Resolução 6/82/A
Pronúncia da Assembleia Regional dos Açores sobre os projectos de revisão constitucional
1 - A Assembleia Regional dos Açores emite o seguinte parecer sobre os 4 projectos de revisão constitucional presentemente em análise na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.
2 - Dos 4 projectos, apenas 2 - o da AD e o da FRS - apresentam significativas propostas de alteração com incidência no regime constitucional das regiões autónomas.
O parecer recai sobre a parte da revisão que, directa ou indirectamente, tem a ver com o regime político-administrativo das regiões autónomas e divide-se em 4 partes, consoante as matérias tratadas:
1.ª parte «Definições fundamentais» (artigos 6.º, 227.º e 311.º, n.º 2, da Constituição);
2.ª parte «Organização política das regiões autónomas» (artigos 228.º a 236.º da Constituição);
3.ª parte «Associação das regiões autónomas a decisões nacionais» (artigos 143.º do projecto da AD e 78.º do projecto da FRS);
4.ª parte «Outros preceitos com incidência regional» (artigos 107.º, 139.º, segundo o artigo 75.º do projecto da FRS, 167.º, 168.º, 170.º, 200.º, 238.º, 243.º, 244.º, 249.º, 258.º e 281.º da Constituição e 155.º do projecto da FRS).
As páginas que se indicam sem referência a qualquer obra reportam-se à separata n.º 6/II do Diário da Assembleia da República, de 26 de Junho de 1981, que inclui os projectos de revisão constitucional.
II
1.ª parte «Definições fundamentais»
3 - Artigo 6.º:
A Assembleia Regional entende que é de adoptar o artigo 6.º do projecto da AD porque substitui a expressão «estado unitário» por «estado unitário regional», a qual traduz melhor a forma concreta de organização do Estado Português, derivada da existência de regiões autónomas, e harmoniza este preceito com o restante ordenamento constitucional.
4 - Artigo 227.º:
A Assembleia pronuncia-se pela adopção do texto do projecto da AD, com a substituição da expressão «territórios insulares» por «arquipélagos». Este texto elimina o n.º 3 do actual, que fica inserido, como já se viu no artigo 6.º, n.º 1, insere no seu n.º 1 uma referência, nova, à vontade democraticamente expressa das populações, o que sublinha a ideia de autonomia democrática e insere o qualificativo «própria» na defesa dos interesses regionais, para sublinhar o poder de iniciativa que está ínsito no conceito de autonomia, e a assunção pela Região da defesa, sem intermediários, daquilo que melhor lhe convier.
5 - Artigo 311.º:
A Assembleia pronuncia-se pela eliminação do presente preceito por não parecer ter uma razão séria de ser e contrariar as regras democráticas, para além do facto de a sua eficácia ser bastante duvidosa.
III
2.ª parte «Organização política das regiões autónomas»
6 - Artigo 228.º:
A Assembleia concorda com o aditamento proposto pela AD e FRS para o n.º 4. Em virtude de a expressão «tomará a decisão final» constante do n.º 3 do presente artigo corresponder a uma terminologia normalmente usada por órgãos judiciais e administrativos singulares e não por assembleias legislativas, a Assembleia Regional preconiza a seguinte redacção:
3 - Elaborado o parecer, a Assembleia da República voltará a apreciar em definitivo o projecto ou suas alterações posteriores, aprovando-o ou rejeitando-o.
7 - Artigo 229.º:
A Assembleia Regional concorda com a supressão do n.º 2, por se tratar de matéria que tem melhor cabimento em artigo próprio (artigo 236.º do projecto da AD e artigo 282.º da Constituição, por força do artigo 155.º do projecto da FRS).
8 - Artigo 229.º:
A Assembleia Regional concorda com o texto do projecto da AD, considerando, porém, ser de alterar a parte final «com respeito pela competência própria dos órgãos de soberania» por «com respeito pela competência reservada dos órgãos de soberania».
