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Acórdão 503/2003/T, de 5 de Janeiro

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Texto do documento

Acórdão 503/2003/T. Const. - Processo 37/2003. - Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

O Ministério Público recorre para este Tribunal, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucioal (LTC), da decisão proferida no 2.º Juízo Criminal da Comarca de Lisboa, nos autos de processo comum com intervenção de juiz singular, em que é arguida Maria Filomena Cruz de Oliveira Sales.

Nessa decisão o Tribunal recorrido recusou a aplicação, com fundamento em inconstitucionalidade, das seguintes normas:

Artigos 113.º, n.º 7, e 334.º, n.º 8, do Código de Processo Penal, na versão da Lei 59/98, de 25 de Agosto, e 113.º, n.º 9, e 334.º, n.º 6, do Código de Processo Penal, na versão do Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro, quando interpretados no sentido de que o arguido que não esteve presente na audiência do julgamento e não esteve presente na audiência de leitura da sentença possa validamente considerar-se notificado da sentença quando o foi na pessoa do seu defensor ou por qualquer outro meio que não a notificação pessoal;

Artigos 311.º do Código de Processo Penal e 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982, na interpretação dada pelo Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão de fixação de jurisprudência 5/2001.

Invoca o recorrente, no seu requerimento, o seguinte:

"O presente recurso, fundado na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, tem como objecto a apreciação da constitucionalidade das normas cuja aplicação foi recusada na decisão recorrida, com fundamento na preterição do disposto nos artigos 32.º, n.º 1, e 29.º, n.os 1 e 3, da Constituição da República Portuguesa:

A norma constante dos artigos 334.º, n.º 8, e 113.º, n.º 7, do Código de Processo Penal (na versão da Lei 59/98) - a que correspondem actualmente, na versão emergente do Decreto-Lei 320-C/2000, os artigos 334.º, n.º 6, e 113.º, n.º 9 -, conjugados com o artigo 373.º, n.º 3, interpretados no sentido de que o arguido que não esteve presente, nem na audiência de julgamento, nem na audiência de leitura da sentença, pode ser notificado da sentença na pessoa do seu defensor ou por qualquer outro meio que não a notificação pessoal;

A norma constante do artigo 311.º do Código de Processo Penal, conjugada com os artigos 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982, na interpretação fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão de fixação de jurisprudência 5/2001."

Em momento oportuno concluiu a sua alegação da seguinte forma:

"1.º Por força do preceituado no n.º 6 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, a dispensa da presença do arguido na audiência de julgamento pressupõe que o regime legal estabelecido assegure, em termos bastantes, o direito de defesa do 'ausente'.

2.º Não assegura em termos suficientes o princípio das garantias de defesa e do direito ao recurso em regime que se traduzisse em dispensar a notificação da sentença condenatória ao arguido, julgado na sua ausência, bastando-se com a notificação de tal decisão ao respectivo defensor, e contando-se desta o prazo para a dedução dos subsequentes meios impugnatórios, consentidos no caso de julgamento 'à revelia' ou 'na ausência'.

3.º Termos em que deverão interpretar-se os preceitos desaplicados na decisão recorrida - e especificados no requerimento apresentado pelo Ministério Público - como consagrando a necessidade de a decisão condenatória ser notificado ao arguido ausente, em termos de lhe ser facultado o conhecimento ou cognoscibilidade da decisão contra ele proferida, contando-se de tal notificação o prazo para a dedução dos meios impugnatórios legalmente consentidos ao ausente."

Não há contra-alegações.

Cumpre agora decidir.

O despacho recorrido é do teor que integralmente se transcreve para mais fácil compreensão da matéria em causa:

"Os factos são de 13 de Novembro de 1992.

A arguida foi notificada do despacho proferido nos termos do artigo 311.º do Código de Processo Penal no dia 11 de Novembro de 1997 (fl. 35 v.º).

