de 25 de Março
O n.º 1 do artigo 15.º da Constituição da República Portuguesa estende aos estrangeiros e aos apátridas que se encontrem ou residam em Portugal o gozo dos direitos e a sujeição aos deveres do cidadão português.A saúde e a educação, direitos fundamentais sociais, consagrados, respectivamente, nos artigos 64.º e 73.º da Constituição, têm um carácter universal que não pode ser afastado por qualquer interpretação restritiva, se se tiver em conta o disposto nos artigos 25.º e 26.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, como se impõe no n.º 2 do artigo 16.º da lei fundamental.
É sabida a existência em território nacional de cidadãos estrangeiros menores não legalizados cuja idade é inferior à mínima permitida por lei para a celebração autónoma de contrato de trabalho. Esses menores estão completamente dependentes da economia do agregado familiar a que pertencem, pois não dispõem de qualquer autonomia nem para o exercício de uma actividade laboral, nem para se ausentarem do País, nem para se legalizarem. Em suma, limitados na capacidade de exercício por força da menoridade e na capacidade de gozo por força da sua condição de imigrantes ilegais, encontram-se num vazio jurídico impeditivo do acesso aos benefícios elementares que a sociedade e o Estado destinam a todos os cidadãos sejam nacionais ou estrangeiros.
Sendo intolerável a manutenção deste estado de coisas, e sendo-o, igualmente, que a legalização dos pais se faça por via da própria paternidade, a solução parece residir numa concreta actuação das autoridades públicas sobre a protecção dos menores, já consagrada, aliás, na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Crianças, mormente no n.º 1 do seu artigo 2.º, solução que já é apontada na parte final do preâmbulo do Decreto-Lei 34/2003, de 25 de Fevereiro.
Pelo presente diploma é criado um registo dos cidadãos estrangeiros menores cuja situação seja ilegal em face do regime jurídico da entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, aprovado pelo Decreto-Lei 244/98, de 8 de Agosto, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 34/2003, de 25 de Fevereiro.
Cabe ao Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas, em articulação transversal com os serviços competentes da Administração Pública, garantir que os menores registados acedam ao exercício de direitos que a lei atribui aos menores em situação regular no território nacional.
A restrição quanto à natureza dos dados a recolher salvaguarda o respeito pelos limites estabelecidos no n.º 3 do artigo 35.º da Constituição e pelo n.º 1 do artigo 7.º da Lei 67/98, de 26 de Outubro.
Foram ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas e a Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto
É criado um registo nacional de menores estrangeiros que se encontrem em situação irregular no território nacional.
Âmbito
1 - O registo referido no artigo anterior destina-se exclusivamente a assegurar o acesso dos menores ao benefício dos cuidados de saúde e à educação pré-escolar e escolar.2 - Os dados a recolher devem cingir-se ao estritamente necessário à identificação do menor, nomeadamente o nome do menor, o nome dos progenitores, o nome de quem exerça o poder paternal e o lugar de residência do menor.
3 - Em caso nenhum os elementos constantes deste registo poderão servir de fundamento ou meio de prova para qualquer procedimento, administrativo ou judicial, contra qualquer cidadão ou cidadãos estrangeiros que exerçam o poder paternal do menor registado, salvo na medida do necessário para a protecção dos direitos deste.
4 - Em caso nenhum os elementos constantes deste registo poderão servir de base à legalização do menor registado ou do cidadão ou cidadãos estrangeiros que, sobre este, exerçam o poder paternal.
Artigo 3.º
Competência
1 - O registo é efectuado oficiosamente, a solicitação de qualquer serviço da Administração Pública, ou por requerimento de quem exerça o poder paternal.2 - Competem ao Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas a recolha, o tratamento e a manutenção dos dados recolhidos nos termos do presente diploma.
3 - Cabe ao Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas, em articulação transversal com os serviços competentes da Administração Pública e da administração regional autónoma, garantir que os menores registados acedam ao exercício dos mesmos direitos que a lei atribui aos menores em situação regular no território nacional.
Artigo 4.º
Regulamentação
A regulamentação da recolha e do tratamento dos dados pessoais dos menores abrangidos pelo artigo 1.º será aprovada, no prazo de 90 dias contados a partir da entrada em vigor do presente diploma, por portaria do Ministro da Presidência.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 17 de Janeiro de 2004. - José Manuel Durão Barroso - Maria Manuela Dias Ferreira Leite - Nuno Albuquerque Morais Sarmento - José Luís Fazenda Arnaut Duarte - José David Gomes Justino - Luís Filipe Pereira - António José de Castro Bagão Félix.
Promulgado em 18 de Fevereiro de 2004.
Publique-se.O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 15 de Março de 2004.
O Primeiro-Ministro, José Manuel Durão Barroso.