de 29 de Maio
1. Propendem hoje os penalistas e criminologistas para considerar a prisão como uma medida penal de último recurso. As sanções alternativas ou substitutivas surgem apontadas com cada vez maior frequência. Neste mesmo contexto se inserirá, de resto, a tendência para a descriminalização e a despenalização.Por isso mesmo, a Resolução (76)10 do Conselho da Europa aponta, decididamente, para a revisão das diversas legislações nesse sentido. O objectivo último será o de se evitar na medida do possível a aplicação de penas privativas de liberdade, em razão dos seus múltiplos inconvenientes e por respeito pela liberdade individual, no pressuposto de que tal política seja prosseguida sem pôr em risco a segurança pública.
Ao restringir-se o espaço reservado à prisão entre as medidas penais, implicitamente se amplia a esfera de intervenção do Serviço Social. A semidetenção, a prestação de trabalho a favor da comunidade e o regime de prova postulam todo um conjunto de novas funções, que virão por certo a ser atribuídas ao serviço social prisional logo que seja publicado o novo Código Penal. Entretanto, e desde já, da entrada em vigor do Decreto-Lei 265/79, de 1 de Agosto, decorre o reforço das funções por esse serviço já tradicionalmente exercidas, criado como foi o regime aberto, necessariamente ligado ao acompanhamento regular dos reclusos autorizados a exercer uma actividade no meio livre.
Tem vindo a ganhar consistência a ideia de que o período que se segue à libertação do recluso constitui uma fase crítica quanto à viabilidade da sua reintegração social.
Tanto no plano da supervisão obrigatória durante a liberdade condicional como no da assistência voluntariamente solicitada por reclusos, verifica-se a imprescindibilidade de intensificar e de diversificar as prestações sociais, procurando-se corresponder mais adequadamente aos problemas postos pelos libertados. A criação de residências de acolhimento e, porventura, de oficinas protegidas, a promoção do interesse e da responsabilização do público pelos assuntos penais e o empenhamento em acções de intervenção comunitária, susceptíveis de minorar disfunções económicas e sociais, representam novas áreas onde a actuação do Serviço Social deverá ser potenciada e tornada mai seficaz.
É de sublinhar o relevo que vem desde há alguns anos a ser dado ao papel que a opinião pública poderá desempenhar como factor de adesão e complementação do trabalho desenvolvido na perspectiva de uma política decididamente voltada para a reabilitação e reinserção social dos reclusos. Nesta linha têm sido ressaltados, designadamente no âmbito do Conselho da Europa, os aspectos positivos da utilização, quando correcta, dos meios de comunicação social para tais objectivos.
Ora está fora de causa que o recluso tem de ver reconhecida, por todos e em todos os momentos, a sua dignidade humana e que tudo se deve fazer para que se concretize a sua reintegração social. Isso poderá ser conseguido sem que se subalternizem os princípios de autoridade do Estado, da segurança da comunidade e da disciplina dos serviços, que uma teorização excessiva não poderá derrogar (assim, Despacho do Ministro da Justiça n.º 23/78, de 10 de Outubro, in Diário da República, 2.ª série, de 23 do mesmo mês).
Tudo estará em encontrar o ponto adequado e sensato no balancear dos dois interesses: protecção da sociedade e recuperação social do recluso.
2. Nos últimos anos, o crescimento da população prisional em termos quantitativos e de complexidade tem obrigado a um esforço de adaptação por parte dos serviços que impõe, nomeadamente, uma maior coordenação das acções empreendidas no exterior e no interior dos estabelecimentos prisionais. Desse circunstancialismo flui, por um lado, a necessidade de uma maior interacção dos serviços sociais prisionais e dos serviços sociais da comunidade - que propiciará ao ex-recluso a assunção da sua qualidade e responsabilidade de homem livre. Por outro lado, dele resulta a necessidade de um apoio integrado para as diferentes actuações dos educadores e técnicos do serviço social prisional. São os próprios serviços a sentir a indispensabilidade de um suporte técnico capaz de promover o melhor aproveitamento dos educadores e de facilitar a ligação entre estes e os técnicos do Serviço Social.
Acresce que, muito embora o ensino seja assegurado principalmente pelo Ministério da Educação e Ciência, para isso naturalmente vocacionado, importa garantir um certo número de tarefas de coordenação - que, na orgânica actual, podem mais cabalmente ser desempenhadas por uma direcção de serviços.
