de 24 de Maio
Estabelece um processo de regularização extraordináriada situação dos imigrantes clandestinosA Assembleia da República decreta, nos termos dos artigos 164.º, alínea d), 168.º, n.º 1, alíneas b), c) e d), e 169.º, n.º 3, da Constituição, o seguinte:
CAPÍTULO I
Objecto e âmbito
Artigo 1.º
Objecto
1 - A presente lei estabelece um processo de regularização extraordinária da situação de cidadãos originários de países de língua oficial portuguesa que se encontrem a residir em território nacional sem a necessária autorização legal.2 - O regime estabelecido na presente lei é extensivo, nas condições previstas no artigo seguinte, aos demais cidadãos estrangeiros não comunitários ou equiparados que se encontrem a residir em território nacional sem autorização legal.
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
1 - Podem requerer a regularização extraordinária, nos termos da presente lei:a) Os cidadãos originários de países de língua oficial portuguesa que tenham entrado no território nacional até 31 de Dezembro de 1995 e nele tenham residido continuadamente e disponham de condições económicas mínimas para assegurarem a subsistência, designadamente pelo exercício de uma actividade profissional remunerada;
b) Os cidadãos originários de países de língua portuguesa cuja entrada no País tenha ocorrido em data anterior a 1 de Junho de 1986 e obedeçam às condições previstas no n.º 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei 212/92, de 12 de Outubro;
c) Os demais cidadãos estrangeiros não comunitários ou equiparados que tenham entrado no País até 25 de Março de 1995 e nele tenham residido continuadamente e disponham de condições económicas mínimas para assegurarem a subsistência, designadamente pelo exercício de uma actividade profissional remunerada.
2 - Considera-se que há residência continuada em território nacional quando o cidadão estrangeiro nele permaneceu ininterruptamente ou apenas se ausentou por períodos de curta duração para prestar assistência à família, gozar férias ou por outro motivo socialmente relevante.
Artigo 3.º
Causas de exclusão
Não podem beneficiar de regularização extraordinária as pessoas que:a) Tenham sido condenadas, por sentença transitada em julgado, em pena privativa da liberdade de duração não inferior a um ano;
b) Se encontrem em qualquer das circunstâncias previstas como fundamento da expulsão do território nacional, com excepção da entrada ou permanência irregular no País e do desrespeito pelas leis portuguesas referentes a estrangeiros;
c) Tendo sido objecto de uma decisão de expulsão do País, se encontrem no período de subsequente interdição de entrada em território nacional;
d) No âmbito do Sistema de Informações Schengen, tenham sido indicados por qualquer das partes contratantes para efeitos de não admissão.
Insusceptibilidade de procedimento criminal e contra-ordenacional
1 - Os cidadãos que requeiram a sua regularização nos termos da presente lei não são susceptíveis de procedimento criminal e contra-ordenacional por infracções à legislação relativa à entrada e permanência em território nacional, durante a pendência do processo de regularização, excepto por infracção aos artigos 93.º e 94.º do Decreto-Lei 59/93, de 3 de Março.
2 - A regularização extraordinária definitiva determina a extinção de responsabilidade criminal e contra-ordenacional relativa à entrada e permanência em território nacional, salvo o disposto na parte final do número anterior.
3 - As entidades empregadoras que declarem as situações de irregularidade de emprego por elas praticadas em relação aos cidadãos abrangidos pelo artigo 1.º não são passíveis de procedimento criminal e contra-ordenacional, excepto se as situações se enquadrarem nos artigos 169.º, 170.º e 299.º do Código Penal.
Artigo 5.º
Suspensão e extinção de instância
1 - Durante a pendência do processo de regularização é suspenso todo o procedimento criminal e contra-ordenacional que tenha sido movido ao interessado por infracções à legislação sobre imigração, sem prejuízo das excepções previstas no artigo 4.º 2 - É suspensa a instância em todos os procedimentos administrativos em que esteja em causa a aplicação da legislação relativa à entrada e permanência de estrangeiros em território nacional que se encontrem quer na fase graciosa quer na fase contenciosa e digam respeito a pessoas que requeiram a regularização da sua situação nos termos da presente lei.
CAPÍTULO II
Comissão Nacional
para a Regularização Extraordinária
Artigo 6.º
Constituição
É criada uma Comissão Nacional para a Regularização Extraordinária com a seguinte constituição:a) Um representante do Ministério da Administração Interna, que preside;
b) Um representante do Ministério da Justiça;
c) Um representante do Ministério da Solidariedade e Segurança Social;
d) Um representante do Alto-Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas;
e) Um representante das associações das comunidades de imigrantes, a designar por elas.
Artigo 7.º
Competência
Compete à Comissão Nacional para a Regularização Extraordinária:a) Decidir os pedidos de regularização extraordinária com base em proposta fundamentada do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras;
b) Decidir os recursos das decisões de recusa de admissão de pedidos apresentados;
c) Elaborar o relatório final sobre o processo de regularização extraordinária, a submeter à aprovação do Ministro da Administração Interna.
CAPÍTULO III
Tramitação processual
Artigo 8.º
Formulação e instrução do pedido
1 - O pedido de regularização extraordinária é individual e gratuito, devendo ser formulado em impresso de modelo oficial, que será aprovado por portaria do Ministro da Administração Interna.
2 - O pedido deve ser acompanhado pelos seguintes documentos:
a) Documento que comprove a identidade do requerente, bem como a data de entrada e período de permanência continuada em território nacional, designadamente documento autenticado pela embaixada competente ou atestado de residência;
b) Certificado de registo criminal, quando se trate de pessoas com 16 ou mais anos de idade;
c) Documento comprovativo da situação económica, designadamente declaração do exercício de actividade remunerada emitida pela entidade empregadora;
d) Documento que comprove eventuais relações de parentesco com cidadãos nacionais ou residentes em território nacional.