A concordância da Assembleia Regional com o projecto da AD, nos termos acima expostos, assenta nas seguintes considerações:
a) Explicitar, segundo a terminologia do artigo 164.º, alínea d), da Constituição, que os diplomas emanados da Assembleia Regional são leis, pondo termo à confusão conceitual suscitada por se lhes chamar decretos regionais;
d) Suprimir a referência a leis gerais da República, conceito que não se encontra claramente definido no nosso ordenamento jurídico, principalmente na óptica da actual organização do Estado Português, e que, por isso mesmo, é fonte constante de dúvidas e interpretações diversas que conduzem a uma menor eficiência na produção legislativa e, consequentemente, na resolução dos problemas das comunidades regionais.
Com a redacção proposta obvia-se aos referidos inconvenientes, porquanto fica recortada com precisão a competência legislativa das regiões autónomas, cujo âmbito é o definido pelas matérias de interesse específico, com as limitações decorrentes da competência exclusiva atribuída pela Constituição aos órgãos de soberania.
9 - Artigo 229.º:
1 - a) ...
a)1 «...»
A Assembleia Regional pronuncia-se pela introdução de uma nova alínea - a)1 - que preveja expressamente a autorização legislativa, aliás prevista no artigo 168.º do projecto da AD. Fundamenta este entendimento no disposto na Constituição relativamente às autorizações legislativas concedidas ao Governo, as quais vêm referidas no artigo 168.º (quanto à Assembleia da República) e no artigo 201.º, n.º 1, alínea b), quanto ao próprio Governo).
Para o efeito, propõe-se o seguinte texto:
Fazer leis regionais nas matérias da competência reservada da Assembleia da República, mediante autorização deste órgão de soberania.
10 - Artigo 229.º, alínea b):
A Assembleia Regional entende ser de adoptar da alínea b) do artigo 229.º do projecto da AD por a mesma atribuir, sem restrições, às regiões autónomas o poder regulamentar que, aliás, decorre da existência de poder executivo próprio, consagrado na alínea d) do n.º 1 do artigo 229.º da Constituição.
11 - Artigo 229.º, alínea c):
A Assembleia pronuncia-se, basicamente, pelo texto proposto pela FRS, com exclusão do termo «respectivas», que é susceptível de originar dúvidas e interpretações diversas. O texto clarifica os poderes regionais de intervenção no processo legislativo perante a Assembleia da República, admitindo que, além de propostas de lei, se apresentem também propostas de alteração. O texto é o seguinte:
Exercer iniciativa legislativa mediante a apresentação à Assembleia da República de propostas de lei e propostas de alteração.
12 - Artigo 229.º, alínea e):
A Assembleia pronuncia-se pela manutenção do texto em vigor da Constituição (igual ao da proposta da AD), entendendo não ser conveniente adoptar o aditamento proposto pela FRS, por o mesmo poder conduzir a uma interpretação limitativa dos poderes da Região em matéria de fontes de financiamento do orçamento regional, para além do facto de se tratar de matéria cuja sede própria serão os estatutos das regiões autónomas.
13 - Artigo 229.º, alínea f):
A Assembleia Regional pronuncia-se pelo seguinte texto: «definir o sistema fiscal regional».
Assim, fica reconhecido, de forma expressa, o direito de as regiões disporem de um regime fiscal adequado à sua realidade e necessidades.
14 - Artigo 229.º, alínea f):
A Assembleia pronuncia-se pelo texto da FRS (artigo 126.º, n.º 3, da p. 89), por se entender que amplia os poderes das regiões, embora já existentes, ao explicitar o poder tributário regional.
15 - Proposta de alteração:
O Grupo Parlamentar do PSD propõe que a alínea g) do artigo 229.º da Constituição passe a ter a seguinte redacção:
Exercer poder de tutela sobre as autarquias locais, bem como tarefas de coordenação e apoio à acção dos municípios, sem limitação dos respectivos poderes.
A Assembleia Regional entende ser de adoptar a alteração proposta pela FRS, por a mesma harmonizar o disposto neste preceito na Constituição para as autarquias; mas com uma alteração, aliás, também, de acordo com outro texto da FRS, relativo ao artigo 257.º da Constituição.
Na verdade, não é compreensível que as regiões autónomas tenham menos poderes, no que toca aos municípios, do que as regiões administrativas.
16 - Artigo 229.º, alínea h):
A Assembleia Regional entende ser de adoptar, basicamente, o projecto da FRS, por clarificar e precisar os poderes regionais de superintendência e ampliá-los a entidades com actividade predominantemente regional. O texto é o seguinte:
Superintender nos institutos e empresas públicas sediados na Região, ou que nela exerçam a sua actividade principal, e noutros casos em que o interesse regional o justifique.
