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Assento DD68, de 26 de Março

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Sumário

O prazo de prescrição dos créditos resultantes do afastamento dos trabalhadores abrangidos pelo Decreto-Lei n.º 40/77, de 29 de Janeiro, inicia-se com a entrada em vigor deste diploma, suspende-se com o requerimento para a instauração do inquérito administrativo e volta a correr após a frustração da tentativa de conciliação requerida no prazo legal.

Texto do documento

Assento
Cópia do douto acórdão proferido a fls. 64 e seguintes, no recurso n.º 598 para o tribunal pleno, em que são recorrente José António Pinho Santos Silva e recorrido TRANSMOTOR, S. A. R. L.

Acordam no pleno do Supremo Tribunal de Justiça:
José António Pinho Santos Silva recorreu para o pleno do Supremo Tribunal de Justiça do Acórdão de 18 de Março de 1983, fotocopiado de fl. 5 a fl. 9, por o considerar em oposição com o Acórdão deste Supremo Tribunal de 28 de Maio de 1982, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, n.º 317, pp. 128 e seguintes.

Por acórdão da secção, proferido nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 766.º do Código de Processo Civil, foi reconhecida a oposição e ordenado o prosseguimento do recurso, que se encontra devidamente alegado, tendo o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitido douto parecer, onde conclui pela proposta de assento nos seguintes termos:

O prazo de prescrição dos créditos resultantes das situações de afastamento de trabalhadores abrangidos pelo Decreto-Lei 40/77, de 29 de Janeiro, inicia-se com a entrada em vigor deste diploma e suspende-se com a apresentação do requerimento para a instauração do inquérito administrativo nele previsto.

Vindo a ocorrer, na sequência deste inquérito administrativo, tentativa prévia de conciliação, aquele prazo volta a correr a partir da data da sua frustração.

Correram os vistos legais.
A oposição entre os dois arestos é manifesta.
Com efeito:
a) No acórdão recorrido decidiu-se que o prazo da prescrição dos créditos do trabalhador "afastado» irregularmente da empresa onde prestava os seus serviços profissionais, ocorrido entre 25 de Abril de 1974 e 25 de Abril de 1976, se conta a partir da data da entrada em vigor do Decreto-Lei 40/77, de 29 de Janeiro;

b) Enquanto no Acórdão de 28 de Maio de 1982 se decidiu que aquele prazo se iniciava, em caso idêntico, a partir da realização da tentativa de conciliação sem êxito.

Os acórdãos em causa foram proferidos no domínio da mesma legislação - o Decreto-Lei 40/77 e o artigo 38.º do Regime do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei 49408 - e respeitante à mesma questão fundamental de direito - a contagem do início do prazo da prescrição dos créditos dos trabalhadores, no caso do seu afastamento ilegal das empresas onde exerciam as suas funções, ocorrido no período que medeia entre 25 de Abril de 1974 e 25 de Abril de 1976.

Estão, assim, preenchidos os requisitos legais exigidos pelo artigo 763.º do Código de Processo Civil para que se possa conhecer do objecto do recurso.

Em face do que se deixou referido verifica-se que o objecto do recurso é o de saber desde quando se inicia o decurso do prazo prescricional de 1 ano previsto no n.º 1 do artigo 38.º do Regime do Contrato Individual de Trabalho (LCT), aprovado pelo Decreto-Lei 49408, no caso especial de afastamentos ilegais ocorridos no período que mediou entre 25 de Abril de 1974 e 25 de Abril de 1976.

Normalmente, como se prescreve no n.º 1 do citado artigo 38.º:
Todos os créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, quer pertencentes à entidade patronal, quer pertencentes ao trabalhador, extinguem-se por prescrição, decorrido 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, [...]

Porém, após o movimento de 25 de Abril de 1974, a situação modificou-se profundamente e a instabilidade político-social dele decorrente teve grave incidência nas reclamações laborais no seio das empresas.

