de 30 de julho
Sumário: Proíbe a colocação no mercado de determinados produtos cosméticos e detergentes que contenham microesferas de plástico.
Os plásticos tornam as nossas vidas mais fáceis de várias formas e são frequentemente mais leves ou menos dispendiosos do que outros materiais alternativos, considerando apenas o custo de produção. Porém, esta vantagem, associada a outras dinâmicas do mercado, tem como efeito o uso excessivo de plástico e a promoção de uma cultura de descartabilidade.
Sucede que, se não forem valorizados ou eliminados adequadamente, os plásticos podem terminar no ambiente, onde permanecem durante séculos, degradando-se em pedaços cada vez menores. Estes pequenos pedaços, quando inferiores a 5 mm, denominam-se microplásticos, que apresentam elevada persistência e potencial de acumulação no ambiente.
Os microplásticos são partículas sólidas compostas por misturas de polímeros e aditivos funcionais, podendo ser formados não intencionalmente devido, por exemplo, à oxidação dos materiais poliméricos usados em artigos de plástico, pneus ou têxteis sintéticos. No entanto, também são fabricados intencionalmente e adicionados a produtos para fins específicos, como microesferas de esfoliação em esfoliantes faciais ou corporais.
Motivados por preocupações com o ambiente e a saúde, vários Estados-Membros da União Europeia já adotaram ou propuseram proibições nacionais sobre utilizações intencionais de microplásticos em produtos de consumo. As proibições referem-se principalmente ao uso de microesferas em cosméticos, que são retirados com água após o uso, nos quais são usadas como agentes abrasivos e de polimento.
Sem prejuízo da legislação nacional aplicável em vários Estados-Membros, encontra-se em desenvolvimento um projeto de restrição de microplásticos ao nível da União Europeia, no âmbito do Regulamento (CE) n.º 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006, relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição dos produtos químicos (Regulamento REACH), com um âmbito mais alargado do que o visado pelo presente decreto-lei.
Em 2017, a Comissão Europeia solicitou à Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA) que avaliasse as provas científicas para a adoção de medidas regulamentares a nível da União Europeia sobre os microplásticos que são adicionados intencionalmente a produtos, tendo a ECHA proposto, em janeiro de 2019, uma restrição abrangente dos microplásticos em produtos comercializados na União Europeia, para evitar ou reduzir a sua libertação para o ambiente.
A avaliação realizada pela ECHA concluiu que, para alguns usos de microplásticos, já existem alternativas no mercado, nomeadamente para microesferas com funções esfoliantes e de limpeza, utilizadas em cosméticos enxaguáveis.
Neste mesmo sentido, considerando que constituem missões do Estado a promoção de padrões sustentáveis de produção e consumo e a proteção do ambiente, da saúde pública e dos trabalhadores, o artigo 321.º da Lei 75-B/2020, de 31 de dezembro, que aprova o Orçamento do Estado para 2021, constitui o Governo na obrigação de proibir a colocação no mercado de cosméticos, produtos de higiene pessoal, detergentes e produtos de limpeza que contenham microesferas de plástico, constituídas por partículas sintéticas com uma dimensão inferior a 5 mm, obrigação a que o presente decreto-lei dá cumprimento.
Nesse âmbito, e tendo em conta que, nos termos do direito da União Europeia, os conceitos de «produto cosmético» e de «detergente» abrangem, respetivamente, os vulgarmente designados «produtos de higiene pessoal» e «produtos de limpeza», por razões de uniformidade e clareza, utiliza-se, no presente decreto-lei, apenas os referidos conceitos de «produto cosmético» e de «detergente».
O presente decreto-lei foi submetido ao procedimento de informação no domínio das regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade de informação, previsto na Diretiva n.º 2015/1535/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de setembro de 2015.
Foram ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas.
Foi promovida a audição do Conselho Nacional do Consumo.
Assim:
Nos termos do artigo 321.º da Lei 75-B/2020, de 31 de dezembro, e da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
O presente decreto-lei procede à proibição da colocação no mercado de produtos cosméticos e detergentes aos quais tenham sido adicionadas intencionalmente microesferas de plástico.
