Decreto Legislativo Regional 45/2006/M
Cria o Serviço Regional de Resolução Voluntária de Conflitos de Trabalho
A vivência laboral, pelas suas natureza e dinâmica e face aos interesses em presença, implica algum potencial de conflitualidade, para cuja superação supõe a existência de mecanismos de diálogo e estruturas que permitam a abordagem dos problemas na perspectiva da sua resolução consensual, em primeira instância com a participação dos interessados e mais eficazmente na base de intervenção tripartida.
O diálogo social, a intervenção conciliatória e a assunção plena do tripartismo têm constituído vectores importantes da política laboral empreendida nesta Região Autónoma, situação evidente sobretudo no domínio dos processos colectivos, pela acção mais acentuada das associações representativas dos parceiros sociais - sindicatos e associações de empregadores -, revelando-se necessário institucionalizar, ao nível dos conflitos individuais, meios de intervenção que garantam também a estes a possibilidade de recurso a soluções consensuais formalizadas que assegurem e tutelem os seus direitos de forma célere e eficaz, independentemente de a função conciliatória ser desde sempre uma das atribuições exercidas na rotina dos serviços da área laboral.
A experiência advinda das extintas comissões de conciliação, bem como de idênticos serviços nesta área, e a acção recorrente das iniciativas e da disponibilidade dos vários departamentos da área laboral na resolução e na procura de soluções consensuais face aos problemas e conflitos suscitados individualmente pelos interessados - trabalhadores e empregadores - justificam a criação nesta Região Autónoma de serviço vocacionado para esta função, objectivo assumido no Programa do Governo Regional para a área do trabalho que ora se concretiza.
O referido serviço, no domínio das conciliações, assenta na decisão voluntária das partes e constitui um processo de composição dos conflitos que lhe são presentes, tendo por base o acordo dos intervenientes, como expressão da autonomia da vontade daqueles, sem intervenção decisória de terceiros.
Para além da função conciliatória, no âmbito dos conflitos individuais de trabalho, o serviço regional em causa poderá assumir igualmente atribuições no que se refere à arbitragem voluntária de tais conflitos, cumpridos os formalismos legais inerentes ao seu reconhecimento e nos demais termos estabelecidos na legislação aplicável, nomeadamente tendo presente o regime jurídico da arbitragem voluntária, previsto na Lei 31/86, de 29 de Agosto, e no Decreto-Lei 425/86, de 27 de Dezembro, reconhecimento este que será promovido após a criação deste serviço.
Igualmente o serviço ora criado integra, como inovação, aproveitando esta estrutura, e como mais uma opção no elenco das alternativas à resolução voluntária de conflitos de trabalho, a decorrente do anunciado sistema de mediação laboral, assumindo, não obstante algumas particularidades, os mesmos objectivos e metodologias.
Nos termos legais, nomeadamente do artigo 524.º do Código do Trabalho, foram ouvidos os representantes das principais organizações representativas dos trabalhadores e dos empregadores.
Assim:
A Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira decreta, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º e do artigo 228.º da Constituição da República Portuguesa, conjugados, por força do disposto no artigo 46.º da Lei Constitucional 1/2004, de 24 de Julho, com o disposto na alínea n) do artigo 40.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, aprovado pela Lei 13/91, de 5 de Junho, na redacção dada pela Lei 130/99, de 21 de Agosto, com a alteração introduzida pela Lei 12/2000, de 21 de Junho, bem como nos termos da Lei 31/86, de 29 de Agosto, e do Decreto-Lei 425/86, de 27 de Dezembro, o seguinte:
Regime aplicável
É criado o Serviço Regional de Resolução Voluntária de Conflitos de Trabalho, integrando, como opções, a conciliação, a mediação e a arbitragem voluntária de conflitos de trabalho da Região Autónoma da Madeira, que se regerá pelas disposições constantes do estatuto anexo ao presente diploma, do qual faz parte integrante, e seus regulamentos, bem como da demais legislação aplicável.
Artigo 2.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor 60 dias após a sua publicação.Aprovado em sessão plenária da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira em 26 de Julho de 2006.
O Presidente da Assembleia Legislativa, José Miguel Jardim d'Olival Mendonça.
Assinado em 9 de Agosto de 2006.
Publique-se.O Representante da República para a Região Autónoma da Madeira, Antero Alves Monteiro Diniz.
ESTATUTO DO SERVIÇO REGIONAL DE RESOLUÇÃO VOLUNTÁRIA DOS
CONFLITOS DE TRABALHO
CAPÍTULO I
Natureza e atribuições
Artigo 1.º
Natureza
O Serviço Regional de Resolução Voluntária de Conflitos de Trabalho da Região Autónoma da Madeira é o organismo de composição tripartida, dotado de autonomia técnica e independência, integrado na Secretaria Regional dos Recursos Humanos, na estrutura orgânica da Direcção Regional do Trabalho.
