Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 - Por despacho de 24 de Outubro de 2005 do 2.º Juízo do Tribunal do Trabalho de Braga, a fl. 108, foi indeferido o requerimento apresentado a fl. 91 pela Companhia de Seguros Fidelidade-Mundial, S. A., para remição obrigatória da pensão que, na sequência de acidente de trabalho ocorrido em 23 de Junho de 1964, do qual resultou a morte de Amaro Gomes dos Santos, foi atribuída à viúva do sinistrado, Mariana da Silva.
Para o efeito, o Tribunal recusou a aplicação, por inconstitucionalidade, da norma constante do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro, "interpretad[a] no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes nos casos em que estas excedam 30%, sempre que se pretenda operar a remição contra vontade expressa do beneficiário da pensão em causa".
Após ter analisado o regime aplicável, concluindo que a mesma pensão se tornou "remível a partir de 1 de Janeiro de 2003", o tribunal pronunciou-se nos seguintes termos:
"Todavia, deve ter-se presente a orientação constitucional jurisprudencialmente definida no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 56/2005, de 3 de Março, o qual julgou inconstitucional, por violação do artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da CRP, o artigo 74.º do Decreto-lei 143/99, de 30 de Abril (na redacção do Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro), interpretado no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes nos casos em que estes excedam 30%.
O Tribunal, face ao teor deste acórdão e ponderando a sua aplicação em concreto, ordenou a notificação da beneficiária da pensão para que informasse os autos, no prazo de 10 dias, se concordava com a pretendida remição da pensão, requerida pela ré seguradora.
Ora, [...] Mariana da Silva veio, a fl. 106, afirmar que não pretende remir a pensão, opondo-se, portanto, a essa remição.
Cumpre apreciar e decidir.
O estabelecimento de pensões por incapacidade existe para compensar os trabalhadores, ou os seus familiares mais próximos nos casos de morte, pela perda da capacidade de trabalho devido a um infortúnio decorrente do desempenho do seu labor.
Compreende-se que, não sendo uma perda muito acentuada, até 30%, se permita que essa compensação seja 'transformada' em capital para aplicações por ventura mais rentáveis que uma 'renda' anual num valor pouco ou nada significativo.
Quando o grau de incapacidade excede aquela percentagem, antes 10% e hoje 30%, terá de entender-se que o risco com uma aplicação indevida do capital recebido de uma só vez é claramente maior em função do montante de "renda" a que o beneficiário deixa de poder ter acesso.
Nestes casos, em que a ponderação da escolha entre a remição ou a não remição, traz consequências de ordem financeira necessariamente importantes para o trabalhador ou para o beneficiário da pensão, como é aqui o caso da viúva do falecido Amaro Santos, deve de ser este, no mínimo, a ter uma palavra definitiva sobre matéria tão decisiva.
Pretender o contrário significaria permitir uma violação do direito à justa reparação por acidente de trabalho ou doença profissional, consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da Constituição da República Portuguesa - v., além do acórdão citado, no mesmo sentido quanto à substância dos argumentos aduzidos, os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 379/2002, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 54.º vol., pp. 313-321, 302/99, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 43.º vol., pp. 597-603, e 482/99, disponível em www.tribunalconstitucional.pt."
2 - Veio então o Ministério Público recorrer para o Tribunal Constitucional, invocando a recusa de "aplicação por inconstitucionalidade do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, quando interpretado no sentido de 'impor a remição obrigatória total das pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes nos casos em que estas excedam 30%, sempre que se pretenda operar a remição contra vontade expressa do trabalhador em causa'".
O recurso foi admitido, por decisão que não vincula este Tribunal (n.º 3 do artigo 76.º da Lei 28/82).
Entende-se que o recurso é interposto ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro.
3 - Notificado para o efeito, o Ministério Público apresentou alegações, nas quais, após sustentar que as razões que levaram ao julgamento de inconstitucionalidade formulado no citado Acórdão 56/2005 valem inteiramente para o caso em que a beneficiária da pensão é a viúva do sinistrado, falecido em consequência do acidente de trabalho, concluiu da seguinte forma:
"1 - É inconstitucional, por violação do artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da Constituição da República Portuguesa, a norma constante do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril (na redacção emergente do Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro), interpretada no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes, nos casos em que estas excedam 30% ou por morte, opondo-se o titular à remição, pretendida pela seguradora.
2 - Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade formulado pela decisão recorrida."
A recorrida não alegou.
