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Acórdão 396/2001/T, de 14 de Novembro

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Texto do documento

Acórdão 396/2001/T. Const. - Processo 303/2000. - 1 - Os licenciados Luís Miguel Nogueira Rosa Dias e João José Pinto d'Almeida Carneiro instauraram pela Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo recursos contenciosos de anulação do despacho proferido em 3 de Dezembro de 1992 pela Ministra da Saúde e que indeferiu o recurso hierárquico do acto de homologação da lista final do concurso de provimento para chefe de serviço hospitalar de cirurgia vascular da carreira média hospitalar do Hospital de Santa Maria.

Nas alegações que produziram podem ler-se as seguintes "conclusões", no que ora releva, ou seja, no que concerne a questões conexionadas com alegadas preterições de normas ou princípios constitucionais (note-se, por um lado, que as alegações dos dois recorrentes eram praticamente iguais e, por outro, que nos respectivos "teores" nada de substancialmente diverso - à excepção do que mais à frente se dirá - foi escrito reportadamente ao que também se escreveu nas adiante transcritas "conclusões"):

"...

14.ª O deliberado pelo júri, na acta 3, violou, em concreto, o disposto nos n.os 56 e 56.1 da Portaria 114/91, de 7 de Fevereiro, e, pelo menos em abstracto, os princípios da 'igualdade, justiça e imparcialidade', consagrados no n.º 2 do artigo 266.º da CRP.

15.ª A falta de notificação da acta 3 aos concorrentes implicou uma violação do direito à notificação com fundamentação - n.º 3 do artigo 268.º da CRP, n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei 256-A/77, de 17 de Junho, e artigos 66.º, 68.º, 70.º, 124.º e 125.º do Código do Procedimento Administrativo.

...

19.ª No caso em apreço o júri refugiou-se numa votação por unanimidade, que, além de contrariar o 'mecanismo de uma discussão curricular', viola inequivocamente aquelas disposições regulamentares e as demais normas legais que consagram o direito à fundamentação (n.º 3 do artigo 268 da CRP, artigo 1.º do Decreto-Lei 256-A/77, de 17 de Junho, e artigos 124.º a 126.º do Código do Procedimento Administrativo).

20.ª Finalmente, a mesma acta 6, ao dar uma lista de classificação final em que a fundamentação é remetida para 'verbetes individuais', em separado, viola o disposto no n.º 57, conjugado com a alínea d) do n.º 42, ambos da Portaria 114/91 e bem assim o 'princípio do contraditório' entre os concorrentes, quer entre si, quer perante o júri, princípio esse que uma 'discussão curricular' deve observar, como única forma de se salvaguardar os princípios da igualdade, imparcialidade e justiça, consignados no n.º 2 do artigo 266.º da CRP.

..."

Por acórdão da Subsecção da 1.ª Secção, tirado em 10 de Dezembro de 1998, concedeu o Supremo Tribunal Administrativo provimento aos recursos, o que fez por entender que "[a]o estabelecer, sem mais e apenas. uma pontuação para cada conjunto, quis [o legislador] conferir ao júri a flexibilidade para, em cada caso concreto,... das mais diversas realidades, poder sopesar conveniente e ponderadamente os vários elementos, sem estar sujeito a outros balizamentos que não os traçados por aquele n.º 56.1", pelo que "[a]o proceder pela sobredita forma, o júri desrespeitou este dispositivo, violando-o".

Ao decidir desse modo, o aludido Supremo Tribunal, no indicado aresto, entendeu ficarem prejudicados os demais vícios invocados pelos recorrentes.

Não se conformando com o mencionado acórdão, dele recorreu para o pleno da Secção de Contencioso Administrativo daquele alto Tribunal a Ministra da Saúde, tendo os licenciados Luís Miguel Nogueira Rosa Dias e João José Pinto d'Almeida Carneiro recorrido subordinadamente.

Na alegação que produziram quanto ao recurso interposto pela Ministra da Saúde, estes últimos foram silentes quanto a qualquer questão de desconformidade com o diploma básico.

Por outro lado, na alegação que produziram referente ao recurso subordinado por eles interposto, os falados licenciados Luís Miguel Nogueira Rosa Dias e João José Pinto d'Almeida Carneiro concluíram assim:

"1.ª Os vícios do acto administrativo recorrido, aludidos nas conclusões 14.ª a 20.ª, foram, todos eles, arguidos cumulativamente.