Assim é que, por variadas razões, especialmente de carácter político ou ideológico, se verificaram os chamados "saneamentos», ou seja, afastamento compulsivos de trabalhadores dos seus postos de trabalho, na maioria dos casos sem observância das normas reguladoras em vigor sobre a cessação dos contratos de trabalho.

A Constituição da República de 1976, reconheceu no n.º 1 do artigo 51.º que todos têm direito ao trabalho e impôs no artigo 52.º o dever de o Estado garantir tal direito, assegurando, como se diz na alínea b), a segurança no emprego e estabelecendo a proibição dos despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos.

Aliás, já o legislador ordinário sentira a necessidade de impor essa proibição - n.º 1 do artigo 9.º do Decreto-Lei 372-A/75, de 16 de Julho.

Mas havia numerosas situações de clamorosa injustiça a que era necessário atender e solucionar por via legislativa.

E foi assim que foi publicado o Decreto-Lei 471/76, de 14 de Junho, mais tarde substituído pelo Decreto-Lei 40/77, que no seu artigo 11.º o revogou.

Tiveram os dois diplomas como objectivo principal, como se lê no relatório do último:

[...] fazer respeitar as leis do trabalho, garantindo o exercício de um direito fundamental, que é o direito ao trabalho, concretizando a directriz constitucional contida no artigo 52.º da Constituição da República Portuguesa, segundo a qual são proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos.

Teve ainda em vista, o referido diploma, rever as situações de afastamento compulsivo de trabalhadores das empresas privadas e nacionalizadas posteriores a 25 de Abril de 1974, quando desrespeitadas as normas imperativas sobre resolução do contrato de trabalho.

Só quanto a este último ponto é que o Decreto-Lei 40/77 se afastou do anterior, por se ter entendido ser necessário proceder a alteração no processo administrativo para garantir a sua jurisdicionalização.

Por isso, logo no artigo 1.º deste Decreto-Lei 40/77 se repete que são proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos, declarando-se no n.º 1 do artigo seguinte "juridicamente inexistentes os afastamentos de trabalhadores das respectivas empresas ocorridos entre 25 de Abril de 1974 e 25 de Abril de 1976, desde que não tenham sido observadas as disposições vigentes à data do afastamento sobre a resolução do contrato de trabalho ou tenham ocorrido por motivos políticos ou ideológicos».

E, para resolver essas situações ocorridas no mencionado período, no artigo 3.º permitia-se que o trabalhador que se encontrasse ao abrigo do preceituado no artigo anterior requeresse, no prazo de 90 dias a contar da data da entrada em vigor do mesmo diploma, ao Ministro do Trabalho inquérito administrativo sobre as razões do seu afastamento.

Instaurado o processo administrativo, realizadas as diligências convenientes e elaborado o relatório, o Ministro do Trabalho a quem esse processo seria presente podia tomar diversas atitudes:

a) Tratando-se de afastamento que não tivesse sido da iniciativa (aprovação ou consentimento tácito) da entidade patronal:

Confirmar o afastamento como despedimento com justa causa, se a considerasse provada; ou

Confirmar a existência do acto de afastamento, no caso contrário.
Em qualquer dos casos podia haver recurso contencioso de plena jurisdição para o Supremo Tribunal Administrativo;

b) Se, porém, se tratasse de afastamento por iniciativa (com aprovação expressa ou tácita) da entidade patronal, então o processo devia ser remetido ou à comissão de conciliação e julgamento, se estivesse constituída, ou ao Ministério Público junto do tribunal do trabalho competente, os quais fariam notificar o trabalhador para, em 5 dias, requerer a tentativa de conciliação, no primeiro caso, ou indicar se pretendia o seu patrocínio oficioso, no segundo, isto para que a respectiva acção pudesse depois ser instaurada.

Houve quem sustentasse que o atrás mencionado artigo 38.º não se aplicava aos casos de inexistência previstos no Decreto-Lei 40/77.

