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Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 8/2015, de 2 de Junho

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Sumário

«A omissão de entrega total ou parcial, à administração tributária de prestação tributária de valor superior a EUR 7.500 relativa a quantias derivadas do Imposto sobre o Valor Acrescentado em relação às quais haja obrigação de liquidação, e que tenham sido liquidadas, só integra o tipo legal do crime de abuso de confiança fiscal, previsto no artigo 105 nº 1 e 2 do RGIT, se o agente as tiver, efectivamente, recebido»

Texto do documento

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 8/2015

Processo 85/14

Uniformização de Jurisprudência

Relato n.º 642

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

O arguido Pedro Araújo veio interpor recurso extraordinário para fixação de jurisprudência do acórdão da Relação de Lisboa de 15 de Maio de 2014, proferido nos autos de recurso penal supra identificado, nos termos do artigo 437.º Cód. Proc. Penal. Alega que a solução nele adoptada se encontra em oposição com a constante do acórdão da mesma Relação, proferido a 21 de Novembro de 2013, no Processo 22/10.3IDFUN.L1.

Em abono da sua tese refere que o litígio jurisprudencial se concretiza no facto de o acórdão fundamento considerar que, para efeitos do preenchimento do crime de abuso de confiança fiscal do artigo 105.º do RGIT, «o recebimento da prestação tributária é...pressuposto essencial do crime..., sendo que o dever fiscal de entrega de IVA não recebido não goza de protecção penal, por atipicidade do facto», enquanto o recorrido, adoptou solução contrária, decidindo que «o elemento típico "recebimento" não consta do tipo incriminador», e sendo «um crime de omissão pura, em que não se exige qualquer elemento de apropriação», «o pagamento do IVA liquidado e declarado à Administração Fiscal, é exigível assim que decorra o prazo para o efeito, tenha ou não o sujeito tributário recebido a quantia do cliente/devedor».

Na sequência processual adequada o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão proferido a 8 de Janeiro de 2015, decidiu-se pela oposição de julgados, determinando o prosseguimento do recurso.

Sinteticamente a questão que se coloca é definir se o agente que não entrega à administração tributária prestação tributária de IVA de valor superior a (euro) (euro) 7.500 relativo a quantias que tenha liquidado, mas que não tenha efectivamente recebido, comete o crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105.º, n.º 1 do RGIT.

No que concerne o acórdão fundamento entendeu que, como o recebimento faz parte do tipo legal, só comete o crime de abuso de confiança fiscal do artigo 105.º, n.º 1 e 2 do RGIT, quem não entregar ao Estado, no prazo legalmente fixado, o montante de imposto que efectivamente recebeu no concreto período em causa.

Por seu turno, o acórdão recorrido entendeu que comete o crime de abuso de confiança fiscal o arguido que não entregar à administração tributária prestação tributária deduzida nos termos da lei e a que estava legalmente obrigado, mesmo que não tenha efectivamente recebido tais valores, porquanto o recebimento não faz parte do tipo.

Em abono da posição que defende refere, em termos de argumentário, o acórdão fundamento:

1) O sujeito passivo tributário que liquida na factura e recebe o IVA é um fiel depositário da prestação tributária podendo, em cada declaração, apurar um saldo nulo de imposto a entregar, ou um saldo positivo que lhe seja favorável. O que o agente económico tem de entregar é o eventual saldo que, nessa contabilidade, exista a favor do Estado.

2) Não se encontra, no quadro do IVA, uma prestação tributária deduzida, cuja retenção (omissão de entrega), tal como se encontra prevista no artigo 105.º, n.º 1 do RGIT, seja merecedora de tutela criminal.

3) No âmbito do IVA, trata-se de dedução de imposto relativamente ao imposto que o sujeito passivo tem a receber nos termos dos artigos 19º a 25º do CIVA, mas não em qualquer situação em que o sujeito passivo tenha de entregar imposto que tenha sido deduzido. Na concretização do direito à dedução, os sujeitos passivos não têm de entregar à administração tributária a prestação tributária que deduziram, mas, pelo contrário, apenas têm de fazer a entrega do imposto na medida em que excede o IVA a cuja dedução têm direito.

4) A norma a aplicar é o artigo 105.º, n.º 2, do RGIT, que estabelece uma extensão do tipo previsto no n.º 1 aos casos de não entrega de IVA que tenha sido recebido.

5) Se o tipo legal do abuso de confiança fiscal pressupõe necessariamente a existência de uma relação fiduciária que se estabelece entre o Estado e os agentes económicos, só existe desvalor da acção (omissão) quando o agente que, tendo efectivamente recebido o IVA, o liquidou, recebeu e detém omitida a sua entrega ao Estado.

6) Se a prestação tributária não chegou a ser recebida e retida não há possibilidade de cumprimento da obrigação de entrega, nem existe depositário legal, pelo que não pode haver quebra de confiança, nem conduta censurável.

7) A atribuição de dignidade penal à omissão de entrega de quantia não recebida significaria uma insustentável violação da proibição de punição de uma conduta sem culpa.

8) O crime de abuso de confiança fiscal tem como um dos seus elementos objectivos a dedução ou o recebimento da prestação tributária.

9) Assim, só comete o crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelo artigo 105.º n.º 1 e 2 do RGIT, quem não proceder à entrega ao Estado, no prazo legalmente fixado, do montante de imposto que efectivamente recebeu no concreto período em causa.

Em suporte da sua tese chama à colação na área da jurisprudência:- Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 22.01.2014, procº 49/08.5 IDAVR.C2, www.dgsi.pt; Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 22.04.2013, procº 520/11.1 IDBRG.G1, www.dgsi.pt,- Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 18.03.2013, procº 412/11.4 IDGRG.G1, www.dgsi.pt;- Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 28.03.2012, procº 1133/10.0 IDLRA.C1, www.dgsi.pt;- Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 29.02.2012, procº 1638/09.6 ID;LRA.C1, www.dgsi.pt;- Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 09.06.2005, procº 203/04-1, www.dgsi.pt;- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13.12.2001, 01P3749, sumário disponível em www.dgsi.pt:- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20.05.1999, procº 276/99; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 02.07.1998, CJ, acórdãos do STJ, ano VI, tomo II, 1998, pág. 230. e da doutrina:- Susana Aires de Sousa, Os Crimes Fiscais, Análise Dogmática e Reflexão Sobre a Legitimidade do Discurso Criminalizador, Coimbra Editora, 2006;- Alfredo José de Sousa, Infracções Fiscais Não Aduaneiras, 3ª edição, Anotada, Livraria Almedina Coimbra, 1998; Isabel Marques Silva, Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Paulo de Pitta e Cunha, Vol. II, Economia, Finanças Públicas e Direito Fiscal, Almedina, Nullum Crimen, Nulla Poena, Sine Lege Praevia.;- Augusto Silva Dias, ainda no domínio do RIFNA, Os Crimes de Fraude Fiscal e de Abuso de Confiança Fiscal: Alguns Aspectos Dogmáticos e Político-Criminais.;- Américo Taipa de Carvalho, O Crime de Abuso de Confiança Fiscal, Coimbra Editora.;- Jorge Lopes de Sousa e Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias, Anotado, 2008, Áreas Editora.;- Nuno Lumbrales, O abuso de confiança Fiscal no Regime Geral das Infracções Tributárias, Fiscalidade, n.º 13/14.

Por seu turno o acórdão recorrido suporta-se nas seguintes premissas:

1) No IVA o arguido actua como substituto do devedor originário (adquirente dos bens ou serviços) sendo ele a pessoa a quem a lei impõe o dever de praticar actos tributários em nome do credor estatal.

2) Ao nível da interpretação literal do preceito incriminador em causa, o "recebimento" não consta do tipo incriminador como seu elemento típico.

3) Na lógica do sistema fiscal a dívida de IVA de um determinado período não tem de ser necessariamente paga pelas "forças financeiras" da empresa angariadas no período a que a dívida diz respeito, podendo sê-lo com o dinheiro recebido noutros períodos, anteriores ou posteriores, com crédito bancário, com venda de bens da empresa, com suprimentos dos sócios, etc.

4) O direito penal tributário não é "direito penal de justiça" no sentido de direito penal clássico em que está em causa a protecção das principais referências éticas e axiológicas da comunidade, mas direito penal secundário no sentido de que pretende sobretudo o reforço da garantia de execução das finalidades dos Estados modernos, sem particulares fundamentos axiológicos, como é o caso da cobrança de impostos.

5) A perspectiva de que o recebimento é elemento típico deste tipo legal de crime abre uma autêntica "caixa de pandora" relativamente à garantia daquelas finalidades.

6) E tal perspectiva não pondera que o IVA devido às finanças é uma relação dinâmica entre IVA cobrado aos clientes do contribuinte e o IVA pago pelo contribuinte aos seus fornecedores. Se existem situações em que o IVA liquidado não é recebido até à data do seu pagamento, elas coexistem com situações em que o contribuinte também não pagou IVA aos seus fornecedores. E tal como declara IVA liquidado aos seus clientes, mas não recebido, também abate nesse "deve" o "haver" dos montantes de IVA que os seus fornecedores lhe liquidaram e que ainda não pagou.