4 - A fl. 125, foi proferido o seguinte despacho:
"A fl. 114, o Ministério Público veio recorrer para o Tribunal Constitucional do despacho a fl. 108, atribuindo-lhe a recusa de 'aplicação por inconstitucionalidade do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, quando interpretado no sentido de impor a remição obrigatória total das pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes nos casos em que estas excedam 30%, sempre que se pretenda operar a remição contra vontade expressa do trabalhador em causa'.
Definiu, portanto, o objecto do recurso de constitucionalidade como a norma do citado artigo 74.º quando interpretada no sentido que descreve.
Verifica-se, todavia, que, no caso dos autos, se trata de uma pensão atribuída, por morte do trabalhador, à viúva do sinistrado, falecido na sequência de acidente de trabalho.
Isto significa que a norma impugnada não coincide com a norma cuja recusa, por inconstitucionalidade, foi afastada pela decisão recorrida, e que foi a norma do mesmo artigo 74.º 'interpretad[a] no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes nos casos em que estas excedam 30%, sempre que se pretenda operar a remição contra vontade expressa do beneficiário da pensão em causa'.
Do texto da decisão recorrida verifica-se, claramente, que se está a ter em conta a remição de uma pensão atribuída por morte e que o consentimento que seria relevante seria o da viúva do sinistrado.
Não sendo possível alterar a norma que constitui o objecto do recurso nas alegações posteriormente apresentadas, é plausível que o Tribunal Constitucional venha a não tomar conhecimento do recurso, por não ter sido recusada como ratio decidendi a norma que foi definida como seu objecto.
Assim, nos termos conjugados do disposto no n.º 1 do artigo 704.º do Código de Processo Civil e no artigo 69.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, convidam-se as partes a pronunciarem-se, querendo, sobre a eventualidade de não conhecimento do objecto do presente recurso."
O Ministério Público respondeu, pronunciando-se no sentido de que a referência, constante do requerimento de interposição de recurso, à "vontade expressa" do "trabalhador em causa" e não à "vontade expressa" do "beneficiário da pensão", como faz a sentença recorrida, resulta de um "lapso material ou de escrita, aliás espontaneamente rectificado na alegação já apresentada", sem "relevo decisivo, no que toca à delimitação da interpretação normativa questionada".
Tal diferença na identificação dos titulares da pensão, em seu entender, não deve ser relevante, nem sequer tendo implicações quanto à "solução alcançada quanto à questão de constitucionalidade".
Conclui sustentando que se deve considerar corrigido o lapso.
5 - Tendo em conta esta confirmação apresentada pelo Ministério Público, o Tribunal entende que se deve considerar corrigido o objecto do presente recurso, que, assim, consiste na norma constante do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril (na redacção resultante do Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro), interpretada no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões vitalícias atribuídas por morte, opondo-se o titular à remição, pretendida pela seguradora.
Pelo Acórdão 34/2006 (Diário da República, 1.ª série-A, de 8 de Fevereiro de 2006), foi declarada a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da "norma constante do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, na redacção emergente do Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro, interpretada no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes do trabalhador/sinistrado, nos casos em que estas excedam 30%, por violação do artigo 59.º n.º 1, alínea f), da Constituição da República Portuguesa".
Não há, manifestamente, coincidência entre esta norma e aquela que constitui o objecto do presente recurso.
Nas alegações que apresentou, o Ministério Público sustentou que valem plenamente para a norma agora em apreciação as razões que ditaram "os sucessivos julgamentos de inconstitucionalidade material" que, como se sabe, levaram à referida declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral. Foram as seguintes, como se pode ler no Acórdão 34/2006, por transcrição do Acórdão 56/2005 (Diário da República, 2.ª série, de 3 de Março de 2005):
"4 - O artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, na redacção em causa (dada pelo Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro), já foi julgado (organicamente) inconstitucional por este Tribunal no Acórdão 468/2002 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 54, pp. 789-802), 'na interpretação segundo a qual aquele preceito é aplicável à remição das pensões previstas na alínea d) do n.º 1 do artigo 17.º e no artigo 33.º, ambos da Lei 100/97, de 13 de Setembro, em pagamento à data da entrada em vigor desta mesma Lei'.
[...]
O que se discutia nesse caso era, [...] antes de mais, a extensão do regime transitório fixado no artigo 41.º, n.º 2, da Lei 100/97. No presente caso, o sentido impugnado da mesma norma é outro, e está em causa uma inconstitucionalidade material, sendo que a norma impugnada - o artigo 74.º, na interpretação de 'fazer abranger no conceito de pensões de reduzido montante todas as pensões infortunísticas laborais, incluindo nelas as situações de total ou elevada incapacidade permanente' - vem acusada, pelo tribunal recorrido, de violar os princípios da igualdade, da proporcionalidade e da justa indemnização dos acidentes de trabalho, sendo que é bastante estabelecer uma dessas causas de inconstitucionalidade para dispensar a averiguação das restantes."
