Processos n.º 605/12, 606/12, 607/12, 608/12, 609/12 e 626/12
Plenário
Ata
Aos dezanove dias do mês de setembro de dois mil e doze, encontrando-se presentes o Excelentíssimo Conselheiro Presidente Rui Manuel Moura Ramos e os Exmos. Conselheiros Maria de Fátima Mata-Mouros, João Cura Mariano, Ana Maria Guerra Martins, Catarina Sarmento e Castro, Joaquim de Sousa Ribeiro, Vítor Manuel Gonçalves Gomes, Fernando Vaz Ventura, Maria Lúcia Amaral, José da Cunha Barbosa, Maria João Antunes, Carlos Fernandes Cadilha e Maria José Rangel Mesquita, foram trazidos à conferência os autos dos processos em referência para apreciação.Após debate e votação, foi ditado pelo Excelentíssimo Conselheiro Presidente o seguinte:
Acórdão 405 2012 1 - Foram submetidas a este Tribunal seis deliberações de realização de referendo local aprovadas por diferentes Assembleias de Freguesia, para efeitos da respetiva fiscalização preventiva da constitucionalidade e da legalidade, em cumprimento do que dispõe o artigo 25.º da Lei Orgânica 4/2000, de 24 de agosto (LORL), diploma que aprova o regime jurídico do referendo local.
São as seguintes as mencionadas deliberações:
A deliberação da Assembleia de Freguesia de Lapa do Lobo, aprovada em 8 de setembro de 2012 (conforme documento junto ao processo 605/12, a fls. 14), sobre a realização de um referendo local com a seguinte pergunta:
"Concorda com a alteração dos limites territoriais da freguesia de Lapa do Lobo?"
A deliberação da Assembleia de Freguesia de Aguieira, aprovada em 10 de setembro de 2012 (conforme documento junto ao processo 606/12, a fls. 8 e 9), sobre a realização de um referendo local com a seguinte pergunta:
"Concorda com a alteração dos limites territoriais da freguesia de Aguieira?"
A deliberação da Assembleia de Freguesia de Santar, aprovada em 11 de setembro de 2012 (conforme documento junto ao processo 607/12, fls. 12 a 14), sobre a realização de um referendo local com a seguinte pergunta:
"Concorda com a alteração dos limites territoriais da freguesia de Santar?"
A deliberação da Assembleia de Freguesia de Moreira, aprovada em 6 de setembro de 2012 (conforme documento junto ao processo 608/12, fls. 13 a 15), sobre a realização de um referendo local com a seguinte pergunta:
"Concorda com a alteração dos limites territoriais da freguesia de Moreira?"
A deliberação da Assembleia de Freguesia de Vilar Seco, aprovada em 11 de setembro de 2012 (conforme documento junto ao processo 609/12, a fls.
12 e 13), sobre a realização de um referendo local com a seguinte pergunta:
"Concorda com a alteração dos limites territoriais da freguesia de Vilar Seco?"
A deliberação da Assembleia de Freguesia de Senhorim, aprovada em 10 de setembro de 2012 (conforme documento junto ao processo 626/12, a fls 11-12) sobre a realização de um referendo local com a seguinte pergunta:
"Concorda com a alteração dos limites territoriais da freguesia de Senhorim?"
Estas deliberações de realização de referendo local são apresentadas na sequência da aprovação da Lei 22/2012, de 30 de maio, que entrou em vigor no dia seguinte, prevendo a reorganização das freguesias mediante parâmetros de agregação. Admite tal lei no n.º 4 do seu artigo 11.º, que as assembleias de freguesia apresentem pareceres sobre a reorganização administrativa territorial dos respetivos municípios, os quais devem ser ponderados pelas assembleias municipais que, nos termos do n.º 1 do mesmo artigo, deverão deliberar sobre tal matéria, respeitando os parâmetros de agregação e considerando os princípios e as orientações estratégicas da lei. Tal deliberação ou pronúncia da assembleia municipal deve, posteriormente, de acordo com o artigo 12.º da lei, ser entregue à Assembleia da República no prazo máximo de 90 dias a contar da sua entrada em vigor que, como se viu, ocorreu no dia 31 de maio de 2012.