7) Uma vez que o recebimento não faz parte do tipo, ainda que não tenha recebido os valores deduzidos, comete o crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. no artigo 105.º, n.º 1, do RGIT, o arguido que não entregar à administração tributária prestação tributária deduzida nos termos da lei e a que estava legalmente obrigado.

Fundamenta-se, em termos jurisprudenciais nas seguintes decisões; Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 24.10.2012, procº 314/09.4 IDAVR.C1, www.dgsi.pt;- Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 21.09.2011, procº 142/09.7 IDCBR.C1, www.dgsi.pt;- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 04.02.2009, procº 11036/2008 - 3, www.dgsi.pt;- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 01.10.2008, procº 0842659, www.dgsi.pt;- Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19.12.2006, procº 3360/2006-5, www.dgsi.pt;- Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 20.11.2006, procº 1796/06-2, www.dgsi.pt

O Exº Mº Sr. Procurador-Geral Adjunto apresentou alegações concluindo que:

1- O IVA, como os demais impostos, constitui um dever fundamental do cidadão, sendo o contributo indispensável que possibilita concretizar a ideia redistribuição de riqueza e de solidariedade social acolhidas na Constituição.

2- O IVA visa tributar todo o consumo de bens materiais e serviços, abrangendo, na sua incidência, todas as fases do circuito económico, com a base tributável limitada ao valor acrescentado em cada uma.

3- A divida tributária de cada operador económico é calculada pelo método de crédito de imposto segundo o qual, aplicada a taxa ao valor global das transacções da empresa em determinado período, deduz-se ao montante assim obtido o imposto por ela suportado nas compras desse mesmo período, revelado nas respectivas facturas de aquisição. O resultado corresponde ao montante a pagar ao Estado.

4- Sendo o IVA um imposto sobre o consumo final em que os agentes económicos têm o dever de o fazer repercutir sobre os adquirentes de bens ou serviços, são estes últimos os verdadeiros contribuintes de facto ou devedores originários do imposto de que aqueles são substitutos tributários.

5- No IVA, a prestação tributária deduzida é a suportada pelo sujeito passivo e entra, como elemento a subtrair, no cálculo da prestação tributária a entregar. Daí que o IVA a entregar, nos casos em que existe e foi exercido o direito à dedução, é, não a prestação tributária deduzida nos termos da lei, mas a diferença positiva entre o IVA liquidado pelo sujeito passivo aos adquirentes dos seus bens ou serviços e o IVA que suportou.

6- Deste modo, não correspondendo o IVA a entregar "à prestação deduzida nos termos da lei", a conduta do agente que não entregar prestação tributária de IVA não se inscreve, face ao princípio da tipicidade e da legalidade, no n.º 1 do artigo 105.º do RGIT.

7- Verificando-se que no IVA existe a obrigação legal de liquidar e de entregar ao Estado, a omissão de entrega preenche a previsão do n.º 1 e 2 do artigo 105.º, do referido diploma legal.

8- E, de harmonia com o n.º 2, o "recebimento" é elemento típico do crime.

9- Quando o legislador considera dotado de dignidade penal certo bem jurídico, a permanência da norma incriminatória na ordem jurídica será determinada pela absoluta indispensabilidade de tutela penal: a necessidade da pena e as inerentes razões de prevenção geral e especial com vista à protecção do bem jurídico.

10- No direito penal económico terá sempre de haver uma essencial correspondência de sentido entre a ordem legal dos bens jurídicos-económicos e a ordem axiológica constitucional, sob pena de inconstitucionalidade.

11- Tal como no direito penal comum, o ponto de partida da fundamentação da pena é sempre a ideia de prevenção geral positiva ou de integração, não podendo a intervenção do direito penal ocorrer por motivos estranhos a razões de política criminal.

12- A razão da tipificação do crime de abuso de confiança fiscal reside no facto de o agente ficar investido na posição de fiel depositário e não entregar (no cumprimento dos deveres de cooperação e de colaboração com a administração) as quantias recebidas, o que gera uma quebra de confiança, na qual radica o desvalor da acção que justifica a intervenção do direito penal.

13- Não pode ser imputada responsabilidade criminal, ao sujeito passivo, por não conseguir, por motivos alheios à sua vontade, concretizar a cobrança efectiva do imposto ao adquirente do bem ou do serviço, nem tal responsabilidade se pode fundamentar no facto de este não assumir o pagamento do imposto com o seu próprio património.

Consequentemente, acompanhando a solução do acórdão fundamento, propõe que o Conflito de Jurisprudência existente entre os acórdãos da Relação de Lisboa, de 15 de Maio de 2014 (recorrido) e de 21 de Novembro de 2013 (fundamento), seja resolvido nos seguintes termos:

«A omissão de entrega, total ou parcial, à administração tributária, de prestação tributária de valor superior a (euro) (euro) 7.500, relativa a quantias provenientes de IVA, em relação às quais haja obrigação de liquidação e que tenham sido liquidadas, só preenche o crime de abuso de confiança fiscal, do artigo 105.º, n.º s 1 e 2 do RGIT, se o agente as tiver, efectivamente, recebido.»

Igualmente o recorrente apresentou alegações concluindo que:

1. O presente recurso tem como objecto a fixação de Jurisprudência, proveniente da existência de dois Acórdãos em oposição entre si, porque com soluções opostas, proferidos ambos pelo Tribunal da Relação de Lisboa, relativamente à mesma questão de Direito.

2. A questão de Direito com soluções opostas resume-se à (in)existência do critério de apropriação do Tributo no Crime de Abuso de Confiança Fiscal, no regime estabelecido no artigo 105º do R.G.I.T.;

3. Este artigo determina o abuso de confiança, como um crime de resultado, praticado na forma omissiva, contendo uma presunção legal (juris et de jure) que impede a exclusão do elemento subjectivo do tipo legal e respectiva ilicitude;

4. Contudo, e por via do disposto no art. 73º da LGT, as normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário;

5. Constando provado em juízo sobre a inexistência do efectivo recebimento do imposto, deverá concluir-se que não se encontra preenchida a moldura penal prevista no artigo 105º do RGIT, por inexistência de constituição da relação tributária enquanto fiéis depositários da prestação tributária;

6. O Acórdão Recorrido consignou que "Por conseguinte, tratando-se o crime de abuso de confiança fiscal de um crime omissivo, o pagamento do IVA liquidado e declarado à Administração Fiscal, é exigível assim que decorra o prazo para o efeito, tenha ou não o sujeito tributário recebido a quantia do cliente/devedor; contrariamente ao que defende o recorrente."

7. No entanto e respeitosamente não perfilha o Recorrente do mesmo entendimento que o Acórdão Recorrido, perfilhando, pelo contrário, os fundamentos defendidos na defesa que apresentou nos articulados, bem como diversa doutrina e jurisprudência que sufraga no sentido de que, "(...)., no caso do IVA, só comete o crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105º do RGIT, aquele sujeito passivo que tendo efectivamente recebido o montante devido pela cobrança do imposto e esteja por isso obrigado à sua entrega ao Estado, o não faça no prazo legalmente fixado para tal";

8. E é neste sentido que o Acórdão Fundamento se expressa, perante a mesma questão de Direito aplicada em situações deveras equitativas e com soluções completamente antagónicas - a condenação e a absolvição;

9. Há igualmente expressão Doutrinária no sentido de que o tipo legal do art. 105º do RGIT não se encontra preenchido quando a omissão da entrega da diferença do IVA liquidado ao Estado/Administração se deve à não recepção do mesmo, pelo que não opera a retenção na fonte nem se constitui fiel depositário.

10. A Jurisprudência que acompanha este entendimento é próspera: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-12-2011, processo 01P3749, rel. Cons.º Hugo Lopes, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 27-6-2001, proc.º n.º 127/2001, rel. Ferreira Diniz, de 15-12-2010, proc.º n.º 24/06.4IDGRD, rel. Mouraz Lopes (cfr.Colectânea Jurisprudência, Ano XXXV, V, 2010 p. 61) e de 29-2-2012, proc.º n.º 1638/09.6IDLRA.C1, rel. Paulo Guerra, o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 3-12- 2009, proc.º n.º 1358/06.3TDLSB.E1, rel. Fernando Ribeiro Cardoso, os acórdãos deste Tribunal da Relação de Guimarães de 9-6-2005, proc.º n.º 203/04-1, rel. Ricardo Silva, de 13-6-2011, proc. n.º 137/09.0IDBRG, rel. Fernando Ventura (cfr. Colectânea de Jurisprudência Ano XXXVI, 2011, III, p. 299), de 3-12-2012 proc.º n.º 103/11.6IDBRG.G1, rel. Fernando Monterroso e de 18-3-2013, proc.º n.º 412/11.4IDGRG.G1, rel. João Lee Ferreira, todos in www.dgsi.pt; Ac. Rel. Évora, de 2013-11-19 (Rec. n.º 95/08.9IDFAR.E2, rel. António João Latas, in www.dgsi.pt); Ac. Rel. Évora, de 2013-09-17 (Rec. n.º 152/10.1IDSTR.E1, rel. José Maria Martins Simão, in www.dgsi.pt); Ac. Rel. Évora, de 2013-09-10 (Rec. n.º 346/09.2IDSTB.E1, rel. António João Latas, in www.dgsi.pt);

11. É fundamental distinguir na presente questão de oposição de julgados a obrigação fiscal de um crime fiscal;

12. O dever fiscal existe. Prevalecerá sempre sobre o recebimento ou não recebimento do tributo pelos adquirentes dos serviços;

13. Contudo, questão diversa é se tal incumprimento do dever fiscal é necessariamente um crime, quando não há efectivo pagamento desse dinheiro (e IVA) pelos seus clientes devedores da factura;

14. Não goza de protecção penal o dever fiscal de entrega de IVA não recebido, pois o recebimento da prestação tributária é pressuposto necessário e obrigatório para aferir a ilicitude e o dolo e consequentemente, a tipicidade do crime de abuso de confiança fiscal.

