Decreto Legislativo Regional 9/2006/M
Aprova o Estatuto do Sistema de Acção Social da Área de Segurança
Social na Região Autónoma da Madeira
Pelo Decreto-Lei 426/77, de 13 de Outubro, e, posteriormente, pelo Decreto-Lei 391/80, de 23 de Setembro, foram regionalizados os serviços de segurança social e cometida ao Governo Regional da Madeira a orientação política referente a este sector.O desenvolvimento entretanto verificado, proporcionado pela autonomia regional, incrementou, significativamente, o nível e a qualidade de vida das populações. Na área da acção social, o incremento das prestações e o extraordinário aumento do número e da qualidade das infra-estruturas ao nível de serviços e equipamentos sociais e, concomitantemente, o desenvolvimento de programas de combate à exclusão social, contribuíram para elevar, decisivamente, o bem-estar social das populações.
A sociedade actual defronta-se com novos desafios, face ao acentuar do envelhecimento da população e do seu grau de dependência, a emergência de recentes fenómenos de vulnerabilidade social, como a violência doméstica, as crianças e jovens em perigo, os sem-abrigo, os toxicodependentes, que conduzem à necessidade de resolver não apenas os problemas existentes, mas de atacar, igualmente, as causas geradoras de situações de dependência e de exclusão sociais. A procura de um equilíbrio que permita aos cidadãos melhorar as suas condições de vida e usufruir de uma vida social estável e próspera é, hoje, um dos objectivos centrais.
Neste contexto, a criação de oportunidades ao nível das condições de vida de todos os cidadãos que garantam autonomia e integração social em termos de proporcionar um exercício efectivo da cidadania, conjugada com a co-responsabilidade dos próprios e de todos os sectores da sociedade na abordagem e na resolução dos problemas sociais, apresenta-se como o novo desafio da área de acção social.
Face às opções estratégicas actuais de reforço do sistema de acção social importa, partindo dos princípios e das bases consubstanciadas na Lei de Bases da Segurança Social, aprovada pela Lei 32/2002, de 20 de Dezembro, desenvolver um quadro normativo que fixe os critérios orientadores do sistema de acção social da área de segurança social na Região Autónoma da Madeira, de modo a potenciar a sua evolução de uma forma eficaz, harmoniosa, coerente e aberta, face aos novos desafios e respostas exigidos pela sociedade madeirense, no dealbar deste novo século.
Assim:
A Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, no desenvolvimento do regime jurídico estabelecido nas bases contidas nos artigos 82.º a 93.º e 131.º da Lei 32/2002, de 20 de Dezembro, que aprova as bases da segurança social, decreta, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição da República Portuguesa, da alínea e) do n.º 1 do artigo 37.º e da alínea m) do artigo 40.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, aprovado pela Lei 13/91, de 5 de Junho, revisto pelas Leis n.os 130/99, de 21 de Agosto, e 12/2000, de 21 de Junho, o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto
É aprovado o Estatuto do Sistema de Acção Social da Área de Segurança Social na Região Autónoma da Madeira, publicado em anexo ao presente diploma, do qual é parte integrante.
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.Aprovado em sessão plenária da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira em 7 de Março de 2006.
O Presidente da Assembleia Legislativa, José Miguel Jardim d'Olival Mendonça.
Assinado em 3 de Abril de 2006.
Publique-se.O Representante da República para a Região Autónoma da Madeira, Antero Alves Monteiro Diniz.
ESTATUTO DO SISTEMA DE ACÇÃO SOCIAL DA ÁREA DE SEGURANÇA
SOCIAL NA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objecto
1 - O presente diploma define as normas enquadradoras gerais aplicáveis ao sistema de acção social da área de segurança social na Região Autónoma da Madeira, adiante designado, abreviadamente, por sistema de acção social, bem como os critérios e objectivos deste sistema de intervenção social.2 - O sistema de acção social da área de segurança social é integrado pelo serviço de segurança social da estrutura orgânica do Governo Regional, por instituições particulares de solidariedade social, misericórdias, organizações não governamentais, pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e demais entidades privadas, com ou sem fins lucrativos com actuação na área social.
3 - O sistema de acção social rege-se pelos princípios e direitos estabelecidos na Constituição da República Portuguesa, pelo Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, pela Lei de Bases da Segurança Social e pelas normas constantes do presente diploma e legislação subsequente.
Artigo 2.º
Âmbito pessoal
O sistema de acção social tem como destinatários privilegiados as pessoas, indivíduos e famílias e ou grupos sociais mais vulneráveis, cujas necessidades de bem-estar social não se encontrem asseguradas pelos subsistemas previdencial, de solidariedade e de protecção familiar do sistema público de segurança social.
Artigo 3.º
Âmbito material
1 - A intervenção social no âmbito do sistema de acção social realiza-se através da concessão de, designadamente:a) Prestações pecuniárias, de carácter eventual ou renovável e em condições de excepcionalidade;
b) Prestações em espécie;
c) Acesso aos serviços e equipamentos sociais;
d) Apoio e participação em programas de combate à pobreza, disfunção, marginalização e exclusão sociais;
e) Outras prestações criadas através de decreto legislativo regional.
