A regulamentação do relacionamento comercial e contratual entre os prestadores do referido serviço e os seus clientes encontra-se traduzida no Regulamento de Relações Comerciais (RRC) aprovado através do Despacho 17 744-A/2007, de 10 de Agosto, cabendo à ERSE a sua elaboração e as respectivas actualizações. Estas regras devem observar, entre outros normativos, o disposto na lei dos serviços públicos essenciais, pelo que as alterações a esta lei, produzidas pela Lei 12/2008, conduzem à necessidade de se proceder à revisão do edifício regulamentar vigente.
O processo de revisão decorreu de acordo com a tramitação prevista para o efeito, incluindo o processo de consulta pública junto das entidades representativas dos vários interesses no sector eléctrico, bem como do Conselho Consultivo da ERSE, no qual também têm assento representantes dos referidos interesses.
Os impactes da Lei 12/2008 no relacionamento comercial com os consumidores de electricidade incidem em especial sobre os seguintes aspectos:
Periodicidade da facturação - A Lei 12/2008 veio alterar o artigo 9.º da lei dos serviços públicos essenciais, prevendo que a "(...) factura deve ter uma periodicidade mensal (...)". Considerando que esta lei não proíbe uma estipulação alternativa que os consumidores considerem mais favorável, a regulamentação da ERSE estabeleceu a seguinte regra: "Salvo acordo em contrário, a periodicidade da facturação (...) é mensal". Com efeito, a ERSE considera que, sem prejuízo do carácter injuntivo dos direitos estabelecidos no artigo 13.º da lei dos serviços públicos essenciais, esta mesma lei, logo no seu artigo 14.º, ressalva as disposições legais que em concreto se mostrem mais favoráveis ao utente. Assim, no alinhamento da Lei 12/2008, a ERSE procurou regulamentarmente disponibilizar a solução que se mostra mais favorável aos direitos e interesses dos consumidores de energia e a que lhes assegura um dos seus mais importantes direitos: o da sua liberdade de escolha.
Na ausência de acordo, a lei e o regulamento garantem ao consumidor a facturação mensal. Ainda sobre a periodicidade da facturação, impõe-se salientar que a consideração da facturação mensal para todos os consumidores importaria um aumento muito significativo dos custos, os quais seriam inevitavelmente repercutidos no preço da electricidade a pagar pelos consumidores, atingindo os seus direitos e contrariando, por isso, o próprio espírito da lei. Considerando que actualmente a maioria dos contratos de fornecimento de electricidade se caracterizam pela vigência da facturação bimestral, entendeu-se que os comercializadores de último recurso deveriam informar os seus clientes, por escrito, sobre o conteúdo da Lei 12/2008 e de qual a sua situação contratual, bem como da necessidade da manifestação da vontade por parte do cliente em alterar o contrato em vigor, sem prejuízo de, e a todo o tempo, o cliente poder vir a exercer o direito à facturação mensal.
Periodicidade das leituras - O exercício do direito ao pagamento dentro dos prazos de prescrição e caducidade previstos suscitou a pertinência de se proceder à alteração do número de leituras dos equipamentos de medição a realizar pelos operadores das redes, que, no caso dos clientes em baixa tensão normal (BTN) passa de seis em seis meses para uma periodicidade trimestral.
Esta alteração implica, desde logo, a redução do número de facturações por recurso à estimativa de consumos, o que se mostra globalmente mais vantajoso para os consumidores.
Leitura extraordinária - A clarificação das regras aplicáveis em matéria de prescrição e de caducidade operada pela Lei 12/2008 veio suscitar a questão de saber se o período associado à realização de leituras extraordinárias é o adequado, sob pena de se frustrar a sua utilidade. A leitura extraordinária surge como um instrumento a usar em último recurso, na sequência de tentativas frustradas para conhecer o consumo efectivo de energia eléctrica por parte dos clientes e proceder, se for caso disso, aos acertos de facturação devidos. A preocupação de acautelar o uso da leitura extraordinária dentro dos prazos de prescrição e de caducidade conduziu à alteração dos respectivos preceitos regulamentares no sentido de conceder aos operadores das redes a faculdade de gerir o recurso a este instrumento, de modo a que, sendo necessária, a leitura extraordinária deva ocorrer antes de terminar o período de seis meses consecutivos. Tendo em vista impedir qualquer interpretação no sentido de que a formulação proposta pudesse abarcar um potencial uso discricionário da leitura extraordinária, o RRC prevê que o recurso a este mecanismo apenas possa ocorrer após uma tentativa de leitura, esta no âmbito do ciclo normal de leituras, a qual deve ter em conta a observância dos avisos aos clientes, estes já previstos no RRC em vigor.
