Decreto Legislativo Regional 21/2019/A
Sumário: Define a estratégia para a implementação da mobilidade elétrica nos Açores.
Define a estratégia para a implementação da mobilidade elétrica nos Açores
A Região Autónoma dos Açores tem implementado, nos últimos anos, uma política energética alinhada com as orientações e com os compromissos nacionais e internacionais subscritos nesta temática, mas também com novos desafios que, entretanto, têm surgido e aos quais tem sabido corresponder.
Atualmente, um dos principais desafios com que a Humanidade se depara é o fenómeno das alterações climáticas, cujos impactes ameaçam reverter décadas de desenvolvimento, com efeitos especialmente gravosos nos territórios mais frágeis, como sejam as zonas costeiras e as ilhas.
A luta contra os efeitos das alterações climáticas faz-se em dois planos, através da mitigação e da adaptação. No plano da mitigação, reduzindo as emissões de gases com efeito estufa (GEE), investindo na descarbonização e no aumento da eficiência energética, tornando-a menos dependente dos recursos energéticos externos. No plano da adaptação, implementando medidas que protejam os recursos, as pessoas e bens, aumentando a resiliência aos impactes das alterações climáticas.
Neste sentido, o Programa do XII Governo Regional dos Açores definiu, para a área da energia, diversos objetivos que visam adotar ou reforçar políticas de redução de consumo de combustíveis fósseis e de dependência energética face ao exterior, de promoção de consumos e comportamentos energeticamente eficientes, de aposta na inovação, na tecnologia e na eficiência energética, bem como potenciar os Açores, no contexto das regiões insulares e ultraperiféricas europeias, como um verdadeiro laboratório de soluções para a mobilidade elétrica.
Os Açores reúnem condições ideais para a implementação da mobilidade elétrica, considerando a crescente autonomia dos veículos elétricos, as características geográficas, fisiográficas e ambientais de cada uma das ilhas e as suas dimensões. Estas condições propiciam a existência de percursos médios diários relativamente curtos face à autonomia crescente dos veículos elétricos e à evolução tecnológica deste setor, que está fortemente empenhado em acompanhar a concretização do novo paradigma de desenvolvimento sustentável, fomentando, ainda, a competitividade da Região, enquanto espaço insular, no contexto nacional, europeu e mundial.
O desígnio da mobilidade sustentável de base elétrica, sobretudo no setor dos transportes terrestres, públicos e privados, mas também nos setores social, do ambiente e do turismo, entre outros, é hoje uma aposta consensual que visa o desenvolvimento de um novo eixo de crescimento da economia açoriana de baixo carbono, associado à inovação tecnológica, à partilha de novas formas de conectividade e à qualificação ambiental, possibilitando, ainda, a integração de fontes de energia renovável no sistema eletroprodutor dos Açores.
Numa primeira fase, encontra-se em implementação uma rede de carregamento de veículos elétricos de acesso público, que abrangerá todas as ilhas e concelhos do arquipélago dos Açores. Promover-se-á, também, a instalação progressiva da rede de carregamento de veículos elétricos em edifícios em regime de propriedade horizontal, em empreendimentos turísticos e infraestruturas turísticas, sociais, recreativas, culturais e desportivas, entre outras, bem como em estabelecimentos e conjuntos comerciais, em parques de estacionamento de acesso público e em operações de loteamento urbano, tudo com o objetivo de proporcionar maior conforto e segurança aos utilizadores dos veículos elétricos, nos vários percursos e itinerários que realizem, satisfazendo as necessidades imediatas ou emergentes de carregamento.
Serão, ainda, previstos incentivos e metas para a adoção da mobilidade elétrica que contemplem a discriminação positiva dos utilizadores de veículos elétricos dos Açores, considerando a natureza estratégica e operacional deste tipo de mobilidade, incluindo na administração pública e no setor público empresarial, e desenvolvidas ações de sensibilização, de informação e de promoção da mobilidade elétrica, dirigidas aos diferentes públicos-alvo e setores de atividade. Esta estratégia de atuação será acompanhada pela elaboração de instrumentos de planeamento da mobilidade elétrica, de âmbito regional e municipal, que serão alvo de avaliação periódica.
Nestes termos, a implementação da mobilidade elétrica nos Açores será suportada por um programa robusto que visa a concretização de medidas e ações definidas pela estratégia adotada, constituindo-se como um instrumento catalisador da participação de entidades do sistema científico e tecnológico, das empresas, da administração pública regional e da sociedade civil.
