de 14 de Dezembro
A actualização da legislação com vista à segurança de barragens, que constitui preocupação de entidades públicas e privadas, é plenamente alcançada com a publicação do presente Regulamento de Pequenas Barragens, que completa o Regulamento de Segurança de Barragens, permitindo ao País dispor de um conjunto de diplomas legais coerentes e articulados, acompanhando o desenvolvimento tecnológico e melhorando a segurança e a qualidade da construção e exploração de barragens.Assim:
Nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 201.° da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.° É aprovado o Regulamento de Pequenas Barragens, que é publicado em anexo ao presente diploma e que dele faz parte integrante.
Art. 2.° São revogados os Decretos números 48 373, de 8 de Maio de 1968, e 48 643, de 23 de Outubro de 1968.
Art. 3.° O presente diploma entra em vigor seis meses após a data da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 23 de Setembro de 1993. - Aníbal António Cavaco Silva - Joaquim Fernando Nogueira - Luís Francisco Valente de Oliveira - Manuel Dias Loureiro - Arlindo Marques da Cunha - Luís Fernando Mira Amaral - Joaquim Martins Ferreira do Amaral - Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Promulgado em 23 de Novembro de 1993.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 24 de Novembro de 1993.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.
ANEXO
Regulamento de Pequenas Barragens
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.°
Objecto
1 - O presente Regulamento é aplicável ao projecto, construção, exploração e observação de barragens com altura igual ou inferior a 15 m, medida desde a parte mais baixa da superfície geral de fundações até ao coroamento, e capacidade de armazenamento menor do que 100 000 m3, com excepção das abrangidas pelo n.° 2 do artigo 2.° do Regulamento de Segurança de Barragens (RSB), aprovado pelo Decreto-Lei n.° 11/90, de 6 de Janeiro.2 - Para as barragens de altura inferior a 8 m é dispensada a aplicação das disposições do presente diploma quando especiais condições técnicas assim o exigirem.
3 - A verificação do condicionalismo previsto no número anterior é feita pelo Instituto Nacional da Água (INAG).
Artigo 2.°
Elaboração dos projectos, direcção técnica das obras
e responsabilidade pela exploração
1 - Os projectos devem ser elaborados por técnicos com qualificação reconhecida pelo INAG.2 - A construção deve ser dirigida por técnico com as mesmas qualificações requeridas para a elaboração do projecto.
3 - A exploração é da responsabilidade do dono da obra perante o INAG.
Artigo 3.°
Organização dos projectos
Os projectos devem conter as peças escritas e desenhadas necessárias para definir completamente a obra e justificar o seu dimensionamento e outras peças que o INAG considere convenientes, designadamente no que respeita a impacte ambiental.
Artigo 4.°
Aprovação dos projectos
Os projectos devem ser submetidos à aprovação do INAG, de acordo com as leis e regulamentos em vigor sobre o aproveitamento das águas.
CAPÍTULO II
Reconhecimento da fundação e da albufeira
Artigo 5.°
Estudo do maciço de fundação
1 - O maciço de fundação deve ser estudado com base em trabalhos de reconhecimento in situ que permitam colher elementos informativos sobre as características geológicas e geotécnicas do local.2 - O estudo deve referir a estrutura geológica, com identificação das formações ocorrentes, indicação das suas espessuras e atitudes, sistemas de diaclases e outros aspectos estruturais relevantes, tais como superfícies de descontinuidade.
3 - O estudo das características geotécnicas deve contemplar a resistência, a deformabilidade e a permeabilidade das formações.
Artigo 6.°
Estudos relativos à albufeira
1 - Deve ser efectuado o reconhecimento das características dos terrenos da albufeira que possam influenciar a sua estanquidade e a estabilidade das encostas.2 - Deve ser apresentado o estudo de impacte ambiental ou indicada justificação da sua omissão.
CAPÍTULO III
Materiais de construção
Artigo 7.°
Locais de empréstimo
O projecto deve mencionar a origem dos materiais e, no caso de barragens de aterro, indicar, nomeadamente, em escala adequada, a planta dos locais de empréstimo, a avaliação do respectivo volume e os efeitos da sua exploração no ambiente.
Artigo 8.°
Estudo dos materiais de construção
1 - Os materiais destinados à construção de barragens de aterro com abundância de elementos finos devem ser isentos de matéria orgânica e devendo ser analisadas as seguintes características:a) Identificação: limites de liquidez e de plasticidade e a composição granulométrica;
b) Compactação: peso volúmico aparente seco máximo e teor em água óptimo;
c) Corte: para o solo compactado em duas situações, teor em água de colocação e saturação completa;
d) Permeabilidade: para o solo compacto e saturado;
2 - Os materiais destinados à construção de barragens de enrocamento devem ser estudados de forma a determinar:
a) Características físicas;
b) Propriedades-índice;
c) Composição mineralógica;
3 - Os cimentos e inertes destinados à fabricação de betões devem ter propriedades físicas e químicas de harmonia com as normas oficiais.