Após citar e transcrever extractos do Acórdão 379/2002 (Diário da República, 2.ª série, de 16 de Dezembro de 2002), o Acórdão 56/2005 continua da seguinte forma:
"Em todo o caso, o argumento mais relevante apresentado pela decisão recorrida contra a conformidade constitucional da norma do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99 (na redacção dada pelo artigo 2.º do Decreto-Lei 382-A/99, e na interpretação que foi efectuada pela decisão recorrida, que o Tribunal Constitucional tem de aceitar como um dado no presente recurso) foi, justamente, o dos limites à teleologia da remição: nesses casos de incapacidade elevada, 'só a subsistência de uma pensão vitalícia poderá precaver o sinistrado contra o destino, eventualmente aleatório, do capital resultante da remição obrigatória, em casos como o sub judice'.
Neste ponto, a decisão recorrida foi também ao encontro da ponderação reiterada pelo Tribunal Constitucional no Acórdão 302/99 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 43, pp. 597-603), no qual se pode ler:
'O estabelecimento de pensões por incapacidade tem em vista a compensação pela perda da capacidade de trabalho dos trabalhadores devida a infortúnios de que foram alvo no ou por causa do desempenho do respectivo labor.
E, por isso, compreende-se que, se uma tal perda não foi por demais acentuada, o que o mesmo é dizer que o acidente de trabalho ou a doença profissional não implicou a futura continuação do desempenho de labor por parte do trabalhador (ainda que tenha reflexo, mesmo em medida não muito relevante, na retribuição por aquele desempenho, justamente pela circunstância de não apresentar uma total capacidade de trabalho), se permita que a compensação correspondente à pensão que lhe foi fixada - e sabido que é que, de uma banda, o montante das pensões é de pouco relevo e, de outra, que o quantitativo fixado se degrada com o passar do tempo - possa ser transformada em capital, a fim de ser aplicada em finalidades económicas porventura mais úteis e rentáveis do que a mera percepção de uma renda anual cujo quantitativo não pode permitir qualquer subsistência digna a quem quer que seja.
Transformação essa que ocorrerá a requerimento do trabalhador ou da entidade responsável pelo pagamento da pensão, ou, até, obrigatoriamente, por força da própria lei, neste último caso quando a incapacidade for diminuta (até 10%) e o montante da pensão for reduzido.
Outrotanto se não passará quando em causa se postarem acidentes de trabalho ou doenças profissionais cuja gravidade seja de tal sorte que vá acentuadamente diminuir a capacidade laboral do trabalhador e, reflexamente, a possibilidade de auferir salário condigno com, ao menos, a sua digna subsistência. Nestas situações, e porque a pensão é, necessariamente, de mais elevado montante, servirá ela de complemento à parca (e por vezes nula) remuneração que aufere em consequência da reduzida capacidade de trabalho.
Se o montante dessas pensões se perspectivar como algo que actua (ou actuaria desejavelmente) como um mínimo de asseguramento de subsistência, então compreende-se que o legislador pretenda, como assinala o Exmo. Procurador-Geral Adjunto na sua alegação, colocar o trabalhador a coberto dos riscos de aplicação do capital de remição.
Efectivamente, a aplicação de um capital - ainda que no momento em que essa intenção é formulada se apresente como um investimento adequado, porquanto proporcionador de um rendimento mais satisfatório do que o correspondente à percepção da pensão anual - é sempre alguma coisa que, em virtude de ser aleatória, comporta riscos.
E daí se aceitar que, nos casos em que a incapacidade de trabalho se situa em maior percentagem (com o consequente maior montante da pensão), o legislador, para ressalva do próprio trabalhador que dessa incapacidade padece, não autorize a remição das respectivas pensões, desta sorte estabelecendo uma limitação ao poder do trabalhador de pedir ou não a remição.'
Neste Acórdão 302/99 (bem como no Acórdão 482/99, disponível em www.tribunalconstitucional.pt), o Tribunal Constitucional pronunciou-se sobre a conformidade constitucional de disposições que vedam a remição de certas pensões 'a requerimento dos pensionistas ou das entidades responsáveis', e julgou-as inconstitucionais por violação das disposições conjugadas dos artigos 13.º, n.º 1, 59.º, n.º 1, alínea f), e 63.º, n.º 3, da Constituição.