2 - As prestações constantes das alíneas a) e b) do número anterior são concedidas mediante uma prévia avaliação das situações de carência e têm um carácter personalizado e temporário.
Artigo 4.º
Missão
1 - O sistema de acção social constitui um sistema de protecção social participado, envolvendo recursos públicos e privados, humanos e materiais, numa perspectiva globalizante, integradora e de co-responsabilidade, orientada pelos objectivos de prevenção, reparação, intervenção e integração comunitária das pessoas e grupos sociais mais vulneráveis.2 - O sistema de acção social tem por missão criar oportunidades ao nível das condições de vida das pessoas, geradoras de iniciativas individuais e colectivas, que garantam a autonomia, integração e o protagonismo social daquelas e de grupos sociais mais vulneráveis, através da criação e desenvolvimento dos meios adequados à promoção e exercício efectivo da cidadania.
Artigo 5.º
Eixos privilegiados de intervenção do sistema de acção social
Consideram-se eixos privilegiados da intervenção do sistema de acção social, nomeadamente:
a) Promoção das condições de vida da população idosa mais desfavorecida, no sentido de prevenir situações de dependência e de garantir a sua autonomia pessoal;
b) Promoção da prevenção primária junto das famílias, das crianças e dos jovens;
c) Promoção da integração social e comunitária dos grupos mais vulneráveis;
d) Promoção da solidariedade entre gerações e da participação activa da sociedade civil;
e) Promoção da integração comunitária e do combate à exclusão social;
f) Definição de medidas de protecção social, tendo em vista o pleno exercício de direitos e a melhoria do bem-estar social;
g) Intervenção ao nível dos cuidados continuados integrados, promovendo a autonomia pessoal e, por essa via, garantindo qualidade de vida e bem-estar das pessoas com dependências;
h) Programação e execução de uma política de investimento em infra-estruturas e equipamentos que propiciem condições adequadas e de qualidade ao acolhimento das pessoas e à dinamização das actividades de acção social;
i) Promoção de uma rede regional de serviços e equipamentos sociais, para apoio às pessoas e às famílias, com o envolvimento das entidades e serviços mencionados no n.º 2 do artigo 1.º do presente diploma;
j) Promoção de acções de voluntariado, tendo em vista a adopção e desenvolvimento de atitudes renovadas de participação, responsabilização e intervenção na vida da comunidade.
CAPÍTULO II
Critérios orientadores e níveis de intervenção social
Artigo 6.º
Critérios orientadores
A intervenção do sistema de acção social obedece aos seguintes critérios fundamentais:a) Subsidiariedade social, que implica que a pessoa, a família e a comunidade sejam, por excelência, os parceiros dos processos que lhes dizem respeito;
b) Adequação, que se concretiza em respostas oportunas, flexíveis e eficazes, de forma personalizada, às carências detectadas;
c) Orientação para a participação e responsabilização no desenvolvimento, que visa a criação de condições de vida geradoras de iniciativas individuais e colectivas que garantam a autonomia, a integração e o protagonismo social das pessoas e dos grupos mais vulneráveis;
d) Parceria, que se traduz na co-responsabilização na definição, prossecução e avaliação das acções respectivas e uma intervenção integrada e articulada em função de objectivos comuns para que cada parceiro assuma, numa óptica de complementaridade, a sua responsabilidade específica;
e) Transversalidade, que traduz a ideia de uma intervenção integrada e conjugada de todos os sectores da sociedade na abordagem e na resolução dos problemas sociais;
f) Descentralização, que se opera num quadro potenciador da autonomia local e da criação de redes de serviços próximos às populações, garantindo a sua participação na resolução dos problemas locais;
g) Não cumulação, que consiste na não acumulação das prestações do sistema de acção social com outras de idêntica natureza e finalidade, desde que garantidas pelo sistema público de segurança social;
h) Garantia da equidade, justiça social e da igualdade de tratamento;
i) Articulação eficaz entre as entidades com responsabilidades sociais e os serviços de saúde e assistência.
Artigo 7.º
Intervenção social
A intervenção do sistema de acção social deve ser:a) Garante dos direitos sociais;
b) Especializada, para fazer face a necessidades específicas;
c) Personalizada, por ser centrada na pessoa em situação;
d) Contextualizada e, por isso, concertada, coordenada e promotora do desenvolvimento social;
e) Eficaz na prestação de apoio social.
Artigo 8.º
Níveis de intervenção social
A definição e execução da política de acção social implicam uma intervenção simultânea a três níveis:a) Prevenção;
b) Protecção social;
c) Inclusão social.
Artigo 9.º
Prevenção social
1 - A prevenção social assenta na adopção de uma política que privilegie acções tendentes a evitar disfunções sociais, o seu agravamento ou as suas consequências, através de uma intervenção oportuna e adequada.2 - O sistema de acção social deve propor medidas de estratégia e contribuir para a definição das medidas de política, objectivos e prioridades sociais.