17 - Artigo 229.º, alínea i):
A Assembleia Regional é do parecer de adoptar a alínea l) do artigo 229.º, (p. 52 do projecto AD), por significar um aperfeiçoamento do texto actual, com a introdução da palavra «elaborar».
18 - Artigo 229.º, alínea j):
A Assembleia Regional preconiza o texto da alínea m) do artigo 229.º do projecto da AD, por corresponder a uma redacção mais correcta, pondo termo a relações entre causa e efeito que não eram inteiramente exactas.
19 - Proposta de aditamento de uma alínea m) ao artigo 229.º, de acordo com projecto da FRS, artigo 126.º, n.º 6, a p. 89:
A Assembleia Regional é de parecer ser de adoptar aquela proposta, em virtude de ampliar o direito de participação política.
20 - Proopsta de aditamento de uma alínea n) ao artigo 229.º:
Aprovado o aditamento constante da proposta da AD (p. 52), por consagrar uma ampliação dos poderes regionais em áreas jurídicas que, não pondo em causa os direitos fundamentais, permite estabelecer uma disciplina «por medida» a vários tipos de relações, fundamentalmente ligadas à actividade administrativa e económica.
21 - Artigo 230.º:
O artigo 230.º, como é reconhecido pelos comentadores, integra, na sua maior parte, proibições e limites já constantes de outros passos da Constituição. Acham-se nesta situação as matérias da sua alínea b), quanto ao trânsito de pessoas (cf. Constituição, artigos 17.º, 18.º e 44.º, n.º 1), e as da sua alínea c) [cf. Constituição, artigos 13.º, 17.º, 18.º, 51.º e 167.º, alínea c)]. Constituíram inovação restrita a matéria da alínea a), quanto aos direitos não garantidos constitucionalmente, seja em termos materiais, seja em termos orgânico-formais, e as restrições quanto ao trânsito de bens.
Relativamente à alínea a), entende-se que ela não pode ser mantida. Os direitos ditos fundamentais dos trabalhadores acham-se garantidos pela Constituição nos artigos 51.º a 60.º
Saber quais são os direitos não fundamentais dos trabalhadores constitui tarefa relativamente difícil e parece evidente que só o órgão jurisdicional competente poderá, caso a caso, concretizá-la. Em abstracto, porém, afigura-se que tais direitos não fundamentais têm uma natureza acidental, marcada pelas condições da conjuntura, e variável com os tempos e os lugares.
Isto conduz, sem qualquer esforço, a deixar a definição de tais direitos acidentais aos órgãos constitucionalmente competentes para definirem e executarem a política regional, muito especialmente nas suas incidências sócio-económicas.
Trata-se, naturalmente, dos órgãos regionais, cuja democraticidade, representatividade, capacidade política e exercício territorial de poderes do Estado ninguém tem o direito de pôr em dúvida, sob pena de estar em contradição com a filosofia política subjacente à Constituição do nosso país.
Ora, são os órgãos regionais quem faz e executa o plano regional, quem intervém nos mecanismos do mercado e tem uma política económica que lhes compete desenvolver e são quem está em condições de conhecer, melhor que ninguém, a situação laboral de uma região formada por pequenas parcelas descontínuas, com estruturas de produção ainda arcaicas, com uma agricultura minifundiária e em grande parte com a forma familiar imperfeita, e uma taxa de desemprego inferior a 2%. É inadmissível querer nivelar situações laborais de áreas metropolitanas com a situação dos Açores, respeitados que sejam, claro, os direitos fundamentais dos trabalhadores, que são iguais para todo o País. Acrescentar-se-á, finalmente, que a Região, até agora e no que toca a direitos dos trabalhadores, justamente por ser pequena e ser rural, se atreveu àquilo que os órgãos de soberania não foram capazes de fazer: legislou sobre o trabalho rural, criando direitos (conjunturais e locais) de que os outros trabalhadores portugueses ainda estão à espera [parte final da alínea b) do artigo 230.º].