No presente caso, o problema é de certa forma inverso, pois não está em causa a limitação ao poder de o trabalhador ponderar se, atento o diminuto quantitativo da pensão, não seria mais compensadora a efectivação da remição (que redundava - disse-se - 'verdadeiramente, na consagração de uma discriminação materialmente infundada, actuando como um obstáculo a que o sistema de segurança social proteja adequadamente [...] o direito dos trabalhadores à justa reparação, quando vítimas de acidentes de trabalho ou de doença profissional [artigo 59.º, n.º 1, alínea f), do diploma básico]'), mas antes a limitação a continuar a receber a pensão, pela imposição de uma remição obrigatória, para todas as pensões infortunísticas laborais, mesmo que por incapacidades parciais permanentes que excedam 30%.
Todavia, também no presente caso a interpretação em causa redunda numa limitação do poder de o trabalhador ponderar se é menos arriscado continuar a receber a pensão e recusar a remição numa imposição do risco do capital a receber - , a qual, com a extensão que a dimensão normativa admite, tornaria precário e limitaria o direito dos trabalhadores a uma justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou doença profissional.
6 - Segundo as alegações do Ministério Público, a razão essencial da inconstitucionalidade material passaria, todavia, a ser outra, radicando, antes, na instituição de um regime (transitório) de remição obrigatória de pensões sem relação com a vontade do beneficiário e 'sem qualquer conexão com os valores de remuneração mínima mensal garantida'.
Quer, porém, se entenda que essa conexão com os valores de remuneração mínima mensal garantida só está prevista nos casos de incapacidade permanente e parcial inferior a 30% (o regime transitório não substitui o regime material constante do artigo 56.º do Decreto-Lei 143/99), quer se entenda, apenas, que tal não é relevante no caso dos autos, em que estava em causa uma incapacidade parcial permanente fixada em 60%, deixando inteiramente em aberto o modo de aplicar o direito infraconstitucional, o certo é que o Tribunal Constitucional está vinculado à formulação da questão tal como feita na decisão recorrida: a interpretação do citado artigo 74.º no sentido de impor a remição obrigatória de todas as pensões emergentes de acidente de trabalho quando a desvalorização funcional que afecte o sinistrado for total ou exceder 30%.
Pode, assim, concluir-se, como nos acórdãos citados, que a remição total obrigatória - isto é, independentemente da vontade do beneficiário - de uma pensão vitalícia atribuída por uma incapacidade parcial permanente superior a 30% é inconstitucional por violação do direito à justa reparação por acidente de trabalho ou doença profissional, consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da Constituição.
Desnecessário se torna, pois, confrontar o normativo em crise com outros princípios ou normas constitucionais."
6 - Contrariamente ao que é sustentado pelo Ministério Público, estes argumentos não são inteiramente transponíveis para a hipótese de morte do sinistrado, e em que o beneficiário da pensão é o cônjuge (ou outro beneficiário, nos termos previstos na lei actualmente, no artigo 20.º da Lei 100/97), como o Tribunal Constitucional já salientou no citado Acórdão 379/2002, que concluiu no sentido da não inconstitucionalidade, a propósito de norma de conteúdo semelhante à que constitui o objecto do presente recurso, embora referida ao n.º 1 do artigo 56.º do mesmo Decreto-Lei 143/99:
"No caso sub judice o beneficiário da pensão não é o próprio sinistrado, uma vez que este morreu, mas poder-se-á defender que, também aqui, haverá que proceder a idêntica ponderação: se, face a um quadro em que as pensões tendem inevitavelmente a degradar-se, se consideraram inconstitucionais as normas que estabelecem 'uma limitação ao poder do trabalhador de pedir ou não a remição', justificar-se-ia também um juízo de inconstitucionalidade para uma interpretação normativa que, por morte do trabalhador, impõe a remição obrigatória das pensões, sujeitas a actualizações anuais e ajustes por idade dos beneficiários, para assim se salvaguardar a liberdade de o beneficiário correr os riscos do capital de remição, como nas decisões referidas.
[...]
A norma em sindicância, com efeito, assenta na actualização do valor presumivelmente recebido, de harmonia com as bases técnicas aplicáveis ao cálculo do capital de remição e, bem assim, com as respectivas tabelas práticas, fixadas por portaria do Ministério das Finanças, de acordo com o artigo 57.º do diploma. E a lógica que lhe subjaz comporta a conversão em capital de pensões de valor anual reduzido de modo a permitir aos beneficiários, sem prejuízo da álea inerente, que assim se obtenha uma aplicação mais rentável e útil do valor percebido.