2.ª A correcta decisão quanto à questão equacionada na conclusão 14.ª não prejudica o conhecimento das questões equacionadas nas conclusões 15.ª a 20.ª

3.ª Ficaram, assim, os ora recorrentes vencidos, rectius prejudicados, pela falta de pronúncia quantos às questões equacionadas nas conclusões 15.ª a 20.ª, decorrendo daí a sua legitimidade para o presente recurso.

4.ª Qualquer entendimento contrário ao expendido na precedente conclusão violaria o núcleo essencial do direito - consagrado na lei fundamental - ao recurso contencioso (n.º 4 do artigo 268.º da CRP, na redacção anterior à ora vigente).

5.ª A conclusão anterior ilustra-se pela hipótese académica, mas possível, de o recurso interposto pela Ministra da Saúde ser provido.

6.ª O acórdão recorrido, ao considerar prejudicado o conhecimento dos vícios equacionados nas conclusões 15.ª a 20.ª, violou expressamente o disposto na primeira parte do n.º 2 do artigo 660.º, incorrendo na nulidade prevista na 1.ª parte da alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil, disposições legais essas aplicáveis por força do artigo 1.º da LPTA."

O pleno da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, por Acórdão de 18 de Janeiro de 2000, concedeu provimento ao recurso da Ministra da Saúde, para tanto tendo considerado que "o júri, ao proceder à valorização das referidas alíneas do n.º 56 [do Regulamento aprovado pela Portaria 114/91, de 7 de Fevereiro]", "com respeito pelo estabelecido nos n.os 56.1 e 42, alínea d), exerceu regularmente os poderes que lhe foram atribuídos" por aquele Regulamento, sendo que os "resultados da apreciação curricular são obtidos a partir das valorações atribuídas por cada membro do júri a cada um dos elementos constantes do n.º 56, consideradas na determinação da pontuação dos conjuntos referidos no n.º 56.1 e depois na classificação final, de acordo com o disposto no artigo 56.º".

E, quanto ao recurso subordinado, o citado aresto negou-lhe provimento, por isso que entendeu, após sublinhar que a única questão colocada pelos impugnantes se reportava à nulidade prevista na primeira parte do n.º 2 do artigo 668.º do Código de Processo Civil, por violação da primeira parte do n.º 2 do artigo 660.º do mesmo diploma adjectivo, que, no caso, não se verificava a existência de um tal vício.

2 - É deste acórdão, e após ter sido indeferido um pedido de aclaração por eles formulado, que pelos licenciados Luís Miguel Nogueira Rosa Dias e João José Pinto d'Almeida Carneiro vem interposto recurso para o Tribunal Constitucional, sendo que no respectivo requerimento de interposição os ora recorrentes, por um lado, nem sequer indicaram o normativo com base no qual a interposição se fundava e, por outro, não indicaram, com um mínimo de precisão, quais as normas infraconstitucionais que pretendiam que fossem apreciadas por este Tribunal do ponto de vista da sua compatibilidade com a lei fundamental, nem indicaram, concretamente, qual a verdadeira interpretação que reputavam contrária à Constituição.

Tendo o recurso sido admitido, foram os impugnantes convidados a aperfeiçoar o requerimento de interposição de recurso, apresentando então extenso requerimento de onde se poderá extrair que as normas questionadas serão as constantes dos n.os 56 e 56.1 do Regulamento aprovado pela Portaria 114/91 "na interpretação que lhe foi dada pelo acórdão recorrido".

Determinada a feitura de alegações, concluíram os ora recorrentes a por si apresentada com as seguintes conclusões:

"1.ª Consoante resulta da acta 2 do júri, datada de 17 de Janeiro de 1992, os ora recorrentes foram definitivamente admitidos a concurso.

2.ª Nos termos do aviso do concurso, os ora recorrentes foram obrigadas, antes da elaboração da acta referida na conclusão precedente, a apresentar 'sete exemplares do curriculum vitae, por área profissional a que concorre;' [alínea d) do ponto 5.4].

3.ª Nos termos do mesmo aviso, os métodos de selecção consistiriam em provas públicas: discussão pública do curriculum vitae (7 do ponto 5.5).

