Despacho 14 190/2007
O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, entidade requerida no processo cautelar de suspensão de eficácia interposto pela SIDES - Sociedade Independente para o Desenvolvimento do Ensino Superior, S. A., que corre os seus termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa sob o n.º 1503/07.1BELSB, vem, pelo presente despacho, e nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 128.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, reconhecer que o diferimento da execução do acto objecto da referida providência, inserido no procedimento destinado a averiguar da caducidade do reconhecimento de interesse público do estabelecimento de ensino superior Universidade Independente, de que é entidade instituidora a SIDES - Sociedade Independente para o Desenvolvimento do Ensino Superior, S. A., seria gravemente prejudicial para o interesse público.
Assim, é sua intenção continuar a executar o referido acto, isto é, continuar o procedimento em curso, pelos seguintes motivos:
1 - Na indicada providência foi pedida "a suspensão da eficácia do despacho de comprovação proferido pelo Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, em 8 de Maio de 2007, com as legais consequências".
2 - O indicado despacho foi notificado à SIDES e, em obediência ao disposto no artigo 55.º, n.º 3, do Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo (aprovado pelo Decreto-Lei 16/94, de 22 de Janeiro, alterado pela Lei 37/94, de 11 de Novembro, e pelos Decretos-Leis n.os 94/94, de 23 de Março, e 74/2006, de 24 de Março, e, doravante, designado EESPC), publicado sob o n.º 10 935/2007, no Diário da República, 2.ª série, n.º 108, de 5 de Junho de 2007.
3 - Nele deu-se por comprovada, de acordo com o relatório da Direcção-Geral do Ensino Superior de 30 de Abril de 2007 "e nos termos e para os efeitos do artigo 55.º do Estatuto, a falta superveniente dos seguintes pressupostos subjacentes à atribuição do reconhecimento do interesse público, conferido pelo Decreto-Lei 310/94, de 21 de Dezembro, necessários, nos termos da lei, à manutenção de um projecto educativo, científico e cultural próprio e de qualidade e ao funcionamento do estabelecimento de ensino superior particular Universidade Independente, de que é entidade instituidora a já mencionada SIDES, S. A.:
Estabilidade societária e gestão regular da entidade instituidora, imprescindível ao normal funcionamento do seu estabelecimento de ensino - cf. as disposições conjugadas no n.º 1 do artigo 5.º, na alínea a) do n.º 1 do artigo 19.º e na alínea b) do n.º 1 do artigo 51.º, todos do Estatuto;
Assunção plena das funções e responsabilidades dos membros dos órgãos académicos do estabelecimento, em matéria científica e pedagógica - cf. a alínea e) do n.º 1 do artigo 51.º do Estatuto;
Plano económico e financeiro que garanta a cobertura das despesas inerentes ao funcionamento por um período correspondente a cinco anos, demonstrando a viabilidade económica e financeira do projecto e a garantia da cobertura de custos a ele associados - cf. a alínea h) do n.º 1 do artigo 51.º, conjugada com a alínea c) do n.º 1 do artigo 52.º do Estatuto".
4 - No mesmo despacho, considerando que "a prossecução do interesse público exige, neste tipo de processos, uma actuação ponderada e determinada, que, sem mais delongas, clarifique a situação comprovada nos termos expostos supra e as suas consequências legais" (n.º 18), fixou-se em 15 dias o prazo para a ora requerente da providência cautelar regularizar a situação.