15. Os fins do Estado têm de ser escrupulosamente cumpridos, mas não se consigna igualdade quando os fins dos Cidadãos são marginalizados em detrimento da salvaguarda da Administração;

16. O não recebimento efectivo do IVA determina a atipicidade do crime de abuso de confiança fiscal nos termos do artigo 105º do RGIT.

17. Torna-se fundamental uniformizar a jurisprudência para uma justa e correcta aplicação da lei no que concerne ao pressuposto de recebimento efectivo do tributo para a concretização do tipo legal do crime de abuso de confiança fiscal previsto no artigo 105º do RGIT.

18. Face ao exposto, a Recorrente acompanha a solução do Acórdão Fundamento, propondo que o conflito de Jurisprudência entre os acórdãos da Relação de Lisboa, de 15/05/2014, no âmbito do processo 169/09.9IDFUN.L2 (acórdão recorrido) e de 21/11/2013, no âmbito do processo 22/10.3IDFUN.L1 (acórdão fundamento) seja resolvido nos seguintes termos:

"No caso do IVA, só comete o crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105º do RGIT, aquele sujeito passivo que tendo efectivamente recebido o montante devido pela cobrança do imposto e esteja por isso obrigado à sua entrega ao Estado, o não faça no prazo legalmente fixado para tal."

Os autos tiveram os vistos legais.

*

Cumpre decidir

I

Este Supremo Tribunal de Justiça é novamente convocado para se pronunciar sobre questão suscitada pela interpretação de um dos segmentos em que se decompõe o tipo legal previsto, e punido, nos termos do artigo 105 do RGIT. Equaciona-se agora uma das diferentes questões que têm sido suscitadas pela diversa, e sucessiva, conformação com que o legislador modelou os diferentes tipos legais inscritos no direito penal fiscal e articulou o seu relacionamento recíproco, originando a qualificativa da "irrequietude" atribuída por alguns autores. (1)

Em termos concretos somos agora interpelados para o tema da necessidade, ou não, do prévio recebimento do imposto sobre o valor acrescentado deduzido como elemento constitutivo do tipo legal do crime de abuso de confiança fiscal previsto, e punido, nos referidos termos.

Neste tipo legal de crime o objecto da omissão de entrega, total ou parcial, é a prestação tributária, conceito constante do artigo 1.º n.º 1, alínea a) e definido no artigo 11.º alínea a), do Regime Geral das Infracções Tributárias o qual inclui os impostos e outros tributos cuja cobrança caiba à administração tributária, abrangendo o artigo 105.º três tipos de prestações pecuniárias cuja não entrega faz recair sobre o agente a responsabilidade penal por tal crime - para além da prestação tributária deduzida nos termos da lei, prevista no n.º 1, o objecto é "alargado" pela definição extensiva do n.º 2 e do n.º 3 (aqui abrangendo prestações com natureza parafiscal) do citado preceito legal.

No normativo sancionador estão em causa créditos de impostos ou de tributos fiscais, ou parafiscais devidos ao Estado, estabelecendo-se uma relação entre o Estado representado pela Administração Fiscal, enquanto sujeito activo da relação jurídica tributária e titular do direito de exigir o cumprimento das obrigações tributárias, ou seja, do crédito do imposto e o sujeito passivo que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, como substituto ou como responsável (cfr. artigos 18.º (sujeitos da relação jurídica tributária), 20.º (substituição tributária), 28.º (responsabilidade em caso de substituição tributária) e 34.º (retenção na fonte) da Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei 398/98, de 17-12, republicado em anexo à Lei 15/2001.

O delito em causa pressupõe assim, na maior parte das situações relevantes, uma relação em que convergem três entidades: o Estado-Administração Fiscal, titular do crédito do imposto; o contribuinte originário propriamente dito, que é o sujeito substituído, e, por último, um terceiro, o substituto, o único sujeito em posição de cometer o crime.

Aprofundando a natureza do crime em apreço dir-se-á que a conduta omissiva é o elemento central do abuso de confiança fiscal» pois que "ao não se exigir como elemento típico do crime de abuso de confiança fiscal a apropriação, mas a mera falta de entrega, não deixa dúvidas para que se considere que se trata da incriminação de uma omissão pura".

A omissão verifica-se em relação à prestação tributária deduzida que o infractor estava obrigado a entregar ou em relação à qual, tendo sido recebida, existia igualmente a obrigação de entrega nos termos da lei. Nomeadamente são três as prestações tributárias cuja omissão de entrega releva no crime de abuso de confiança fiscal, fazendo incidir sobre o agente a respectiva responsabilidade penal:

Prestação tributária deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar;

Prestação tributária que foi deduzida por conta daquele (exemplo: retenção na fonte em sede de IRS), bem como a que, tendo sido recebida, haja obrigação legal de liquidar (exemplo: IVA)

Prestação deduzida que tenha natureza parafiscal e desde que possa ser entregue autonomamente. (2)

A perspectiva analítica destas três situações imprime a conclusão de que o artigo 105º do RGIT pretende salvaguardar, essencialmente, situações de substituição tributária.

Precisando o conceito de substituição tributária refere Ferreira dos Reis que «devedor substituto» é aquele sujeito a quem a lei comina o dever de praticar, em nome do Estado ou outro ente público, actos tributários em nome do credor estatal. (...) a partir do momento em que a pratica os actos tributários, cuja prática o Estado lhe comina, o devedor substituto é que passa a figurar como devedor perante o Estado, e "ipso facto", o devedor directo fica eximido dessa obrigação. (3)

A substituição tributária verifica-se quando, por imposição da lei, a prestação tributária é exigida a pessoa diferente do contribuinte. Na legislação portuguesa está prevista no artigo 20º, n.º 1 da LGT, relativamente à qual se pronuncia Susana Aires de Sousa afirmando que o «n.º 2 daquele artigo reconduz a substituição tributária aos casos em que é usada a técnica de retenção na fonte do imposto devido.» (4). A substituição surge sempre que se determine a obrigação do imposto, não em relação ao sujeito no qual se verifica o pressuposto de tributação (o contribuinte), mas a um terceiro que ocupará na relação jurídica a posição de sujeito passivo.

Existe nestes casos, a deslocação da responsabilidade de entrega do tributo do contribuinte (substituído) para um terceiro (substituto). O n.º 2 da mesma disposição legal acrescenta que a substituição tributária "é efectivada através do mecanismo da retenção na fonte", limitando, assim, aquela figura jurídica aos casos em que a cobrança de imposto opera dessa forma. (5)

Tal fisionomia substitutiva enquadra-se perfeitamente no funcionamento do IVA, objecto específico da presente decisão, cujo funcionamento opera pelo método do crédito de imposto, assumindo o sujeito passivo a qualidade de devedor ao Estado pelo valor do tributo que factura aos seus clientes, nas vendas efectuadas ou nos serviços prestados em determinado período (imposto liquidado ou imposto a favor do Estado) e, em contrapartida, é credor do Estado pelo imposto suportado nos seus inputs, no mesmo período (imposto suportado ou imposto a favor do sujeito passivo). Assim, o sujeito passivo é devedor do montante do tributo facturado (contribuinte de direito) mas assume igualmente as vestes de credor do imposto nas aquisições realizadas. A entrega nos cofres do Estado resume-se ao diferencial, sendo o consumidor final quem suporta o tributo (contribuinte de facto) embora o mesmo seja entregue ao Estado pelo sujeito passivo de IVA (6).

Como referem Jonatas Machado e Paulo Nogueira da Costa "o IVA assenta na distinção entre IVA repercutido, IVA suportado e IVA a pagar. O IVA repercutido é adicionado na factura emitida ao cliente; o IVA suportado corresponde ao IVA que pagamos quando adquirimos um bem ou serviço e o IVA a pagar consiste na diferença entre o IVA repercutido e o IVA suportado.