4.ª Consoante resulta da acta 3 do júri, datada de 22 de Fevereiro de 1997, isto é, mais de 30 dias após a elaboração da acta 2, deliberou aquele órgão colegial, antes da discussão pública dos curricula vitae, prefixar os valores a atribuir às alíneas a) a g) referidas nos n.os 56 e 56.1 da Portaria 114/91, de 7 de Fevereiro.

5.ª Logo que foi publicada a lista de classificação final, os ora recorrentes interpuseram recurso hierárquico necessário do acto administrativo de homologação da lista de homologação final (n.º 60 da Portaria 114/91, de 7 de Fevereiro).

6.ª Posteriormente interpuseram recurso contencioso de anulação do despacho do Ministro da Saúde que indeferiu os recursos hierárquicos.

7.ª Quer nos recursos hierárquicos, quer nos recursos contenciosos, os ora recorrentes levantaram a questão de que a deliberação constante da acta 3 era fruto de errónea interpretação do disposto nos n.os 56 e 56.1 da Portaria 114/91, de 7 de Fevereiro, e que, em circunstância alguma, poderia ser válida, até porque tal deliberação foi tomada depois de apresentados os currículos de todos os concorrentes (cf. acta 2, fls. 5 e 6 do processo instrutor), ou seja, em momento em que júri tinha possibilidade de os conhecer pormenorizadamente, e isto porque entre a data da acta 2 - 17 de Janeiro de 1992 - e a data da acta 3 - 22 de Fevereiro de 1992 - (fl. 7 do processo instrutor) decorreram mais de 30 dias, razão pela qual, em todo o caso, se mostrariam violados os princípios da igualdade, justiça e imparcialidade, consagrados no n.º 2 do artigo 266.º da CRP (cf. alegações de fl. 144 a fl. 179 e conclusão 14.ª, comum a ambas).

8.ª Por acórdão da 1.ª Secção da 2.ª Subsecção do Supremo Tribunal Administrativo (fls. 210 e seguintes) foi julgado que o júri fez errada interpretação dos disposto nos citados n.os 56 e 56.1 da Portaria 114/91, de 7 de Fevereiro, anulando o impugnado o acto.

9.ª Nesse mesmo acórdão não foi tomada posição quanto a uma das questões levantadas na conclusão 14.ª, qual seja a de se saber se a interpretação dada pelo júri aos citados normativos da Portaria 114/91, de 7 de Fevereiro, violava ou não os princípios da igualdade, justiça e imparcialidade, consagrados no n.º 2 do artigo 266.º da CRP, tendo em atenção a particularidade de a deliberação tomada pelo júri, na acta 3, ter sido tomada depois de apresentados os currículos de todos os concorrentes (cf. acta 2, a fls. 5 e 6 do processo instrutor), ou seja, em momento em que o júri tinha possibilidade de os conhecer pormenorizadamente e isto porque entre a data da acta 2 - 17 de Janeiro de 1992 - e a data da acta 3 - 22 de Fevereiro de 1992 - (fl. 7 do processo instrutor) decorreram mais de 30 dias.

10.ª A ora recorrida recorreu do citado acórdão para o pleno da Secção e os ora recorrentes interpuseram recurso subordinado.

11.ª Nas alegações do recurso subordinado os ora recorrentes escreveram na conclusão 23.ª: 'A correcta decisão quanto à questão equacionada na conclusão 14.ª não prejudica o conhecimento das questões equacionadas nas conclusões 15.ª a 20.ª'. Quer dizer,

12.ª Os ora recorrentes não abandonaram a questão, contida na conclusão 14.ª, a que se alude na precedente conclusão 9.ª

13.ª Do mesmo entendimento foi o Exmo. Conselheiro Relator da Secção do pleno, que não hesitou em receber o requerimento de interposição para o Tribunal Constitucional (fl. 302 a fl. 307).

14.ª Se é certo que é justificável, face ao que se dispõe na primeira parte do n.º 1 do artigo 660.º do Código de Processo Civil, que o acórdão da 1.ª Secção, 2.ª Secção, não tivesse tomado conhecimento da questão referida na precedente conclusão 9.ª, já o mesmo se não pode dizer do acórdão da Secção do pleno, por lhe competir proferir decisão, em princípio, em última instância de recurso!