Acertos de facturação - Com a redacção que lhe é dada pela Lei 12/2008, a lei dos serviços públicos essenciais passa a conter um artigo dedicado aos acertos de facturação, com o objectivo específico de determinar que o acerto entre a facturação do consumo efectivo e a facturação do consumo estimado, já pago e em excesso, seja efectuado por compensação de crédito na própria factura que procede ao acerto, salvo declaração expressa em contrário por parte do utente. Só neste último caso poderá ser utilizado outro meio para a devolução do valor cobrado em excesso. Neste sentido, esta regra passou a integrar o conteúdo do RRC.
Prazo de pagamento - Conforme decorre do disposto no artigo 10.º da Lei 12/2008, o prestador do serviço está obrigado a comunicar ao utente a exigência de pagamento com a antecedência mínima de 10 dias úteis sobre a data limite para o respectivo pagamento. Embora este prazo de pagamento se encontre previsto em sede das regras da prescrição e da caducidade, o mesmo repercute-se necessariamente a todas as facturas, na medida em que a exigência do seu pagamento deverá ter sempre em conta aquelas figuras, ainda que seja para afastar a sua aplicação. Resulta assim desta disposição que o utente deverá ter, no mínimo, um prazo de 10 dias úteis para efectuar o devido pagamento a contar da data da apresentação da factura.
Pré-aviso de interrupção do fornecimento - A Lei 12/2008, no que concerne ao regime da interrupção do serviço e do respectivo pré-aviso, não alterou o conteúdo do anterior regime resultante da Lei 23/96, tendo apenas alargado a antecedência mínima desse pré-aviso de 8 para 10 dias. À semelhança do que já sucede na regulamentação vigente, a ERSE vem consagrar o alargamento do prazo para o pré-aviso de interrupção a todos factos imputáveis ao cliente que possam motivar a interrupção do fornecimento e não apenas em caso de mora no pagamento das facturas, como estabelece a lei dos serviços públicos essenciais, na sua redacção original e com as alterações introduzidas pela Lei 12/2008. Trata-se de mais uma situação em que a regulamentação vai mais longe na protecção do consumidor, mostrando-se mais favorável ao utente do serviço de fornecimento de energia eléctrica.
Ónus da prova - A Lei 12/2008 veio aditar um artigo referente ao ónus da prova, alargando o seu regime a todas as obrigações e diligências a cargo dos prestadores dos serviços públicos essenciais. É incluído expressamente neste ónus a prova da realização das comunicações para efeitos de exigência dos pagamentos aos utentes, em particular no âmbito do regime da prescrição e da caducidade. No mesmo sentido, foi introduzido um novo artigo no RRC do sector eléctrico, com a epígrafe "Ónus da prova", reproduzindo as regras recriadas pela Lei 12/2008, tendo sido colocado no Capítulo I, referente aos princípios e disposições gerais e consequentemente aplicável a todos os relacionamentos comerciais emergentes do sector eléctrico.
Resolução de conflitos - Com a Lei 12/2008, na esteira do que se tem vindo a fazer através de outros diplomas, o legislador procura incentivar o recurso à resolução alternativa de litígios, com as vantagens que lhe são associadas.
Assim, dispõe o respectivo artigo 15.º que o prazo para a propositura da acção é suspenso quando as partes optem por recorrer a mecanismos de resolução extrajudicial de conflitos de consumo, só voltando a iniciar-se nova contagem daquele prazo quando e se as partes não obtiverem uma solução para o seu diferendo. O RRC do sector eléctrico foi alterado em conformidade com o regime descrito.
O procedimento regulamentar, que culmina pelo presente despacho na aprovação da revisão do Regulamento de Relações Comerciais, desencadeou-se nos termos previstos no artigo 23.º dos Estatutos da ERSE anexos ao Decreto-Lei 97/2002, de 12 de Abril. Na observância deste preceito, a ERSE elaborou uma proposta de articulado, tendo a mesma, acompanhada de um "documento justificativo", sido enviada às empresas reguladas abrangidas, às associações de consumidores, à Direcção-Geral de Energia e Geologia, à Direcção-Geral do Consumidor e demais entidades administrativas competentes, para comentários e sugestões, bem como ao Conselho Consultivo em razão das suas competências estabelecidas nos Estatutos da ERSE, para emissão de parecer.
O documento "Discussão dos Comentários à Proposta de Revisão do Regulamento de Relações Comerciais" e o documento justificativo da proposta regulamentar, ficam, por apropriação, a constituir parte integrante da fundamentação preambular deste despacho, sendo publicados na página da ERSE na internet.