2 - Na apreciação da constitucionalidade e da ilegalidade das seis deliberações em causa deverá ser tido em consideração o que ficou decidido, ainda recentemente, por este Tribunal, no acórdão 402/2012 (Processo 590/12), sobre a deliberação de realização de um referendo local aprovada pela Assembleia de Freguesia de Melres, em 30 de agosto de 2012, no mesmo contexto legislativo das deliberações de realização do referendo local das Assembleias de Freguesias de Lapa do Lobo, Aguieira, Santar, Moreira, Vilar Seco e Senhorim agora submetidas a apreciação.
Conclui-se, com efeito, no referido acórdão:
«Segundo o artigo 240.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP), as autarquias locais podem submeter a referendo dos respetivos cidadãos eleitores matérias incluídas nas competências dos seus órgãos, nos casos, nos termos e com a eficácia que a lei estabelecer, devendo entender-se que são matérias de referendo local as da competência meramente consultiva dos órgãos das autarquias locais (assim, Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 390/98, 518/99, 113/99 e, mais recentemente, Acórdãos n.os 384/2012, 388/2012 e 400/2012, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt). A reorganização administrativa do território das freguesias não é matéria da competência deliberativa das assembleias de freguesia, face ao disposto nos artigos 164.º, alínea n), e 236.º, n.º 4, da CRP, mas tal não obsta a que este órgão representativo da freguesia delibere sobre a realização de um referendo local. O artigo 3.º, n.º 1, da LORL dispõe até que o referendo local pode ter por objeto questões que se integrem nas competências dos órgãos autárquicos, quer exclusivas quer partilhadas com o Estado ou com as Regiões.
Na medida em que a divisão administrativa do território é matéria de reserva de lei (artigos 164.º, alínea n), e 236.º, n.º 4, da CRP), as assembleias de freguesia só poderão deliberar a realização de um referendo local atinente à reorganização administrativa territorial autárquica se houver lei a prever a intervenção destes órgãos representativos do poder local no procedimento de reorganização e nos termos legalmente previstos para tal intervenção (neste sentido, Acórdãos n.os 518/99, 113/99 e, mais recentemente, Acórdãos n.os 391/2012 e 400/2012).
A intervenção das assembleias de freguesia no procedimento de reorganização administrativa territorial autárquica, bem como os termos de tal participação, está prevista, presentemente, na Lei 22/2012, de 30 de maio, que aprova o regime jurídico da reorganização administrativa territorial autárquica, revogando, entre outras, a Lei 8/93, de 5 de março, diploma que, até então, definia o regime jurídico da criação de freguesias. E daquela lei resulta, conjugadamente com o disposto nos artigos 3.º, n.º 1, e 23.º da LORL, que as assembleias de freguesias podem deliberar a realização de um referendo local, tendo em vista o parecer que podem apresentar à assembleia municipal sobre a reorganização administrativa territorial autárquica (artigo 11.º, n.º 4), no quadro da preparação da pronúncia deste órgão representativo sobre esta reorganização (artigo 11.º, n.º 1), a qual deverá ser entregue à Assembleia da República no prazo máximo de 90 dias a contar da sua entrada em vigor (artigo 12.º). Isto é: até ao dia 15 de outubro de 2012, face ao disposto nos artigos 20.º e 22.º da Lei 22/2012 e ao entendimento de que a contagem do prazo se suspendeu durante as férias judiciais (artigo 144.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).
Este prazo máximo de 90 dias tem, porém, de ser articulado com os prazos e regras estabelecidos na LORL, com os previstos nos artigos 25.º, 26.º, 32.º e 145.º, n.º 1, e, muito particularmente para o que agora releva, com os estabelecidos nos artigos 33.º, n.º 1, conjugadamente com o que dispõe o artigo 96.º, n.º 2, e 142.º, n.º 3. De acordo com estes últimos, o referendo deve realizar-se no prazo mínimo de 40 dias e no prazo máximo de 60 dias a contar da decisão de fixação, devendo a data coincidir com um domingo, dia de feriado nacional, autonómico ou autárquico, e a assembleia de apuramento geral deve iniciar as suas operações no 2.º dia seguinte ao da realização do referendo.
[...] A deliberação de realização do referendo local tomada pela Assembleia de Freguesia de Melres integra-se no disposto no n.º 4 do artigo 11.º da Lei 22/2012. Esta Assembleia não deliberou porém em momento em que ainda era possível contribuir para a pronúncia da assembleia municipal, apresentando parecer sobre a reorganização administrativa territorial autárquica, de harmonia com o que dispõe o artigo 11.º, n.os 1 e 4, da Lei 22/2012.