15.ª O acórdão recorrido sufragou a tese-parecer da Direcção dos Serviços de Contencioso da Secretaria-Geral do Ministério da Saúde, fl. 6 do processo instrutor, onde se lê: '20. O júri, ao proceder à valorização das referidas alíneas no n.º 56, respeitando o disposto no n.º 56.1, exerceu os poderes que lhe foram atribuídos pelo Regulamento. Em teoria e a título de exemplo, podia também dar 1 valor à alínea a) e 9 à alínea b). De facto, não há qualquer limitação legal, que não a constante do n.º 56.1, à atribuição de valorização por parte do júri às alíneas do n.º 56', retomada nas alegações de recurso da ora recorrida (fls. 238 e 239). Quer dizer,

16.ª - Os elementos dos conjuntos das alíneas referidas no n.º 65.1 poderão ter qualquer valoração desde que:

1) As pontuações para o conjunto das alíneas a) e b) perfaçam 10 valores;

2) As pontuações para o conjunto das alíneas c) a e) perfaçam 6 valores;

3) As pontuações para o conjunto das alíneas f) e g) perfaçam 4 valores.

17.ª Assim, abre-se mão a que qualquer júri faça todas as combinações possíveis, dentro do quadro referido nas precedentes conclusões, potenciando-se desta forma o benefício de uma candidatura, em prejuízo das demais, com postergação irredutível do comando ínsito no n.º 2 do artigo 266.º da CRP.

18.ª Na medida em que o acórdão recorrido acolheu tal questionada actividade interpretativa, violou o disposto no artigo 206.º da CRP (na redacção então vigente)."

3 - Foi apresentado projecto de acórdão e, não obtendo o mesmo vencimento, mudaram os autos de relator.

Cumpre, pois, decidir.

4 - Como resulta do, aliás extenso, relato supra-efectuado, é de concluir que, no recurso interposto para o Pleno da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, e quer relativamente ao recurso principal da Ministra da Saúde, quer referentemente ao recurso subordinado dos licenciados Luís Miguel Nogueira Rosa Dias e João José Pinto d'Almeida Carneiro, estes não suscitaram a incompatibilidade com a Constituição por banda de qualquer norma constante do ordenamento jurídico infraconstitucional.

Assim, e presumindo-se que o recurso intentado interpor se esteava na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro (presunção derivada do modo como alegaram neste Tribunal, sendo certo que em nenhuma peça processual os impugnantes se referiram a tais alínea, número e artigo), haverá, in casu, que concluir que os recorrentes não cumpriram o ónus de suscitação da questão de inconstitucionalidade, ónus esse que lhes é imposto por aquele disposição e, bem assim, pela alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da lei fundamental.

Na verdade, em nenhum passo da alegação do seu recurso subordinado para o Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo se lobriga, directa ou indirectamente, expressa ou implicitamente, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa.

Os recorrentes tentam, na alegação que produziram neste Tribunal, objectar a um tal entendimento (e daí que, no momento, da questão do não conhecimento do objecto do vertente recurso, não tenham, antes de ser proferida decisão sobre ela, de ser ouvidos os recorrentes, visto que sobre essa questão já efectuaram, motu proprio, pronúncia), porquanto - dizem - ao escreverem, na conclusão 2.ª da alegação do recurso subordinado, que "[a] correcta decisão quanto à questão equacionada na conclusão 14.ª não prejudica o conhecimento das questões equacionadas nas conclusões 15.ª a 20.ª", isso significava que não "abandonaram" as questão de inconstitucionalidade que estavam levantadas naquelas 14.ªs conclusões das alegações que efectivaram aquando do recurso para a Subsecção da Secção de Contencioso Administrativo.

Não têm, porém, razão.

É para o Tribunal claro que o escrito na referida conclusão 2.ª da alegação tocante ao recurso subordinado para o Pleno da 1.ª Secção apenas pode ser interpretado como o fundamento do vício de nulidade do acórdão da subsecção daquela secção que, por intermédio desse mesmo recurso, pretendiam que o aludido pleno viesse a declarar; isto é: ao escreverem daquela sorte, os então recorrentes subordinados o que estavam a sustentar era que, não tendo o acórdão da subsecção tomando conhecimento dos outros vícios pelos mesmos invocados e que não aquele que levou ao provimento do recurso, isso fazia o aresto incorrer em nulidade.

E foi isso, aliás, o que entendeu o acórdão do pleno.