Por estas razões, cria-se agora a Direcção dos Serviços de Educação, Ensino e Serviço Social, à qual se imputam poderes de intervenção diferenciados: mais vastos no sector do serviço social e mais restritos (limitados a uma função coordenadora) nos sectores da educação e do ensino.
3. Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
ARTIGO 1.º
(Direcção dos Serviços de Educação, Ensino e Serviço Social)
É criada na Direcção-Geral dos Serviços Prisionais a Direcção dos Serviços de Educação, Ensino e Serviço Social.
ARTIGO 2.º
(Competência da Direcção dos Serviços de Educação, Ensino e Serviço Social)
Compete à Direcção dos Serviços de Educação, Ensino e Serviço Social:
a) Fixar as linhas directivas da política dos serviços e planificar a sua acção anual;
b) Garantir o funcionamento racional dos serviços e a sua coordenação a nível nacional;
c) Colaborar na selecção e na formação dos funcionários e na actualização dos seus conhecimentos;
d) Fomentar o intercâmbio de conhecimentos e experiências com outros serviços, a nível nacional e internacional;
e) Promover a colaboração entre os serviços e os organismos oficiais ou particulares que tenham a seu cargo, nomeadamente a resolução de problemas de assistência, de saúde, de emprego e trabalho, de orientação profissional e de ensino;
f) Promover a criação de residências para acolhimento temporário de libertados e de outras formas de apoio;
g) Fomentar a constituição de associações particulares que se dediquem à assistência a reclusos e libertados e estudar os critérios a observar na colaboração com voluntários;
h) Dirigir e inspeccionar as actividades do Serviço Social;
i) Promover, coordenar e incentivar acções dos educadores;
j) Promover, coordenar e incentivar acções destinadas à instrução dos reclusos;
k) Propor as dotações dos fundos permanentes;
l) Centralizar e organizar os arquivos e difundir as informações e documentos de utilidade para os serviços;
m) Organizar a estatística e elaborar o relatório anual das actividades da Direcção dos Serviços de Educação, Ensino e Serviço Social.
ARTIGO 3.º
(Composição da Direcção dos Serviços de Educação, Ensino e Serviço Social)
A Direcção dos Serviços de Educação, Ensino e Serviço Social compreende:
O Serviço de Educação;
O Serviço de Ensino;
O Serviço Social;
ARTIGO 4.º
(Competência do Serviço de Educação)
Compete ao Serviço de Educação:
a) Desenvolver as actividades necessárias ao melhor acolhimento dos reclusos, esclarecendo-os sobre os regulamentos e normas em vigor no estabelecimento, em colaboração com os técnicos do Serviço Social;
b) Colaborar na elaboração e actualização do plano individual de readaptação dos reclusos;
c) Acompanhar os reclusos durante a execução das penas;
d) Organizar, com a participação activa dos reclusos, actividades culturais, recreativas e de educação física, a fim de manter ocupados os tempos livres;
e) Promover conferências, colóquios e cursos especializados, de frequência facultativa, tendo em vista a aquisição de conhecimentos que facilitem a preparação para a liberdade;
f) Organizar e dinamizar mesas redondas com os reclusos sobre problemas relacionados, de preferência, com a reclusão, aproveitando, nomeadamente, projecções de filmes e programas de rádio e de televisão;
g) Manter os reclusos ao corrente dos acontecimentos relevantes para a comunidade, fomentando a leitura de jornais diários e de outras publicações e promovendo a elaboração de jornais de parede;
h) Colaborar com os responsáveis pelo sector do trabalho na distribuição dos reclusos pelas actividades profissionais mais adequadas às suas aptidões e motivá-los para o trabalho;
i) Dar os pareceres legalmente exigidos ou superiormente solicitados;
j) Prestar assistência durante o período das visitas aos reclusos;
k) Dar parecer, quando solicitado, nos casos de aplicação de sanções disciplinares mais graves aos reclusos;
l) Acompanhar os reclusos durante o cumprimento de sanções disciplinares, sempre que necessário;
m) Colaborar com os técnicos do Serviço Social na preparação dos reclusos para as saídas precárias e apoiá-los no seu regresso;
n) Organizar, manter e dinamizar bibliotecas para uso dos reclusos e funcionários;
o) Organizar a estatística e elaborar o relatório anual das actividades do Serviço.