Artigo 2.º
Definições
1 - Para efeitos de aplicação do presente decreto-lei, entende-se por:
a) «Detergente», um detergente na aceção do n.º 1 do artigo 2.º do Regulamento (CE) n.º 648/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativo aos detergentes;
b) «Polímero», uma substância na aceção do n.º 5 do artigo 3.º do Regulamento (CE) n.º 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006, relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição dos produtos químicos;
c) «Produto cosmético», um produto cosmético na aceção da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Regulamento (CE) n.º 1223/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de novembro de 2009, relativo aos produtos cosméticos, na sua redação atual;
d) «Microesferas de plástico», partículas que contêm polímero sólido com qualquer dimensão igual ou inferior a 5 mm, às quais aditivos ou outras substâncias podem ter sido adicionados, com exceção dos polímeros naturais que não tenham sido quimicamente modificados, utilizadas como um abrasivo, ou seja, para esfoliar, polir ou limpar.
2 - Para efeitos do presente decreto-lei, aplicam-se as definições de «colocação no mercado» e «disponibilização no mercado» constantes do artigo 3.º do regime da gestão de fluxos específicos de resíduos, aprovado pelo Decreto-Lei 152-D/2017, de 11 de dezembro, na sua redação atual.
3 - No âmbito das competências da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), a definição de «colocação no mercado» prevista no número anterior inclui ainda o conceito de «introdução em livre prática» constante do artigo 201.º do Código Aduaneiro da União, aprovado pelo Regulamento (UE) n.º 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de outubro de 2013, na sua redação atual.
Artigo 3.º
Proibição de colocação no mercado
1 - É proibida a colocação no mercado de produtos cosméticos ou detergentes aos quais tenham sido intencionalmente adicionadas microesferas de plástico numa concentração igual ou superior a 0,01 % em peso.
2 - O disposto no número anterior não prejudica a disponibilização no mercado dos produtos que tenham sido colocados no mercado antes da entrada em vigor do presente decreto-lei.
3 - O disposto no n.º 1 não é aplicável:
a) A polímeros biodegradáveis;
b) A polímeros com solubilidade superior a 2 g/L.
4 - O disposto no número anterior é verificado com base em critérios fixados pela Agência Portuguesa do Ambiente, I. P., e publicados no respetivo sítio na Internet.
Artigo 4.º
Fiscalização
1 - A fiscalização do cumprimento do disposto no presente decreto-lei cabe, no âmbito das respetivas competências, à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) e à AT.
2 - O disposto no número anterior não prejudica o exercício dos poderes de fiscalização e polícia que competem às demais autoridades públicas.
Artigo 5.º
Contraordenação
1 - O incumprimento do estabelecido no n.º 1 do artigo 3.º constitui contraordenação económica grave, punível nos termos do Regime Jurídico das Contraordenações Económicas (RJCE), aprovado em anexo ao Decreto-Lei 9/2021, de 29 de janeiro.
2 - O produto das coimas aplicadas pela prática da contraordenação económica prevista no número anterior é repartido nos termos do RJCE.
3 - A tentativa e a negligência são puníveis, nos termos do RJCE.
Artigo 6.º
Instrução do processo e aplicação de sanções
Compete à ASAE e à AT, no âmbito das respetivas competências, instruir os processos relativos à contraordenação prevista no artigo anterior e decidir a aplicação das correspondentes coimas e sanções acessórias.
Artigo 7.º
Regiões Autónomas
1 - O presente decreto-lei aplica-se às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, sem prejuízo da sua adequação à especificidade regional, nos termos da respetiva autonomia político-administrativa, cabendo a sua execução aos serviços e organismos das respetivas administrações regionais, sem prejuízo das atribuições das entidades de âmbito nacional.
2 - O produto das coimas aplicadas nas Regiões Autónomas constitui receita própria destas.
Artigo 8.º
Avaliação legislativa
O Governo promove a reavaliação do presente decreto-lei em função das restrições que venham a ser adotadas no âmbito do procedimento desencadeado pela Comissão Europeia e acompanhado pela Agência Europeia dos Produtos Químicos relativo a uma possível restrição relativa à utilização de partículas sintéticas de polímeros insolúveis em água iguais ou inferiores a 5 mm em qualquer dimensão intencionalmente adicionadas a produtos de qualquer espécie, ao abrigo do n.º 1 do artigo 69.º e do anexo xv do Regulamento (CE) n.º 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006, relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição dos produtos químicos.
Artigo 9.º
Entrada em vigor
O presente decreto-lei entra em vigor a 1 de julho de 2022.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 15 de julho de 2021. - António Luís Santos da Costa - Pedro Gramaxo de Carvalho Siza Vieira - António Mendonça Mendes - João Saldanha de Azevedo Galamba.
Promulgado em 21 de julho de 2021.
Publique-se.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Referendado em 23 de julho de 2021.
O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa.
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