Não pode, consequentemente, aquela asserção ser interpretada no sentido de que com ela estavam os então recorrentes subordinados a "reiterar", perante o pleno e à guisa de solicitar do mesmo decisão concreta sobre elas, as questões que eventualmente se continham nas conclusões 14.ªs das alegações produzidas antes do acórdão tirado na subsecção, designadamente no que tange a qualquer questão de inconstitucionalidade normativa que nessas conclusões se continha.

4.1 - E isto, claro está, a aceitar-se (o que, no mínimo, é não é facilmente sustentável) que, nas alegações dos recursos interpostos perante a subsecção, foi, efectivamente, suscitada qualquer questão de desconformidade com o diploma básico reportada a norma ou normas (ou a uma sua dada dimensão interpretativa) ínsitas no ordenamento jurídico infraconstitucional (note-se que, como resulta da transcrição das indicadas conclusões 14.ªs acima levada a efeito, o que os recorrentes sustentaram foi que o "deliberado pelo júri [...] violou [...] os princípios da igualdade, justiça e imparcialidade", pelo que a violação daqueles princípios constantes da lei fundamental foi assacada à deliberação do júri - ou seja, ou acto administrativo por ele praticado - e não a qualquer norma que regesse a respectiva actividade).

Só se não afirma peremptoriamente que nas ditas alegações não foi, de todo, suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, por isso que, a dado passo, se pode ler no "teor" daquelas alegações (e, aliás, com remessa para o que foi escrito no recurso hierárquico) que "a interpretar-se diferentemente tais normativos [os n.os 55 a 58 da Portaria 114/91], ficariam in casu gravemente ofendidos, ao menos formalmente, os princípios da justiça e imparcialidade que devem nortear a actuação dos órgãos e agentes administrativos (n.º 2 do artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa)" (cf., contudo, o que é dito a final no parágrafo de que parte agora se transcreveu, quando os recorrentes referem que "ainda que estivéssemos só em face de errónea interpretação e aplicação das supracitadas 'normas regulamentares', de tal ilegalidade sempre resultaria vício de forma - preterição das formalidades legais - porque, in casu, o júri do concurso não adoptou, na classificação final, os critérios dos supracitados comandos da Portaria 114/91, de 7 de Fevereiro").

4.2 - Não se diga, por outra banda, que, a aceitar-se que, na ocasião dos recursos interpostos para a Subsecção da 1.ª Secção, os ora recorrentes, nas alegações que produziram, vieram, ainda que de modo não totalmente claro, a colocar uma questão de desconformidade com a lei fundamental por parte de uma norma jurídica, isso seria o suficiente para se ter, no caso sub specie, como preenchido o requisito da suscitação da inconstitucionalidade normativa durante o processo.

É que, como tem sido jurisprudência maioritária deste Tribunal, não satisfaz o requisito da alínea d) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82 o recorrente que, tendo inicialmente suscitado uma questão de inconstitucionalidade normativa acabou por abandoná-la perante a formação judicial superior, de tal modo que este foi chamado a apreciar e decidir tal questão (cf., por entre outros, os Acórdãos deste órgão de administração de justiça n.os 36/91, 468/91 e 469/91, publicados, respectivamente, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 18.º e 20.º vols., pp. 657 a 664 e 557 a 585) e 10/93, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 19 de Janeiro de 1994).

5 - Em face do exposto, não toma o Tribunal conhecimento do objecto do recurso, condenando os impugnantes nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em 6 unidades de conta por cada um.

Lisboa, 26 de Setembro de 2001. - Bravo Serra - Paulo Mota Pinto - Guilherme da Fonseca - Maria Fernanda Palma (vencida nos termos da declaração de voto junta) - José Manuel Cardoso da Costa.

Declaração de voto

Votei vencida por entender que o Tribunal Constitucional deveria ter tomado conhecimento do objecto do recurso, já que não só não é claro que o recorrente tenha abandonado, no recurso subordinado para o pleno (conclusão 2.ª), a questão de constitucionalidade já suscitada, designadamente na alegação 14.ª, através de uma reiteração, embora vaga e implícita, da mesma bem como porque não é exigível que quem tenha obtido vencimento na primeira instância tenha de vir suscitar de novo a questão de constitucionalidade num recurso subordinado. Sempre defendi este ponto de vista, que, aliás, correspondia a uma corrente jurisprudencial firme, embora não unânime, no Tribunal Constitucional.