Artigo 2.º
Atribuições
São atribuições do Serviço Regional de Resolução Voluntária dos Conflitos de Trabalho:a) Realizar diligências de conciliação e mediação nos conflitos individuais de trabalho que voluntariamente lhe sejam submetidos pelas partes;
b) Realizar arbitragens voluntárias institucionalizadas de litígios laborais, nos termos da legislação aplicável.
Artigo 3.º
Princípios orientadores
Na acção do Serviço Regional de Resolução Voluntária dos Conflitos de Trabalho serão observados os seguintes princípios:a) A sua acção exercer-se-á com imparcialidade, autonomia técnica e independência, aplicando-se, com as devidas adaptações, as normas relativas a garantias de imparcialidade previstas no Código de Processo Civil (CPC), não estando os seus membros obrigados a proceder de acordo com instruções provindas de qualquer entidade;
b) Na sua estrutura e no seu funcionamento serão respeitados os princípios do tripartismo;
c) A sua intervenção apenas poderá ter lugar a requerimento do interessado ou dos interessados;
d) A mediação laboral será regida pelos princípios do correspondente sistema nacional;
e) Poderão ser fixados valores pelos serviços prestados por despacho conjunto dos secretários regionais com a tutela das finanças e do trabalho.
CAPÍTULO II
Estrutura orgânica
Artigo 4.º
Estrutura
1 - O Serviço Regional de Resolução Voluntária dos Conflitos de Trabalho exerce a sua actividade no âmbito geográfico da Região Autónoma da Madeira e circunscrito às relações laborais nela estabelecidas, sendo integrado por comissões de conciliação e arbitragem (CCA), a constituir, representativas de cada sector de actividade, e, quanto à mediação, por mediadores laborais credenciados.2 - O Serviço Regional de Resolução Voluntária dos Conflitos de Trabalho será chefiado por um presidente, cujo titular é qualificado como cargo de direcção intermédia do 2.º grau, designado como chefe de divisão.
3 - As comissões serão compostas pelo presidente do Serviço Regional de Resolução Voluntária dos Conflitos de Trabalho, que presidirá, e por dois vogais, em representação paritária dos trabalhadores e das entidades empregadoras.
4 - O quadro de pessoal do Serviço Regional de Resolução Voluntária dos Conflitos de Trabalho será aprovado por portaria conjunta das secretarias regionais que tutelam os sectores das finanças, da Administração Pública e do trabalho.
CAPÍTULO III
Da constituição das CCA
SECÇÃO I
Do presidente
Artigo 5.º
Nomeação, ausências e impedimentos
1 - O presidente do Serviço Regional de Resolução Voluntária dos Conflitos de Trabalho é, por inerência, o presidente das CCA a constituir, sendo nomeado pelo secretário regional com a tutela da área laboral, pelo período de três anos, renováveis, e recrutado nos termos da legislação aplicável de entre indivíduos licenciados em Direito, com experiência profissional no domínio das relações laborais e vinculados à função pública.2 - Nas ausências ou impedimentos, o presidente das CCA será substituído por quem para o efeito for designado, nos termos do artigo anterior, e salvaguardando o princípio do tripartismo.
3 - No exercício das suas funções, aplicam-se ao presidente do Serviço Regional de Resolução Voluntária dos Conflitos de Trabalho e das CCA, com as necessárias adaptações, as normas relativas às garantias de imparcialidade e isenção previstas na lei, nomeadamente no Código do Procedimento Administrativo.
SECÇÃO II
Dos vogais
Artigo 6.º
Indicação de representantes
Cada associação de empregadores e sindical signatária das convenções colectivas do sector que tenha associados na área de actuação da respectiva CCA indicará à Direcção Regional do Trabalho, até 15 dias após o início da vigência do presente diploma e, posteriormente, até 30 dias do final de cada mandato, os seus representantes nas respectivas comissões, seja a título de vogal efectivo como do suplente.
Artigo 7.º
Composição
1 - A composição das CCA será comunicada às associações de empregadores e sindicais através de ofício.2 - A CCA considera-se constituída e em funcionamento a partir do 5.º dia útil subsequente à data da expedição dos ofícios referidos no número anterior.
3 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, os elementos de identificação dos membros de cada CCA serão publicados na 3.ª série do Jornal Oficial da Região.
