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Despacho 11718-A/2020, de 25 de Novembro

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Sumário

Aprova o Regulamento das Condições Materiais das Salas de Atendimento à Vítima em Estabelecimento Policial

Texto do documento

Despacho 11718-A/2020

Sumário: Aprova o Regulamento das Condições Materiais das Salas de Atendimento à Vítima em Estabelecimento Policial.

A violência doméstica constitui umas das mais graves formas de violação dos direitos humanos, sendo amplamente reconhecida como um sério problema, nomeadamente em matéria de segurança e de saúde públicas. Trata-se do crime contra as pessoas mais registado pelas autoridades policiais em Portugal, sendo a sua prevenção e investigação prioritárias, e, por força da lei, as vítimas de violência doméstica são sempre consideradas vítimas especialmente vulneráveis.

As condições existentes nos estabelecimentos policiais para efeitos de atendimento às vítimas de crime, designadamente das vítimas especialmente vulneráveis, e em particular das vítimas de violência doméstica, têm constituído, desde há mais de 20 anos, uma preocupação da área governativa da administração interna.

Em 1998, determinava-se um conjunto de medidas a adotar de modo a aperfeiçoar o atendimento policial às vítimas de violência, nomeadamente mulheres vítimas de maus-tratos, e que, face às mudanças ocorridas desde então, importa atualizar.

A existência de condições adequadas para o atendimento é essencial para promover a sua qualidade, facilitando a estabilização emocional das vítimas, sempre que necessário, e para reafirmar a importância atribuída a cada caso em concreto.

Nesse sentido, têm sido criadas salas de atendimento à vítima (SAV) nos estabelecimentos da Guarda Nacional Republicana e da Polícia de Segurança Pública, constituindo um aspeto especialmente previsto aquando da construção de novos postos ou esquadras ou no âmbito da reabilitação dos existentes.

No final de 2019 existiam 459 SAV, quase todas ao nível dos postos e esquadras de competência territorial, representando uma taxa de cobertura na ordem dos 69 % ao nível destes estabelecimentos policiais.

A criação de tais salas está igualmente contemplada no artigo 27.º da Lei 112/2009, de 16 de setembro, na sua redação atual, e, em sede do plano de ação para a prevenção e o combate à violência contra as mulheres e à violência doméstica 2018-2021, integrado na Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação 2018-2030, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/2018, de 21 de maio, ficou prevista a elaboração e implementação de um normativo em matéria de requisitos mínimos e padrões a este nível.

Por outro lado, e conforme previsto no Manual de Atuação Funcional a adotar pelos órgãos de polícia criminal (OPC) nas 72 horas subsequentes à denúncia por maus-tratos cometidos no contexto da violência doméstica, elaborado no contexto da Resolução do Conselho de Ministros n.º 139/2019, de 19 de agosto, a vítima, quando se dirige aos estabelecimentos policiais ou aí for conduzida na sequência de intervenção de OPC, deve ser acolhida em lugar reservado, que assegure a sua privacidade e ausência de quaisquer tipos de pressões.

Estas vítimas devem ainda ser atendidas, sempre que possível, por elemento policial com formação específica em violência doméstica (especialmente, ao nível da avaliação e gestão do risco), e de preferência ou sempre que solicitado, por elemento policial do mesmo sexo.

Tal como indicado nesse Manual: 1) a vítima apenas deve prestar declarações uma única vez e no momento temporal mais próximo possível dos factos e da sua notícia; 2) é fundamental a realização de atos processuais urgentes de aquisição de prova que habilitem, no mais curto período de tempo possível sem exceder as 72 horas, à tomada de medidas de proteção à vítima e à promoção de medidas de coação relativamente à pessoa agressora; 3) a investigação criminal implica necessariamente a diversificação dos meios de prova, sendo essencial ir além das declarações da vítima/denunciante; 4) devem ser privilegiadas, sempre que possível, medidas eficazes de contenção da pessoa agressora, sempre que tal se afigure imprescindível para a segurança da(s) vítima(s); e 5) é essencial que estas vítimas usufruam de forma plena dos seus direitos, nomeadamente, enquanto vítimas especialmente vulneráveis.