Por outras palavras, cada empresa paga o IVA relativo ao valor por ela acrescentado ao produto na cadeia produtiva, ao passo que o consumidor paga um imposto que reflecte o valor total do bem. Assim, o funcionamento do IVA é relativamente simples, o que se traduz em custos administrativos e económicos aceitáveis. Todas as empresas são sujeitos passivos de imposto, mas podem deduzir os impostos pagos nas compras de bens e serviços directamente relacionados com a respectiva actividade nos impostos devidos pelas vendas" (7)

O imposto devido é apurado através da dedução do IVA pago nas aquisições (necessárias ao processo de produção e distribuição) ao IVA cobrado nas operações activas realizadas (transmissões ou prestações de serviços). O resultado final é a imputação a cada sujeito passivo da responsabilidade de entregar ao Estado o imposto sobre o valor que acrescentou ao processo de produção e distribuição. (8)

Em síntese, pode-se afirmar que o citado artigo 105º visa situações de substituição tributária configurando um crime omissivo, de mera inactividade, em que a omissão integradora do ilícito tem a seu montante uma acção consubstanciada numa conduta legal de prévia dedução que conduz a que o substituto se converta num depositário das quantias deduzidas, assumindo-se como um intermediário no processo de arrecadação da receita e constituindo-se na obrigação de dar o devido destino, traduzindo-se a omissão subsequente na violação da obrigação de entrega do retido.

O mesmo aplica-se a todos os tributos e impostos, com excepção das contribuições devidas à segurança social, aplicando-se a estas o artigo 107º do RGIT.

II

O ilícito penal configura-se como a relação de desconformidade do facto com a ordem jurídica, como a sua contrariedade com os tipos legais de crime ou como "a negação de valores, interesses ou bens jurídico-criminais". A determinação desses interesses, e bens relevantes, é realizada através da tipicidade penal que constitui um dos corolários constitucionais do princípio da legalidade no direito penal.

Questão de interpretação da lei cuja elucidação deverá resultar de uma conjugação do conteúdo concreto do preceito em causa com apelo ao elemento racional e histórico. Na verdade, como refere Ferrara, toda a norma tem um objectivo a atingir, quer cumprir certa função e finalidade, para cuja concretização foi criada. A norma descansa num fundamento jurídico, numa ratio iuris, que indigita a sua real compreensão e é necessário que a mesma seja entendida no sentido que melhor responda à consecução do resultado que quer obter, pois que a lei se comporta para com a ratio iuris, como o meio para com o fim: quem quer o fim quer também os meios.

Para se determinar esta finalidade prática da norma, é preciso atender às relações da vida, para cuja regulamentação a norma foi criada. Devemos partir do conceito de que a lei quer dar satisfação às exigências económicas e sociais que brotam das relações (natureza das coisas). E, portanto, é necessário atentar, não só no mecanismo técnico das relações, como, também, nas exigências que derivam daquelas situações, procedendo-se à avaliação dos interesses em causa. (9)

A compreensão do normativo em causa implica, assim, em primeira linha a identificação do bem jurídico protegido com a incriminação o que constitui questão essencial quando se inicia o estudo de um tipo legal, uma vez que, como refere Jeschek "o bem jurídico constitui o ponto de partida e a ideia que preside à formação do tipo" (10).

Na verdade, e repetindo Roxin, "A missão do direito penal é garantir aos cidadãos uma convivência pacífica e livre, garantindo todos os direitos estabelecido legal e constitucionalmente. Se esta missão é denominada em termos de síntese de protecção de bens jurídicos estes devem ser entendidos como todas as circunstâncias e finalidades que são necessárias para o livre desenvolvimento do indivíduo, para a realização de seus direitos fundamentais e para o funcionamento do Estado."(11 12)

A contribuição de uma tal teoria do bem jurídico, na garantia da liberdade, é que as leis penais são ilegítimas quando têm como objecto um comportamento que não afecte nem o livre desenvolvimento do indivíduo nem o seu relacionamento em termos sociais (Por exemplo, a administração da justiça). Neste sentido, refere Frister (13) citado por Roxin que: "Tanto os bens jurídicos individuais como os interesses jurídicos da comunidade servem em última análise, o potencial de desenvolvimento do indivíduo. Na sua opinião, a diferença estaria tão-somente em que enquanto a lesão de um direito legal individual afecta a possibilidade de desenvolvimento de um ser humano em particular, a lesão de um bem jurídico da comunidade afecta imediatamente as possibilidades de desenvolvimento de todas as pessoas. Daqui deduz o mesmo autor que o espaço de configuração do legislador é limitado na medida em que um comportamento que não afecta de forma alguma as possibilidades de desenvolvimento dos outros não deve ser valorizado como ilícito penal.

De acordo, ainda, com o Autor supracitado, e no intuito de alcançar soluções mais concretas, teremos de recorrer à teoria dos três níveis de protecção dos direitos legais, desenvolvido por Manfred Heinrich (14), a qual deve ser equacionada em relação a cada uma das normas penais de duvidosa legitimidade e que se consubstancia na interrogação sobre o que se pretende proteger, contra quem e por quê. Só no fim desta análise é permitido concluir se o comportamento incriminado afecta o livre desenvolvimento do individuo como tal e em sociedade.

Com base nestes pontos de partida, o conceito de bem jurídico certamente é determinante para validar a legitimidade das regras criminais. Como refere Mir Puig no conceito de interesse jurídico: "O que é verdade é que todos os princípios gerais exigem uma concretização realização através debate público. Princípios como a democracia ou o princípio da igualdade são por tal forma gerais, que permitem completamente diferentes concreções, mas nenhuma pessoa razoável chega à conclusão de que era melhor não confiar em tais princípios." (15)

A necessidade de uma lesão, ou de colocação em perigo de bens jurídicos, não é, de todo, o único princípio a atender em sede de limitação do alcance da criminalização. Uma vez que também o direito civil, o direito público e, especialmente, o direito administrativo sancionatório protegem bens jurídicos nos casos em que ocorre a afectação dum bem jurídico coloca-se a questão de saber se a sua protecção deve ser realizada pelo Direito Penal ou por outra regulamentação legal (por exemplo: indemnização; medidas de controle).

A maior parte da doutrina considera que a ameaça de punição, como castigo, só deve entrar em ordem de consideração quando as regulações de outro tipo são insuficientes. O princípio da subsidiariedade tem um peso equivalente ao princípio da protecção dos bens jurídicos e concorre com ele na definição duma política criminal. Consequentemente, a tarefa do direito penal deve ser caracterizado como direito penal de protecção subsidiária de bens jurídicos.

Igualmente é exacto que o princípio da protecção dos bens jurídicos e o princípio da proporcionalidade, se complementam, como descrito no Comentário Schönke /Schröder (16): quando refere que, quanto à questão de quais as finalidades que devem ser perseguidas com o direito penal, a teoria do bem jurídico e os requisitos legais e constitucionais entrelaçam-se; o princípio da proporcionalidade como ponto de referência pressupõe um bem a proteger para o qual a teoria do bem jurídico pode oferecer pontos de partida.

Citado por Roxin, igualmente Kaspar (17) vem, no seu ensaio sobre o princípio da proporcionalidade, concluir que é necessário combinar os dois princípios Neste contexto, na sua opinião, "importa integrar os princípios materiais do bem jurídico, sem quaisquer rupturas no exame jurídico constitucional. Aqui, essa compreensão do princípio da proporcionalidade evita a crítica de não oferecer quaisquer critérios para o conteúdo das leis criminal. "Na verdade, não é possível uma concepção diversa pois que a proporcionalidade não existe por si própria, mas deve ser necessariamente relacionada com os objectivos pretendidos pela intervenção do Estado para os quais a dimensão e protecção dos bens jurídicos representam um papel importante.

É também a noção de bem jurídico que informa o discurso de Figueiredo Dias quando refere que um bem jurídico político criminalmente tutelável existe onde se encontre reflectido num valor jurídico-constitucionalmente reconhecido em nome do sistema social total e que, deste modo, se pode afirmar que "preexiste" ao ordenamento jurídico-penal. O que por sua vez significa que entre a ordem axiológica jurídico-constitucional e a ordem legal - jurídico-penal dos bens jurídicos tem por força de verificar-se uma qualquer relação de mútua referência... Correspondência que deriva, ainda ela, de a ordem jurídico-constitucional constituir o quadro obrigatório de referência e, ao mesmo tempo, o critério regulativo da actividade punitiva do Estado. É nesta acepção que os bens jurídicos protegidos pelo direito penal devem considerar-se concretizações dos valores constitucionais expressa ou implicitamente ligados aos direitos e deveres fundamentais e à ordenação social, política e económica. É por esta via - e só por ela, em definitivo - que os bens jurídicos se "transformam" em bens jurídicos dignos de tutela penal ou com dignidade jurídico-penal, numa palavra, em bens jurídico-penais. (18)

Uma das notas mais relevantes do direito penal secundário, adianta Figueiredo Dias - e que, como tal, o contrapõe ao e o distingue do direito penal de justiça - a relação de codeterminação recíproca entre o bem jurídico e a conduta típica. Sem que todavia a partir daqui se deva concluir que no direito penal secundário o bem jurídico é um posterius e não um prius, um constituto e não um constituens relativamente à estrutura do ilícito e à matéria proibida. Exacto é apenas que. nestas hipóteses (v. g., num crime económico), a matéria proibida assume uma relevância sistémica e funcional muito maior do que em crimes definitivamente consolidados à escala planetária (como é o caso do homicídio); e que essa maior relevância não deve ser desatendida ou minimizada em sede de hermenêutica e de aplicação do direito. Mas nem por isso o bem jurídico deixa de ser o fundamento e o padrão-crítico do ilícito constituído e serve portanto essencialmente às mesmas funções dos bens jurídicos do direito penal de justiça. (19 20)