Quanto às restrições ao trânsito de bens entre as regiões e o restante território nacional, entende a Comissão que elas devem desaparecer. Além das restrições gerais que decorrem da Constituição, esta parte final da alínea b) do artigo 230.º tem o condão de criar o privilégio negativo de serem as regiões autónomas a única entidade portuguesa de direito público constitucionalmente proibida, em termos expressos, de restringir o trânsito de bens em relação ao seu exterior. Os órgãos regionais não são irresponsáveis e precisam de providenciar, como têm feito, quanto à defesa sanitária da Região, impedindo a importação de mercadorias potencialmente veiculadoras de epidemias e de epizootias, como aliás resulta de normas internacionais acolhidas no direito português. Igualmente, poderá o Governo Regional ter de controlar determinadas exportações, em conformidade com um programa de governo que preveja intervenções no mercado, uma política de defesa do consumidor e a garantia do abastecimento público em todas ou algumas ilhas em épocas de especial dificuldade de transporte.
22 - Nova redacção proposta pela AD para o n.º 2 do artigo 231.º (p. 52):
A Assembleia é favorável a esta proposta, por consolidar e ampliar os direitos regionais de audição, em termos já em certa medida vinculativos para os órgãos de soberania, no que toca aos condicionalismos regionais, devendo, no entanto, ser substituída a expressão «territórios insulares» por «arquipélagos dos Açores e da Madeira», à semelhança do que ficou expresso no artigo 227.º
23 - Artigo 232.º:
1 - (Igual ao projecto da AD) (p. 52):
A Assembleia é favorável ao texto proposto pela AD. Este texto consagra linhas básicas do entendimento, que resultam do artigo 51.º do Estatuto, quanto à intervenção dos órgãos de governo próprio da Região nos actos preparatórios da escolha do Ministro da República. O texto da AD põe termo a uma situação que era duvidosa antes do Estatuto e que levara mesmo o Conselho da Revolução a não se pronunciar pela inconstitucionalidade da nomeação do Ministro da República, para a qual não haviam sido ouvidos os órgãos do governo próprio da Região.
2 - (Igual ao projecto da AD) (p. 52).
3 - (Igual ao projecto da AD) (p. 52):
A Assembleia concorda com os n.os 2 e 3 propostos pela AD por entender que os mesmos definem com clareza a função do Ministro da República. Fica assim delimitada a função do Ministro da República como representante da soberania nacional, mas sem interferência na administração regional.
No entanto, o n.º 3 entende-se que deveria ficar com a seguinte redacção:
O Ministro da República superintende nas funções administrativa exercidas pelo Estado na Região.
24 - Artigo 233.º:
A assembleia entende adoptar o projecto da AD, por conter melhorias formais e uma explicitação útil, consistente na referência expressa às relações regionais. Entende-se, ainda, que o actual n.º 3 deve ser eliminado, por estabelecer limitações que, por muito exactas que sejam, só devem ter lugar no Estatuto da Região.
25 - Artigo 234.º:
A Assembleia entende recomendar o texto do n.º 1, segundo o projecto da AD; mas com a substituição da expressão «por práticas de actos contrários à Constituição» por «no caso de situações de conflito institucional entre órgãos de governo próprio da Região que inviabilizem a governação da mesma».
A substituição destina-se a vincar o carácter anormal da faculdade de dissolução, pois que só determinadas situações atingirão a gravidade justificativa de uma dissolução. Prefere-se o texto agora proposto para este número por duas razões: a primeira, por prever apenas a dissolução da Assembleia, uma vez que, em bom rigor técnico, o Governo não é dissolúvel; a segunda, por criar a obrigatoriedade da audiência do Governo da República antes da dissolução, uma vez que todas as cautelas são poucas para o Presidente da República tomar uma decisão de tamanha gravidade.
Relativamente ao n.º 2, a Assembleia concorda com o texto da AD, que corresponde inteiramente ao n.º 3 do texto da FRS.
Relativamente aos n.os 3 e 4, a Assembleia concorda com o texto da AD, o qual inclui a eliminação do n.º 4.