Artigo 10.º
Protecção social
O sistema de acção social deve desempenhar um papel interventor no sentido de promover a protecção social das pessoas, das famílias e dos grupos mais vulneráveis, concedendo as prestações mais adequadas às situações individualmente consideradas.
Artigo 11.º
A inclusão social traduz-se na promoção do processo dinâmico conducente à integração de todos os membros da comunidade, por via de alterações organizacionais e comportamentais.
CAPÍTULO III
Planeamento
Artigo 12.º
Planeamento social
1 - O exercício da acção social deve assentar num planeamento social, que proceda ao diagnóstico dos fenómenos e dos problemas de exclusão social, à previsão da sua evolução, à definição de metas e de prioridades, à definição de estratégias e programas de intervenção, no sentido de actuar sobre as causas dos problemas sociais.2 - Os planos sociais devem privilegiar, nas suas estratégias:
a) Mecanismos de responsabilização e de mobilização do conjunto da sociedade e de cada pessoa no esforço de erradicação dos problemas sociais;
b) A transversalidade entendida como convergência das medidas económicas, sociais e ambientais, assentando numa congregação de recursos;
c) A promoção das comunidades locais e das pessoas, criando dinâmicas de potenciação dos recursos e das competências locais.
3 - A execução dos planos deve ser acompanhada da realização de estudos de avaliação do impacte das intervenções sociais.
CAPÍTULO IV
Equipamentos e serviços
Artigo 13.º
Equipamentos e serviços de acção social
1 - Os equipamentos e serviços de acção social actuam tendencialmente de forma concertada e coordenada e constituem, por excelência, um agente da dinamização local, com vista à prevenção, protecção e inclusão social das pessoas e grupos sociais mais vulneráveis.
2 - Os equipamentos e serviços de acção social são constituídos, nomeadamente, por:
a) Centros de acolhimento para crianças e jovens em perigo;
b) Centros de acolhimento para vítimas da violência doméstica;
c) Centros de acolhimento para mães em risco;
d) Centros de acolhimento para os sem-abrigo;
e) Centros de actividades de tempos livres;
f) Centros de convívio;
g) Centros comunitários;
h) Centros de dia;
i) Centros de noite;
j) Colónias de férias;
l) Lares de crianças e jovens em perigo;
m) Lares de idosos;
n) Linha de emergência social;
o) Residências de autonomização;
p) Residências de idosos;
q) Refeitórios sociais;
r) Serviços de ajuda domiciliária;
s) Serviço de tele-alarme.
3 - As comparticipações dos utentes e respectivos familiares, relativas à utilização de serviços e equipamentos sociais criados e regulamentados nos termos da lei, são definidas segundo parâmetros que têm em conta os rendimentos dos seus destinatários e respectivas famílias, numa óptica de responsabilização global da família e em concretização dos princípios da solidariedade e da subsidiariedade social.
CAPÍTULO V
Parcerias Artigo 14.º
Parceria intersectorial
Constituem parceiros privilegiados da segurança social no exercício da acção social as instituições de educação, formação e emprego, saúde, habitação e demais entidades que desenvolvam uma intervenção de carácter social, por forma a garantir a convergência e eficácia ao nível da política social.
Artigo 15.º
Parcerias com universidades
1 - O sistema de acção social promove, sempre que se revele conveniente, a parceria com universidades, participando em projectos de investigação e observatórios sociais, tendo em vista o conhecimento da realidade e a definição de políticas, objectivos e prioridades sociais.2 - As entidades e os serviços do sistema de acção social podem facultar aos estabelecimentos de ensino que ministrem cursos na área social oportunidades de estágios curriculares.
3 - As parcerias previstas nos números anteriores são precedidas de celebração de protocolo que estabeleça a forma de colaboração, as obrigações e prestações mútuas e a repartição dos encargos financeiros, ou outros, resultantes daquela colaboração.
Artigo 16.º
Outras entidades
O sistema de acção social pode adoptar formas de colaboração com entidades privadas com actividades e estabelecimentos no âmbito da acção social, através de protocolos de parceria.
CAPÍTULO VI
Cooperação
Artigo 17.º
Instituições particulares de solidariedade social
1 - A cooperação com as instituições particulares de solidariedade social, registadas na segurança social, assume a forma de acordos de cooperação e de gestão, nos termos da legislação aplicável.
2 - As instituições mencionadas no número anterior ficam sujeitas, no âmbito das suas actividades, aos poderes de fiscalização e inspecção do membro do governo regional da tutela, nos termos da legislação em vigor, designadamente para aferição da prossecução efectiva dos acordos e protocolos celebrados.
CAPÍTULO VII
Disposições finais
Artigo 18.º
Regulamentação
Compete ao Governo Regional adoptar as medidas regulamentares necessárias à boa execução do disposto no presente diploma.