CAPÍTULO IV
Projecto
Artigo 9.°
Fundações
1 - O projecto deve dar indicação do critério a seguir nas escavações para determinação da profundidade definitiva da fundação.2 - O projecto deve conter a demonstração da estabilidade mecânica das fundações face às características geotécnicas do local de implantação, tendo em conta aspectos de capacidade de carga e de resistência ao deslizamento:
a) Ao longo do contacto da barragem com a fundação;
b) Ao longo de superfícies de descontinuidade existentes no maciço de fundação;
c) Ao longo de superfícies potenciais de escorregamento que respeitem o conjunto do corpo da barragem e da fundação;
3 - No que diz respeito aos aspectos hidráulicos, o projecto deve conter:
a) Estudo da estabilidade hidráulica (erosão interna) da fundação face à carga hidráulica, ao coeficiente de permeabilidade e à granulometria dos materiais que constituem o maciço de fundação recorrendo ao traçado de redes de fluxo ou a regras práticas consagradas;
b) Definição do tipo, constituição, localização e dimensões de dispositivos de controlo de pressões de água na fundação, a adoptar quando a estabilidade hidráulica não esteja assegurada;
c) Quantificação dos valores dos caudais percolados através da fundação e dimensionamento dos dispositivos a adoptar para reduzir esses caudais a valores aceitáveis.
Artigo 10.°
Descarregador de cheias
1 - O valor do caudal de projecto deve ser fixado, sempre que se justifique, recorrendo à análise dos resultados obtidos por utilização das seguintes vias de cálculo:a) Métodos estatísticos incorporando os dados de precipitação e caudais medidos na bacia hidrográfica no local da barragem ou, na falta deles, métodos que considerem os obtidos em bacias hidrográficas, morfológica e hidrologicamente análogas;
b) Fórmulas empíricas ou semiempíricas, do tipo cinemático;
2 - Pode adoptar-se no projecto o caudal máximo de cheia com probabilidade de ocorrência de uma vez em 100 anos, devendo, no entanto, nos casos de risco potencial elevado ou significativo, aplicar-se o disposto no RSB.
3 - Para a determinação da precipitação devem utilizar-se os valores médios horários extraídos de registos udográficos de posto ou postos representativos , sendo recomendável que o período das observações seja, pelo menos, de 30 anos.
4 - Em relação à concepção e dimensionamento hidráulico e estrutural do descarregador de cheias deve ter-se em consideração o seguinte:
a) O descarregador não pode ficar fundado no corpo de barragens de aterro;
b) No caso de barragens de aterro, não é recomendável a adopção de descarregadores munidos de comportas;
c) As soluções adoptadas para a soleira de controlo, canal de descarga e estrutura de dissipação de energia devem ser convenientemente justificadas.
Artigo 11.°
Folga
1 - A fixação da folga deverá ser feita tendo em conta as características da barragem, a sismicidade local e a amplitude das ondas geradas na albufeira por acção do vento.2 - Entende-se por folga a diferença entre a cota do coroamento da barragem, não considerando o parapeito nem a sobrelevação e o nível de máxima cheia (NMC), devendo, no caso de descarregadores de cheias com comportas, este nível ser considerado admitindo a situação de avaria de uma delas.
3 - No caso das barragens de aterro a folga deve ser igual ou superior a 1 m.
Artigo 12.°
Largura do coroamento
A largura do coroamento deve ser justificada em função da altura e da importância da barragem e, no caso de barragens de aterro, a largura não deve ser inferior a 3 m e deve ter em atenção a configuração da linha de saturação com a albufeira cheia e a sismicidade local.
Artigo 13.°
Tomada de água e descarga de fundo
1 - As barragens devem possuir uma tomada de água e uma descarga de fundo, com o diâmetro mínimo de 0,70 m, sendo de atender ao seguinte:a) As entradas da tomada de água e da descarga de fundo devem ser localizadas de forma a garantir a permanência do seu funcionamento e ser munidas de grades de protecção;
b) Salvo razões justificadas, cada circuito hidráulico deve ser munido de uma comporta a montante, convenientemente arejada e com comando fiável facilmente acessível;
c) Nos casos em que a exploração o permita, pode aceitar-se que uma única conduta desempenhe as duas funções;
2 - No caso de condutas que atravessem o corpo do aterro deve o projecto:
a) Prever disposições adequadas para prevenir o efeito de assentamentos diferenciais;
b) Indicar os meios a adoptar para o controlo de eventuais infiltrações ao longo do contacto do aterro com as condutas;
3 - O projecto deve conter a curva de vazão da descarga de fundo e a indicação do tempo de esvaziamento da albufeira.