A fórmula prevista pela AD para o n.º 3 parece a mais adequada, porque nada permite afirmar, à partida, que o Governo Regional deva sempre ficar impedido de assegurar a gestão corrente em caso de dissolução da Assembleia. Interessa mesmo referir que será muito difícil a qualquer Ministro da República gerir a administração regional, ainda por cima com o encargo de fazer novas eleições, durante um período que pode ir até aos 3 meses. Por isso, a fórmula da AD parece a mais realista, deixando ao decreto de dissolução o definir quem governará a Região até às eleições, e até em que medida o irá fazer.
26 - Artigo 235.º:
A Assembleia entende pronunciar-se pelo texto do projecto da AD.
A Assembleia regista que o projecto da AD assumiu e consagrou, basicamente, a fórmula constante do artigo 29.º do Estatuto, que permite a ultrapassagem do chamado veto de bolso. Assumiu e consagrou ao mais alto nível, visto que é esse o sistema a adoptar para o veto do Presidente da República relativamente às leis e decretos-leis, segundo o artigo 139.º do projecto da AD.
Relativamente às regiões autónomas, o artigo 235.º não coincide inteiramente com o artigo 29.º do Estatuto, mas por razões que são positivas, úteis e de perfilhar:
1.ª razão: desaparece o controle preventivo da constitucionalidade, por o mesmo não ter lugar na nova filosofia constitucional;
2.ª razão: prevê-se a figura do veto tácito do Ministro da República, dando origem a uma reapreciação por maioria qualificada, o que não sucedia até agora. O processo é de acolher, visto que só pode levar a uma melhor ponderação do corpo legislativo sobre o diploma;
3.ª razão: permite-se a ultrapassagem, por via da Assembleia Regional, de decretos regulamentares do Governo, se vetados pelo Ministro da República.
Esta nova faculdade parece decorrer do deferimento ao Governo dos poderes regulamentares da legislação nacional, visto que para os demais poderes regulamentares não se prevê sequer a assinatura do Ministro da República. Esta opção é de fundo, e concorda-se com ela, porquanto consagra o reconhecimento do poder executivo próprio, que abrange, como regra, o poder regulamentar.
27 - Artigo 236.º:
A Assembleia preconiza o texto proposto pela AD. Este texto substitui um outro, completamente diferente, que regulamentava o papel da Comissão Consultiva para os Assuntos das Regiões Autónomas, a qual, assim, desaparece. Com efeito, a figura da ilegalidade dos diplomas regionais deixa de ter autonomia, passando a apreciar-se apenas em sede de constitucionalidade.
Este novo artigo 236.º reforça os poderes da Assembleia Regional como legítima representante da Região, ao atribuir-lhe a faculdade de defesa desta, perante as instâncias jurisdicionais competentes, tanto em caso de inconstitucionalidade como de qualquer desconformidade com a lei.
As fontes deste novo artigo são, sem dúvida, o n.º 2 do artigo 229.º da actual Constituição e - com menor nitidez - o n.º 1, alínea b), conjugado com o n.º 3 do actual artigo 236.º, agora votado ao desaparecimento.
28 - Artigo 236.º-A (p. 53):
A Assembleia entende pronunciar-se pelo texto do projecto AD, aliás decalcado sobre o artigo 8.º do Estatuto. Este texto é menos limitativo, pelo menos em termos conceituais, do que o projecto da FRS. Isto só por si imporia a sua adopção, até como factor a considerar no elemento histórico de futuras interpretações constitucionais. Em qualquer caso, é preferível prever-se uma organização judiciária para as regiões a uma simples adaptação de uma organização judiciária nacional única.
29 - Artigo 236.º-B (p. 53):
A Assembleia é favorável à introdução deste novo artigo, o qual vem consagrar precedentes que têm vindo a verificar-se nos últimos 5 anos, sempre com prestígio para os interesses portugueses. A cooperação internacional ao nível regional ainda é bastante incipiente na Europa, mas já existem associações inter-regionais que trocam experiências e põem interesses em comum, contribuindo para o desenvolvimento regional, sobretudo nas regiões periféricas e menos favorecidas.
IV
3.ª parte «Associação das regiões autónomas a decisões nacionais»
30 - O artigo 143.º (p. 45) do projecto AD prevê a existência de um Conselho de Estado, com 12 membros, entre os quais os presidentes dos governos regionais. O artigo 78.º do projecto da FRS (p. 82) prevê o Conselho da República, constituído por - artigo 142.º - um número superior a 18 pessoas, entre as quais os presidentes das assembleias das regiões autónomas.