O caminho já percorrido pelas forças de segurança no domínio da intervenção em violência doméstica é longo, e reconhecidamente evidente, sendo essencial valorizar o elevado esforço efetuado por todos os efetivos que lidam com estas situações, quer do ponto de vista operacional, quer do ponto de vista da sua própria gestão emocional.

Face às atuais exigências que se colocam ao nível do policiamento da violência doméstica, torna-se cada vez mais evidente a importância do reforço das medidas que potenciem a qualidade do atendimento inicial, o qual deve ser realizado, sempre que aplicável, numa SAV, pelo que, e de modo a garantir uma uniformização ao nível das condições das SAV existentes e, mediante as adaptações possíveis, dos espaços alternativos utilizados (nos estabelecimentos onde ainda não existe uma SAV), é aprovado o presente regulamento.

Assim:

Nos termos do disposto na alínea d) do artigo 199.º da Constituição:

a) Revogo o despacho relativo às condições de atendimento às vítimas de violência, designadamente às mulheres vítimas de maus-tratos, e instrumentos de apoio à atividade das forças de segurança neste âmbito, que foi aprovado pelo Despacho, do Ministro da Administração Interna, n.º 15/98, de 9 de março;

b) Aprovo o Regulamento das Condições Materiais das Salas de Atendimento à Vítima em Estabelecimento Policial, anexo ao presente despacho;

c) O disposto no regulamento ora aprovado entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação no Diário da República, para todo o dispositivo da Guarda Nacional Republicana e da Polícia de Segurança Pública.

24 de novembro de 2020. - O Ministro da Administração Interna, Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita.

ANEXO

Regulamento das Condições Materiais das Salas de Atendimento à Vítima em Estabelecimento Policial

Artigo 1.º

Âmbito de aplicação

O presente regulamento aplica-se aos espaços nos estabelecimentos da Guarda Nacional Republicana e da Polícia de Segurança Pública destinados ao atendimento preferencial das vítimas especialmente vulneráveis, em particular das vítimas de maus-tratos cometidos no contexto da violência doméstica, sem prejuízo do disposto na lei e nos regulamentos aplicáveis, quanto ao atendimento às vítimas de crime e quanto aos requisitos construtivos das edificações urbanas.

Artigo 2.º

Definições

1 - Para efeitos do presente regulamento, considera-se sala de atendimento à vítima, doravante «SAV», o espaço policial onde deve decorrer o atendimento às vítimas especialmente vulneráveis, nomeadamente das vítimas de maus-tratos cometidos no contexto da violência doméstica e que garante um atendimento diferenciado e de qualidade, assegurando a privacidade e o conforto da vítima.

2 - Consideram-se vítimas especialmente vulneráveis as incluídas na alínea b) do n.º 1 do artigo 67.º-A do Código do Processo Penal, na sua versão atual.

Artigo 3.º

Características infraestruturais das SAV

1 - A SAV deve reunir boas condições de habitabilidade, possuir iluminação e ventilação natural, isolamento térmico, climatização e condições de segurança.

2 - A SAV deve situar-se preferencialmente em local resguardado, distante de local onde é realizado o atendimento ao público e sem acesso direto da rua ou da porta do estabelecimento policial.

3 - A SAV deverá ter uma área, idealmente, de 12 m2 ou superior, e nunca inferior a 8 m2, e possuir um pé-direito de 2,7 m. Em casos excecionais, nomeadamente situações de adaptação e de reabilitação de edifícios, poderão ser admitidos pés-direitos não inferiores a 2,4 m.

4 - Os materiais a aplicar em pavimentos, rodapés, paredes e tetos deverão ser confortáveis, não abrasivos, de fácil manutenção e limpeza e conferir um ambiente psicologicamente sereno.