Artigo 14.°
Dimensionamento da estrutura
1 - No dimensionamento de barragens de aterro deve-se:a) Considerar as acções devidas à gravidade e à água;
b) Indicar, no caso de barragens de terra, a posição da superfície de saturação no perfil da barragem e os dispositivos drenantes previstos para que ela não intersecte o paramento de jusante;
c) Apresentar justificação do modo como é assegurada a estanquidade do corpo das barragens de enrocamento;
d) Quantificar a segurança em relação ao colapso por análise da estabilidade ao deslizamento dos taludes, utilizando métodos de equilíbrios limites;
e) Considerar, nas barragens de terra, as situações de pleno armazenamento e esvaziamento rápido, sendo, respectivamente, de 1,5 e 1,3 os coeficientes de segurança mínimos a adoptar;
f) Considerar, nas barragens de enrocamento, apenas a situação de pleno armazenamento, sendo de 1,5 o coeficiente de segurança mínimo a adoptar;
g) Ter em conta a acção sísmica, recorrendo, quando se justifique, a métodos de cálculo pseudo-estáticos, na situação de pleno armazenamento;
2 - Nos casos de barragens de terra, em que a altura, a capacidade de armazenamento e os eventuais prejuízos causados por acidente o permitam, as inclinações dos taludes podem ser fixadas de acordo com critérios práticos relacionados com as características de identificação dos solos do aterro.
3 - No dimensionamento das barragens de betão deve-se:
a) Considerar as acções devidas à gravidade, à água e à temperatura;
b) Ter em conta a acção sísmica, podendo utilizar-se métodos de cálculo pseudo-estáticos, para situação de armazenamento mais desfavorável;
c) Demonstrar a estabilidade em relação ao derrubamento e ao deslizamento na superfície de fundação;
d) Determinar as tensões máximas para as várias situações de dimensionamento;
e) Utilizar os critérios de segurança consagrados pela prática;
4 - Para outros tipos de barragens, como é o caso, por exemplo, dos aterros armados e barragens de gabiões, os estudos de dimensionamento devem ser efectuados tendo em consideração os aspectos de maior vulnerabilidade da estrutura às diversas acções.
Artigo 15.°
Filtros
1 - Devem ser dispostos filtros nas transições do aterro para o revestimento do paramento de montante e para os dispositivos drenantes.2 - No caso de filtros naturais as granulometrias devem obedecer às regras consagradas na bibliografia da especialidade.
3 - No caso de filtros de geotêxteis devem ser justificadas a abertura dos poros e a espessura em função da granulometria do material a proteger.
Artigo 16.°
Revestimento dos paramentos das barragens de aterro
1 - O paramento de montante deve ser protegido da acção das vagas por meio de um revestimento convenientemente justificado.
2 - O paramento de jusante das barragens de terra deve ser protegido:
a) Da acção da chuva, por meio de revestimento vegetal ou enrocamento e por valetas junto às encostas e, ainda, quando a altura da barragem o aconselhe, por banquetas dotadas de valetas;
b) Da acção das descargas dos órgãos de segurança e exploração, sempre que se justifique.
CAPÍTULO V
Construção
Artigo 17.°
Saneamento das fundações
1 - O saneamento das fundações deve ser realizado de acordo com o especificado no projecto, garantindo a retirada de todos os materiais considerados inadequados.2 - As ressurgências devem ser captadas e drenadas antes de ser iniciada a execução da obra.
Artigo 18.°
Compactação dos aterros
1 - Nas barragens de terra a compactação deve ser efectuada tendo em atenção o seguinte:a) O grau de compactação e o teor em água devem situar-se dentro dos limites obrigatoriamente especificados no projecto;
b) A espessura das camadas deve ser experimentalmente ajustada às características do material de aterro e ao tipo dos equipamentos de compactação;
c) As operações de rega, quando necessárias, devem garantir uma distribuição uniforme da água, recorrendo para isso a técnicas adequadas, designadamente rega nas manchas de empréstimo, dispersão de água e uso de grades de discos;
2 - Nas barragens de enrocamento a compactação das camadas deve ser realizada de forma a conseguir as compacidades fixadas no projecto.