Mas tal tese não obteve acolhimento nos tribunais, cuja jurisprudência tem sido unânime no sentido de que:

Não obstante declararem-se inexistentes os afastamentos referidos no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei 40/77, estão os mesmos sujeitos ao prazo prescricional do artigo 38.º do Regime do Contrato Individual de Trabalho.

Neste sentido, além de outros, os Acórdãos de 23 de Outubro de 1981, 16 de Abril de 1982 e 14 de Janeiro de 1983, in Acórdãos Doutrinais, n.os 240/1522, 247/1024 e 263/1384, respectivamente.

Isto na pura vigência do Decreto-Lei 40/77.
Sucede, porém, que, após a propositura desta acção, o Conselho da Revolução emitiu a Resolução 286/80, publicada no Diário da República de 19 de Agosto de 1980, que declarou com força obrigatória geral a inconstitucionalidade da segunda parte do n.º 2 do artigo 2.º e os artigos 3.º a 10.º daquele diploma.

Ora, consignava-se expressamente no n.º 1 do artigo 3.º que:
Qualquer trabalhador, independentemente do decurso nas condições de prescrição do direito e de caducidade da acção, que se encontre nas condições previstas no artigo anterior poderá, no prazo de 90 dias a contar da entrada em vigor do presente diploma, requerer ao Ministro do Trabalho, apresentando logo as provas, a instauração de inquérito administrativo sobre as razões do seu afastamento [...].

Desaparecendo este preceito da ordem jurídica, poderia entender-se que os créditos prescritos por já ter decorrido mais de 1 ano sobre a cessação factual do contrato de trabalho prescritos continuavam.

Isto porque no n.º 2 do artigo 281.º da Constituição, na primitiva redacção, se ressalvavam apenas da declaração de inconstitucionalidade de quaisquer normas os efeitos resultantes dos casos julgados.

Para os nossos mais modernos constitucionalistas, a declaração de inconstitucionalidade de uma norma tem efeitos ex tunc, ou seja, efeitos retroactivos.

Assim, escrevem os Profs. Gomes Canotilho e Vital Moreira a p. 482 da sua Constituição da República Portuguesa Anotada:

Embora a solução não seja líquida, a declaração de inconstitucionalidade tem efeitos ex tunc, ou seja, efeitos retroactivos, pois a Constituição só exceptua "os efeitos do caso julgado».

Por sua vez, o Prof. Jorge Miranda, a p. 636 do 2.º volume do seu Manual de Direito Constitucional, escreve:

Quando qualquer lei ordinária ab initio contradiz a Lei Fundamental, ela fica desde logo ferida de invalidade, juridicamente incapaz de regular as situações da vida sobre que versa - seja qual for a sanção ou valor jurídico negativo que se configure (inexistência jurídica, nulidade, anulabilidade ou outro) e que depende de razões de ordem política e de funcionamento de mecanismos de garantia.

Esta retroactividade sofre limitações, pois, como se disse, a própria Constituição, no n.º 2 do citado artigo 281.º, expressamente exceptua o caso julgado.

Mas será apenas o caso julgado que não pode ser atingido pela declaração de inconstitucionalidade da norma?

Hoje o sistema é diferente, como se vê dos diversos números do artigo 282.º da Constituição revista, mas nós estamos ante a regulamentação do preceito anterior.

Em face dela entendeu este Supremo Tribunal, no Acórdão de 16 de Abril de 1982, in Acórdãos Doutrinais, n.º 247/1024:

A declaração de inconstitucionalidade de normas legais não pode ofender o caso julgado, o caso administrativo ou os negócios jurídicos esgotados.

Por isso, a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 3.º a 10.º do Decreto-Lei 40/77 só atinge as situações ainda não resolvidas à face daquele diploma, deixando intactos os direitos adquiridos pelos casos resolvidos administrativamente.