A arguida já foi condenada nos autos e o teor da decisão foi comunicado ao registo criminal (fls. 74 e 77). Por outro lado, já foi também feita a liquidação das custas nos termos da sentença condenatória (fl. 75), tendo o Ministério Público até já tomado posição no sentido de não executar estas custas (fl. 82).

Contudo, a sentença ainda não transitou.

A arguida não esteve presente na audiência de julgamento e não esteve presente na audiência de leitura da sentença, devendo por isso ter sido notificada pessoalmente da sentença (artigos 113.º, n.º 7, e 334.º, n.º 8, do Código de Processo Penal, na versão da Lei 59/98, de 25 de Agosto, vigente à data daquelas audiências, e 113.º, n.º 9, e 334.º, n.º 6, do Código de Processo Penal, na versão hoje vigente do Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro).

A interpretação destas disposições no sentido de que o arguido que não esteve presente na audiência de julgamento e não esteve presente na audiência de leitura da sentença pudesse ser notificado da sentença na pessoa do seu defensor ou por qualquer outro meio que não a notificação pessoal, viola o artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, que assegura todas as garantias de defesa e o direito ao recurso.

Assim, a sentença ainda não transitou, não obstante ela ter sido comunicada ao registo criminal e terem sido liquidadas as custas no entendimento de que ela já teria transitado.

Ora, não tendo a sentença ainda sido notificada pessoalmente à arguida, como devia tê-lo sido por imperativo constitucional, e, portanto, não tendo a sentença transitado, é aplicável o prazo de prescrição do procedimento criminal e não o prazo de prescrição da pena (artigos 121.º, n.º 3, do Código Penal de 1982, e 122.º, n.º 2, do Código Penal de 1995).

A arguida está acusada da prática de um crime de emissão de cheque sem provisão previsto e punido pelo artigo 11.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei 454/91, de 28 de Dezembro, em conjugação com o artigo 313.º, n.º 1, do Código Penal de 1982 e, actualmente, com o artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal de 1995.

O prazo de prescrição do procedimento criminal é de cinco anos e não se verificaram quaisquer factos que interrompessem ou suspendessem aquele prazo de prescrição, nos termos dos artigos 119.º e 120.º do Código Penal de 1982.

Com efeito, atenta a data dos factos, são aplicáveis os artigos 119.º e 120.º do Código Penal de 1982. Acresce que as causas de interrupção e de suspensão da prescrição do procedimento criminal previstas naqueles artigos se reportavam ao Código de Processo Penal de 1929 e não podem ser aplicadas analogicamente ao Código de Processo Penal de 1987, como tem decidido o Tribunal Constitucional (v. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 205/99, de 7 de Abril, e 122/2000, de 23 de Fevereiro, in, respectivamente, Diário da República, 2.ª série, de 5 de Novembro de 1999 e de 6 de Junho de 2000).

Decorre, pois, da jurisprudência constitucional a manifesta inconstitucionalidade, por violação do artigo 29.º, n.os 1 e 3, da CRP, do Acórdão do Pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça n.º 5/2001, de 1 de Março (in Diário da República, 1.ª série, de 15 de Março de 2001), que consubstancia uma aplicação analógica a processos instaurados já nos termos do Código de Processo Penal de 1987 de uma causa de suspensão e de interrupção prevista no Código Penal de 1982 para processos instaurados nos termos do Código de Processo Penal de 1929 (notificação do despacho de recebimento da acusação proferido em processo correccional). A equiparação do despacho que receba a acusação e designe dia para julgamento previsto hoje no artigo 311.º do Código de Processo Penal ao despacho 'equivalente ao de pronúncia' mencionado nos artigos 119.º, n.º 1, alínea a), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982 redunda, pois, em uma adaptação a posteriori do regime das causas de suspensão e de interrupção da prescrição do procedimento criminal do Código Penal de 1982 vigente à data dos factos em manifesto prejuízo do arguido e, por isso, consubstancia uma violação clara da proibição constitucional de aplicação analógica e retroactiva da lei criminal em sentido desfavorável ao arguido.