Igualmente Costa Andrade acentua esta incindível associação entre o direito penal e os bens jurídicos de eminente dignidade de tutela, emergindo como um desdobramento do princípio constitucional da proporcionalidade, consagrado no artigo 18.º, n.º 2, da CRP (21)

É, também, nessa sequência que o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 83/95, afirma que o instrumentarium penal «há-de limitar-se à defesa das perturbações graves da ordem social e à protecção das condições existenciais indispensáveis ao viver comunitário» (sendo que estamos perante um bem jurídico com dignidade de tutela quando a conduta que o lese mereça, pela sua danosidade social, um «juízo qualificado de intolerabilidade social» (22) Daqui decorre que «toda a norma incriminatória na base da qual não seja susceptível de se divisar um bem jurídico-penal claramente definido é nula, porque materialmente inconstitucional» (23)

A violação de um bem jurídico não basta, assim, por si para desencadear a intervenção antes se requerendo que esta seja absolutamente indispensável à livre realização da personalidade de cada um na comunidade. O direito penal constitui a ultima ratio da política social e a sua intervenção é de natureza definitivamente subsidiária. Quando tal não suceda aquela intervenção pode implicar uma contrariedade ao princípio da proporcionalidade sob a precisa forma de violação dos princípios da subsidiariedade e da proibição de excesso. (24)

Neste sentido, entende-se que um preceito penal que não tem subjacente qualquer protecção a bens jurídicos pode, e deve, ser entendido como inconstitucional na medida em que é inapropriado, excessivo e desproporcionado para a liberdade do cidadão.

III

Concretizado o postulado de que o conceito de bem jurídico protegido é um dos elementos chave da interpretação normativa que nos propomos efectuar importa agora afinar a procura, transpondo para o domínio específico dos crimes fiscais a concretização do mesmo conceito.

No que concerne, e como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 05-09-2012 relativamente à interpretação das leis ficais, determina a LGT no art. 11º, que "Na determinação do sentido e alcance das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis" (nº 1). Logo a seguir, no seu n.º 2 determina-se que "Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei". Finalmente, no n.º 3 dispõe-se que "Persistindo dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários."

Assim sendo, também no direito fiscal (25) se aplica a norma fundamental da hermenêutica jurídica radicada no art. 9º do Código Civil que incide sobre a interpretação da lei. (26)

É nessa lógica que, também neste domínio, têm aplicabilidade as palavras de Manuel de Andrade (27) quando afirmava que interpretar uma lei não é mais do que fixar o seu sentido e o alcance com que ela deve valer, ou seja, determinar o seu sentido e alcance decisivos; o escopo final a que converge todo o processo interpretativo é o de pôr a claro o verdadeiro sentido e alcance da lei.

Interpretar em matéria de leis, quer dizer não só descobrir o sentido que está por detrás da expressão, como também, dentro das várias significações que estão cobertas pela expressão, eleger a verdadeira e decisiva. (28 29) Assim, e repetindo as palavras de Baptista Machado, a letra assume-se, naturalmente, como o ponto de partida da interpretação, cabendo-lhe, desde logo, uma função negativa, qual seja, "a de eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio, ou, pelo menos, qualquer correspondência ou ressonância nas palavras da lei" (30).

Para apreender o sentido da lei, a interpretação socorre-se, como refere Francesco Ferrara de vários meios: "Em primeiro lugar busca reconstruir o pensamento legislativo através das palavras da lei, na sua conexão linguística e estilística, procura o sentido literal. Mas este é o grau mais baixo, a forma inicial da actividade interpretativa. As palavras podem ser vagas, equívocas ou deficientes e não oferecerem nenhuma garantia de espelharem com fidelidade e inteireza o pensamento: o sentido literal é apenas o conteúdo possível da lei: para se poder dizer que ele corresponde à mens legis, é preciso sujeitá-lo a crítica e a controlo." (31) Ora, nesta tarefa de interligação e valoração que acompanha a apreensão do sentido literal, intervêm elementos lógicos, apontando a doutrina elementos de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica.

O elemento sistemático compreende a consideração de outras disposições que formam o complexo normativo do instituto em que se integra a norma interpretada, isto é, que regula a mesma matéria (contexto da lei), assim como a consideração de disposições legais que regulam problemas normativos paralelos ou institutos afins (lugares paralelos). Compreende, ainda, o lugar sistemático que compete à norma interpretada no ordenamento global, assim como a sua consonância com o espírito ou unidade intrínseca de todo o ordenamento jurídico. O elemento histórico, por seu turno, compreende todas as matérias relacionadas com a história do preceito material da mesma ou de idêntica questão, as fontes da lei e os trabalhos preparatórios.

O elemento racional, ou teleológico, consiste na razão de ser da norma (ratio legis), no fim visado pelo legislador ao editar a norma, nas soluções que tem em vista e que pretende realizar. A propósito deste critério realça Ferrara que "É preciso que a norma seja entendida no sentido que melhor responda à consecução do resultado que quer obter. Pois que a lei se comporta para com a ratio iuris, como o meio para com o fim: quem quer o fim quer também os meios.

Para se determinar esta finalidade prática da norma, é preciso atender às relações da vida, para cuja regulamentação a norma foi criada. Devemos partir do conceito de que a lei quer dar satisfação às exigências económicas que brotam das relações (natureza das coisas). E portanto ocorre em primeiro lugar um estudo atento e profundo, não só do mecanismo técnico das relações, como também das exigências que derivam daquelas situações, procedendo-se à apreciação dos interesses em causa (32)

Contrapondo tais critérios à questão que nos é proposta verifica-se que, com a actual entrada em vigor do RGIT, o legislador alterou a estrutura do tipo em referência afastando o elemento «apropriação» e determinando que a conduta incriminada passaria a assumir uma natureza essencialmente omissiva. Na opinião de Nuno Lumbrales denota-se agora um vazio ético do tipo, que tem por base razões pragmáticas e de política criminal, negligenciando-se razões dogmáticas relacionadas com o bem jurídico tutelado. (33)

Sobre a identificação do bem jurídico nesta tipologia criminal, e na opinião do mesmo autor, este é constituído por dois elementos distintos, ou, pelo menos, por um deles: a tutela do erário público e do interesse do Estado na integral obtenção das receitas tributárias, e/ou, por outro lado a tutela dos deveres de cooperação do sujeito passivo para com o credor tributário, entre os quais se contam os que consubstanciam a relação de confiança entre o substituto tributário e aquele credor, designadamente o dever de entrega atempada da prestação tributária.

Como se teve ocasião de acentuar no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência 8/2010, e no que toca a este tema, partimos do pressuposto inarredável de que o Estado social e as suas conquistas no bem-estar da sociedade só são possíveis pelo financiamento proporcionado pelo Estado fiscal ou, como refere Cecília Xavier, «o actual Estado social, de facto, configura-se como um Estado fiscal, significando que as suas necessidades financeiras são essencialmente cobertas pela receita oriunda dos impostos. Esta é, aliás, a nota predominante dos estados sociais de direito».

Em última análise o erário público é a única fonte que financia as diversas actividades do Estado seja qual for a modalidade e o título pelo qual tiver sido recebido no património público. É uma questão de distribuição de receitas de acordo com as tarefas que o mesmo Estado se propõe e as condutas tipificadas sob a epígrafe de crimes tributários colocam sempre em causa o mesmo património ou erário.

A tutela de tal bem jurídico - entendido como «expressão de um interesse, da pessoa ou da comunidade, na manutenção ou integridade de um certo estado, objecto ou bem em si mesmo socialmente relevante e por isso juridicamente reconhecido como valioso» cuja incriminação deriva da própria constelação de valores objecto de tutela constitucional- emana do disposto no artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa. É, pois, à luz de tal arquétipo que Manuel da Costa Andrade, e Susana Aires de Sousa centram a tutela erigida nos artigos 105.º e 107.º do RGIT indistintamente no património público tributário a deduzir-se do «peso do desvalor associado à violação dos deveres tributários, como referente axiológico e ético de legitimação do crime de abuso de confiança fiscal e contra a segurança social». (34)

Podemos afirmar que a generalidade dos crimes tributários visa em última instância proteger realidades patrimoniais afectas a finalidades de direito público: de forma genérica, o erário público e o património da segurança social. Porém, o desenho do respectivo tipo de ilícito não pode ignorar a circunstância de nos encontrarmos no domínio do direito penal e que, assim, a tutela que é concedida apenas se justificar em função duma ofensa do bem jurídico tutelado e não em resultado duma conduta anódina e absolutamente irrelevante em termos axiológico normativos Para além da idoneidade lesiva ou do dano patrimonial efectivo é necessária a demonstração da violação de deveres de colaboração, de lealdade e de informação dos agentes económicos.