[...]
Na verdade, se a presunção da maior utilidade [da disponibilidade imediata do capital, em consequência da remição] para o beneficiário não valerá, eventualmente, para o sinistrado, em função da sua própria incapacidade, já não pode valer para um beneficiário que, por definição, não é o sinistrado."
7 - Sucede, todavia, que no presente recurso está em causa uma pensão atribuída ao cônjuge do sinistrado por acidente ocorrido em 1964, decorrendo a obrigatoriedade da remição de um regime que entrou em vigor em 1999 (cf. n.º 1 do artigo 41.º da Lei 100/97 e n.º 1 do artigo 71.º do Decreto-Lei 143/99).
Esta circunstância justifica que se aprecie a norma em causa, não apenas à luz da tutela constitucional do direito à justa reparação por acidente de trabalho, direito fundamental dos trabalhadores acrescentado ao artigo 59.º da Constituição pela revisão constitucional de 1997, passando a integrar a alínea f) do seu n.º 1, mas também na perspectiva das implicações do princípio da confiança, contido no princípio do Estado de Direito (artigo 2.º da Constituição).
Com efeito, e como tem sido repetidamente apontado pelo Tribunal Constitucional (cf. Acórdãos n.os 287/90, Diário da República, 2.ª série, de 20 de Fevereiro de 1991, e 467/2003, Diário da República, 2.ª série, de 19 de Novembro de 2003, e jurisprudência neles citada), uma lei que "prevê consequências jurídicas para situações que se constituíram antes da sua entrada em vigor mas que se mantêm nessa data", como é o caso, tem de "ser examinada à luz do referido princípio da protecção da confiança, no qual vai implicada uma ideia de segurança, de certeza e de previsibilidade da ordem jurídica" (Acórdão 232/91, Diário da República, 2.ª série, de 17 de Setembro de 1991).
Não será, pois, consentânea com tal princípio se "a confiança do cidadão na manutenção da situação jurídica com base na qual tomou as suas decisões for violada de forma intolerável, opressiva ou demasiado acentuada. Num tal caso, com efeito, a confiança na situação jurídica preexistente haverá de prevalecer sobre a medida legislativa que veio agravar a posição do cidadão. E isso porque, tendo tal confiança, nesse caso, maior 'peso' ou 'relevo' constitucional do que o interesse público subjacente à alteração legislativa em causa, é justo que o conflito se resolva daquela maneira" (mesmo Acórdão 232/91); dito por outras palavras, será inconstitucional se "atingir de forma inadmissível, intolerável, arbitrária ou desproporcionadamente onerosa aqueles mínimos de segurança que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar" (Acórdão 486/97, Diário da República, 2.ª série, de 17 de Outubro de 1997).
Isto não significa, naturalmente, que exista qualquer "direito à não frustração de expectativas jurídicas ou à manutenção do regime legal em relações jurídicas duradoiras ou relativamente a factos complexos já parcialmente realizados. Ao legislador não está vedado alterar o regime do casamento, do arrendamento, do funcionalismo ou das pensões, por exemplo [...]. Cabe saber se se justifica ou não na hipótese da parte dos sujeitos de direito ou dos agentes um 'investimento na confiança' na manutenção do regime legal [...]", como se escreveu no citado Acórdão 287/90.
Ora, no caso presente, impor ao beneficiário de uma pensão atribuída em 1964 a sua substituição por um capital de remição, obrigando-o a providenciar pela respectiva aplicação em termos de garantir, em idêntica medida, a sua subsistência, afecta de forma inaceitável a expectativa que legitimamente fundou na manutenção de um regime legal que lhe permitiu organizar a vida contando com o pagamento periódico e vitalício daquela quantia.
É certo que a obrigatoriedade de remição traz óbvias vantagens para a seguradora, obrigada a pagar repetidamente e durante um longo período de tempo inúmeras pensões de reduzido montante; e que, por essa via, o novo regime se explica facilmente por critérios de racionalidade económica. Não se vê, todavia, que tais vantagens sejam aptas a prevalecer sobre o risco que dela poderá resultar para a subsistência do beneficiário, que confiou, nos termos expostos, na manutenção da pensão.
Para além disso, e pese embora a circunstância de o titular (por direito próprio, não por sucessão) do direito à pensão não ser, aqui, o trabalhador, não se afasta o critério da tutela constitucional do direito à "assistência e justa reparação" por "acidentes de trabalho" para aferir a validade constitucional da norma em apreciação, já que o direito a pensão desempenha, no fundo, uma função de substituição da contribuição que o vencimento do trabalhador significava para a subsistência do beneficiário.