Acresce que as causas de interrupção e de suspensão do procedimento criminal devem ser interpretadas restritivamente e constituem um catálogo apertado que se refere apenas aos institutos processuais vigentes à data da criação da lei que regulamenta a lei da prescrição, como manda a boa doutrina (cf. Adolf Schönke e Horst Shröder, Strafgesetzbuch Kommentar, München, editora Beck, 1991, p. 945, e Eduard Dreher e Herbert Tröndle, Strafgesetzbuch Kommentar, München, editora Beck, 1995, p. 606), seguida uniformemente pela jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça alemão, o Bundesgerichtshof (BGH-Entscheidungen, vol. 4, p. 135, vol. 18, p. 278, vol. 26, p. 83, e vol. 28, p. 281). Esta doutrina e esta jurisprudência são particularmente significativas, porque o Código Penal português de 1982 reproduz praticamente o sistema alemão previsto nos §§ 78, 78a, 78b, 78c, 79, 79a e 79b do Código Penal alemão, sendo ainda mais restrito do que este direito, por prever menos causas de suspensão e de interrupção. O intérprete português não pode, portanto, ignorar o elemento interpretativo sistemático e teleológico que inspirou o legislador português em 1982, sob pena de se estar a substituir ao legislador.

Coloca-se ainda o problema de saber qual das questões de inconstitucionalidade deve este Tribunal conhecer primeiro, o que é decisivo para efeitos da interposição do recurso desta decisão.

Se a questão da inconstitucionalidade do sistema de notificações da sentença tiver prioridade sobre a questão da inconstitucionalidade do regime das causas de suspensão e interrupção da prescrição do procedimento criminal, o recurso obrigatório para o Tribunal Constitucional por força do artigo 280.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa também tem prioridade sobre o recurso obrigatório para o Supremo Tribunal de Justiça ao abrigo do artigo 446.º do Código de Processo Penal, pois a questão da inconstitucionalidade do sistema de notificações da sentença não foi ainda decidida por qualquer acórdão de fixação de jurisprudência e devia ser apreciada no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional.

Ora, é manifesto que a questão atinente à inconstitucionalidade do sistema de notificações da sentença é efectivamente prévia à questão da inconstitucionalidade do regime das causas de suspensão e interrupção da prescrição do procedimento criminal, pois esta última questão só se coloca porque se entende que a sentença não transitou ainda. É porque se decidiu que a sentença não foi devidamente notificada e não transitou que se teve de aferir da prescrição do procedimento criminal e não da prescrição da pena, tendo-se concluído pela prescrição do procedimento criminal.

Aliás, mesmo em relação à questão da inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 119.º e 120.º do Código Penal de 1982, nos termos em que foi decidida pelo Acórdão 5/2001, a prioridade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça da decisão que negue a aplicação da interpretação fixada no referido acórdão com base na sua inconstitucionalidade poderia ter como consequência a manutenção pelo Supremo Tribunal de Justiça da sua posição, revogando a decisão recorrida e não podendo o Tribunal Constitucional conhecer da própria inconstitucionalidade suscitada em relação à interpretação firmada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. Este movimento circular, em que o Supremo Tribunal de Justiça é o último juiz da inconstitucionalidade da interpretação fixada nos acórdãos de fixação de jurisprudência que profere, conduziria em linha recta a uma interpretação das disposições do n.º 5 do artigo 70.º da Lei 28/82, na versão do artigo 1.º da Lei 13-A/98, de 26 de Fevereiro, em violação do disposto no artigo 280,.º n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa e representaria uma fraude ao sistema constitucional de garantia da Constituição.