Com efeito, a mesma força de caso julgado tem, como é doutrina e jurisprudência unânimes, os chamados, em direito administrativo, casos decididos ou casos resolvidos, isto é, os actos administrativos não impugnados contenciosamente ficam com carácter de incontestabilidade e estabilidade na ordem jurídica por razões de certeza e segurança.

Ainda da mesma forma, e por idênticas razões, se devem resolver os efeitos civis já produzidos pelo cumprimento da obrigação.

Por isso, não deve poder ser anulado o efeito de um acto administrativo definitivo e executório, não impugnado contenciosamente, só porque se produziu na vigência de um diploma posteriormente declarado inconstitucional, com força obrigatória geral.

Acresce que nunca ninguém se lembrou de considerar nulos, inválidos ou ineficazes quaisquer reintegrações ou pagamentos efectuados voluntariamente ao abrigo e após as diligências preceituadas no referido Decreto-Lei 40/77 antes da declaração de inconstitucionalidade.

Embora a Constituição italiana atribua efeitos diferentes da nossa à declaração de inconstitucionalidade, o Dr. Azzaritti, presidente honorário da Cassação, em "Efeitos da pronúncia de inconstitucionalidade das leis», publicado em Estudos Jurídicos em Honra de António Scialoja, aceitando como bons tais efeitos, escreve a p. 53 sobre a retroactividade:

Quando muito, deverá dizer-se que à abrogação da lei para o futuro acresce a sua anulação retroactiva, embora limitada às relações ainda não esgotadas, o que no fundo é a mesma coisa que uma abrogação de lei com efeito retroactivo, mas limitado nos termos referidos.

Temos, portanto, que a declaração de inconstitucionalidade, no domínio da Constituição não revista, não podia afectar quer o caso julgado quer o caso resolvido ou caso decidido, bem como os efeitos já produzidos (esgotados) de um negócio jurídico.

O Prof. Jorge Miranda, a p. 388 do 2.º volume da 2.ª edição do seu Manual de Direito Constitucional, debruçando-se sobre o citado aresto de 16 de Abril de 1982, escreve que lhe "parece um tanto duvidoso» entender que a declaração de inconstitucionalidade não possa afectar o caso decidido ou os efeitos civis já produzidos pelo cumprimento da obrigação, mas não repudia formalmente essa doutrina.

Aliás, como doutamente escreve o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto:
Repugna à própria ordem constitucional, que no seu artigo 267.º recolhe o princípio da presunção de legalidade dos actos da Administração, e que, atento o esquema da fiscalização da constitucionalidade que instituiu - restrito a certos órgãos -, parece aceitar o princípio da presunção de conformidade constitucional dos seus actos normativos, designadamente dos actos legislativos.

Daí que não possa recusar-se à utilização do meio processual facultado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei 40/77 um qualquer efeito paralisador da prescrição [...]

Objecto do recurso.
Resolvidas as questões preliminares, há que entrar propriamente na apreciação do objecto do recurso, que, como se disse, é o do início do prazo da prescrição após a entrada em vigor do Decreto-Lei 40/77.

Parece indiscutível que a prescrição dos créditos laborais já consumada foi ultrapassada com a publicação dos já citados diplomas (os Decretos-Leis n.os 471/76 e 40/77), pois se assim não fosse eles resultariam pura e simplesmente inúteis relativamente a todos os despedimentos ou afastamentos nas condições neles prescritas que tivessem já ocorrido há mais de 1 ano em relação às respectivas datas, quando eles pretendiam precisamente rever todas as situações de afastamento compulsivo de trabalhadores em que haviam sido desrespeitadas as normas imperativas sobre a resolução do contrato de trabalho, ou determinadas por motivos políticos ou ideológicos, ocorridos no período de 2 anos entre 25 de Abril de 1974 e igual dia e mês de 1976.