Essa função é, aliás, revelada pelos termos em que o artigo 20.º da Lei 100/97 define quer o círculo dos titulares quer as condições da sua atribuição.
Basta verificar que o direito é reconhecido a pessoas a quem o sinistrado, em vida, estava legalmente obrigado a prestar alimentos ou, em certos casos, os prestava de facto: cônjuge [cf. artigos 1672.º, 1675.º, 2009.º, n.º 1, alínea a), e 2015.º do Código Civil)], ex-cônjuge ou cônjuge judicialmente separado de pessoas e bens com direito a alimentos [cf. artigos 2009.º, n.º 1, alínea a), e 2016.º do Código Civil], filhos [cf. artigos 1874.º, 1880.º, 2009.º, n.º 1, alínea b), do Código Civil], ascendentes [cf. artigo 2009.º, n.º 1, alínea b), do Código Civil] e quaisquer parentes sucessíveis, desde que o sinistrado "contribuísse com regularidade para o seu sustento". No último caso, há um alargamento (subjectivo) em relação ao que consta do artigo 2009.º, alíneas d) e e), do Código Civil, todavia contrabalançado com a exigência acabada de referir.
Quanto ao direito a pensão reconhecido ao unido de facto, há que ter em conta que o artigo 6.º da Lei 7/2001, de 11 de Maio, exige, como condição de atribuição da pensão, a reunião das condições constantes do artigo 2020.º do Código Civil, ou seja, para o que agora interessa, a titularidade do "direito a exigir alimentos da herança do falecido".
Deve assim concluir-se pela inconstitucionalidade da norma que constitui o objecto do presente recurso, por violação conjugada do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição e do princípio da confiança, inerente ao princípio do Estado de direito (artigo 2.º da Constituição).
Nestes termos, decide-se:
a) Julgar inconstitucional, por violação conjugada do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição e do princípio da confiança, inerente ao princípio do Estado de direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição, a norma constante do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril (na redacção emergente do Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro), interpretada no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões vitalícias atribuídas por morte, opondo-se o titular à remição, pretendida pela seguradora;
b) Consequentemente, negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida no que respeita à questão de constitucionalidade.
Lisboa, 12 de Julho de 2006. - Maria dos Prazeres Beleza - Vítor Gomes - Bravo Serra (vencido pelas razões constantes da declaração de voto aposta ao presente aresto pelo Exmo. Conselheiro Gil Galvão e para as quais, com vénia, remeto) - Gil Galvão (vencido pelas razões constantes da declaração de voto que anexo) - Artur Maurício.
Declaração de voto
1 - Votei vencido o presente acórdão, no essencial pelas seguintes razões:
1.1 - Em primeiro lugar, considero, tal como, aliás, se afirma no acórdão de cuja decisão dissinto, que os argumentos que fizeram vencimento no Acórdão 34/2006, em foi declarada a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da "norma constante do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, na redacção emergente do Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro, interpretada no sentido de impor a remição obrigatória total de pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes do trabalhador/sinistrado, nos casos em que estas excedam 30%, por violação do artigo 59.º, n.º 1, alínea f), da Constituição da República Portuguesa" não são transponíveis para a hipótese de morte do sinistrado, em que o beneficiário da pensão é o cônjuge.
Na verdade, neste caso, está em causa a remição de uma pensão atribuída a um beneficiário que não é o trabalhador que foi vítima de acidente de trabalho ou de doença profissional. Ora, se, em relação a um trabalhador que foi vítima de acidente de trabalho ou de doença profissional, da qual resultou uma incapacidade não inferior a 30%, se poderá ainda concluir, como aconteceu naquele acórdão, que a remição de uma pensão, ainda que de reduzido montante, independentemente da vontade do beneficiário incapacitado, viola o direito deste a uma justa reparação, previsto na alínea f) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição, dificilmente se poderá chegar a idêntica conclusão em relação a uma pensão paga a um beneficiário que não é o trabalhador que foi vítima de acidente de trabalho ou de doença profissional, sobretudo se, como é o caso, tal pensão é de reduzido montante.