Tendo deliberado no dia 30 de agosto de 2012 e sendo o feriado municipal no dia 8 de outubro do ano em curso, os resultados do referendo não poderiam nunca ser proclamados e publicados a tempo de ser apresentado aquele parecer e de o mesmo ser ponderado na pronúncia da assembleia municipal, a entregar à Assembleia da República até ao dia 15 de outubro de 2012.
Considerando que o referendo se deve realizar no prazo mínimo de 40 dias a contar da decisão da fixação (artigo 33.º, n.º 1, da LORL), num domingo, em dia de feriado nacional ou autárquico (artigo 96.º, n.º 2, da LORL), e que a assembleia de apuramento geral só pode iniciar as operações às 9 horas do 2.º dia seguinte ao da realização do referendo (artigo 142.º, n.º 3, da LORL), a proclamação e a publicação dos resultados do referendo nunca poderia ser feita antes dia 16 de outubro de 2012. Isto, portanto, sem atender à circunstância de o pedido de verificação da constitucionalidade e da legalidade ter sido enviado no dia 2 de setembro, ao prazo de 25 dias que o Tribunal Constitucional tem para se pronunciar (artigo 26.º) e aos prazos estabelecidos nos artigos 32.º e 145.º, n.º 1, da LORL.
Assim sendo, o resultado da consulta «não se poderá precipitar em ato de órgão autárquico permitido pela Lei 22/2012, de 30 de maio», (cf. Acórdão 400/2012), o que dita a ilegalidade da deliberação em causa».
3 - À semelhança do que sucedeu com a deliberação de realização do referendo local tomada pela Assembleia de Freguesia de Melres, aprovada em 30 de agosto de 2012, também as deliberações de realização do referendo local das Assembleias de Freguesias de Lapa do Lobo, Aguieira, Santar, Moreira, Vilar Seco e Senhorim se integram no disposto no n.º 4 do artigo 11.º da Lei 22/2012. Mas também elas não foram tomadas a tempo de ainda ser possível que o resultado do referendo contribuísse para determinar o sentido da pronúncia das respetivas assembleias municipais sobre a sua própria reorganização administrativa territorial, nos termos do artigo 11.º, n.º 1, da Lei 22/2012.
Na verdade, tendo as Assembleias de Freguesias de Lapa do Lobo, Aguieira, Santar, Moreira, Vilar Seco e Senhorim tomado as suas deliberações entre os dias 6 e 11 de setembro de 2012 (ou seja, já após o dia 30 de agosto), nunca os resultados do referendo poderiam - pelos motivos acima transcritos no Acórdão 402/2012 ser proclamados e publicados a tempo de serem apresentados os pareceres resultantes das consultas referendárias às respetivas assembleias municipais e de os mesmos serem ponderados na pronúncia da mesmas, a entregar à Assembleia da República, como se viu, até ao dia 15 de outubro de 2012.
4 - Face ao exposto, propõe-se que o Tribunal:
a) Se pronuncie pela ilegalidade da deliberação de realização de referendo local aprovada pela Assembleia de Freguesia de Lapa do Lobo, em 8 de setembro de 2012;
b) Se pronuncie pela ilegalidade da deliberação de realização de referendo local aprovada pela Assembleia de Freguesia de Aguieira, em 10 de setembro de 2012;
c) Se pronuncie pela ilegalidade da deliberação de realização de referendo local aprovada pela Assembleia de Freguesia de Santar, em 11 de setembro de 2012;
d) Se pronuncie pela ilegalidade da deliberação de realização de referendo local aprovada pela Assembleia de Freguesia de Moreira, em 6 de setembro de 2012;
e) Se pronuncie pela ilegalidade da deliberação de realização de referendo local aprovada pela Assembleia de Freguesia de Vilar do Seco, em 11 de setembro de 2012.
f) Se pronuncie pela ilegalidade da deliberação de realização de referendo local aprovada pela Assembleia de Freguesia de Senhorim, em 10 de setembro de 2012.
Lisboa, 19 de setembro de 2012. - Maria de Fátima Mata-Mouros - João Cura Mariano - Ana Guerra Martins - Catarina Sarmento e Castro - Joaquim de Sousa Ribeiro - Vítor Gomes - Fernando Vaz Ventura - Maria Lúcia Amaral - J. Cunha Barbosa - Maria João Antunes - Carlos Fernandes Cadilha - Maria José Rangel de Mesquita - Rui Manuel Moura Ramos.
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