de 1 de Julho
1. A consolidação de um processo revolucionário não será nunca conseguida se não houver o cuidado na criação oportuna de instrumentos adequados que lhe assegurem a sua permanente dinâmica e a sua crescente radicação nos diferentes sectores das populações, quer a nível nacional, que a nível internacional.Daqueles instrumentos sobressaem os meios de informação, por detrás dos quais se encontram as agências noticiosas como os grandes centros difusores que são, das ideias e das notícias de acontecimentos em que se radica o essencial da formação das opiniões públicas.
2. Foi consciente destes factos e consciente, ainda, dos perigos que espreitam a revolução portuguesa (interna e externamente) que o Ministério da Comunicação Social concebeu a ideia e, em consequência, está a estruturar a iniciativa da criação de uma agência noticiosa à altura das exigências da fase histórica que o País vive, por forma a dotar o Governo de um instrumento indispensável à sua acção e ao processo revolucionário que a justifica e determina.
Trata-se de procurar suprir uma das mais sérias lacunas que, neste momento, se detectam nos grandes mecanismos indispensáveis àquela acção, uma vez que não é a ANI, que o Governo adquiriu recentemente, que oferece condições para o fazer, por mais profundas reestruturações que pudesse suportar.
Por um lado, a ANI, como fruto que é, e fiel servidora que foi, do próprio regime fascista, aparece com uma vinculação psicológica ao regime deposto que, pelo menos a curto e médio prazos, constitui uma carga negativa na ingente acção a desenvolver. Por outro lado, o tipo de estrutura requerida por uma agência noticiosa moderna, vigorosa e irradiante - veículo eficaz não só do nome do novo Portugal no Mundo inteiro, como também de uma informação ao serviço dos valores positivos da humanidade e da sua progressiva evolução -, de forma nenhuma pode ter como ponto de apoio a estrutura ancilosada, decadente e viciada de uma ANI que, se o Governo a adquiriu, mais foi para calar a conduta reaccionária que perfidamente começava a manifestar que, de facto, por outra razão.
3. O que se pretende é uma agência noticiosa que se situe na perspectiva histórica que o MFA veio abrir ao País, sendo dela poderoso instrumento e tornando-se um reputado e digno de confiança centro internacional de comunicações, em especial entre zonas ou regiões do Mundo (designadamente a África, a América Latina e a Europa mediterrânica), no aproveitamento da oportunidade que o Portugal pós-25 de Abril oferece para o desempenho daquela função.
De facto, afigura-se incontestável que a actual situação política em Portugal e a sua consolidação e progressiva evolução oferecem as condições necessárias para abrirem as possibilidades de se tornar no ponto de encontro e de irradiação das ideias e dos acontecimentos de certas zonas do Globo, como as referidas, tendo em conta dados de base, como o nosso passado histórico extremamente vinculado a tais regiões, o nosso estádio de desenvolvimento, que nos insere no mesmo bloco, a nossa localização geográfica e a grande experiência de libertação que estamos a viver e que constitui forte estímulo (ou modelo) para as aspirações colectivas de muitos povos do Terceiro Mundo.
É também neste sentido - o de sabermos aproveitar em todos os domínios a oportunidade que a História hoje nos oferece - que a criação de uma adequada agência noticiosa deve ser encarada, para além de, como se disse, ser inteiramente indispensável à defesa da consolidação do processo revolucionário.
4. Pensa-se que é a forma de empresa pública a mais ajustada à função no momento presente. De propriedade e contrôle estatais, o regime de gestão é suficientemente autónomo e flexível a fim de, mais eficiente e prontamente, poder corresponder ao objectivo. No domínio financeiro observa-se, e pela mesma razão, o princípio da autonomia e de marcado grau de descentralização em relação ao aparelho do Estado.
O próprio contrôle admite a intervenção de órgãos não estatais, no que se refere, singularmente, ao respeito pelo cumprimento de obrigações fundamentais, como são as da objectividade e rigor da informação e as de a actividade da agência ser, sempre e escruplosamente, ao serviço da democracia.