Desde logo, porque aquele juízo pressupõe que a vítima do acidente ou da doença profissional é o melhor juiz da sua incapacidade para angariar sustento e, consequentemente, de qual é a forma mais adequada da compensação que lhe é devida pela sua própria incapacitação. O que justificará a tutela da autonomia da vontade do próprio trabalhador lesado e a ponderação atribuída à sua vontade, embora com excepções. Na verdade, como salientou o representante do Ministério Público, "sempre será lícito ao legislador restringir tal autonomia plena, impedindo a remição total da pensão, mesmo a pedido do trabalhador, nos casos em que esta assegura, em termos decisivos, a própria subsistência do lesado" e também "será lícito ao legislador restringir a autonomia de opção do trabalhador, impondo a remição, independentemente da vontade manifestada por aquele, no caso de pensões que compensem uma reduzida incapacidade laboral, insusceptível de afectar decisivamente a capacidade aquisitiva do sinistrado, ou quando se trate de 'pensões' degradadas que - pelo seu montante (independentemente do grau de incapacidade que compensam) - se revelam absolutamente inidóneas para assegurar uma subsistência minimamente condigna do lesado". Mas este pressuposto de que a vítima do acidente ou da doença profissional é o melhor juiz da sua incapacidade para angariar sustento não tem, todavia, paralelo quando o beneficiário não é, de todo em todo, o sinistrado.
Além disso, há, ainda, um argumento literal que dificilmente permite chegar à conclusão de violação, nestes casos, do artigo 59.º da Constituição: é que o próprio artigo 59.º se refere, exclusivamente, a trabalhadores, quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional, o que, manifestamente, não é o caso. E nem se diga que o mesmo se justifica em relação a outros beneficiários, já que o direito à pensão desempenharia, no fundo, uma função de substituição da contribuição que o vencimento do trabalhador significaria para a subsistência do beneficiário. É que, dito deste modo, estaremos apenas perante uma afirmação feita em termos abstractos que pode ser claramente negada pelos factos concretos. Mas, além disso, porque, ainda que assim fosse, tal contribuição não deixaria de existir pelo simples facto de haver remição, uma vez que esta se traduz, precisamente, na substituição da pensão vitalícia por uma verba teoricamente equivalente.
Não se afigura, assim, que, em relação a pensões atribuídas a um beneficiário que não é o trabalhador que foi vítima de acidente de trabalho ou de doença profissional, a respectiva remição se possa configurar como violadora do direito dos trabalhadores receberem uma "justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional", previsto na alínea f) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa, nomeadamente naquelas situações, como é o caso dos autos, em que a pensão é de reduzido montante.
1.2 - Dir-se-á, porém, que, não obstante não existir violação da alínea f) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição, ainda assim não estará assegurada a conformidade constitucional da norma, já que outros princípios poderão estar em causa, nomeadamente o princípio da confiança, contido no princípio do Estado de direito (artigo 2.º da Constituição). Na verdade, estando em causa uma pensão atribuída ao cônjuge do sinistrado por acidente ocorrido em 1964 e decorrendo a obrigatoriedade da remição de um regime que entrou em vigor em 1999, poderá justificar-se a apreciação da norma em causa também à luz da tutela constitucional do princípio da confiança.
Com efeito, o Tribunal Constitucional tem repetidamente salientado (cf. Acórdãos n.os 287/90, Diário da República, 2.ª série, de 20 de Fevereiro de 1991, e 467/2003, Diário da República, 2.ª série, de 19 de Novembro de 2003, e jurisprudência neles citada), que uma lei que "prevê consequências jurídicas para situações que se constituíram antes da sua entrada em vigor mas que se mantêm nessa data", como é o caso, tem de "ser examinada à luz do referido princípio da protecção da confiança, no qual vai implicada uma ideia de segurança, de certeza e de previsibilidade da ordem jurídica" (Acórdão 232/91, Diário da República, 2.ª série, de 17 de Setembro de 1991). Não sendo consentânea com tal princípio uma norma que crie uma situação em que "a confiança do cidadão na manutenção da situação jurídica com base na qual tomou as suas decisões [seja] violada de forma intolerável, opressiva ou demasiado acentuada. Num tal caso, com efeito, a confiança na situação jurídica preexistente haverá de prevalecer sobre a medida legislativa que veio agravar a posição do cidadão" (Acórdão 232/91). Ou, por outras palavras, uma tal norma será inconstitucional se "atingir de forma inadmissível, intolerável, arbitrária ou desproporcionadamente onerosa aqueles mínimos de segurança que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar" (Acórdão 486/97, Diário da República, 2.ª série, de 17 de Outubro de 1997).
Isto não significa, contudo, como o Tribunal tem igualmente salientado (cf., por exemplo, o Acórdão 287/90), que exista qualquer "direito à não frustração de expectativas jurídicas ou à manutenção do regime legal em relações jurídicas duradoiras ou relativamente a factos complexos já parcialmente realizados. Ao legislador não está vedado alterar o regime do casamento, do arrendamento, do funcionalismo ou das pensões, por exemplo. [...]"