Artigo 8.º
Mandatos
1 - O mandato dos vogais das CCA tem a duração de três anos, sem prejuízo da sua renovação.2 - Ainda que se tenha esgotado o prazo do respectivo mandato, os vogais das CCA manter-se-ão em funções até que sejam designados novos vogais.
3 - No exercício das suas funções, os vogais estão sujeitos ao disposto no artigo 5.º 4 - Nas suas ausências ou impedimentos, os vogais serão substituídos pelos vogais suplentes.
5 - Tornando-se definitiva a ausência ou o impedimento do vogal ou verificando-se a sua desistência, deverá ser designado um novo vogal, nos termos do artigo 6.º
Artigo 9.º
Faltas ao trabalho
As faltas ao trabalho dos vogais das CCA motivadas pela necessidade de comparência nas respectivas sessões são consideradas como justificadas para todos os efeitos legais e equiparadas a prestação de serviço efectivo, não implicando a perda de quaisquer direitos ou regalias.
CAPÍTULO IV
Funcionamento das CCA
Artigo 10.º
Vogais designados
1 - As CCA funcionarão, em cada caso, com os vogais designados:a) Pelas associações de empregadores e sindicais signatárias das convenções colectivas do sector de actividade em que se inserir o conflito;
b) Pelas associações que representarem as partes, no caso de num sector de actividade haver mais de uma associação patronal ou sindical;
c) Por qualquer das associações do sector se, na hipótese da alínea anterior, as partes não estiverem filiadas em nenhuma delas;
d) Pelas associações representativas do sector de actividade com que haja maior afinidade no caso de no sector em que se inserir o conflito não existirem associações de empregadores ou sindicais.
2 - A representatividade das associações de empregadores e sindicais afere-se pelo maior número de associados.
Artigo 11.º
Reuniões de conciliação
1 - As CCA só deverão reunir quando estiverem presentes o presidente e os dois vogais.2 - Sem prejuízo do disposto em matéria de arbitragem, as CCA poderão funcionar apenas com o presidente ou com o presidente e um dos vogais quando:
a) À hora marcada para as sessões não compareçam os vogais efectivos nem os suplentes e as convocatórias se mostrem regularmente efectuadas;
b) Não existam associações de empregadores ou sindicais e não seja possível aplicar o disposto na alínea d) do artigo anterior;
c) Não sejam designados vogais por alguma das associações de empregadores ou sindicais nos prazos estabelecidos.
Artigo 12.º
1 - Sem prejuízo do disposto em matéria de arbitragem, as diligências de conciliação exprimem o mútuo consentimento das partes ou o seu dissentimento.2 - O presidente deve opôr-se aos acordos de conciliação que entenda violarem a lei, mediante despacho devidamente fundamentado.
CAPÍTULO V
Da conciliação, da mediação laboral e da arbitragem dos conflitos individuais de
trabalho
SECÇÃO I
Da conciliação
Artigo 13.º
Requerimento
1 - O processo de tentativa de conciliação iniciar-se-á com requerimento do interessado, em que este identificará o requerido e deduzirá o seu pedido sumariamente justificado e fundamentado.2 - Com o requerimento serão juntas as provas admissíveis nos termos legais.
3 - O requerimento solicitando a tentativa de conciliação será acompanhado por uma cópia destinada a ser entregue ao requerido.
4 - O requerimento será assinado pelo requerente, ou a seu rogo se este não o souber fazer, ou ainda pelo respectivo sindicato ou associação de empregadores, devendo, neste último caso, ser acompanhado do consentimento expresso do requerente para esse efeito.
Artigo 14.º
Tramitação processual
1 - Recebido, registado e autuado o pedido, será este despachado pelo presidente dentro dos cinco dias úteis seguintes, marcando-se dia e hora para a tentativa de conciliação.2 - Se o pedido se mostrar manifestamente inviável, o presidente indeferi-lo-á em despacho fundamentado, que será comunicado ao requerente.
3 - Se apenas se tratar de irregularidades, deficiências ou obscuridades, o presidente convidará o requerente a saná-las, supri-las ou esclarecê-las no prazo de cinco dias úteis.
4 - Poderá o requerente reclamar para a CCA, no prazo referido no número anterior, com efeito suspensivo, do despacho de indeferimento do presidente, devendo ela deliberar nos 15 dias seguintes à apresentação da reclamação.
5 - Se a reclamação for atendida ou tiver sido dado cumprimento ao disposto no n.º 3 deste artigo, será proferido nas quarenta e oito horas seguintes o despacho previsto no n.º 1 do presente artigo.