O documento de "Discussão dos Comentários à Proposta de Revisão do Regulamento de Relações Comerciais", supra referido, identifica os comentários e sugestões apresentados à proposta regulamentar, as respostas da ERSE justificando os comentários que foram considerados no texto regulamentar que agora se aprova, bem como os que não puderam ser aceites e as respectivas razões.
Nestes termos:
Ao abrigo das disposições conjugadas do artigo 65.º e n.º 1 do artigo 67.º do Decreto-Lei 172/2006, de 23 de Agosto, da alínea a) do artigo 10.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 31.º dos Estatutos da ERSE, anexos ao Decreto-Lei 97/2002, de 12 de Abril, o Conselho de Administração da ERSE deliberou, no âmbito do sector eléctrico, o seguinte:1.º Os artigos 54.º, 147.º, 148.º, 178.º, 183.º, 193.º, 198.º, 200.º, 248.º, 265.º do Regulamento de Relações Comerciais do sector eléctrico passam a ter a seguinte redacção:
«Artigo 54.º
Interrupções por facto imputável ao cliente1 - ...
a)...
b)...
c)...
d)...
f)...
g)...
h)...
i)...
2 - ...
3 - Nos casos previstos nas alíneas a), b), c), e), g) e i) do n.º 1, a antecedência mínima é fixada em 10 dias.
4 - ...
5 - ...
6 - ...
Artigo 147.º
Leitura dos equipamentos de medição
1 - ...
2 - ...
3 - ...
a)...
b)...
c)...
4 -
5 - A leitura dos equipamentos de medição da responsabilidade dos operadores das redes deve respeitar as seguintes regras:
a)...
b) Nos clientes em BTN deve ser assegurado que o intervalo entre duas leituras não seja superior a 3 meses.c) Na iluminação pública deve ser assegurado que o intervalo entre duas leituras não seja superior a 6 meses.
6 - ...
7 - ...
8 - ...
Artigo 148.º
Leitura extraordinária dos equipamentos de medição 1 - Se, por facto imputável ao cliente, após uma tentativa de leitura, observando o disposto nos n.os 6 e 7 do artigo 147.º, não for possível o acesso ao equipamento de medição, para efeitos de leitura, durante um período que não deve ultrapassar os 6 meses consecutivos, e não existindo qualquer comunicação por parte do cliente sobre os dados de consumo durante o mesmo período, o operador da rede pode promover a realização de uma leitura extraordinária.2 - Para os restantes clientes, se, por facto imputável ao cliente, após duas tentativas de leitura, observando o disposto nos n.os 6 e 7 do artigo 147.º, não for possível o acesso ao equipamento de medição para efeitos de leitura, durante um período que não deve ultrapassar os 6 meses consecutivos, e não existindo qualquer comunicação por parte do cliente sobre os dados de consumo durante o mesmo período, o operador da rede pode promover a realização de uma leitura extraordinária.
3 - Nas situações previstas nos números anteriores, o pagamento dos encargos com a leitura extraordinária é da responsabilidade do cliente.
4 - A data de realização da leitura extraordinária deve ser acordada entre as partes.
5 - Na impossibilidade de acordo sobre uma data para a leitura extraordinária dos equipamentos de medição, num prazo máximo de 20 dias após notificação, os operadores das redes podem interromper o fornecimento, nos termos do artigo 54.º 6 - Acordada a data para a realização da leitura extraordinária, se não for possível o acesso ao equipamento de medição para o efeito, por facto imputável ao cliente, os operadores das redes podem interromper o fornecimento, nos termos do artigo 54.º
Artigo 178.º
Cálculo do valor da caução
1 - O valor da caução deve corresponder aos valores médios de facturação, por cliente, opção tarifária e potência contratada, num período de consumo igual ao período de facturação acrescido do prazo de pagamento da factura.
2 - ...
3 - ...
Artigo 183.º
Periodicidade da facturação
1 - Salvo acordo em contrário, a periodicidade da facturação de energia eléctrica entre os comercializadores, os comercializadores de último recurso e os respectivos clientes é mensal.2 - As partes podem, nos termos do número anterior, acordar num prazo de periodicidade diferente do previsto, desde que o cliente considere que o prazo lhe é mais favorável.
3 - Sempre que a periodicidade acordada nos termos dos números anteriores não for observada, o pagamento do valor exigido pode ser fraccionado em prestações mensais a pedido do cliente, considerando o período de facturação apresentado a pagamento, sem prejuízo do regime aplicável em sede de prescrição e caducidade.
4 - Se o incumprimento da periodicidade da facturação resultar de facto não imputável ao cliente, às prestações mensais previstas no número anterior não devem acrescer quaisquer juros legais ou convencionados.