O projecto do MDP/CDE não prevê a presença regional no Conselho da República; o projecto do PCP prevê a recondução do Conselho da Revolução.
A Assembleia entende que nenhuma das soluções preconizadas é satisfatória no que toca à participação das regiões autónomas.
O Estatuto desta Região diz que a representação dela cabe aos respectivos órgãos de governo próprio (artigo 5.º), sem privilegiar nenhum deles. Tem sido defendido, e a partir desta Região, que as instituições autonómicas regionais participem no exercício do poder político nacional, o que hoje consta mesmo do artigo 3.º, n.º 2, do Estatuto. E tem-se sustentado que uma das formas de consolidar o Estado democrático consiste justamente em associar os órgãos regionais às grandes decisões nacionais. Esta associação, no que respeita ao Presidente da República, deve exercer-se pela participação no seu órgão de conselho, seja o estritamente político, seja aquele que, como abaixo se dirá, tem que ver com a defesa nacional.
Acresce que se prevê que o Presidente da Assembleia da República e o Primeiro-Ministro integrem aquele Conselho.
A mesma lógica sugere que os legislativos e executivos regionais lá estejam também.
Tem-se presente a pequenez das duas regiões autónomas. Mas também se sabe que o respectivo peso político decorrente da importância geostratégica sobreleva em muito a sua dimensão humana, territorial e económica.
31 - Apenas o projecto da FRS - no seu mesmo artigo 78.º - prevê, a par do Conselho da República, um Conselho Superior de Defesa Nacional, composto pelo Primeiro-Ministro, por vários ministros e deputados, além de certos chefes militares.
A Assembleia entende que, no caso de vir a criar-se um Conselho Superior de Defesa Nacional, o mesmo deverá incluir a representação das regiões autónomas, através dos seus 2 órgãos de governo próprio.
Esta pretensão baseia-se no papel que, historicamente, as regiões autónomas sempre desempenharam e continuam a desempenhar num contexto político-militar atlântico e, por via disso, português. Elas fazem que exista o chamado «triângulo estratégico português». A consideração da sua existência determina muitas das opções nacionais em matéria de política internacional; é pressuposto de compromissos militares portugueses, de vantagens, de riscos e até de inevitáveis pressões a que se encontra sujeito o nosso país.
De tudo isto decorre mesmo que a estabilidade política, o progresso económico e a paz pública nas regiões autónomas arrastam implicações que têm muito que ver com a política de defesa nacional e os compromissos militares do Estado Português.
Acresce ainda o direito constitucional das regiões a participar nos acordos internacionais que lhes digam respeito [cf. artigo 229.º, n.º 1, alínea l), da Constituição], direito esse que se acha explicitado nos artigos 60.º, alíneas d) e e), 61.º e 62.º do Estatuto, com grande relevância para os acordos de natureza militar [v. artigo 61.º, alíneas a) e b)]. Esta participação existe ao nível da negociação dos acordos e das respectivas comissões de execução ou fiscalização (Estatuto, artigo 62.º), o que vinca o profundo envolvimento da Região e dos seus órgãos neste tipo de relações.
V
4.ª parte «Outros preceitos com incidência regional»
32 - Artigo 107.º:
Relativamente às regras sobre o sistema fiscal e impostos, a Assembleia entende ser indispensável a introdução de uma ressalva para que a alínea f) do artigo 229.º possa ter um conteúdo efectivo e útil. Assim, o último número a acrescentar ao artigo 107.º seria do seguinte teor:
O disposto neste artigo não prejudica a definição prevista na alínea f) do artigo 229.º (conforme proposta por esta Assembleia Regional).
33 - Artigo 139.º:
O artigo 75.º do projecto da FRS, p. 82, propõe o aditamento de um novo n.º 3, no sentido de ser necessária uma maioria de dois terços dos deputados em efectividade de funções para a confirmação de decretos respeitantes ao Estatuto das regiões autónomas.
A Assembleia pronuncia-se contra a existência desta maioria qualificada, por entender que a mesma hipertrofia a função presidencial e a das minorias em detrimento da maioria absoluta na Assembleia da República.