Artigo 15.º
Tentativas de conciliação
1 - Nos três dias úteis seguintes à marcação da tentativa de conciliação, serão os vogais convocados para a respectiva reunião.2 - Dentro do prazo referido no número anterior serão notificados os interessados para comparecer pessoalmente à tentativa de conciliação, devendo ser advertidos das sanções correspondentes à falta de comparência.
3 - Ao requerido será enviado, aquando da notificação, duplicado do pedido do requerente.
Artigo 16.º
Resposta ao pedido
1 - O requerido poderá apresentar, no prazo previsto no n.º 1 do artigo 14.º, a contar a partir da recepção por este do respectivo pedido, resposta escrita ao pedido do requerente.2 - A resposta será apresentada em duplicado, destinando-se os seus exemplares, respectivamente, ao processo e ao requerente.
Artigo 17.º
Participação nas conciliações
1 - As partes deverão comparecer na tentativa de conciliação pessoalmente ou através de representante com poderes bastantes para confessar, desistir ou transigir.2 - As pessoas colectivas serão representadas por administrador, director, gerente ou mandatário nos termos do número anterior.
Artigo 18.º
Não comparência nas conciliações
1 - A falta de comparência injustificada de qualquer dos interessados à diligência de conciliação faz recair sobre o faltoso a obrigação de pagar à parte que compareceu, se esta o reclamar, as despesas de transporte, perdas de remuneração e outras que comprove ter suportado.2 - Considera-se faltosa a parte que não comparecer sem justificação ou cujo representante não se apresente munido de poderes suficientes para conciliar, excepto se este firmar acordo que venha a ser ratificado pelo representado nos cinco dias úteis posteriores à notificação para o efeito.
Artigo 19.º
Novas reuniões
1 - A falta devidamente comprovada de qualquer dos interessados por motivos considerados justificados ou atendíveis determinará que seja marcada nova tentativa de conciliação nos 15 dias seguintes, salvo se a razão do adiamento impuser prazo maior, que não será, contudo, superior a 30 dias.2 - Persistindo o motivo que determinou a falta referida no número anterior, não poderá haver segundo adiamento, pelo que o interessado deverá fazer-se representar nos termos do artigo 17.º 3 - A falta não justificada dos interessados no prazo de cinco dias úteis determina o arquivamento do processo, excepto se neste prazo for requerida nova diligência de conciliação.
Artigo 20.º
Autos de conciliação
1 - Havendo conciliação, os termos do acordo celebrado serão reduzidos a escrito e dele serão tirados os exemplares necessários, respectivamente, ao processo, às partes e à instituição de previdência, no caso de a este serem devidas quaisquer contribuições ou descontos.2 - Os autos de conciliação serão assinados pelo presidente, pelos vogais que nela intervierem e pelas partes e deles constarão obrigatoriamente os termos do acordo no respeitante a prestações, prazos e lugares de cumprimento.
3 - Os autos de conciliação constituem, para todos os efeitos, títulos executivos perante os tribunais.
Artigo 21.º
Auto de não acordo
1 - Frustrada a conciliação, será desse facto lavrado auto, do qual não se mencionarão os motivos que levaram à não conciliação.2 - Os autos de não conciliação serão assinados pelas entidades referidas no n.º 2 do artigo anterior e deles serão tirados os exemplares necessários, respectivamente, ao processo e às partes.
3 - Na hipótese prevista no n.º 1 deste artigo, a CCA deve elucidar as partes do direito aplicável.
SECÇÃO II
Da mediação laboral
Do regime
A mediação laboral rege-se pelo estabelecido para o sistema nacional de mediação laboral, com as adaptações decorrentes das competências dos órgãos e serviços regionais e de acordo com o regulamento, a publicar.
SECÇÃO III
Da arbitragem voluntária
Artigo 23.º
Recurso a arbitragem
Frustrada a tentativa de conciliação, ou independentemente desta, podem as partes recorrer à arbitragem pela CCA visando prevenir ou resolver conflitos emergentes de relações de trabalho.
Artigo 24.º
Regime aplicável à arbitragem
1 - No domínio da arbitragem, a CCA reger-se-á pelas normas e pelos princípios gerais constantes da legislação aplicável, nomeadamente da Lei 31/86, de 29 de Agosto, e do Decreto-Lei 425/86, de 27 de Dezembro, bem como pelo seu regulamento de arbitragem.2 - O regulamento de arbitragem previsto no número anterior será elaborado e aprovado pela CCA e conterá os procedimentos a observar na arbitragem.
CAPÍTULO VI
Disposições finais
Artigo 25.º
Orçamento
As despesas de instalação e de funcionamento do Serviço Regional de Resolução Voluntária dos Conflitos de Trabalho serão suportadas por verbas para esse efeito inscritas no orçamento da Direcção Regional do Trabalho.