5 - A SAV deve estar equipada com tomadas de usos gerais com alvéolos protegidos num circuito dedicado e tomada com ligação à rede estruturada.

6 - Sempre que possível deverá ser assegurada iluminação e ventilação natural adequada através de janela com possibilidade de abertura de batente, oscilobatente ou de correr, e com área mínima não inferior a um décimo da área do compartimento com o mínimo de 1,08 m2 medidos no tosco, ou seja, cumprir o estipulado no n.º 1 do artigo 71.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas para compartimentos de habitação.

7 - A janela, a existir, não deve ficar localizada em fachadas exteriores orientadas e na proximidade da via pública, garantindo que a privacidade interior seja assegurada, nomeadamente, através de sistema de obscurecimento parcial.

8 - Deverá garantir-se facilidade de acesso a vítimas com mobilidade condicionada, assegurando-se o cumprimento das normas previstas no Decreto-Lei 163/2016, de 8 de agosto (regime da acessibilidade aos edifícios e estabelecimentos que recebem público, via pública e edifícios habitacionais).

Artigo 4.º

Condições de privacidade e segurança

1 - A SAV deverá garantir um isolamento acústico de 35 DB.

2 - A SAV deve ser visualmente isolada, assegurando-se que não existem elementos transparentes nas paredes ou portas, e em conformidade com o n.º 7 do artigo anterior.

3 - Deve existir um mecanismo sinalizador de presença no interior da SAV (ex.: sinalização luminosa que indique que a sala está ocupada) para evitar intrusões que interrompam o atendimento.

4 - As condições existentes na SAV devem garantir a segurança das vítimas e dos elementos policiais.

Artigo 5.º

Mobiliário e organização

1 - O espaço deve estar mobilado com duas ou mais cadeiras confortáveis, uma secretária para a realização do expediente necessário, dois sofás e uma mesa de apoio.

2 - As cadeiras e sofás devem ser dispostos de modo a que a vítima não fique virada de frente para a entrada da sala.

3 - Deve existir um espaço na SAV particularmente acolhedor para crianças, quer com mobiliário e decoração adequadas, quer com brinquedos e outros objetos promotores da interação com as crianças.

4 - Deve evitar-se a acumulação de documentação de registo, de arquivo e/ou outros objetos visivelmente desordenados e não deve, igualmente, estar visível material de ordem pública, tal como bastões, escudos, algemas ou armas, nem elementos especialmente alusivos à atuação das forças de segurança.

5 - A decoração deve ser simples, sem cores fortes ou elementos que possam promover o desconforto ou a insegurança, nomeadamente grades metálicas. Deve ter-se, igualmente, em consideração a existência de elementos que promovam a sensação de conforto, tais como quadro(s), planta(s) e outros objetos decorativos.

6 - No interior da sala deve encontrar-se disponível água (ex.: da torneira, em recipiente próprio e renovada diariamente) para consumo da vítima e do elemento policial, copos, lenços de papel, desinfetante para mãos/objetos, bem como outros elementos que possam ser necessários durante o atendimento, de modo a evitar interrupções e/ou que a vítima tenha de aguardar e fique sozinha na SAV.

Artigo 6.º

Equipamento e materiais informativos

1 - A SAV deve dispor de equipamento informático que viabilize a realização de todo o expediente necessário, nomeadamente computador (com ligação à intranet e Internet) e impressora, bem como telefone que permita estabelecer contacto com entidades externas (ex.: da Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica).

2 - Na SAV deve estar disponível informação atualizada sobre vítimas especialmente vulneráveis, nomeadamente dirigida a vítimas de maus tratos cometidos no contexto da violência doméstica, incluindo informação sobre direitos/legislação, recursos/contactos de apoio e medidas de promoção da segurança, que seja passível de visualização e consulta por parte da vítima.

3 - Deverá evitar-se que os cartazes e documentos informativos a dispor na sala e acessíveis às vítimas contenham imagens que possam suscitar reações negativas ou especial desconforto por parte destas (ex.: vítimas com marcas de agressão).