Mais: reduz a um maior apagamento o papel das Assembleias Regionais, únicas entidades com competência para desencadear o processo de feitura e da revisão dos estatutos. Até por isso o processo de confirmação de um decreto estatutário vetado não é comparável ao de outros de especial gravidade, previstos no n.º 3 do artigo 139.º, precisamente porque este tem, na sua origem, uma manifestação de vontade regional, legitimamente expressa através do seu órgão representativo parlamentar.
34 - Em matéria de reserva relativa de competência legislativa, a AD [artigo 167.º, n.º 2, alínea b), p. 47] e a FRS [artigo 87.º, com referência ao artigo 168.º, da Constituição, n.º 1, alínea d), p. 84] ampliam a reserva de competência legislativa da organização das autarquias locais [actual artigo 167.º, alínea h)], para uma realidade muito mais ampla, que abrange, além da organização das autarquias, todo o seu estatuto - as suas atribuições, a competência dos seus órgãos, o regime das suas finanças e, além disso, a divisão territorial.
A Assembleia pronuncia-se a favor da manutenção da reserva de competência nos precisos termos do artigo 167.º, alínea h), da Constituição, no seu texto actual. Desta maneira, entende a Assembleia que a reserva de competência não abrange o estatuto das autarquias, designadamente as suas atribuições, a sua competência, o seu sistema financeiro e a divisão territorial, mesmo reduzida às bases gerais.
Esta Assembleia, nos 5 anos que traz de vigência, já tomou posições e definiu precedentes sobre esta matéria.
Pôs em relevo que os artigos 239.º, 240.º e 241.º da Constituição distinguem conceitualmente quanto às autarquias, as suas atribuições, a sua organização, a sua competência e o regime das suas finanças. O que a levou a entender, por recurso ao elemento sistemático da interpretação, que apenas a organização, ou seja, a estrutura das autarquias, era da competência reservada à Assembleia da República.
E porque assim entendeu, já atribuiu, por decretos regionais, competências específicas às assembleias municipais (Decreto Regional 11/77/A, de 20 de Maio, artigo 9.º, n.os 1 e 2) e às assembleias de freguesia (Decreto Regional 4/81/A, de 15 de Abril, artigo 2.º, n.º 3).
Outrossim, porque a divisão do território não era matéria da competência reservada, esta Assembleia criou critérios, novos e específicos, para a elevação de vilas a cidades e de povoações a vilas na Região Autónoma dos Açores (Decretos Regionais n.os 6/81/A, de 23 de Maio, e 14/81/A, de 13 de Julho) elevou, concretamente, duas vilas à categoria de cidades (Decretos Regionais n.os 7/81/A, de 20 de Julho, e 9/81/A, de 29 de Julho) e criou várias novas freguesias (Decretos Regionais n.os 24/80/A, de 15 de Setembro, e 27/80/A, de 18 de Setembro).
Tudo isto se fez ao abrigo das disposições combinadas dos artigos 229.º, n.º 1, alínea a), e 167.º da Constituição e 27.º, alínea b), do Estatuto.
Por outro lado, definiu critérios sobre a delimitação e coordenação quanto aos investimentos das administrações regional e local e formulou duas propostas para alteração da Lei das Finanças Locais conducentes a uma intervenção significativa dos órgãos regionais nesse sector.
Não será demais acentuar que as peculiares características territoriais da Região Autónoma dos Açores, dispersa por 9 pequenas ilhas, determinam tipos de povoamento profundamente diferentes dos do continente português e, até, dos da Região Autónoma da Madeira. Aquelas características foram tenuamente levadas em consideração no Estatuto dos Distritos Autónomos das Ilhas Adjacentes, quanto às freguesias da Madeira e às povoações, únicas, de Porto Santo e do Corvo, consideração que desapareceu na rasoira igualitária da Lei 79/77, de 25 de Outubro.