Realmente, do n.º 1 do citado artigo 3.º, atrás transcrito, ao permitir a reapreciação do fundamento desses afastamentos, independentemente do decurso dos prazos de prescrição do direito e da caducidade da acção, não se pode tirar outra conclusão.

É óbvio, pois, que quanto aos trabalhadores cujas situações estão previstas neste diploma não se pode falar em prescrição anterior.

Mas é evidente que a inércia do trabalhador, mesmo após a entrada em vigor deste diploma, deve ter consequências, pois continuaram válidas as razões que justificam o instituto da prescrição.

Todavia, do exame do Decreto-Lei 40/77 verifica-se a existência de diversos momentos a partir dos quais se poderá considerar relevante a inércia do trabalhador - interessado para efeitos de prescrição.

Vejamos quais são, como esquematicamente os aponta o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto e resultam do decreto-lei em causa:

a) Decurso do prazo de 90 dias, estabelecido no n.º 1 do artigo 3.º, sem apresentação de requerimento aí previsto;

b) Do despacho do Ministro do Trabalho previsto no artigo 4.º para os afastamentos que não tenham sido da iniciativa da entidade patronal;

c) Do trânsito em julgado da decisão do Supremo Tribunal Administrativo no recurso previsto no artigo 5.º;

d) Do despacho do Ministro do Trabalho da remessa do processo administrativo às comissões de conciliação e julgamento ou ao Ministério Público, previsto no artigo 6.º, n.º 1;

e) Da notificação (ou do decurso do prazo de 5 dias sobre ela) sem apresentação do requerimento para tentativa prévia de conciliação;

f) Da frustração da tentativa prévia de conciliação (ou até do decurso do prazo de 30 dias sobre a sua realização ...).

Ante este quadro complexo, a jurisprudência da 4.ª Secção deste Supremo Tribunal inclinou-se para soluções nem sempre conformes.

Assim:
a) Nos Acórdãos de 23 de Outubro de 1981, in Acórdãos Doutrinais, n.º 240/1522, e de 18 de Março de 1983, in Boletim, n.º 325/483, decidiu-se que o prazo de prescrição dos créditos laborais deve, em princípio, contar-se a partir da entrada em vigor do Decreto-Lei 40/77;

b) No Acórdão de 16 de Abril de 1982, in Acórdãos Doutrinais, n.º 247/1024, decidiu-se que aquele prazo se deveria contar a partir do despacho ministerial, não impugnado contenciosamente, que ordenava a remessa do processo administrativo à comissão de conciliação e julgamento competente ou ao Ministério Público;

c) No Acórdão de 28 de Maio de 1982, in Boletim, n.º 317/128, foi decidido que tal prazo se iniciava a contar da tentativa de conciliação sem êxito;

d) Finalmente, no Acórdão de 14 de Janeiro de 1983, in Acórdãos Doutrinais, n.º 263/1384, considerou-se que o mencionado prazo se devia contar da remessa ordenada por despacho ministerial, não impugnado contenciosamente, do processo especial de revisão ao agente do Ministério Público ou à comissão de conciliação e julgamento competente.

Quid juris?
Já acima dissemos, e não é de mais repetir, que o Decreto-Lei 40/77, permitindo rever a situação dos trabalhadores afastados compulsivamente dos seus postos de trabalho no período nele referido, fez, perdoe-se-nos a expressão, "tábua rasa» da prescrição, por essa revisão se poder efectuar "independentemente do decurso dos prazos de prescrição do direito», abrindo-se, através dele, a via necessária para o exercício do respectivo direito.

Daí que se tenha de entender que é a partir da data da entrada em vigor deste diploma que se reiniciará o prazo de 1 ano de prescrição dos créditos laborais, porquanto é a partir desse momento que o trabalhador poderá voltar a agir para obter a satisfação do seu direito.

É claro que este prazo se deve considerar suspenso com a instauração do inquérito administrativo.

E tem necessariamente de se considerar suspenso, segundo a regra geral do direito laboral, uma vez que não se podia conceber que continuasse a correr durante todo o processamento do inquérito, que poderia ser mais ou menos longo.