5 - Ora, considerando, por um lado, que:
a) "O Estado reconhece e fiscaliza o ensino particular e cooperativo, nos termos da lei" (artigo 75.º, n.º 2, da Constituição), competindo-lhe "no domínio do ensino superior particular ou cooperativo garantir o elevado nível pedagógico, científico e cultural do ensino" [alínea c) do artigo 8.º do EESPC];
b) "O funcionamento de estabelecimentos de ensino superior particular ou cooperativo onde se pretendam ministrar cursos que confiram o grau de bacharel, licenciado, mestre, doutor ou o diploma de estudos superiores especializados só pode ter lugar após o reconhecimento de interesse público do estabelecimento" (artigo 50.º do EESPC);
c) O reconhecimento de interesse público é concedido no termo de um processo a tanto dirigido, onde a respectiva entidade instituidora fornece os elementos necessários à sua apreciação e solicita a autorização de funcionamento dos cursos que se propõe ministrar (cf. artigo 51.º do EESPC);
d) A apreciação do pedido versa sobre os domínios científico e pedagógico e, bem assim, sobre as condições de salubridade e segurança das instalações, a sua adequação e do equipamento disponível ao fim previsto, bem como a viabilidade económico-financeira do projecto, a garantia de cobertura de custos e a existência de estruturas e formas de apoio social a alunos carenciados, aspectos relativamente aos quais devem também ser ouvidos especialistas de reconhecido mérito (artigo 52.º do EESPC);
e) "O reconhecimento de interesse público de um estabelecimento de ensino considera-se conferido enquanto se verificarem os pressupostos de facto e de direito subjacentes à sua atribuição, determinando a falta superveniente de algum desses pressupostos a caducidade do reconhecimento", que "carece de confirmação pelo Ministro [...] a qual deve ser feita decorridos seis meses após a comprovação de falta superveniente dos pressupostos referidos no número anterior", a efectuar "por despacho do Ministro [...] publicado no Diário da República, no qual deve ser fixado um prazo, não superior a dois meses, para a regularização da situação" (artigo 55.º do EESPC);
f) O despacho, cujos efeitos se pretendem suspender no indicado processo, limita-se a verificar a falta superveniente dos pressupostos de facto e de direito subjacentes à atribuição do reconhecimento de interesse público e a fixar o prazo de 15 dias para a situação ser regularizada;
g) A suspensão dos seus efeitos equivaleria, assim, a admitir a dispensa, por parte de um estabelecimento de ensino superior, do cumprimento dos pressupostos de facto e de direito subjacentes à atribuição do reconhecimento do seu interesse público, uma vez que:
i) Em 27 de Fevereiro de 2007, na sequência de alterações ocorridas ao nível dos órgãos da entidade instituidora e dos órgãos académicos da Universidade Independente e da suspensão do funcionamento das aulas - factos de que dava conta a comunicação datada de 26 de Fevereiro de 2007, subscrita pelo então reitor daquela Universidade - a Inspecção-Geral do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior foi solicitada a, em adequada articulação com a Direcção-Geral do Ensino Superior (DGES), averiguar se se mantinham os pressupostos do reconhecimento de interesse público daquele estabelecimento de ensino superior e da autorização de funcionamento dos seus cursos e propor as medidas necessárias à salvaguarda dos interesses dos alunos;
ii) Após o relatório preliminar da referida inspecção, em 26 de Março de 2007, foi enviada à SIDES, S. A., nos termos do n.º 2 do artigo 76.º do Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, uma advertência formal, proferida nos termos do n.º 1 do mesmo artigo, para que repusesse, até ao termo do prazo referido no n.º 3, "os pressupostos em que se fundamentaram o reconhecimento de interesse público da Universidade Independente, as autorizações de funcionamento de cursos e o reconhecimento de graus académicos", ou seja, tendo em vista a reposição, de imediato, da situação de normal funcionamento da Universidade Independente;
iii) Em 5 de Abril de 2007, a direcção da SIDES, S. A., entregou um conjunto de documentos, entre eles, um denominado "Estudo de viabilidade económico-financeira", datado de Março de 2007;
iv) Feita uma apreciação dos documentos apresentados pela SIDES, S. A., constatou-se serem os mesmos claramente insuficientes face ao que era solicitado, em virtude de se encontrarem em falta, quer os compromissos de aceitação dos membros dos órgãos de direcção da entidade instituidora e dos membros dos órgãos científicos e pedagógicos da Universidade, quer toda a documentação de suporte do denominado "Estudo de viabilidade económico-financeira", os quais, sendo de elaboração obrigatória numa sociedade anónima, se revelavam absolutamente necessários para se poder efectuar uma análise sustentada da sua situação económico-financeira actual;
v) Foi reiterado, em 13 de Abril de 2007, o pedido de remessa da documentação em falta;
vi) Em 17 de Abril de 2007, a SIDES, S. A., procedeu à entrega de uma carta acompanhada de cinco documentos, na qual alega e requer o seguinte: "o relatório e as presentes informações complementares demonstraram todos os pressupostos financeiros de viabilidade da SIDES, S. A., para manter em funcionamento a UNI, nomeadamente o aumento de receitas, redução de custos e resolução da dívida actual, pelo que deve ser emitido o parecer de conformidade";
vii) Resulta do relatório da DGES, datado de 30 de Abril de 2007, que a SIDES - Sociedade Independente para o Desenvolvimento do Ensino Superior, S. A.:
1) Não procede ao depósito legal das contas desde o ano de 2002;
2) Não aprovou as contas dos anos de 2004 e 2005;
3) Vive uma situação de disputa legal da titularidade das acções, cujo desfecho não se prevê, nem no tempo nem em resultados;