Artigo 193.º
Acertos de facturação
1 - ...
a)...
b)...
c)...
d)...
2 - ...
3 - Quando o valor apurado com o acerto de facturação for a favor do cliente o seu pagamento deve ser efectuado por compensação de crédito na própria factura que tem por objecto o acerto, salvo declaração expressa em sentido diverso por parte do cliente.4 - Quando o valor apurado no âmbito do acerto de facturação for a favor do comercializador de último recurso, aplica-se o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 183.º, considerando para o efeito o número de meses objecto do acerto de facturação.
5 - Os acertos de facturação a efectuar pelos comercializadores de último recurso subsequentes à facturação que tenha tido por base a estimativa dos consumos devem utilizar os dados disponibilizados pelo operador da rede de distribuição, ou comunicados pelo cliente, recolhidos a partir de leitura directa do equipamento de medição, e ter em conta os prazos de prescrição e caducidade.
6 - O comercializador de último recurso não será responsável pela inobservância do disposto no número anterior se, cumprido o disposto nos n.os 6 e 7 do artigo 147.º e no n.º 1 do artigo 5.º - A do presente regulamento, por facto imputável ao cliente, não foi possível obter os dados de consumo recolhidos a partir da leitura directa do equipamento de medição.
Artigo 198.º
Prazos de pagamento
O prazo limite de pagamento mencionado na correspondente factura dos comercializadores de último recurso é de:a) 10 dias úteis, a contar da data de apresentação da factura, para os clientes em BTN e para a iluminação pública.
b) 26 dias, a contar da data de apresentação da factura, para os clientes em MAT, AT, MT e Boletim do Trabalho e Emprego.
Artigo 200.º
Interrupção do fornecimento de energia eléctrica por facto imputável ao cliente1 - ...
a)...
b)...
2 - A interrupção do fornecimento por facto imputável ao cliente só pode ter lugar após pré-aviso a efectuar pelo operador da rede, com uma antecedência mínima de 10 dias relativamente à data em que irá ocorrer.
4 - ...
Artigo 248.º
Facturação e pagamento
1 - ...
2 - O prazo limite de pagamento mencionado na correspondente factura é de:a) 10 dias úteis, a contar da data de apresentação da factura, para os clientes em BTN e para a iluminação pública.
b) 26 dias, a contar da data de apresentação da factura, para os clientes em AT, MT e Boletim do Trabalho e Emprego.
Artigo 265.º
Mediação e conciliação de conflitos
1 - ...
2 - ...
3 - ...
4 - A intervenção da ERSE através dos procedimentos descritos no presente artigo, relativamente aos conflitos de consumo, suspende os prazos de recurso às instâncias judiciais, nos termos da lei.» 2.º É aditado ao Regulamento de Relações Comerciais do sector eléctrico o artigo 5.º-A, com a seguinte redacção:
«Artigo 5.º-A
Ónus da prova
1 - Nos termos da lei, cabe aos operadores das redes, comercializadores de último recurso e comercializadores a prova de todos os factos relativos ao cumprimento das suas obrigações e execução das diligências inerentes à prestação dos serviços previstos no presente regulamento.2 - Ao abrigo do disposto no número anterior, o ónus da prova sobre a realização das comunicações relativas à exigência do pagamento e do momento em que as mesmas foram efectuadas incide sobre os operadores e comercializadores mencionados no número anterior.» 3.º Considerando o disposto na Lei 23/96, de 26 de Julho, com a redacção que lhe foi dada pela Lei 12/2008, de 26 de Fevereiro, cabe aos comercializadores de último recurso informar os seus clientes que a alteração contratual relativa à periodicidade da facturação fica dependente da declaração expressa da vontade do cliente.
4.º Para efeitos do disposto no número anterior, a ausência de declaração expressa por parte do cliente será entendida pelos comercializadores de último recurso como intenção de manter inalteradas as condições contratuais em vigor, no que se refere à periodicidade da facturação, sem prejuízo de, a todo o tempo, e nos termos da lei, o cliente poder exercer o direito à facturação mensal.
5.º O Regulamento de Relações Comerciais, em função das alterações referidas nos números anteriores, é reorganizado, sistematizado e os seus artigos são renumerados em conformidade, e ficará disponível na página da ERSE na Internet.
6.º As alterações ao Regulamento de Relações Comerciais do sector eléctrico, nos termos referidos no presente despacho, entram em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
23 de Maio de 2008. - O Conselho de Administração: Vítor Santos - Maria Margarida de Lucena Corrêa de Aguiar - José Braz.