaula, do concelho de Santa Cruz, requer ao Tribunal Constitucional, de acordo com o disposto no artigo 25.º da Lei Orgânica 4/2000, de 24 de Agosto, por carta que nele deu entrada em 26 de Março de 2004, a apreciação da constitucionalidade e da legalidade de um referendo local, a submeter aos cidadãos eleitores da freguesia de Gaula, concelho de Santa Cruz, tendo como objecto a seguinte pergunta: "Concorda com a retirada de todas as unidades industriais de transformação (britadeiras, centrais de asfalto e de betão e outros equipamentos do género) existentes no vale do Porto Novo (Gaula)?"

2 - O requerimento foi admitido por despacho de 26 de Março de 2004 do Presidente do Tribunal Constitucional, do seguinte teor: "Não se verificando irregularidades processuais e tendo em conta que, apesar de se me afigurar muito questionável que a matéria se integre nas competências dos órgãos da freguesia, se poderá considerar não existir inconstitucionalidade ou ilegalidade manifestas, vão os autos à distribuição."

Em cumprimento deste despacho o processo foi distribuído no mesmo dia.

3 - O requerimento está instruído com os seguintes documentos:

a) Proposta de referendo local;

b) Acta de reunião da Junta de Freguesia de Gaula que apreciou a proposta de referendo;

c) Requerimento do presidente da Junta de Freguesia de Gaula dirigido ao presidente da Assembleia de Freguesia de Gaula;

d) Edital (convocatória para a 2.ª sessão extraordinária da Assembleia de Freguesia de Gaula - ano de 2004;

e) Oito cartas de convocação dirigidas a membros de Assembleia de Freguesia de Gaula;

f) Acta de reunião da Assembleia de Freguesia de Gaula que apreciou a proposta de referendo apresentada pela Junta de Freguesia de Gaula;

g) Ofício n.º 984, da Direcção Regional do Comércio, Indústria e Energia.

4 - Com base nestes documentos, consideram-se assentes os seguintes factos com interesse para a decisão:

a) Por deliberação, tomada por unanimidade, da Junta de Freguesia de Gaula, concelho de Santa Cruz, de 1 de Março de 2004, foi aprovada a proposta apresentada à Junta de Freguesia de Gaula pelo seu presidente, secretário e tesoureiro, respectivamente Filipe Martiniano Martins de Sousa, Marília Luz Freitas Gonçalves e Luís Filipe Quintal Nunes, de apresentação à Assembleia de Freguesia de Gaula de uma proposta de referendo local, com vista a serem chamados a pronunciarem-se os cidadãos eleitores recenseados na freguesia de Gaula, concelho de Santa Cruz, tendo como objectivo a seguinte pergunta: "Concorda com a retirada de todas as unidades industriais de transformação (britadeiras, centrais de asfalto e betão e outros equipamentos do género) existentes no vale do Porto Novo (Gaula)?";

b) Por carta datada de 12 de Março de 2004, o presidente da Junta de Freguesia de Gaula requereu, nos termos do artigo 14.º, n.º 1, alínea a), da Lei 169/99, de 18 de Setembro, na redacção dada pela Lei 5-A/2002, de 11 de Janeiro, ao presidente da Assembleia de Freguesia de Gaula que este convocasse uma sessão extraordinária desta assembleia de freguesia para apreciação da proposta de referendo acabada de referir;

c) A Assembleia de Freguesia de Gaula aprovou, na sessão extraordinária de 22 de Março de 2004, por maioria de cinco votos a favor e de quatro contra, a proposta de referendo local apresentada pela Junta de Freguesia, do teor abaixo transcrito, a submeter aos cidadãos eleitores da freguesia de Gaula, tendo como objectivo a pergunta referida na alínea a);

d) Os votos dos deputados da Assembleia de Freguesia contra a aprovação da proposta basearam-se, "essencialmente, na necessidade de o Governo Regional dar resposta ao volume de obras públicas que estão em curso por toda a Região" e os votos a favor "no facto de [...] todas as unidades industriais de transformação localizadas no vale do Porto Novo não possuírem, por um lado, qualquer tipo de licenciamento ao nível da exploração e localização" e "por outro [no de que] o desenvolvimento de uma freguesia, localidade ou região nunca poderá estar acima da qualidade de vida dos cidadãos e do ambiente, considerando ainda matérias enquadráveis no âmbito das atribuições e competências das freguesias [artigo 14.º da Lei 159/99, de 14 de Setembro (protecção da comunidade)]";

e) Os processos de licenciamento industrial referentes às unidades de transformação instaladas no Porto Novo, freguesia de Gaula, concelho de Santa Cruz, encontram-se pendentes na Direcção Regional do Comércio, Indústria e Energia.