Assim, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição da República Portuguesa e do n.º 1 do artigo 37.º e n.º 1 do artigo 54.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objeto e âmbito
O presente diploma estabelece a estratégia para a implementação da mobilidade elétrica na Região Autónoma dos Açores, adiante designada por RAA, considerando as suas características geográficas, fisiográficas e ambientais.
Artigo 2.º
Princípios
Sem prejuízo da aplicação dos princípios previstos na legislação aplicável, a implementação da mobilidade elétrica na RAA deve respeitar os objetivos do desenvolvimento sustentável, bem como o do acesso universal, em condições de igualdade, a todos os cidadãos, empresas e demais organizações públicas e privadas, assegurando a sua concretização em cada uma das ilhas e em todos os concelhos do arquipélago dos Açores.
Artigo 3.º
Prioridades estratégicas
O fomento da mobilidade elétrica na RAA deve estar alinhado com as orientações políticas nacionais e europeias, em coerência com as linhas de atuação da comunidade internacional, em matérias de transição energética e clima, e tem como prioridades estratégicas:
a) Reduzir a dependência energética da RAA, no que respeita ao consumo de combustíveis fósseis provenientes do exterior, bem como a imprevisibilidade dos custos para a economia resultantes da oscilação de preços associados àqueles;
b) Contribuir para a redução de emissões de gases com efeito estufa, como aposta na transição energética para uma economia competitiva e de baixo carbono, assente num modelo democrático e justo de coesão territorial que potencie a geração de riqueza e o uso eficiente de recursos, mitigando, também, os efeitos das alterações climáticas;
c) Apostar, de forma significativa, na produção e consumo de energia elétrica proveniente de fontes renováveis e endógenas, bem como no incremento da sua penetração nos diversos sistemas eletroprodutores dos Açores, e potenciar a mobilidade elétrica através da alocação do consumo para o carregamento das baterias dos veículos elétricos em períodos de vazio, garantindo condições de segurança no abastecimento energético;
d) Promover a eficiência energética e apoiar a mobilidade sustentável, estimulando a transição energética do setor dos transportes terrestres, sobretudo através da sua eletrificação, incentivando a introdução de veículos elétricos e a instalação de infraestruturas de carregamento, bem como de serviços de partilha de veículos, garantindo a melhoria da qualidade ambiental, com vantagens para a saúde pública;
e) Sensibilizar a sociedade civil para as vantagens da eficiência energética, da eletrificação da economia, da descarbonização dos transportes e da importância do combate às alterações climáticas, incentivando a assunção de padrões de produção e consumo de energia mais sustentáveis, através da adoção de comportamentos inerentes à economia circular da energia;
f) Potenciar os Açores, no contexto das regiões insulares e ultraperiféricas europeias, como um verdadeiro laboratório de soluções para a mobilidade elétrica e incentivar a investigação, o desenvolvimento e a inovação nos sistemas de transportes, sobretudo terrestres, incluindo os individuais e os coletivos, bem como os afetos ao uso da administração pública regional;
g) Reduzir a fatura energética para as famílias e para as organizações que optem por esta alternativa de mobilidade, contribuindo para o aumento da competitividade regional e para o desenvolvimento de uma economia de baixo carbono.
Artigo 4.º
Especificidades
A RAA, considerando a sua natureza insular e arquipelágica, bem como as particularidades geográficas e ambientais que caracterizam as diversas ilhas, apresenta, no que respeita ao desenvolvimento da mobilidade elétrica, um conjunto de especificidades, nomeadamente:
a) O sistema elétrico regional está repartido por nove sistemas isolados de energia, correspondentes a cada uma das ilhas, não permitindo a interligação entre estes, e por consequência, não sendo possível a transferência da energia excedentária produzida por fontes endógenas e renováveis de umas ilhas para as outras, tal como acontece a nível continental;
b) O dimensionamento das ilhas, com percursos médios diários relativamente curtos face à crescente autonomia dos veículos elétricos e aos progressos tecnológicos destes, e as suas particularidades fisiográficas, determinam menores necessidades de carregamento das baterias;
c) A natureza exuberante e distintiva de cada uma das ilhas do arquipélago da RAA e a qualidade ambiental que apresentam, associada à crescente notoriedade dos Açores enquanto destino turístico, impelem à persecução dos objetivos atinentes ao desenvolvimento sustentável, os quais podem ser robustecidos através da aposta na mobilidade elétrica;
d) A condição e o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, no contexto europeu, enquanto Região Ultraperiférica no âmbito da União Europeia, convocam à assunção de especiais responsabilidades na implementação das políticas europeias relacionadas com a mobilidade elétrica e com a eficiência energética.