Nem se compreenderia que neste período, subtraído à inércia do trabalhador, ele pudesse vir a ser prejudicado com a demora desse inquérito, que normalmente nem lhe seria imputável. Basta lembramo-nos que se, por qualquer circunstância independente da vontade do trabalhador, esse processo demorasse mais de 1 ano, ele veria prescrito o seu direito, o que não pode ser.

Há agora que apurar quando volta a correr o prazo prescricional suspenso com a instauração do inquérito administrativo.

Deve entender-se que tal prazo volta a correr após a frustração da tentativa de conciliação resultante do envio do processo do inquérito à comissão de conciliação e julgamento competente ou ao agente do Ministério Público respectivo.

Com efeito, só a realização desta diligência (a tentativa de conciliação) poderá pôr termo àquela suspensão, uma vez que é com ela que finda toda a tramitação prescrita no diploma em causa.

Nem se diga que fica na disponibilidade do interessado o prazo para requerer a tentativa de conciliação. É que ela terá de ser requerida obrigatoriamente no prazo de 5 dias a contar da notificação para esse fim, sob pena de, não sendo requerida, "se ter por confirmada a inexistência».

Frustrada a tentativa de conciliação, começará então a correr de novo o prazo da prescrição, dentro do qual deve o trabalhador instaurar a respectiva acção.

Nos casos normais, esse prazo só volta a correr 30 dias após aquela diligência (cf. artigos 28.º do Decreto-Lei 54/74, de 15 de Fevereiro, 68.º, n.º 4, da Portaria 280/76, de 4 de Maio, e 49.º, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho), isto porque ela, muitas vezes, é requerida já muito próximo do termo do prazo prescricional (às vezes até de um dia), e daí a necessidade de se conceder um prazo, que a lei fixou em 30 dias, para o recomeço da prescrição, permitindo que naquele período de 30 dias se possa elaborar devidamente a petição da acção a propor.

No caso vertente não se verifica a premência desse prazo extra, uma vez que apenas teriam decorrido, no máximo, 90 dias desde a entrada em vigor do Decreto-Lei 40/77 até ao requerimento para o inquérito administrativo, que suspendeu o decurso do prazo de prescrição.

Deste modo, frustrada a tentativa de conciliação, ainda o interessado tem, pelo menos, 9 meses para a propositura da acção.

Não há, portanto, analogia entre o caso dos autos e as hipóteses normais, motivo por que, como bem acentua o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto, "a analogia do regime jurídico só seja de utilizar até onde o reclama a analogia das situações concretas».

Resumindo: com a entrada em vigor do Decreto-Lei 40/77 inicia-se o decurso do prazo de prescrição dos créditos dos trabalhadores afastados compulsivamente, nas condições ali referidas. Esse prazo suspende-se com o requerimento para o início do inquérito administrativo, cessando a suspensão com a frustração da tentativa de conciliação, pois só a partir desse momento fica na disponibilidade do trabalhador o exercício do seu direito, podendo ser-lhe imputada a demora na propositura da acção, que pela citação interromperia a prescrição.

Poderá parecer, à primeira vista, que esta solução não está em perfeita consonância com o decidido num ou noutro acórdão em apreço e excederia o âmbito do recurso. Todavia, ela resulta da apreciação do que de útil em cada um deles se dispôs e sempre dentro do seu âmbito: o início do prazo de prescrição e respectiva suspensão.

Em acórdão deste Supremo Tribunal, proferido pelo pleno em 24 de Maio de 1953, escreveu-se:

Na decisão deste recurso não é forçoso seguir a doutrina de um ou de outro dos acórdãos em oposição. O que há é que fixar a doutrina a seguir [...]