No caso concreto, e na questão suscitada, analisando o tipo legal na procura de tal finalidade prática da norma, ou seja, a relação de vida subjacente diremos que o crime de abuso de confiança fiscal tem em vista a protecção do bem jurídico "património fiscal", uma vez que procura "impedir e prevenir o desvio de créditos tributários, punindo-se o agente que violar a específica relação de confiança pelo facto de não entregar à Administração Fiscal as quantias que recebeu e deduziu".

Consequentemente, o crime de abuso de confiança fiscal filia-se numa relação de confiança estabelecida entre o contribuinte, enquanto devedor tributário, e o Estado, enquanto credor tributário, implicando a existência de um vasto conjunto de direitos e deveres por parte de ambos. Segundo Augusto Rodrigues "Há assim neste tipo incriminador a violação de uma relação de confiança institucional do depositário legal perante o seu credor, que reside efectivamente na não entrega do tributo no prazo que a lei lhe impõe, ou seja, vê o credor empobrecido o seu património ao mão receber o tributo a que tem direito, por violação dos deveres legais de entrega por parte do depositário legal, ou seja, pelo rompimento unilateral pelo detentor precário da prestação da relação fiduciária em si depositada pelo Estado-Fisco" (35). Aquela relação é violada, dando oportunidade a que o devedor se apodere de quantias que não lhe pertencem, com um claro e evidente prejuízo para o património do Estado, limitando-o fortemente na sua capacidade para realizar as finalidades públicas que lhe estão confiadas.

Assim sendo, o crime de abuso de confiança fiscal, depende, na sua essência, desta relação de confiança, não visando a Lei "a criminalização da falta de pagamento em si, para a qual já prevê apenas a utilização de mecanismos coercivos em sede de execução fiscal (artigo 148.º e ss do CPPT) mas apenas o sancionamento criminal de comportamentos dolosos dos contribuintes que atentem contra a lealdade e cooperação. (36)

Saliente-se a propósito que a questão do não pagamento do IVA liquidado, mas não recebido, e das suas consequências na tesouraria, e gestão das pequenas e médias empresas, mereceu uma especial atenção de legislador com o DL n.º 71/2013, de 30 de Maio que aprovou, com efeitos a partir de 1.10.13, um regime de contabilidade de caixa em sede de IVA. (37)

O mesmo consagrou um regime estruturado de forma simplificada e opcional, pois tem carácter facultativo e pretende criar um impacto positivo na tesouraria das empresas através do diferimento do momento da exigibilidade do imposto para o momento em que esse imposto venha a ser pago pelo adquirente dos bens ou serviços.

A exigibilidade do IVA devido nas operações activas efectuadas no âmbito deste regime apenas ocorre no momento do recebimento dos clientes. Com este novo regime pretendeu-se criar um impacto positivo na tesouraria das empresas através do diferimento do momento da exigibilidade do imposto para o momento em que esse imposto venha a ser pago pelo adquirente dos bens ou serviços.

Independentemente da sua relevância em termo de cumprimento de obrigações fiscais é por alguma forma contraditório assumir que, para uma categoria de contribuintes, o prévio recebimento seja pressuposto necessário da obrigação tributária de pagamento e para outros tal prévio recebimento seja irrelevante, atribuindo-se uma tutela criminal ao mero não pagamento de quantia não recebida. Isto aconteceria, não por uma diferente relevância axiológico normativa da concreta conduta do contribuinte, mas pela mera categorização em termos fiscais atribuída a este.

Tal elemento de análise poderá não assumir um especial significado em termos interpretativos, mas tem um peso específico na caracterização da fluidez conceptual que acompanha a área concreta do domínio penal fiscal e no especial cuidado que exige a determinação do seu objecto de tutela em relação a cada infracção tipificada.

Face ao exposto, não se vislumbra qual o valor jurídico violado e qual a conduta ilícita merecedora de tutela penal daquele que não entrega ao Estado aquilo que também não recebeu.

IV

Indo um pouco mais além na análise da questão proposta sublinhe-se a necessidade duma separação ou, dito por outras palavras, de uma não confusão entre o que é a obrigação fiscal e a tutela penal.

O facto de existir uma obrigação de pagar impostos incumprida impele a sequente reacção da máquina fiscal com recurso à respectiva execução, mas tal não significa, necessariamente, que o devedor entrou no domínio da violação penal. O não cumprimento da obrigação para com o Estado tem exactamente esse significado e, sob pena duma instrumentalização do direito penal à revelia de princípios e valores, não pode equivaler automaticamente a uma infracção penal.

Importa, assim, não confundir a responsabilidade tributária pelo imposto devido com a responsabilidade penal tributária. O facto gerador da responsabilidade tributária é autónomo da responsabilidade criminal pois que, como refere Germano Marques da Silva «O facto gerador da dívida de imposto existe independentemente da prática de qualquer crime: a obrigação tributária é autónoma relativamente 'responsabilidade penal pela prática de crime tributário e é geralmente proveniente da prática de facto ilícito, ainda que entre a dívida tributária e a responsabilidade pelo crime exista conexão». (38)

Para que o mero incumprimento se transmute em crime é necessário algo mais do que este incumprimento o que só se pode traduzir na existência da violação do valor, ou bem jurídico, como base no qual a norma penal foi construída. No caso concreto do normativo em análise tal valor, como já se referiu, consubstancia-se no desrespeito pela relação de confiança em que assenta a relação fiscal e na circunstância de o arguido não entregar ao estado uma quantia que recebeu como mero substituto.

Mas, sendo assim, nunca se poderá afirmar que existiu tal violação quando a quantia nem sequer foi recebida pois que aí apenas existe um mero incumprimento fiscal e este, por si, não tem relevância axiológico normativa que o erija em bem jurídico carente de tutela penal, salvo se pretendermos utilizar o direito penal como instrumento de coacção.

Reforçando tal entendimento importa referir que a jurisprudência dos Tribunais Tributários, com largo apoio doutrinário, é hoje uniforme no sentido de que não existe infracção contra-ordenacional relativamente à omissão de entrega ao Estado de IVA liquidado, mas não recebido do adquirente da mercadoria ou beneficiário do serviço, pois essa obrigação subsume-se à parte final do nº 3 do art.º 114º do RGIT, e não ao conceito de "prestação tributária deduzida" do n.º 1 do preceito, o qual faz depender a tipicidade do efectivo pagamento do IVA liquidado em factura pelo cliente (cfr. o Ac. do STA de 28-05-2008, proc.º n.º 0279/08; de 18-09-2008, proc.º n.º 483/08 de 15-10-2008; proc.º n.º 481/08, de 11-02-2009; proc.º n.º 578/08, de 18-11-2009; proc.º n.º 0593/09, de 02-12-2009, proc.º n.º 0887/09)

Recorrendo ao argumentário esgrimido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 12-11-2008, proferido no recurso n.º 577/08, refere-se ali que, no âmbito do IVA, se fala de dedução de imposto relativamente ao imposto que o sujeito passivo tem a receber, nos termos dos artigos 19.º a 25.º do CIVA, não se referindo qualquer situação em que o sujeito passivo tenha de entregar imposto que tenha deduzido.

Adianta-se, ainda, que "De facto, no âmbito do referido direito à dedução, os sujeitos passivos não têm de entregar à administração tributária a prestação tributária que deduziram [o imposto que deduziram, à face da definição dada na alínea a) do artigo 11.º do RGIT], mas, antes pelo contrário, apenas têm de fazer entrega do imposto na medida em que excede o IVA a cuja dedução têm direito, isto é, do imposto que não deduziram. Assim, é de partir do pressuposto de que, com a utilização da expressão «prestação tributária deduzida» se pretendeu aludir a todas as situações em que é apurada uma prestação tributária (isto é, no caso, uma quantia de imposto, nos termos do citado art. 11.º do RGIT) pelo sujeito passivo através de uma subtracção de uma quantia global e essa quantia deduzida tem de ser entregue à administração tributária. (39)

No caso do IVA, há obrigação de os sujeitos passivos procederem à sua liquidação e adicionarem o valor do imposto liquidado ao valor das mercadorias ou prestação de serviços, incluindo-o na factura ou documento equivalente, para efeitos da sua exigência aos adquirentes das mercadorias ou aos utilizadores dos serviços (artigos 35.º e 36.º, n.º 1, do CIVA). Nas situações em que não se está perante um acto isolado (...) o art. 26.º, n.º 1, do CIVA impõe a de entrega do montante do imposto apurado (o «imposto exigível») no momento da apresentação das declarações a que se refere o art. 40.º do mesmo Código independentemente de ter sido efectuado pelos adquirentes de bens ou utilizadores de serviços o pagamento da quantia facturada. O regime do artigo 71.º, n.os 8 e 9, relativamente à possibilidade de dedução de imposto respeitante a créditos incobráveis ou de pagamento retardado confirma que a obrigação de pagamento do imposto pelo sujeito passivo não depende de ter sido paga a quantia liquidada pelo adquirente de bens ou utilizador de serviços. Nestas situações, o imposto que deve ser entregue não é o imposto que foi liquidado, mas sim o eventual saldo positivo a favor da administração tributária que se registe após confrontação do volume global do imposto liquidado (recebido ou não) e do imposto que foi pago pelo sujeito passivo aos seus fornecedores ou prestadores de serviços (artigos 19.º a 25.º do CIVA).