4) Regista um conjunto de actos de manifesta gestão irregular de grande dimensão, como resulta das informações tornadas públicas acerca dos processos crime em curso com ela relacionados;
5) Tem vivido, nos últimos meses, uma situação de grande instabilidade no que se refere à composição e funcionamento dos seus órgãos sociais;
e, bem assim, que, na Universidade Independente:
6) O processo de designação do reitor não foi realizado, nos termos previstos nos Estatutos, pois não foi ouvido o conselho geral, nem teve lugar a consulta aos principais membros do corpo docente;
7) O docente que se pretendeu, desta forma, designar como reitor, foi-o para um mandato a terminar em 30 de Dezembro de 2008, em violação do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º dos mesmos Estatutos. Tratar-se-ia, se isso fosse legal e estatutariamente possível, de uma figura de "reitor a termo" ou de "reitor provisório", aparentemente designado (apenas) para completar o mandato anterior, como se este subsistisse para além da destituição;
8) A designação de dois dos três vice-reitores, constante do despacho reitoral n.º 1, datado de 30 de Março de 2007, aliás não assinado, não teve a correspondente aceitação quanto a um deles, e tendo embora os restantes aceite, no plano meramente informal, essa designação, não é conhecida qualquer actividade ou tomada de decisão envolvendo aquele corpo reitoral, assim constituído, subsequente àquele despacho;
9) A situação do conselho directivo é também claramente irregular, porquanto o representante dos docentes abandonou as suas funções, "tendo-se transferido para a Universidade Lusófona";
10) No que respeita à composição do conselho científico, não é feita prova cabal de que todos os seus membros tenham aceite o respectivo mandato e sejam doutores, à luz da lei portuguesa;
11) No que respeita à composição do conselho pedagógico, não é feita prova cabal de que todos os seus membros tenham aceite o respectivo mandato;
Por último, no que respeita à sustentabilidade económica e financeira da Universidade Independente, concluiu-se que:
12) A SIDES, S. A., apresentou um relatório, denominado "Estudo de viabilidade económico-financeira", mas colhidos pareceres, em separado, de dois revisores oficiais de contas (ROC), concluíram estes que, devido à importância dos assuntos e à falta de informação que suporte as conclusões constantes no estudo apresentado pela SIDES, não estavam em condições de expressar qualquer opinião sobre o estudo de viabilidade económico-financeira da Universidade Independente (SIDES - Sociedade Independente para o Desenvolvimento do Ensino Superior, S. A.), respeitante ao período de 2007 a 2011;
13) A sustentabilidade económica e financeira do projecto assenta, nos termos do relatório apresentado pela SIDES, num conjunto de pressupostos que não se encontram minimamente sustentados documentalmente ou que assentam em hipóteses de probabilidade muitíssimo baixa ou nula, designadamente quanto ao aumento de receitas, diminuição de custos e reestruturação do passivo;
14) Os factos atrás enunciados conduzem inequivocamente à conclusão da não verificação do pressuposto do plano de viabilidade, referente ao invocado aumento do número de alunos;
h) A estes factos acresce ainda que, após a data do relatório da DGES, foram publicados anúncios no sítio http://publicacoes.mj.pt que divulgam a renúncia, em finais do mês de Abril último, de todos os membros da direcção da entidade instituidora da Universidade Independente, a falada SIDES, aos respectivos cargos, sem que até ao presente tenham sido substituídos, pelo que desde 31 de Maio que o órgão de administração da entidade instituidora não se encontra em condições de reunir e deliberar, não havendo também quem a obrigue nos actos ou contratos necessários à sua actividade, pelo menos de acordo com os factos publicados em obediência ao disposto na legislação societária;
i) No requerimento da providência requerida, a entidade instituidora da Universidade Independente não contesta os factos apurados ao longo do processo nem, sequer, as conclusões que deles inequivocamente se retiram.
Nestes termos, como se compreenderá, a suspensão do procedimento e o consequente diferimento dos actos de execução subsequentes seria gravemente prejudicial para o interesse público, pois equivaleria a admitir o funcionamento de um estabelecimento de ensino superior quando comprovadamente não se verificam os pressupostos de facto e de direito subjacentes à atribuição do reconhecimento do seu interesse público, que a lei considera a todo o tempo indispensáveis ao seu funcionamento.
Esta situação afectaria gravemente o prestígio do ensino superior, é susceptível de acarretar prejuízos graves para os alunos que frequentam o estabelecimento de ensino e para a credibilidade do ensino superior privado, pois, a admitir-se, evidenciaria a impotência do Estado para prosseguir uma actividade que constitucionalmente lhe foi atribuída.
Face ao exposto, nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 128.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, reconheço que o diferimento da execução dos actos consequentes do acto suspendendo seria gravemente prejudicial para os interesses públicos que incumbe prosseguir ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, pelo que determino que, não obstante a existência da providência cautelar, o procedimento em curso deva continuar os seus termos, retirando-se as devidas consequências se, no prazo assinado, não for regularizada a situação e preenchidos os pressupostos subjacentes à atribuição do reconhecimento do interesse público em falta.
11 de Junho de 2007. - O Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, José Mariano Rebelo Pires Gago.