Pelo exposto:

1 - Não aplico, por os julgar inconstitucionais, os artigos 113.º, n.º 7, e 334.º, n.º 8, do Código de Processo Penal, na versão da Lei 59/98, de 25 de Agosto, vigente à data daquelas audiências, e 113.º, n.º 9, e 334.º, n.º 6, do Código de Processo Penal, na versão hoje vigente do Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro, quando interpretados no sentido de que o arguido que não esteve presente na audiência do julgamento e não esteve presente na audiência de leitura da sentença pudesse ser notificado da sentença na pessoa do seu defensor ou por qualquer outro meio que não a notificação pessoal e, em consequência da não aplicação destas disposições com este sentido, declaro a arguida não notificada da sentença e esta não transitada,

2 - Também não aplico, por os julgar inconstitucionais, os artigos 311.º do Código de Processo Penal e 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982, na interpretação dada pelo Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão de fixação de jurisprudência 5/2001,

3 - E, em consequência, declaro prescrito o procedimento criminal e determino o oportuno arquivamento dos autos.

Após trânsito, envie boletins ao registo criminal.

Notifique."

Importa, previamente, ter em conta que - nos termos do artigo 70.º, n.º 5, da LTC - não é admissível recurso para o Tribunal Constitucional de decisões sujeitas a recurso ordinário obrigatório. É o que todavia se passa no caso em presença quanto à parte da decisão recorrida que desaplicou a norma do artigo 311.º do Código de Processo Penal, conjugada com os artigos 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982, na interpretação objecto do Acórdão de fixação de jurisprudência 5/2001, do Supremo Tribunal de Justiça.

Nessa parte, a decisão está sujeita a recurso ordinário obrigatório, conforme determina o n.º 1 do artigo 446.º do Código de Processo Penal e, por esta razão, o correspondente recurso não pode ser admitido (cf. Acórdãos deste Tribunal n.os 281/2001 e 282/2001, de 26 de Junho de 2001).

Sendo assim, não se conhecerá do recurso na parte respeitante à norma do artigo 311.º do Código de Processo Penal, conjugada com os artigos 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982, na interpretação objecto do Acórdão de fixação de jurisprudência 5/2001, do Supremo Tribunal de Justiça.

Ora, assim delimitada, a questão em apreço foi já objecto de análise neste Tribunal nos Acórdãos n.os 274/2003 - Diário da República, 2.ª série, de 5 de Julho de 2003 - e 278/2003, cuja linha argumentativa se nos afigura inteiramente de seguir.

No primeiro dos referidos arestos pode ler-se a dado passo o seguinte:

"5 - Cabe assinalar, em primeiro lugar que, no caso sub iudicio, se procedeu à realização da audiência de julgamento sem a presença do arguido com expressa base no preceituado no artigo 334.º, n.os 3 e 6, da versão do Código de Processo Penal decorrente da Lei 59/98, de 25 de Agosto, o que significa, bem ou mal (e isso é questão que escapa aos poderes cognitivos deste Tribunal), que se entendeu que, muito embora os factos que indiciariamente eram imputados ao arguido se reportassem a data anterior à da entrada em vigor daquela lei, o regime processual que dela emanava era imediatamente aplicável, assim possibilitando aquela realização.

De um tal entendimento resultou, desta arte, a efectivação de actos processuais que, por não impugnados, se haverão de considerar firmes nos vertentes autos ou, como assinala o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto na sua alegação, estamos perante decisões que 'obviamente', 'transitaram em julgado, constituindo caso julgado formal'.

6 - Mas, se assim é, ou seja, se a realização da audiência de julgamento sem a presença do arguido se fundou expressamente no regime decorrente dos aludidos n.os 2 e 3 do artigo 334.º do diploma adjectivo criminal, por se ter considerado que ao caso dos autos era aplicável a redacção conferida àqueles preceitos pela Lei 59/98, então é-se levado a concluir que o n.º 8, ainda do mesmo artigo (dita redacção), também cobrará aplicação, isto é, que a sentença proferida relativamente ao arguido, que foi julgado como 'ausente', deve ser-lhe notificada logo que detido ou se apresentar voluntariamente, contando-se o prazo previsto para a interposição do recurso ou para requerer novo julgamento (cf. artigo 380.º-A da mencionada versão) da notificação efectuada em último lugar, sendo que essa notificação que deve ser feita pessoalmente não só ao arguido como também ao seu advogado ou defensor nomeado (cf. n.º 7 do artigo 113.º, ainda da mesma versão).