CAPÍTULO II
Implementação da mobilidade elétrica
Artigo 5.º
Instrumentos de concretização
1 - A implementação da mobilidade elétrica na RAA concretiza-se através da assunção de um conjunto coerente, integrado e articulado de medidas e ações, nomeadamente:
a) Implementação da rede de carregamento de veículos elétricos de acesso público;
b) Desenvolvimento da rede de carregamento de veículos elétricos em:
i) Edifícios em regime de propriedade horizontal;
ii) Empreendimentos turísticos;
iii) Infraestruturas turísticas, sociais, recreativas, culturais e desportivas, entre outras;
iv) Estabelecimentos e conjuntos comerciais;
v) Parques de estacionamento de acesso público;
c) Atribuição de incentivos para a adoção da mobilidade elétrica;
d) Definição de metas para a introdução de veículos elétricos por entidades que possuam frotas;
e) Fomento da mobilidade elétrica na administração pública regional e local;
f) Promoção da mobilidade elétrica na sociedade civil, designadamente através da disponibilização de um portal dedicado à temática.
2 - A rede de carregamento de veículos elétricos de acesso público, referida na alínea a) do número anterior, deve ter uma expressão territorial em todas as ilhas e concelhos da RAA.
3 - No desenvolvimento da rede de carregamento de veículos elétricos, referida na alínea b) do n.º 1, deve ser prevista a instalação de dispositivos destinados ao carregamento de veículos elétricos, nas situações seguintes:
a) Nas operações urbanísticas, sujeitas a licenciamento, de construção, reconstrução e ampliação de edifícios em regime de propriedade horizontal, destinados a habitação, comércio e serviços;
b) Nas operações urbanísticas, sujeitas a licenciamento, de construção, reconstrução e ampliação de edifícios afetos a empreendimentos turísticos;
c) Em infraestruturas turísticas, sociais, recreativas, culturais e desportivas, entre outras;
d) Na instalação e modificação de estabelecimentos comerciais e conjuntos comerciais;
e) Em parques de estacionamento de acesso público.
4 - Os incentivos para a adoção da mobilidade elétrica, referidos na alínea c) do n.º 1, podem abranger incentivos financeiros e não financeiros, designadamente:
a) Financeiros, entre outros, os seguintes:
i) Aquisição de veículos elétricos e dispositivos de carregamento;
ii) Aquisição de veículos elétricos destinados ao transporte coletivo de passageiros para a renovação ou reconversão de frotas;
iii) Aquisição de veículos elétricos afetos aos setores social, económico e ambiental;
b) Não financeiros, entre outros, os seguintes:
i) Criação de lugares de estacionamento destinados a veículos elétricos em parques de estacionamento de acesso público;
ii) Criação de soluções de mobilidade e outras medidas e ações que facilitem a acessibilidade ao sistema de mobilidade elétrica;
iii) Criação de incentivos fiscais.
5 - A definição de metas para a introdução de veículos elétricos por entidades que possuam frotas, referidas na alínea d) do n.º 1, visa a substituição progressiva de veículos de combustão interna por veículos elétricos.
6 - A adoção de medidas e ações de fomento da mobilidade elétrica na administração pública regional, bem como no setor público empresarial, referidas na alínea e) do n.º 1, visa a substituição progressiva da frota de veículos de combustão interna por veículos elétricos.
7 - A promoção da mobilidade elétrica, referida na alínea f) do n.º 1, contempla o desenvolvimento de medidas e ações de sensibilização e de promoção da mobilidade elétrica junto dos cidadãos, das empresas e demais entidades e instituições representativas da sociedade civil, bem como da divulgação de informações sobre os diversos prestadores de serviços e os pontos de carregamento disponíveis na Região.
8 - Os termos e as condições para a instalação da rede de carregamento de veículos elétricos referida na alínea b) do n.º 1 e no n.º 3 e os incentivos para a adoção da mobilidade elétrica referidos na alínea c) do n.º 1 e no n.º 4 são regulados em regulamentação própria.