3 - Quando o documento referido na alínea c) não puder ser obtido pelo requerente, pode o mesmo ser substituído por prova testemunhal, designadamente fornecida por associações sindicais do sector em que o requerente exerça a sua actividade ou autarquia da residência.
4 - O documento referido na alínea b) é obtido oficiosamente, por iniciativa do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, podendo ainda ser apresentado pelo interessado.
Artigo 9.º
Agregado familiar
1 - O agregado familiar do requerente, constituído pelo cônjuge, filhos menores ou incapazes, deve ser identificado nos termos do artigo anterior e em relação a ele deve ser feita prova bastante de residência em comum como condição da aplicação extensiva do regime previsto na presente lei.2 - Quando se trate de menores, o pedido deve ser formulado pelo seu representante legal, pela pessoa a quem o menor tenha sido confiado ou, na falta de ambos, pelo Ministério Público.
3 - Os menores que contem, no mínimo, 16 anos de idade podem formular pessoalmente o pedido, na falta de representante legal ou de pessoa a quem tenham sido confiados.
4 - O pedido pode igualmente ser formulado por responsáveis de estabelecimentos de ensino ou instituições de solidariedade social reconhecidos oficialmente, quando não exista em território nacional representante legal ou pessoa a quem o menor tenha sido confiado.
Artigo 10.º
Recepção do pedido e instrução do processo
1 - Compete ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras receber os pedidos de regularização extraordinária e instruir os respectivos processos.
2 - Os requerimentos a processar nos termos do n.º 1 podem ser entregues em outros locais designados para o efeito na legislação regulamentar da presente lei, por forma a assegurar a acessibilidade aos interessados.
Artigo 11.º
Não admissão do pedido
1 - Não são admitidos os pedidos que:a) Não observem o disposto no artigo 8.º, n.º 1;
b) Não estejam instruídos com os documentos referidos nas alíneas a) e b) do artigo 8.º, n.º 2, sem prejuízo do disposto no artigo 8.º, n.º 4;
c) Contenham falsas declarações ou estejam instruídos com documentos falsos ou alheios.
2 - A recusa de admissão do pedido e o respectivo fundamento serão comunicados ao interessado.
3 - Quando ocorram lapsos de preenchimento ou omissões documentais, o facto será comunicado ao interessado para correcção.
4 - Do acto de recusa de admissão do pedido cabe recurso, a interpor no prazo de 20 dias, para a Comissão Nacional para a Regularização Extraordinária.
5 - A Comissão Nacional para a Regularização Extraordinária aprecia o recurso no prazo de 15 dias, cabendo da decisão de indeferimento recurso para o Ministro da Administração Interna.
Artigo 12.º
Admissão do pedido
1 - Os pedidos de regularização extraordinária admitidos devem ser remetidos à Comissão Nacional acompanhados de propostas de decisão.2 - O recibo comprovativo da admissão do pedido de regularização extraordinária vale como autorização de residência até à respectiva decisão.
3 - Sendo de indeferimento, a proposta de decisão é notificada, através de edital, ao interessado, para no prazo de 10 dias se pronunciar sobre a proposta.
Artigo 13.º
Regularização extraordinária provisória
1 - A Comissão Nacional para a Regularização Extraordinária aprecia o pedido no prazo de 30 dias a contar da data em que o receber.
2 - No caso de deferimento do pedido é concedida a regularização extraordinária provisória e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras emite um título de residência anual com a menção de que foi emitido por decisão da Comissão Nacional para a Regularização Extraordinária.
3 - Da decisão de indeferimento do pedido cabe recurso para o Ministro da Administração Interna, e da decisão deste, recurso contencioso, nos termos gerais, com efeito suspensivo.
Artigo 14.º
Títulos de residência
1 - Sem prejuízo da responsabilidade criminal que possa caber, os títulos de residência obtidos por meios fraudulentos, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º, são nulos, devendo ser cancelados e apreendidos.2 - Na renovação dos títulos de residência dos cidadãos a que se refere o artigo 2.º, n.º 1, alínea b), só é exigível a prova de requisitos previstos no n.º 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei 212/92, de 12 de Outubro.
Artigo 15.º
Regularização extraordinária definitiva
1 - A regularização extraordinária provisória converte-se em regularização extraordinária definitiva no prazo de três anos, se não se verificar, durante esse prazo, nenhuma das causas previstas no artigo 3.º 2 - A verificação de qualquer das causas de exclusão previstas no artigo 3.º durante o prazo estabelecido no número anterior determina a caducidade da regularização extraordinária provisória e do título de residência anual emitido a favor do interessado.
Artigo 16.º
Período de vigência
Os pedidos de regularização extraordinária previstos na presente lei poderão ser formulados no prazo de seis meses a contar da data da sua entrada em vigor.
Artigo 17.º
Medidas de apoio
O Governo adoptará medidas tendentes a assegurar a participação das organizações representativas dos cidadãos originários dos países de língua oficial portuguesa residentes em Portugal na divulgação, informação e acompanhamento do processo de regularização extraordinária previsto na presente lei.
Artigo 18.º
Processos pendentes
Salvo expresso requerimento do interessado, o disposto na presente lei é aplicável aos processos de autorização de residência cuja resolução se encontra pendente, desde que os mesmos obedeçam às condições do artigo 2.ºArtigo 19.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 15 dias após a sua publicação.
Aprovada em 3 de Abril de 1996.
O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.
Promulgada em 10 de Maio de 1996.
Publique-se.O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendada em 13 de Maio de 1996.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.