Com esta orientação concordou inteiramente o Prof. A. Reis na Revista de Legislação e Jurisprudência, n.º 86/35:

O tribunal pleno é chamado a resolver um conflito de jurisprudência, que se traduz na interpretação a dar a determinada disposição de lei; encontra-se perante duas interpretações opostas; não tem necessariamente de optar por uma delas; estabelece aquela que julga exacta, pouco importando que não coincida com alguma daquelas que tem diante de si.

Nem faria sentido que o tribunal pleno, que julga de direito, tivesse de proferir assento, fixando jurisprudência com que não concordava, por a considerar menos correcta, só porque tinha de adoptar uma das soluções em oposição.

O caso dos autos.
Em face do que se expõe há que averiguar agora se se verifica ou não a prescrição do direito do autor.

Ora, apenas três datas concretas, com interesse para a causa, foram dadas como assentes no acórdão recorrido:

30 de Janeiro de 1977 - entrada em vigor do Decreto-Lei 40/77;
8 de Junho de 1979 - dia em que o autor requereu a tentativa de conciliação;
28 de Abril de 1980 - propositura da acção.
Conforme a solução a que acima se chegou, são necessários mais elementos essenciais para bem se poder decidir:

Data em que foi instaurado o inquérito administrativo;
Data em que se realizou a frustrada tentativa de conciliação.
Impõe-se, assim, a ampliação da matéria de facto, aplicando-se depois o direito tal como ficou definido.

Por tal motivo, revoga-se o acórdão recorrido e as decisões por ele confirmadas e formula-se o seguinte assento:

O prazo de prescrição dos créditos resultantes do afastamento dos trabalhadores abrangidos pelo Decreto-Lei 40/77, de 29 de Janeiro, inicia-se com a entrada em vigor deste diploma, suspende-se com o requerimento para a instauração do inquérito administrativo e volta a correr após a frustração da tentativa de conciliação requerida no prazo legal.

Custas a final pelo vencido, adiantando-as o recorrente.
Lisboa, 13 de Fevereiro de 1985. - Melo Franco - Solano Viana - Joaquim Figueiredo - Vasconcelos de Carvalho - José Luís Pereira - Amaral Aguiar Santos Carvalho - Dias da Fonseca - Lima Cluny - Alberto Villanova - Lopes Neves - Pereira Leitão - Flamino Martins - Magalhães Baião - Leite de Campos - Almeida Ribeiro - Licínio Caseiro - Alves Cortês - Miguel Caeiro - Costa Ferreira - Corte Real - Tinoco de Almeida - Moreira da Silva - Costa Cerqueira - Góis Pinheiro - Senra Malgueiro - Alves Peixoto (vencido, consoante a declaração que junto).


Declaração de voto
Embora o conflito de jurisprudência se confine aqui ao momento em que, nos despedimentos tratados pelo Decreto-Lei 40/77, de 29 de Janeiro, começa o ano referido pelo artigo 38.º, n.º 1, do Decreto-Lei 49408, de 24 de Novembro de 1969, nada impede, antes se impõe (A. Reis, in Revista de Legislação e Jurisprudência, n.º 86/35), que o tribunal dê um passo atrás e decida se este prazo de "prescrição» se aplica aos direitos de reintegração e indemnização ou só de indemnização conferidos pela primeira parte do artigo 2.º daquele diploma de 1977, conjugada com o artigo 12.º do Decreto-Lei 372-A/75, de 16 de Julho, com a redacção do Decreto-Lei 84/76, de 28 de Janeiro.

Ora, penso não ser aplicável, estando, consequentemente, a acção do Santos Silva em tempo.

É que, na perspectiva do autor, o seu afastamento da TRANSMOTOR, S. A. R. L., é "juridicamente inexistente», isto na própria terminologia do citado artigo 2.º

Sofre, assim, de um vício mais radical ainda que o da nulidade com que aquele diploma de 1975 cominava idênticos despedimentos.