Para as situações em que o sujeito passivo recebe de terceiros IVA que liquidou mas não entregou ao fisco, havendo obrigação de o entregar, rege o n.º 3 do artigo 114.º, in fine, que refere a prestação tributária "que, tendo sido recebida, haja obrigação legal de liquidar".

É nessa lógica que esta jurisprudência conclui que a não entrega ao credor tributário da prestação tributária deduzida nos termos da lei, só poderá ser punível com coima, de acordo com o disposto no artigo 114.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, em caso de efectivo recebimento da prestação tributária pelo sujeito passivo.

Tal entendimento tem o suporte de Isabel Marques da Silva, (40) no âmbito do IVA, cerne da convocação para a presente uniformização de jurisprudência, referindo que, em relação à tipificação do crime de abuso de confiança fiscal, não tem aplicação o n.º 1, mas o n.º 2 do artigo 105.º do RGIT, que estabelece uma extensão do tipo nele incluindo também a prestação tributária "(...) que, tendo sido recebida, haja obrigação legal de a liquidar, nos casos em que a lei o preveja". O que permite considerar subsumível no tipo legal de crime a não entrega do IVA liquidado que tenha sido recebido. O recebimento da prestação tributária é, pois, em face do tipo legal de crime, pressuposto essencial do crime de abuso de confiança, sendo o que dever fiscal de entrega de IVA não recebido não goza de protecção penal, por atipicidade do facto

Dentro deste entendimento é linear a conclusão de que da proposta aplicabilidade do n.º 2 do normativo em causa resulta a necessidade de prévio recebimento como elemento do tipo legal de crime.

V

Nesta sequência, entende-se que o crime de abuso de confiança fiscal tem como um dos seus elementos objectivos a dedução ou o recebimento da prestação tributária o que, no âmbito do imposto sobre o valor acrescentado (IVA), significa que o devedor tributário só pode praticar esse crime se tiver recebido o montante da prestação tributária ou seja se esta lhe tiver sido entregue pelo adquirente. O pressuposto do qual se arranca, e constitui denominador comum, é o de que, se o tipo legal do abuso de confiança fiscal pressupõe necessariamente a existência de uma relação fiduciária que se estabelece entre o Estado e os agentes económicos, então só existe desvalor da acção (rectius, desvalor de omissão) quando um agente económico que liquida, recebe e detém precária e temporariamente o imposto, omite a entrega ao Estado-Fisco do IVA efectivamente recebido. (41)

Neste sentido de que no caso do IVA, só comete o crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105º, do R.G.I.T., aquele sujeito passivo que, tendo efectivamente recebido o montante devido pela cobrança do imposto e esteja, por isso, obrigado à sua entrega ao Estado, o não faça no prazo legalmente fixado para tal, se pronunciaram Germano Marques da Silva, Direito Penal Tributário, cit., pág. 244 e nota 93; Susana Aires de Sousa, Os Crimes Fiscais, cit pág. 124; Isabel Marques da Silva, Regime Geral das Infracções Tributárias, cit, págs.169 e 181; Paulo Marques, Infracções Criminais, vol. I, Direcção Geral dos Impostos (Centro de Formação), Lisboa, 2007, págs 138-139 e Paulo Marques, Crime de Abuso de Confiança Fiscal, cit., pág. 75 e págs. 101 e ss.

Concluímos, assim, que a ponderação dos argumentos ora aduzidos em favor da tese sufragada pelo acórdão fundamento impõem conclusão diversa da constante decisão recorrida. Consequentemente, considera-se procedente o recurso interposto e uniformiza-se a jurisprudência nos seguintes termos:

A omissão de entrega total ou parcial, à administração tributária de prestação tributária de valor superior a (euro) 7.500 relativa a quantias derivadas do Imposto sobre o Valor Acrescentado em relação às quais haja obrigação de liquidação, e que tenham sido liquidadas, só integra o tipo legal do crime de abuso de confiança fiscal, previsto no artigo 105 n.º 1 e 2 do RGIT, se o agente as tiver, efectivamente, recebido.

Consequentemente, determina-se o reenvio do processo ao Tribunal da Relação de Lisboa afim de que seja proferida decisão em conformidade.

(1) Andrade, Manuel da Costa; Aires de Sousa, Susana - As Metamorfoses e desventuras de um crime (Abuso de Confiança Fiscal) irrequieto reflexões críticas a propósito da alteração introduzida pela Lei 53ª/2006, de 29 de Dezembro Revista Portuguesa de Ciência Criminal. ISSN 0871-8563. 17:1 (2007) 53-72

(2) Anabela Fernandes Bernardo-Dissertação submetida ao Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa: "Crime Fiscal: «Abuso de Confiança Fiscal - artigo 105 do RGIT2 in disserta%C3%A7%C3%A3o%20Abuso%20de%20Confian%C3%A7a%20Fiscal_vers%C3%A3o%20final.pdf

(3) Ferreira dos Reis, Alcindo - Abuso de Confiança Fiscal Crime ou contra-ordenação? Jan. 2012. Disponível em: http://www.regisconsultorum.pt/abuso.html

(4) Aires de Sousa, Susana - Os Crimes Fiscais Análise Dogmática e Reflexão sobre a Legitimidade do Discurso Criminalizador. Coimbra: Coimbra Editora, 2006.

(5) Sérgio Vasques destaca que "nos casos de substituição tributária é o comprador quem concretiza o facto gerador apresentando-se por isso como sujeito passivo, ao passo que nos casos de repercussão tributária é o vendedor quem concretiza o facto gerador e prefigura o sujeito passivo" (in Manual de Direito Fiscal, Almedina, Coimbra, 2011, p. 341).

(6) Joaquim Miranda Sarmento e Paulo Marques IVA Problemas Actuais pag 80 e seg.

(7) Curso de Direito Tributário, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pp. 258-259).

(8) Joaquim Miranda Sarmento e Paulo Marques IVA Problemas Actuais pag 80 e seg.

(9) Interpretação e aplicação das leis Autor(es): Francesco Ferrara; trad. Manuel A. D. de Andrade Coimbra: Arménio Amado, 1933 obra citada pag 141.

(10) Jeschek, Hans-Heinrich, Tratado de Derecho Penal, Parte General, 4ª Edición, Granada: Comares Editorial, 1993.

(11) Claus Roxin El Concepto de bien jurídico como instrumento de crítica legislativa sometido a examen Revista Electrónica de Ciencia Penal y Criminologia 15-01http://criminet.ugr.es/recpc/15/recpc15-01.pdf

(12) Roxin, Tratado (n. 12) § 2 n.m. 7.

(13) Frister Strafrecht,Allgemeiner Teil 5ª edição pag 29 e seg.

(14) Citado por Roxin, ibidem

(15) Idem

(16) Idem pag 23

(17) (ver documento original)

(18) Direito Penal - Parte Geral, t. I, 2.ª ed., Coimbra Editora, 2007.

(19) Ibidem. Adianta o mesmo Autor que Tal constatação fundamenta uma distinção que a cada dia se revela mais importante para a política criminal e a dogmática jurídico-penal: a distinção entre o chamado direito penal de justiça, direito penal "clássico" ou direito penal primário, de um lado, essencialmente correspondente àquele que se encontra contido nos códigos penais; e de outro lado o direito penal administrativo, direito penal secundário ou direito penal extravagante, por isso contido em leis avulsas não integradas nos códigos penais. A diferença entre estas duas categorias à primeira vista de carácter formal e ocasional, acaba no fundo por radicar essencialmente, de um ponto de vista material, no diferente âmbito de relacionamento do bem jurídico com a ordenação axiológica constitucional.

(20) É nesta lógica que se inscreve Silva Dias quando refere que, a respeito do fundamento concreto da intervenção penal no âmbito do ilícito fiscal e diferentemente do que sucede nos chamados «crimes clássicos», não se apresenta à partida um (ou vários) bens jurídico de contornos definidos, concretamente apreensível, que funcione como constituens da estrutura do ilícito e vincule a uma certa direcção de tutela.-. "O Novo direito Penal Fiscal Não Aduaneiro (Decreto-Lei 20-A/90, de 17 de Janeiro) Considerações Dogmáticas e Político-Criminais", "Direito Penal Económico e Europeu: Textos Doutrinários", Volume II, pág. 263.

(21) Costa Andrade, «A dignidade penal e a carência de tutela penal», RPCC, n.º 2, 1992, p. 184.

(22) É também nesta sede que o Tribunal Constitucional no Acórdão 211/95 refere que a exigência de dignidade punitiva prévia das condutas, enquanto expressão de uma elevada gravidade ética e merecimento de culpa (artigo 1º da Constituição, do qual decorre a protecção da essencial dignidade da pessoa humana), que se exprime no princípio constitucional da necessidade das penas (e não só da subsidiariedade do direito penal e da máxima restrição das penas que pressupõem apenas, em sentido estrito, a ineficácia de outro meio jurídico),

(23) Figueiredo Dias, ob. cit., p. 126.

(24) Como se referiu tal sucederá, p. ex., quando se determine a intervenção penal para protecção de bens jurídicos que podem ser suficientemente tutelados pela intervenção dos meios civis ou pelas sanções do direito administrativo.