4 - Deve igualmente estar disponível na SAV documentação atualizada de apoio ao elemento policial que efetua o atendimento, nomeadamente o Manual de Atuação Funcional a adotar pelos órgãos de polícia criminal nas 72 horas subsequentes à denúncia por maus-tratos cometidos no contexto da violência doméstica, o Guia de Intervenção Integrada junto de Crianças ou Jovens Vítimas de Violência Doméstica e respetiva orientação técnica, o Manual da Ficha de Avaliação de risco em violência doméstica, o Manual de Policiamento da Violência Doméstica (elaborado no Ministério da Administração Interna), exemplares de planos de segurança e outra documentação necessária ao expediente, legislação, indicações sobre recursos/contactos no âmbito do apoio às vítimas, bem como normas/diretivas internas à própria força de segurança com relevância neste âmbito e outros guias/manuais de apoio destinados aos elementos policiais.

5 - Sempre que esteja disponível a versão da documentação em suporte eletrónico (ex.: pdf) esta deve estar igualmente acessível no computador existente na sala.

Artigo 7.º

Novos espaços e adaptação dos espaços existentes

1 - As disposições previstas neste regulamento devem ser tidas em conta em qualquer projeto de construção/reabilitação de estabelecimentos policiais onde se preveja vir a ocorrer atendimento a vítimas especialmente vulneráveis, nomeadamente a vítimas de maus-tratos cometidos no contexto da violência doméstica.

2 - Nos espaços atualmente utilizados nos estabelecimentos policiais para efetuar atendimento às vítimas indicadas no número anterior, e onde as várias disposições contidas neste regulamento ainda não estejam verificadas, devem, até que venham a ser objeto, designadamente, de reabilitação, ser efetuadas as adaptações possíveis tendo em vista esse fim.

Artigo 8.º

Utilização da SAV e atendimento

1 - Em cada estabelecimento policial com SAV devem ser reforçadas medidas de sensibilização do efetivo, de modo a potenciar a utilização da SAV para efetuar o atendimento das vítimas especialmente vulneráveis, designadamente das vítimas de maus-tratos cometidos no contexto da violência doméstica.

2 - Devem ser adotadas medidas que viabilizem a utilização da SAV por parte dos efetivos que realizam o atendimento às vítimas especialmente vulneráveis, independentemente do número de elementos policiais presentes no estabelecimento policial.

3 - Deve ser assegurado que a SAV se encontra disponível sempre que seja necessária para efetuar um atendimento, devendo evitar-se a sua utilização para outros serviços/fins.

4 - Sempre que possível, o atendimento às vítimas especialmente vulneráveis, nomeadamente das vítimas de maus-tratos cometidos no contexto da violência doméstica, deve ser realizado por elemento policial com formação específica para o efeito.

5 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, e sempre que possível, o atendimento deve ser efetuado, preferencialmente ou quando solicitado, por elemento policial do mesmo sexo.

Artigo 9.º

Monitorização das SAV existentes e controlo administrativo

1 - As forças de segurança comunicam semestralmente à Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna o número de SAV existentes em cada comando, através da aplicação disponibilizada relativa aos programas especiais de policiamento (dirigidos a grupos especialmente vulneráveis).

2 - A Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna disponibiliza semestralmente informação relativa ao número de SAV existentes e respetivo rácio no âmbito dos postos e esquadras de competência territorial, bem como o número de SAV existentes em outras unidades/subunidades.

3 - As SAV e sua utilização são objeto de verificação sistemática por parte da Inspeção-Geral da Administração Interna no âmbito das suas atividades regulares inspetivas aos estabelecimentos policiais.

100000273

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/4328386.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga ao seguinte documento (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 2009-09-16 - Lei 112/2009 - Assembleia da República

    Estabelece o regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica, à protecção e à assistência das suas vítimas.

Ligações para este documento

Este documento é referido no seguinte documento (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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