5 - Pelo Decreto do Presidente da República n.º 19-A/2004, de 8 de Abril, foi fixado o dia 13 de Junho de 2004 para a eleição dos deputados ao Parlamento Europeu eleitos em Portugal.

Cumpre assim conhecer do pedido.

B - A fundamentação. - 6 - O artigo 8.º da referida Lei Orgânica 4/2000, prescreve que "não pode ser praticado nenhum acto relativo à convocação ou à realização de referendo entre a data de convocação e a de realização de eleições gerais para os órgãos de soberania, eleições do governo próprio das Regiões Autónomas e do poder local, dos deputados ao Parlamento Europeu, bem como de referendo regional autonómico ou nacional".

Por seu lado, dispõe-se no artigo 33.º, da mesma lei, que "o referendo deve realizar-se no prazo mínimo de 40 dias e no prazo máximo de 60 dias a contar da decisão da fixação" (n.º 1).

Dispõe, por sua vez, o artigo 32.º da mesma Lei Orgânica que, "notificado da decisão do Tribunal Constitucional de verificação da constitucionalidade e legalidade do referendo, o presidente da assembleia municipal ou de freguesia que o tiver deliberado notificará também, no prazo de dois dias, o presidente do órgão executivo da respectiva autarquia para, nos cinco dias subsequentes, marcar a data de realização do referendo".

Ora, sendo assim, constata-se que este referendo ficará sempre juridicamente inviabilizado por os actos relativos à sua convocação ou à sua realização, entre eles contando-se os actos futuros de fixação da data do referendo e a sua realização, terem forçosamente de ocorrer, atento o estipulado naqueles artigos 32.º e 33.º, ou entre a data de convocação e a de realização da eleição dos deputados ao Parlamento Europeu eleitos em Portugal ou então fora do prazo máximo de 60 dias a contar da decisão da fixação.

Deste modo verifica-se que o referendo local nunca poderá realizar-se sem violação dos limites temporais estabelecidos no referido artigo 8.º da Lei Orgânica 4/2000. Consequentemente, o mesmo padece de ilegalidade.

C - A decisão. - 7 - Destarte, atento tudo o exposto, decide o Tribunal Constitucional pronunciar-se pela ilegalidade do referendo local que, na sua reunião de 22 de Março de 2004, a Assembleia de Freguesia de Gaula, concelho de Santa Cruz, deliberou apresentar à apreciação deste Tribunal.

Lisboa, 14 de Abril de 2004. - Benjamim Rodrigues (relator) - Vítor Gomes - Artur Maurício - Rui Manuel Moura Ramos - Gil Galvão - Maria Fernanda Palma - Mário José de Araújo Torres - Carlos Pamplona de Oliveira - Bravo Serra - Paulo Mota Pinto - Maria dos Prazeres Pizarro Beleza - Maria Helena Brito - Luís Nunes de Almeida.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2215822.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1999-09-14 - Lei 159/99 - Assembleia da República

    Estabelece o quadro de transferência de atribuições e competências para as autarquias locais.

  • Tem documento Em vigor 1999-09-18 - Lei 169/99 - Assembleia da República

    Estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento, dos orgãos dos municípios e das freguesias.

  • Tem documento Em vigor 2000-08-24 - Lei Orgânica 4/2000 - Assembleia da República

    Aprova o regime jurídico do referendo local.

  • Tem documento Em vigor 2002-01-11 - Lei 5-A/2002 - Assembleia da República

    Altera a Lei nº 169/99, de 18 de Setembro, que estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento, dos órgãos dos municípios e das freguesias. Republicado em anexo aquele diploma com as alterações ora introduzidas.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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