E a tal conclusão não obsta o preceituado no n.º 3 do artigo 373.º - que comanda que o arguido que não estiver presente à leitura da sentença se considera notificado da sentença depois de esta ter sido lida perante o defensor nomeado ou constituído - e no n.º 4 do artigo 334.º (sempre na indicada versão), que estipula que sempre que a audiência tiver lugar na ausência do arguido este é representado, para todos os efeitos possíveis, pelo defensor. E isto porque, como parece límpido, um e outro daqueles preceitos não entra em contradição com o mencionado n.º 8, primeira parte, do artigo 334.º, ou seja, com a imposição da notificação pessoal, ao arguido, da sentença, mal seja detido ou se apresente voluntariamente.

Se assim não fosse - isto é, se se considerasse que a sentença proferida relativamente a um arguido que foi julgado sem estar presente à audiência de julgamento se havia de ter por notificada com a mera dação de conhecimento ao defensor -, revestir-se-ia de perfeita inutilidade a primeira parte do n.º 8 do artigo 334.º, mormente se se atentar que na segunda parte daquele número se preceitua que o prazo previsto para a interposição de recurso ou para requerer novo julgamento só se inicia a partir da notificação ao arguido (notificação pessoal a este, naturalmente, porque é a essa notificação que se alude na sua primeira parte), sendo de vincar que, de todo o modo, no dito n.º 8 se ressalvam os casos previstos nos n.os 1 e 2 do mesmo artigo 334.º, justamente aqueles que se referem às situações a que corresponderia processo sumaríssimo, mas que foi reenviado para processo comum, e em que o arguido, por impossibilidade de comparecer à audiência, requereu ou consentiu na realização dela na sua ausência.

7 - O que se deixou dito referentemente aos normativos adjectivos criminais decorrentes da Lei 59/98 não é alterado perspectivando a alteração que ao Código de Processo Penal foi introduzida pelo Decreto-Lei 320-C/2000.

Neste aspecto, adere-se à entidade recorrente quando a mesma afirma que não ''se vê facilmente a que título - e com que fundamento - tais normas poderiam ser convocáveis e aplicáveis à dirimição da concreta situação procedimental debatida, face, nomeadamente, ao preceituado no artigo 5.º do Código de Processo Penal: aplicação imediata da lei nova sem prejuízo da validade dos actos realizados na vigência da lei anterior; ora, tendo a audiência assentado precisamente na expressa invocação do regime que constava do n.º 3 do artigo 334.º (fl. 86), disposição derrogada pelo Decreto-Lei 320-C/2000 (passando a situação de 'notificação edital', aí prevista, a diluir-se nos casos de 'regular notificação' do arguido para a audiência, previstos no artigo 333.º, n.º 1, como decorrência do novo regime de notificação presumida no domicílio do notificando, mediante carta simples (artigo 313.º, n.º 3, da versão actual do Código de Processo Penal), não se vê a que título seria possível 'convolar' do regime adjectivo, vigente em 1998, para o subsequente do Decreto-Lei 320-C/2000, e que serão ''irrelevantes as alterações legislativas introduzidas em 2000 no regime de notificações para a audiência já que - como se referiu - no caso dos autos o arguido foi pessoalmente notificado da data em que a mesma se iria realizar (o que naturalmente nos dispensa de apreciar as questões da suficiência, para tal fim, quer da notificação 'edital' prevista no n.º 3 do artigo 334.º, na versão de 1998, quer da notificação por carta simples, estabelecida no actual artigo 313.º, n.º 3, do Código de Processo Penal''.

8 - Significa isto que a aplicação dos normativos acima focados aponta para que, nos casos em que o arguido foi julgado na sua ausência (e é esta a hipótese do caso sub specie, pois que se não trata, no mesmo, de uma situação em que o arguido esteve presente nas sessões de audiência, excepto na da leitura da sentença, situação essa em que, eventualmente, se poderia colocar a questão de saber se do n.º 3 do artigo 373.º da indicada versão do Código de Processo Penal resultava a desnecessidade de notificação pessoal desse arguido da sentença) o mesmo deve ser notificado pessoalmente da sentença logo que for detido ou se apresentar voluntariamente, não se podendo contar o prazo para impugnar a sentença ou para requerer novo julgamento se essa notificação não for levada a efeito.