(25) No Direito Fiscal podem ser utilizadas as regras interpretativas usadas no direito civil. Neste sentido, ver J.L.Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, p. 147.

(26) "1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. 2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados".

(27) Cfr. Manuel de Andrade, Ensaio sobre a teoria da interpretação das leis, pp. 21 e 26.

(28) Neste sentido, cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Noções Fundamentais de Direito Civil, 6ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1965, Vol. I., p. 145.

(29) Cfr. Código Civil Anotado, 4ª ed., vol. I., pp. 58/59 de Pires de Lima e Antunes Varela onde se afirma que o sentido de a lei coincidirá com a vontade real do legislador, sempre que esta seja clara e inequivocamente demonstrada através do texto legal, do relatório de diplomas ou dos próprios trabalhos preparatórios da lei.

(30) Cfr. Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 2ª reimpressão, Coimbra, 1987, pp. 187 ss.

(31) Cfr. Interpretação e Aplicação das leis, tradução de Manuel de Andrade, 3ª ed., Coimbra, 1978, pp. 127 ss e 138 ss.

(32) Idem, p. 141.

(33) Lumbrales, Nuno B. M. - O Abuso de Confiança Fiscal no Regime Geral das Infracções Tributárias. Revista de Direito e Gestão Fiscal.ISSN 0974-7326. 13/14 (2003) 85-115.

(34) Manuel da Costa Andrade e Susana Aires de Sousa, in As metamorfoses e desventuras de um crime (abuso de confiança fiscal) irrequieto, reflexões críticas a propósito da alteração introduzida pela Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 17.º, 1.º volume, 2007, página 71, apud Acórdão da Relação do Porto de 27 de Maio de 2009

(35) Rodrigues, Augusto, O crime continuado no crime de abuso de confiança fiscal, no caso do IVA, in Revista Fiscal, Setembro, 2006, p. 16.

(36) Em todo o regime das infracções tributárias se sente a dicotomia latente entre dois modelos distintos de intervenção jurídica: um baseado no elenco de deveres funcionais dos agentes económicos (deveres de colaboração, de lealdade, de informação para com a administração tributária e a administração da segurança social) e outro baseado no interesse patrimonial na efectiva percepção do tributo devido. O primeiro modelo conduz o legislador a adoptar infracções formais, em que o núcleo da ilicitude se limita ao incumprimento do dever ou à desobediência do agente. O segundo modelo organiza a intervenção penal por referência a aspectos de natureza patrimonial e conduz à criação de crimes materiais (de perigo ou de lesão) Crimes tributários -Frederico de Lacerda da Costa. Pinto.

http://www.fd.unl.pt/docentes_docs/ma/fcp_ma_13038.pdf.

(37) Reportando-nos ao citado trabalho de Joaquim Miranda Sarmento e Paulo Marques pag 88 esta solução tem vindo a ser adoptada por alguns países europeus, provando que as suas vantagens suplantam os seus defeitos. Realçamos, no panorama europeu, os seguintes casos:

Na Alemanha pode solicitar-se às autoridades fiscais a aplicação do regime de caixa em três situações: i) se o volume de negócios da empresa, relevante para efeitos de NA, não excedeu (euro) 500.000 no último ano, ii) caso não exista contabilidade organizada ou iii) se estiverem envolvidos profissionais liberais; Na Bélgica, pode aplicar-se um regime de caixa quando não seja necessário emitir facturas (v. g., normalmente quando estejam envolvidos serviços realizados a particulares); No Reino Unido, pode aplicar-se um regime de exigibilidade de caixa desde que i) se espere que o valor das operações tributáveis do ano subsequente seja inferior a 1.350.000 libras, ii) não existam obrigações tributárias por cumprir ou condenações/aplicação de penalidades por conduta desonesta e iii) as autoridades tributárias não tenham recusado a aplicação do regime no ano anterior; Em Itália, pode aplicar-se um regime de caixa quando estejam envolvidos fornecimentos de produtos farmacêuticos ao Serviço Nacional de Saúde ou outros bens e serviços a várias instituições públicas (atendendo ao atraso que estas entidade s normalmente revelam no pagamento das suas dívidas). Também podem aplicar esse regime, os sujeitos passivos com um volume de negócios inferior a (euro) 200.000, desde que se mostrem cumpridas várias condições; Em Portugal, em virtude do Decreto-Lei 71/2013, de 30 de Maio, com efeitos a partir de 1 de Outubro de 2013, foi introduzido o Regime de Contabilidade de Caixa, aplicando-se aos sujeitos passivos cujo valor de negócios do ano civil anterior não supere os (euro) 500.000. Por outro lado, exige-se que tenham tido o início da actividade há mais de um ano e que tenham a sua situação tributária regularizada e não existam obrigações declarativas em falta. Neste regime, os sujeitos passivos em regra somente poderão deduzir o IVA quando tenham na sua mão documento comprovativo do respectivo pagamento. No presente ano (2013), podem os sujeitos passivos exercer o direito de opção por este regime até 30 de Setembro. A autoridade tributária e aduaneira pode aceder à totalidade das informações ou documentos bancários dos sujeitos passivos de IVA que tenham optado pelo regime de caixa, independentemente do consentimento daqueles (artigo 63-B, n.º 1, alínea d), da LGT).

(38) Direito Penal Tributário, Lisboa, 2009, pág. 113

(39) É o que sucede, por exemplo, nas situações de retenção na fonte previstas no artigo 71.º do CIRS, de rendimentos sujeitos a taxas liberatórias, em que a retenção do imposto na fonte é efectuada pelo sujeito passivo a título definitivo, que são enquadráveis no n.º 1 do artigo 114.º.

Há ainda dedução por conta de prestação tributária (por conta do imposto), enquadrável na primeira parte do n.º 3 do artigo 114.º, nos casos em que a retenção na fonte não é feita a título definitivo, mas sim por conta do imposto devido a final, como sucede, por exemplo, nas situações previstas no art. 98.º do CIRS.

(40) Nullum Crimen, Nulla Poena, Sine Lege Praevia: A Inexistência de Infracção Tributária nos Casos de não Entrega de IVA não Recebido - Isabel Marques da Silva Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Paulo de Pitta e Cunha, Volume II - Economia, Finanças Públicas e Direito Fiscal.

(41) José Gomes Mendes, Abuso de Confiança Fiscal controvérsias doutrinais e Jurisprudenciais-Julho de 2013 http://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/72995/2/12951.pdf

Sem custas.

Supremo Tribunal de Justiça, 29 de Abril de 2015. - José António Henriques dos Santos Cabral (Relator) - António Jorge Fernandes de Oliveira Mendes - José Adriano Machado Souto de Moura - Eduardo Maia Figueira da Costa - António Pires Henriques da Graça - Raul Eduardo do Vale Raposo Borges - Isabel Celeste Alves Pais Martins - Manuel Joaquim Braz - Isabel Francisca Repsina Aleluia São Marcos - Helena Isabel Gonçalves Moniz Falcão de Oliveira - Nuno de Melo Gomes da Silva - João Manuel da Silva Miguel - Francisco Manuel Caetano - António Pereira Madeira - José Vaz dos Santos Carvalho - Armindo dos Santos Monteiro - António Silva Henriques Gaspar (Presidente).

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/858900.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1913-07-16 - Lei 53 - Ministério do Interior - Direcção Geral de Saúde

    Autoriza o Governo a ceder à Junta Geral de Angra do Heroísmo uma propriedade situada no lugar de Porto Santo. (Lei n.º 53)

  • Tem documento Em vigor 1990-01-15 - Decreto-Lei 20-A/90 - Ministério das Finanças

    Aprova o regime jurídico das infracções fiscais não aduaneiras.

  • Tem documento Em vigor 1998-12-17 - Decreto-Lei 398/98 - Ministério das Finanças

    Aprova a lei geral tributária em anexo ao presente diploma e que dele faz parte integrante. Enuncia e define os princípios gerais que regem o direito fiscal português e os poderes da administração tributária e garantias dos contribuintes.

  • Tem documento Em vigor 2001-06-05 - Lei 15/2001 - Assembleia da República

    Reforça as garantias do contribuinte e a simplificação processual, reformula a organização judiciária tributária e estabelece um novo Regime Geral para as Infracções Tributárias (RGIT), publicado em anexo. Republicados em anexo a Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei nº 398/98 de 17 de Dezembro, e o Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aprovado pelo Decreto-Lei nº 433/99 de 26 de Outubro.

  • Tem documento Em vigor 2006-12-29 - Lei 53-A/2006 - Assembleia da República

    Aprova o Orçamento do Estado para 2007.

  • Tem documento Em vigor 2013-05-30 - Decreto-Lei 71/2013 - Ministério das Finanças

    Aprova o regime de contabilidade de caixa em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado (regime de IVA de caixa), no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, e altera o Código do IVA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de dezembro, a Lei Geral tributária, aprovada pelo Decreto-Lei nº 398/98, de 17 de dezembro, e o Decreto-Lei nº 198/2012, de 24 de agosto, relativo às medidas de controlo da emissão de faturas e outros documentos com relevância fiscal.

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