de 19 de Janeiro
Define o Decreto-Lei 39/76, de 19 de Janeiro, um baldio como um terreno insusceptível de apropriação individual, usufruído colectivamente por uma comunidade segundo o direito que lhe é conferido pelos usos e costumes e que a cada geração compete transmitir, sem perda de usufruto, às gerações que se lhe seguem.De acordo com este princípio, considera o referido diploma a devolução às respectivas comunidades dos baldios em que o Estado definira formas de aproveitamento e que se encontravam na sua posse.
Para além da acção do Estado desenvolvida nas últimas décadas, viram ainda as comunidades os seus baldios serem indevidamente apropriados por particulares, sempre em resultado da corrupção de um regime que, no compadrio e no favor político, jogou o próprio património dos povos.
Torna-se pois imperioso, como acto elementar de justiça, adoptar as medidas que permitam a devolução aos legítimos utentes dos baldios, dos bens e direitos de que assim foram espoliados.
No presente diploma define-se a doutrina que orientará as acções a desenvolver para a recuperação dos baldios, dando-lhes a necessária cobertura legal.
Contemplou-se, contudo, sem grande ofensa do princípio formulado, a salvaguarda dos casos em que o aproveitamento de terreno baldio teve em vista edificações que na maior parte dos casos foram obra de vizinhos de fracos recursos ou para fins agrícolas, comerciais ou industriais de manifesto interesse para a economia local.
Outro aspecto de realce é o da constituição de comissões de representantes dos povos e do Estado, que, presididas pelo juiz da comarca, julgarão, segundo a equidade, as questões ligadas à recuperação dos baldios, criando-se assim um processo célere de apreciação, sem prejuízo da defesa dos interessados e com a obtenção da prova mais directa e próxima da realidade factual em que se enquadra a situação a apreciar.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pelo artigo 3.º, n.º 1, alínea 3), da Lei Constitucional 6/75, de 26 de Março, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º - 1. Os actos ou negócios jurídicos que tenham como objecto a apropriação de terrenos baldios ou parcelas de baldios por particulares, bem como as subsequentes transmissões que não forem nulas, são, nos termos de direito, anuláveis a todo o tempo.
2. Quando, porém, o acto de alienação, além de revestido de forma legal, tenha sido sancionado por entidade para o efeito competente, a anulação só poderá ser declarada em caso de relevante prejuízo económico ou lesão de interesses dos compartes do baldio, considerados o momento de alienação e o tempo decorrido a contar do respectivo acto.
3. A anulabilidade prevista no número antecedente abrange a apropriação por usucapião de baldios não divididos equitativamente entre os respectivos compartes ou de parcelas não atribuídas, em resultado dessa divisão, a um ou alguns deles.
Art. 2.º Sempre que sejam anulados actos ou negócios jurídicos que tiveram como efeito a passagem à propriedade privada de baldios ou parcelas de baldios a anulação não abrangerá:
a) As parcelas de terreno ocupadas por quaisquer edifícios para habitação e fins agrícolas, comerciais ou industriais e seus acessos, bem como uma área de logradouro à volta dos referidos edifícios dez vezes superior à área do terreno por eles ocupada;
b) As parcelas de terreno cultivadas por pequenos agricultores.
Art. 3.º Têm legitimidade para o pedido de anulação as assembleias de compartes previstas no artigo 6.º do Decreto-Lei 39/76, de 19 de Janeiro, ou, na sua falta, a junta ou juntas de freguesia da área da situação do prédio apropriado.
Art. 4.º A decisão caberá a uma comissão constituída por representantes dos compartes do baldio e das autarquias em cuja área ele se situe, por um representante do Ministério da Agricultura e Pescas, e presidida pelo juiz da comarca, a qual julgará definitivamente segundo a equidade, nela tendo assento um representante do proprietário ou possuidor do prédio em questão.
Art. 5.º Será ainda da competência da comissão referida no artigo anterior a apreciação dos casos de restituição de baldios ou parcelas de baldios apropriados ou simplesmente ocupados sem base em qualquer título.
Art. 6.º Os encargos porventura decorrentes das decisões proferidas nos termos deste decreto-lei serão suportados pelos compartes dos baldios, que poderão recorrer para esse efeito ao apoio do Estado.
Art. 7.º A fixação das normas necessárias à execução deste decreto-lei, bem como o esclarecimento das dúvidas suscitadas na sua aplicação, é da competência do Ministério da Agricultura e Pescas e do Ministério da Justiça.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - José Baptista Pinheiro de Azevedo - Vasco Fernando Leote de Almeida e Costa - João de Deus Pinheiro Farinha - Francisco Salgado Zenha - António Poppe Lopes Cardoso.
Promulgado em 8 de Janeiro de 1976.
Publique-se.O Presidente da República, FRANCISCO DA COSTA GOMES.