Acresce ainda que os órgãos de governo próprio - representantes de uma comunidade com um quarto de milhão de pessoas - vivem em contacto permanente e directo com as populações e, integrados por elementos de todas as 9 ilhas, gozam da invulgar qualidade de uma representatividade profunda e total, estão aptos a aprender e pesar directamente as sensibilidades locais, a avaliar quais as autarquias que podem mais e as que podem menos e a dosear, por isso, conforme os casos, as respectivas competências e até alguns aspectos do seu estatuto financeiro. Nomeadamente, é possível, e está até previsto e já consagrado, que a administração regional autónoma, para o exercício de certos dos seus poderes, recorra às autarquias como uma forma possível de descentralização dos serviços regionais, o que nesta região é evidente para as ilhas de pequena dimensão, nas quais não se justifica criar delegações de todos os serviços regionais. De tudo isto decorre que a Região Autónoma deve ter o poder de se organizar ao nível de toda a administração, respeitados que sejam os princípios constitucionais de carácter político relativos ao poder local.
De maneira que aceitar-se as ampliações propostas era aceitar a diminuição de poderes legislativos regionais, que até agora têm sido efectivamente exercidos.
35 - Artigo 168.º:
A Assembleia pronuncia-se a favor deste preceito.
A possibilidade de autorizações legislativas às Assembleias Regionais - em matérias de competência reservada à Assembleia da República - significa um alargamento importante dos poderes legislativos regionais.
É realmente um novo poder legislativo, poder derivado, ao contrário dos outros poderes previstos no artigo 229.º, que não são derivados ou que não são provenientes de qualquer delegação.
36 - Artigo 170.º, n.º 4:
A Assembleia é favorável ao novo n.º 4 do artigo 17.º do projecto da AD por o mesmo explicitar um entendimento que parece mais adequado.
37 - Artigo 170.º, n.º 6:
A Assembleia entende que o n.º 6 deste artigo deve incluir as Assembleias Regionais das Regiões Autónomas entre as entidades com competência para solicitar o processo de urgência. E isto porque a Assembleia Regional é um órgão que dispõe de iniciativa legislativa perante a Assembleia da República.
38 - Artigo 238.º:
A Assembleia concorda com a alteração ao artigo 238.º, n.º 3, da Constituição, proposta no artigo 132.º da FRS (p. 90), por entender que as ilhas podem justificar formas especiais de organização territorial autárquica. Todavia, considera-se útil que fique explicitado poderem estas formas especiais ser de substituição.
Com efeito, o já citado exemplo do regime existente no Corvo e Porto Santo, em cada um dos quais a existência de uma pequena povoação justificou a criação de uma única autarquia, com supressão da freguesia, ilustra a conveniência e a justeza daquela explicitação.
39 - Artigo 243.º:
A Assembleia considera preferível o texto do n.º 1 do projecto da AD, porque este deixa à lei a definição do conteúdo da tutela administrativa. É o sistema até agora vigente e será imprudente criar um bloqueio constitucional, cuja vantagem está ainda longe de ser clara.
40 - Artigo 244.º:
A Assembleia entende que este artigo deve ser suprimido pela controvérsia que se gera à volta dele, pelos problemas que na Região tem criado a existência do actual quadro geral administrativo, pelas profundas divergências sobre o artigo que se vêem nos quatro projectos e por achar que a matéria não tem dignidade constitucional, cabendo inteiramente na lei ordinária.
41 - Artigo 249.º:
A Assembleia pronuncia-se a favor do texto da FRS (artigo 137.º, p. 90), no entendimento de que a lei ali referida será regional e porque o artigo actualmente vigente, pelos seus próprios termos, não pode continuar como está.
42 - Artigo 258.º:
A Assembleia entende que deverá ser substituída por outra a expressão «Assembleia Regional» - das regiões administrativas -, por se tratar de um órgão profundamente diferente das Assembleias Regionais das Regiões Autónomas, cujo designativo, cuja função e cuja dignidade se consagraram ao longo dos últimos 5 anos.
43 - Artigo 281.º:
A Assembleia pronuncia-se a favor do texto do projecto AD (p. 56), o que significa uma tomada de posição contra o texto para o artigo 282.º da FRS (artigo 155.º do respectivo projecto), especialmente quando este confere competência aos grupos parlamentares das Assembleias Regionais para impugnarem normas pretensamente violadoras do Estatuto. Entende-se, na verdade, que tal competência deverá caber às próprias Assembleias.
Aprovado pela Assembleia Regional dos Açores em 15 de Setembro de 1981.
O Presidente da Assembleia Regional dos Açores, Álvaro Monjardino.