A questão está, então, em saber se a norma ora em causa implica uma violação de forma inadmissível, intolerável, arbitrária, opressiva, ou desproporcionadamente onerosa da confiança do cidadão na manutenção da situação jurídica. Vejamos.
Nos presentes autos está em causa a remição de uma pensão de reduzido montante, por definição inidónea para assegurar uma subsistência minimamente condigna do beneficiário, atribuída em 1964 ao cônjuge de um sinistrado que faleceu em consequência de acidente de trabalho. Com a remição visa-se a atribuição de uma quantia equivalente, em termos actuariais, àquela que o beneficiário receberia se, em condições normais, continuasse a receber a pensão vitalícia. Assim sendo, a substituição da pensão vitalícia por um capital de remição é, em princípio, tendencialmente neutra, quanto aos montantes envolvidos. De facto, o beneficiário, tendo em atenção as tabelas práticas de cálculo da remição - que integram as tábuas de mortalidade - , recebe uma quantia tecnicamente equivalente à que receberia se se mantivesse a percepção periódica da quantia que vinha recebendo com a pensão vitalícia, nessa medida não sendo afectada a contribuição - por definição manifestamente insuficiente - que a pensão de reduzido montante vinha fazendo para a sua subsistência.
É inegável, porém, que há algum risco inerente à aludida remição: por um lado, o capital de remição, sendo calculado em função da pensão actual, não comporta as actualizações de que, anualmente, as pensões vitalícias normalmente beneficiam, tendo em atenção a taxa de inflação; por outro, pode acontecer que o tempo de vida do beneficiário exceda a esperança média de vida, com base na qual o capital de remição é calculado. Quanto ao primeiro ponto, porém, não será incontornável, já que uma aplicação financeira poderá permitir obter uma compensação substitutiva da actualização anual; já quanto ao segundo poderá ser mais difícil a sua ultrapassagem.
A questão é, então, a de saber se a existência de estes riscos é suficiente para que se considere violada de forma inadmissível, intolerável, arbitrária, opressiva, ou desproporcionadamente onerosa a confiança do titular da pensão na manutenção do pagamento periódico e vitalício de uma determinada quantia.
Ora, tratando-se de uma pensão de reduzido montante - por definição, repete-se, manifestamente insuficiente para assegurar uma subsistência minimamente condigna do beneficiário - , atribuída a quem não é o trabalhador que foi vítima de um acidente de trabalho ou de doença profissional e não tem, neste contexto, qualquer incapacidade para prover ao seu sustento, não se afigura que o facto de a remição poder fazer incorrer o beneficiário no risco de, vindo a exceder a esperança média de vida com base na qual o capital de remição foi calculado, porventura ter de encontrar uma aplicação que lhe permita obter um acréscimo do capital para fazer face a esse período adicional, possa ser considerada uma violação inadmissível, intolerável, arbitrária, opressiva, ou desproporcionadamente onerosa da confiança do beneficiário na manutenção de uma pensão vitalícia de reduzido montante, incapaz de prover à sua subsistência. Sendo certo que, em tais casos, não deixariam de funcionar mecanismos gerais de protecção assistencial, capazes de permitir a superação da dificuldade. Não se vislumbra, assim, que exista, nestes casos, violação do princípio da tutela da confiança consagrado constitucionalmente. E também não se vislumbra que outros princípios ou normas constitucionais possam ser considerados violados.
A isto acresce que a remição de pensões de reduzido montante, atribuídas a beneficiários que não são os trabalhadores que foram vítimas de acidentes de trabalho ou de doenças profissionais, ainda que independentemente da vontade do beneficiário, é não só facilmente explicável por critérios de racionalidade económica, mas corresponde, ainda, a uma poupança de meios para a comunidade em geral - e não apenas para as seguradoras obrigadas ao seu pagamento periódico (v., por exemplo, os custos da sistemática intervenção dos tribunais durante todo o período de subsistência do pagamento da pensão) - , o que, num contexto de manifesta escassez, não deve deixar de ser ponderado.
1.3 - Assim sendo, entendi que se deveria ter concluído pela não inconstitucionalidade da norma constante do artigo 74.º do Decreto-Lei 143/99, de 30 de Abril, na redacção emergente do Decreto-Lei 382-A/99, de 22 de Setembro, na precisa dimensão que deu lugar à sua não aplicação ao concreto caso. - Gil Galvão.