Por outro lado, porque conheceria da questão de fundo, diferentemente da maioria do Tribunal, também me vejo na obrigação de explicitar o meu pensamento quanto a ela através da citação do projecto de acórdão que elaborei, como anterior relatora deste processo.

Assim, sobre a questão de fundo, o meu parecer é o seguinte:

1 - Os recorrentes insurgem-se, no presente processo, contra a fixação abstracta de um valor a atribuir a cada uma das alíneas a que se refere o n.º 56.1 da Portaria 114/91, de 7 de Fevereiro, quando esse mesmo preceito fixa valores para grupos de alíneas (e não, individualmente, para cada alínea).

Sustentam, assim, que o júri violou os princípios da igualdade e da imparcialidade.

2 - Todavia, não têm os recorrentes razão. Com efeito, o estabelecimento de um valor abstracto para cada alínea que permita a distribuição entre elas do valor global que lhes é atribuído, fixando-se, assim, o modo de proceder do júri, pertence a um espaço livre da aplicação da norma ao caso na tarefa de valorização levada a cabo pelo júri. A sobrevalorização de uma alínea - por exemplo, a capacidade e aptidão para a gestão e organização de serviços hospitalares em detrimento do desempenho de cargos médicos ou vice-versa -, fazendo valer mais essa alínea do que outra na distribuição das valorações, apenas corresponde à opção concreta de atribuir mais importância a um desses factores, o que é uma forma de os considerar e valorizar. Também a igual atribuição de valor a cada uma das alíneas seria uma outra forma de ponderar em concreto o valor das circunstâncias. E ainda a possibilidade de que apenas a valorização de uma das circunstâncias permitisse atingir uma pontuação superior à de outro concorrente quando a outra circunstância pudesse até ter valido zero, num certo caso, não deixaria de ser um modo concreto de considerar e valorizar tais elementos.

Porém, da lei não decorre qualquer método de distribuição da valorização das circunstâncias, mas apenas a necessidade de fundamentar e tornar transparente o modo como se valorizou. O facto de o júri ter prefixado antes da deliberação o valor de cada circunstância no cômputo da valorização global prevista na lei permite, em princípio, realizar exigências de transparência e de equidade. E, de qualquer modo, a prefixação dos valores de cada circunstância não pode ser considerada uma violação da igualdade relativamente à sua não fixação ou à não limitação do valor de cada uma. Com efeito, o facto de se optar por um método de ponderação em que um concorrente com a valorização máxima numa das alíneas e a mínima na outra possa superar um concorrente com uma valorização equilibrada de cada uma das alíneas ou vice-versa é, apenas, uma opção de ponderação baseada nos fins do concurso na interpretação do júri. Não contraria a igualdade ou a imparcialidade que se entenda que a exigência de uma certa distribuição da valorização global possível entre as alíneas seja o método ponderativo, já que a diferenciação entre os concorrentes não é exclusivamente baseada numa valorização aritmética de circunstâncias, mas sim numa valoração adequada aos fins que a norma pretende alcançar na interpretação que a entidade decisória considerou.

3 - Assim, não estando em causa que os recorrentes suscitem uma questão de constitucionalidade normativa, por os mesmos terem posto o acento tónico numa interpretação da norma que, segundo a sua perspectiva, impediria o júri de distribuir livremente por cada circunstância a valoração global prevista na lei com afectação da igualdade, também é verdade que não viola a igualdade e a imparcialidade a interpretação de norma segundo a qual o júri possa deliberar segundo certo método de concretização da ponderação das circunstâncias, de acordo com o seu entendimento das finalidades legais da ponderação. A existência, num espaço de livre ponderação do valor das circunstâncias, de uma prefixação do valor de cada uma delas não pode contrariar a igualdade ou a imparcialidade, pois esta já é suficiente e devidamente assegurada pela fixação das circunstâncias e da sua valoração global. Maria Fernanda Palma.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1952053.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1977-06-17 - Decreto-Lei 256-A/77 - Ministérios da Administração Interna e da Justiça

    Reforça as garantias de legalidade administrativa e dos direitos individuais perante a Administração Pública.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1991-02-07 - Portaria 114/91 - Ministério da Saúde

    Aprova o Regulamento dos Concursos de Habilitação ao Grau de Consultor da Carreira Médica Hospitalar e dos Concursos de Provimento para Chefe de Serviço da referida carreira.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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