Artigo 6.º
Instrumentos de planeamento
1 - A implementação da política de mobilidade elétrica na RAA implica a existência de instrumentos de planeamento, de âmbito regional e municipal, nomeadamente os seguintes:
a) O Plano de Mobilidade Elétrica dos Açores (PMEA);
b) Os Planos de Mobilidade Elétrica Municipais (PMEM).
2 - O departamento do Governo Regional com competência em matéria de energia, em cooperação com os municípios e em articulação com entidades representativas da sociedade civil e dos setores social, económico e ambiental, deve desenvolver o PMEA, com atualização periódica.
3 - Para o desenvolvimento dos PMEM, os municípios devem envolver os cidadãos, as entidades representativas da sociedade civil, as empresas dos setores económicos representativos dos seus concelhos e demais entidades que se justifiquem, podendo solicitar o acompanhamento técnico do departamento do Governo Regional com competência em matéria de energia.
Artigo 7.º
Acompanhamento
O órgão com competências consultivas que vier a constituir-se no âmbito das atribuições do departamento do Governo Regional com competência em matéria de energia deve emitir pareceres, acompanhar a implementação dos instrumentos de concretização, particularmente a realização de programas, medidas e ações, dos instrumentos de planeamento, e propor linhas de estudo e investigação para o desenvolvimento tecnológico e científico no domínio da mobilidade elétrica.
Artigo 8.º
Avaliação
1 - O departamento do Governo Regional com competência em matéria de energia deve elaborar relatórios de avaliação da implementação da mobilidade elétrica na RAA, com periodicidade trienal.
2 - Os municípios devem proceder à elaboração de relatórios de avaliação dos seus planos de mobilidade elétrica, com periodicidade trienal.
3 - Os relatórios de avaliação referidos no n.º 1 devem refletir o grau de implementação dos instrumentos de concretização, constantes do artigo 5.º, e dos instrumentos de planeamento, mencionados no artigo 6.º, particularmente o PMEA e os PMEM.
4 - Os relatórios de avaliação referidos no n.º 2, devem refletir o grau de implementação dos PMEM.
CAPÍTULO III
Fiscalização e regime contraordenacional
Artigo 9.º
Fiscalização
1 - Para efeitos do presente diploma, as competências de fiscalização estão cometidas ao departamento do Governo Regional com competência em matéria de energia.
2 - O disposto no presente artigo não prejudica o exercício dos poderes de fiscalização que, em razão da matéria, competem a outras entidades públicas.
3 - O processamento das contraordenações e a aplicação das coimas e sanções acessórias compete ao departamento do Governo Regional com competência em matéria de energia.
Artigo 10.º
Regime contraordenacional
Aplica-se o disposto no Decreto-Lei 39/2010, de 26 de abril, na redação atual, e demais legislação aplicável nesta matéria.
CAPÍTULO IV
Disposições finais
Artigo 11.º
Cobrança das taxas administrativas
O produto das taxas administrativas devidas pela apreciação do pedido de registo e da efetivação do registo de comercialização de eletricidade para a mobilidade elétrica, pela emissão de licença de operação de pontos de carregamento e pela inspeção periódica dos pontos de carregamento explorados por cada operador de ponto de carregamento constitui receita própria da RAA.
Artigo 12.º
Competências orgânicas
As referências feitas no Decreto-Lei 39/2010, de 26 de abril, na redação atual, ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I. P., e à Direção-Geral de Energia e Geologia consideram-se, na RAA, reportadas aos departamentos do Governo Regional com competência em matéria de transportes terrestres e de energia, respetivamente.
Artigo 13.º
Entidade gestora e inspeções periódicas
1 - A entidade gestora da rede de mobilidade elétrica é indicada pelo membro do Governo Regional com competência em matéria de energia.
2 - Compete ao departamento do Governo Regional com competência em matéria de energia, em articulação com a entidade gestora da rede de mobilidade elétrica, a realização das inspeções periódicas aos pontos de carregamento explorados por cada operador de ponto de carregamento na RAA.
Artigo 14.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Aprovado pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, na Horta, em 5 de julho de 2019.
A Presidente da Assembleia Legislativa, Ana Luísa Luís.
Assinado em Angra do Heroísmo em 24 de julho de 2019.
Publique-se.
O Representante da República para a Região Autónoma dos Açores, Pedro Manuel dos Reis Alves Catarino.
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