Mas, se assim é, então concluir-se-á que se não vislumbra em que medida é que tais normativos poderão contender com o disposto nos n.os 1 e 6 do artigo 32.º da Constituição.

Em consequência, a interpretação que se deixou efectuada, porque se não mostra desconforme com indicados preceitos constitucionais, deverá ser aquela que, no vertente processo, deverá ser aplicada (n.º 3 do artigo 80.º da Lei 28/82)."

É esta a jurisprudência que, por não se descortinarem razões para a afastar, aqui plenamente se reitera.

Pelo exposto, o Tribunal decide:

a) Não tomar conhecimento do recurso na parte respeitante à norma do artigo 311.º do Código de Processo Penal, conjugada com as dos artigos 119.º, n.º 1, alínea b), e 120.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal de 1982, na interpretação dada pelo Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão de fixação de jurisprudência 5/2001;

b) Interpretar as normas do n.º 8 do artigo 334.º e do n.º 7 do artigo 113.º do Código de Processo Penal, na versão resultante da Lei 59/98, de 25 de Agosto - e que respectivamente correspondem às dos n.º 6 do artigo 334.º e n.º 9 do artigo 113.º do mesmo diploma, no texto resultante do Decreto-Lei 320-C/2000 de 15 de Dezembro -, conjugadas com as normas do n.º 3 do artigo 373.º ainda do mesmo Código, no sentido de que consagram a necessidade de a decisão condenatória ser pessoalmente notificada ao arguido ausente, não podendo, enquanto essa notificação não ocorrer, contar o prazo para ser interposto recurso ou requerido novo julgamento, sentido que não permite concluir pela inconstitucionalidade de tais normativos;

c) Conceder, em consequência, provimento ao recurso, devendo a decisão recorrida ser reformulada em conformidade com o agora decidido.

Sem custas.

Lisboa, 28 de Outubro de 2003. - Carlos Pamplona de Oliveira - Rui Moura Ramos - Artur Maurício - Maria Helena Brito - Luís Nunes de Almeida.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2177845.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1991-12-28 - Decreto-Lei 454/91 - Ministério da Justiça

    Estabelece normas relativas ao uso do cheque e fixa o regime penal e contra-ordenacional do cheque.

  • Tem documento Em vigor 1998-02-26 - Lei 13-A/98 - Assembleia da República

    Altera a lei orgânica sobre a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional.

  • Tem documento Em vigor 1998-08-25 - Lei 59/98 - Assembleia da República

    Altera o Código do Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei 78/87 de 17 de Fevereiro, na redacção introduzida pelos Decretos-Leis 387-E/87, de 29 de Dezembro, 212/89, de 30 de Junho e 317/95, de 28 de Novembro. Republicado na integra, o referido código, com as alterações resultantes deste diploma.

  • Tem documento Em vigor 2000-12-15 - Decreto-Lei 320-C/2000 - Ministério da Justiça

    Altera o Código de Processo Penal, estabelecendo medidas de simplificação e combate à morosidade processual.

  • Tem documento Em vigor 2001-03-15 - Jurisprudência 5/2001 - Supremo Tribunal de Justiça

    Instaurado processo criminal na vigência do Código de Processo Penal de 1987, por crimes praticados antes de 1 de Outubro de 1995, a notificação ao arguido do despacho que designa dia para julgamento, proferido nos termos dos artigos 311º a 313º daquele diploma, na versão originária, suspende e interrompe a prescrição do procedimento criminal, de acordo com os artigos 119º, nrº 1, alínea b) e 120º, nrº 1, alínea c), ambos do Código Penal de 1982, também na sua versão originária. (Proc. nº 2249/2000-3ª Secçã (...)

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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