E é do regime de qualquer desses vícios poder ele ser invocado a todo o tempo por qualquer interessado ou declarado oficiosamente pelo tribunal (artigo 286.º do Código Civil). "O direito de o invocar», ensinava Paulo Cunha, "é imprescritível.» (Teoria Geral Rel. Jur., n.º 265.) "É que nem é necessário intentar acções para destruir [...] aquilo que não existe ou está eivado de defeito fundamentalmente. O mal opera ipsa vi legis.» (Rui Alarcão, in Boletim do Ministério da justiça, n.º 89/208.)

Escreveu Passareli que "a situação jurídica anterior a um tal negócio não é por este modificada; daí a perpetuidade da acção» (Teoria Geral, n.os 205 a 207).

Portanto, face aos princípios expostos e ao preceito da lei referido, o trabalhador despedido, assim como tinha e tem o direito de invocar a inexistência do despedimento, há-de necessariamente ter o direito de extrair os efeitos, as "consequências» da situação.

Mas dir-se-á que o artigo 38.º do Regime do Contrato Individual de Trabalho é especial (cf. artigo 12.º).

É-o de facto, mas nada faz pensar que quisesse fazer tábua rasa dos mencionados princípios, que se impõem por si mesmos, que pretendesse reduzir os vícios negociais à simples anulabilidade.

Aliás, ante aquele artigo 38.º, bem se poderá dizer que os direitos do trabalhador não resultaram do contrato nem da sua cessação, mas da lei (os diplomas de 1975, 1976 e 1977); que, sendo o despedimento inexistente, não houve cessação, tanto que o autor podia ter pedido a reintegração; quando muito, o contrato teria acabado quando optou pela indemnização.

Está conforme.
Secretaria do Supremo Tribunal de Justiça, 6 de Março de 1985. - O Escrivão de Direito da 4.ª Secção, António dos Santos Rocha.

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1969-11-24 - Decreto-Lei 49408 - Ministério das Corporações e Previdência Social - Gabinete do Ministro

    Aprova o novo regime jurídico do contrato individual de trabalho.

  • Tem documento Em vigor 1974-02-15 - Decreto-Lei 54/74 - Ministério das Corporações e Segurança Social

    Revê as normas que regulam a constituição, as atribuições e o funcionamento das comissões corporativas.

  • Tem documento Em vigor 1975-07-16 - Decreto-Lei 372-A/75 - Ministério do Trabalho

    Regula a cessação do contrato individual de trabalho.

  • Tem documento Em vigor 1976-01-28 - Decreto-Lei 84/76 - Ministério do Trabalho

    Dá nova redacção a diversos artigos do Decreto-Lei n.º 372-A/75, de 16 de Julho (lei dos despedimentos).

  • Tem documento Em vigor 1976-05-04 - Portaria 280/76 - Ministérios da Administração Interna, da Justiça e do Trabalho

    Aprova o Regulamento das Comissões de Conciliação e Julgamento.

  • Tem documento Em vigor 1976-06-14 - Decreto-Lei 471/76 - Ministério do Trabalho

    Estabelece normas sobre os saneamentos em empresas privadas ou nacionalizadas ocorridos entre 25 de Abril de 1974 e 25 de Abril de 1976.

  • Tem documento Em vigor 1977-01-29 - Decreto-Lei 40/77 - Ministério do Trabalho

    Revoga o Decreto-Lei n.º 471/76, de 14 de Julho, que estabelece normas sobre os saneamentos em empresas privadas ou nacionalizadas ocorridos entre 25 de Abril de 1974 e 25 de Abril de 1976.

  • Tem documento Em vigor 1980-08-19 - Resolução 286/80 - Conselho da Revolução

    Declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 40/77, de 29 de Janeiro, na parte em que estabelece que aos trabalhadores cujo afastamento tenha sido fundamentado em qualquer das situações previstas no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 123/75, de 11 de Março, apenas poderá ser concedida a indemnização substitutiva do direito à reintegração, nos termos da lei, e a inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 3.º a 10.º do mesmo (...)

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