ARTIGO 5.º
(Competência do Serviço de Ensino)
Compete ao Serviço de Ensino:a) Assegurar a ligação com o Ministério da Educação e Ciência para a efectivação dos acordos relativos à instrução dos reclusos e promover novas modalidades de cooperação;
b) Apoiar, em coordenação com os serviços próprios do Ministério da Educação e Ciência, as direcções dos estabelecimentos prisionais na criação e organização de cursos escolares dos diferentes graus de ensino;
c) Providenciar, em colaboração com as direcções dos estabelecimentos prisionais, para que o ensino seja ministrado em instalações capazes e com o equipamento escolar pedagogicamente aconselhado;
d) Criar ou propor estímulos e recompensas para incentivar o interesse dos reclusos pelas actividades escolares;
e) Apoiar os reclusos que manifestem interesse sério em tirar cursos por correspondência;
f) Dar apoio, quando solicitado, aos cursos de formação profissional a realizar nos estabelecimentos prisionais;
g) Recolher e manter actualizados os dados estatísticos referentes ao ensino nos estabelecimentos prisionais;
h) Colaborar com o Serviço de Educação na organização e dinamização de bibliotecas para uso dos reclusos e dos funcionários;
i) Elaborar o relatório anual das actividades do Serviço.
ARTIGO 6.º
(Competência do Serviço Social)
Compete ao Serviço Social:a) Realizar estudos, inquéritos e relatórios sociais;
b) Colaborar na elaboração e actualização do plano individual de readaptação dos reclusos;
c) Assistir os reclusos e preparar a sua libertação, em colaboração com outros elementos do pessoal;
d) Assegurar a ligação dos reclusos com o meio social, especialmente com as famílias, e, no caso de reclusos estrangeiros, promover a ligação com organismos e entidades representantes do país de origem;
e) Acompanhar o trabalho e o estudo dos reclusos no meio livre;
f) Prestar assistência durante o período das visitas aos reclusos;
g) Preparar os reclusos para as saídas precárias e apoiá-los no seu regresso, em colaboração com os educadores;
h) Dar parecer, quando solicitado, nos casos de sanções disciplinares mais graves;
i) Acompanhar os reclusos durante o cumprimento de sanções disciplinares, sempre que necessário;
j) Colaborar com as direcções dos estabelecimentos prisionais na criação de infantários para filhos de reclusos;
k) Prestar apoio psicológico, moral e material às famílias dos reclusos, directamente ou por intermédio das instituições de assistência, públicas e privadas;
l) Prestar apoio pós-prisional aos libertados, diligenciando especialmente pela obtenção de postos de trabalho;
m) Promover acções de intervenção comunitária, visando a prevenção da criminalidade e a reintegração social dos delinquentes;
n) Promover a sensibilização da opinião pública para os problemas dos delinquentes e da acção penitenciária;
o) Organizar a estatística e elaborar o relatório anual das actividades do Serviço.
ARTIGO 7.º
(Competência do Serviço Administrativo)
Compete ao Serviço Administrativo:
a) Assegurar todo o expediente da Direcção dos Serviços de Educação, Ensino e Serviço Social;
b) Organizar e manter actualizados os ficheiros e os processos sociais de todos os delinquentes a cargo dos serviços e difundir as informações pelos serviços interessados;
c) Colaborar com a secretaria na organização e actualização dos processos individuais dos funcionários da Direcção dos Serviços de Educação, Ensino e Serviço Social;
d) Conferir, registar e remeter à contabilidade as notas de despesa respeitantes a transportes e ajudas de custo dos funcionários referidos na alínea anterior;
e) Propor a aquisição do equipamento e material de expediente necessário aos serviços;
f) Escriturar e manter actualizados os livros das contas do fundo permanente dos serviços centrais e apreciar as contas da administração dos fundos permanentes dos serviços externos;
g) Administrar os artigos em armazém;
h) Organizar a estatística e elaborar o relatório anual das actividades do Serviço.
ARTIGO 8.º
(Direcção e coordenação dos educadores e técnicos do Serviço Social)
Os educadores dependem dos directores dos estabelecimentos prisionais, recebendo apoio técnico da Direcção dos Serviços de Educação, Ensino e Serviço Social. Os técnicos do Serviço Social dependem administrativamente dos directores dos estabelecimentos prisionais e dos juízes dos tribunais de execução das penas onde exercem as funções e, tecnicamente, da referida direcção de serviços.
ARTIGO 9.º
(Disposição transitória)
Enquanto não for publicada a nova lei orgânica da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, as atribuições enumeradas nos artigos anteriores são desempenhadas pela Inspecção do Serviço Social, pelos funcionários administrativos que nela prestam serviço e pelos funcionários dos quadros de educadores e orientadores sociais.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 21 de Maio de 1980. - Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Promulgado em 21 de Maio de 1980.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.