Artigo 19.°
Fabrico e colocação do betão
Para garantia da qualidade do betão devem ser respeitadas as disposições normativas e regulamentares aplicáveis, bem como as cláusulas especiais do caderno de encargos, quando existam.
Artigo 20.°
Controlo da construção
1 - Nas barragens de terra deve ser efectuado controlo do grau de compactação e do teor em água, com a frequência indicada no projecto por cada 1000 m3 de aterro e, no mínimo, duas vezes em cada camada.2 - Nas barragens de enrocamento deve ser efectuado, com base nos estudos referidos no artigo 18.°, o controlo do peso volúmico e da composição granulométrica, com a frequência indicada no projecto e, no mínimo, de uma vez por cada 5000 m3 de enrocamento.
3 - Nas barragens de betão devem ser respeitadas as disposições referidas no artigo 19.°
CAPÍTULO VI
Exploração
Artigo 21.°
Operação dos órgãos de segurança e exploração
1 - A operação dos órgãos de segurança e exploração deve efectuar-se de acordo com normas próprias a definir no projecto, conforme as características de cada aproveitamento, devendo referir-se, entre outros, os aspectos seguintes:
a) Operação manual ou automática, local ou à distância;
b) Fontes de energia de alimentação;
c) Meios humanos necessários;
d) Regras de operação das comportas;
e) Sistemas de comunicação;
2 - As normas referidas no número anterior devem mencionar as características principais de exploração quanto a níveis da albufeira e volumes armazenados, caudal máximo escoado em exploração normal e mínimo lançado em estiagem, tipo e número de descarregadores e respectivas curvas de vazão e definir instruções e procedimentos quanto à operação manual, designadamente no caso de avaria de automatismos.
3 - As regras de operação dos órgãos de segurança e exploração em regime de cheias devem contemplar os aspectos relativos a amortecimento de cheias, minimização dos descarregamentos e estabilidade das margens e leito do rio.
4 - O dono da obra deve instalar dispositivos que forneçam informação fiável sobre os níveis da água a montante e a jusante da barragem e sobre o funcionamento dos órgãos de segurança e exploração.
Artigo 22.°
Conservação das obras e equipamentos
1 - Devem desenvolver-se acções sistemáticas, periódicas ou de rotina, englobando pequenas reparações, desarborizações e medidas preventivas para evitar a deterioração das obras e equipamentos.2 - Quando ocorrerem anomalias cuja caracterização envolva o conhecimento da sua localização e extensão, identificação das causas e dos mecanismos do seu desenvolvimento, deve proceder-se a acções de conservação, aprovadas pelo INAG, visando a reparação dos elementos da obra afectados.
3 - Devem assegurar-se condições eficientes de funcionamento dos equipamentos dos órgãos de segurança e exploração, por meio de acções de conservação que tenham em conta a sua complexidade e importância.
Artigo 23.°
Aspectos ambientais
1 - Para controlar aspectos de impacte ambiental, designadamente alteração da qualidade das águas superficiais, processos de erosão e transporte de caudal sólido e estabilidade das margens, deve proceder-se a análises da água da albufeira, a desassoreamentos, a eventual reconstituição das margens, e deve ainda dar-se atenção à vigilância do desenvolvimento da fauna, flora e biótopos, com relevo para as situações de exploração próximas do nível mínimo ou de esvaziamento total.2 - Para atenuar os efeitos de eutrofização da albufeira, com a contaminação do rio e possibilidade de morte de peixes e degradação da qualidade da água, o dono da obra deve desencadear acções visando remover sedimentos e matéria orgânica do fundo e margens da albufeira.
CAPÍTULO VII
Observação das obras
Artigo 24.°
Comportamento na fase de primeiro enchimento
1 - O comportamento da obra deve ser observado durante a fase de primeiro enchimento, total ou parcial, dando-se particular atenção ao aparecimento de fendas, infiltrações, ressurgências e deformações significativas.
2 - As observações incumbem ao técnico responsável pela construção, que sobre elas deve apresentar relatório a submeter ao INAG.
3 - Após a recepção do relatório mencionado, o INAG deve proceder à vistoria da obra, declarando-a em condições de exploração, se for caso disso.
Artigo 25.°
Observação durante a fase de exploração
1 - Após a entrada da obra em regime de exploração normal, compete ao dono da obra observar o seu comportamento, designadamente no primeiro enchimento, e comunicar ao INAG as ocorrências cujo conhecimento interesse à avaliação do comportamento da obra.
2 - Se o INAG considerar conveniente, promoverá nova vistoria para definição das medidas a adoptar e dos prazos em que o dono da obra deve efectivá-las