Neste termos:
Usando da faculdade conferida pelo artigo 3.º, n.º 1, alínea 3), da Lei Constitucional 6/75, de 26 de Março, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
PROJECTO DE ESTATUTOS DA ANOP - AGÊNCIA NOTICIOSA PORTUGUESA,
EMPRESA PÚBLICA
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º A ANOP - Agência Noticiosa Portuguesa, empresa pública, abreviadamente ANOP, é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, com património próprio e de direcção colegial.Art. 2.º A ANOP rege-se pelo presente estatuto e pelos regulamentos que venham a ser adoptados para a sua execução.
Art. 3.º Nos casos omissos serão aplicadas as normas que regulam o funcionamento das sociedades comerciais.
Art. 4.º A ANOP tem a sua sede em Lisboa e poderá estabelecer filiais, delegações, ou outras formas de representação social em qualquer outro ponto do território nacional ou estrangeiro.
CAPÍTULO II
Objecto social, competência e atribuições
Art. 5.º A ANOP tem por objecto a prestação do serviço de informação noticiosa, através da recolha e difusão de notícias, comentários e imagens para publicação na imprensa periódica e outros meios da comunicação social, além da edição de publicações periódicas e de publicações unitárias.
Art. 6.º - 1. A ANOP não deve em caso algum comprometer o rigor e a objectividade da informação, como também não deve em caso algum deixar de ser um instrumento ao serviço do interesse colectivo e da democracia.
2. A ANOP deve, na medida de todas as suas possibilidades, desenvolver a sua acção de modo a garantir regularmente uma informação rigorosa, objectiva e digna de confiança.
3. A ANOP deve assegurar a existência de um serviço prestigiado à escala nacional e internacional.
Art. 7.º - 1. A ANOP dispõe de um conselho superior encarregado de vigiar pelo cumprimento das obrigações fundamentais previstas no artigo anterior.
2. O conselho superior é constituído por:
Um magistrado, nomeado pelo Conselho Superior Judiciário;
Um representante dos jornalistas;
Um representante das empresas jornalísticas;
Um representante da Emissora Nacional e outro da Radiotelevisão Portuguesa; e Três delegados do Conselho de Imprensa.
3. Os membros do conselho superior exercem um mandato, não imediatamente renovável, pelo período de três anos.
4. Quando o mandato de um membro do conselho superior cessar antes do termo final, o mandato do seu sucessor cessará no termo do dos demais membros.
5. Independentemente do seu poder de iniciativa, o conselho superior deverá atender qualquer reclamação feita por qualquer entidade, quando ela se inscreva na matéria do artigo 6.º, e deliberar no prazo máximo de trinta dias.
6. Reconhecida a existência da procedência da reclamação, o conselho superior comunicará imediatamente as suas conclusões ao conselho de administração, o qual lhes deverá dar aplicação imediata, salvo havendo oposição unânime da totalidade dos administradores em exercício.
7. Se a reclamação julgada procedente pelo conselho superior recair sobre deliberação do conselho de administração, poderá aquele suspendê-la, por um prazo máximo de trinta dias, durante o qual deverá este reafirmá-la pela unanimidade dos administradores em exercício como única forma de a tornar exequível.
8. Se a reclamação julgada procedente pelo conselho superior recair sobre despacho ou conduta que represente falta grave do director-geral, o conselho superior pode propor a sua exoneração ao Ministro da Comunicação Social, com o parecer favorável do conselho de administração, que para o efeito reunirá sem a presença do visado, e após conclusão do adequado processo disciplinar, onde deverá figurar a defesa daquele.
9. O conselho superior emitirá, até ao último dia de Fevereiro de cada ano, um parecer que será obrigatoriamente objecto de publicação e apreciará um relatório sobre a actividade da ANOP, quanto ao cumprimento das obrigações fundamentais enunciadas no artigo 6.º Este relatório, que também deverá ser objecto de publicação, é da responsabilidade do director-geral e deverá ser submetido ao conselho superior no prazo máximo de trinta dias, a contar do termo de cada exercício.
CAPÍTULO III
Administração e fiscalização
SECÇÃO I
O conselho de administração
Art. 8.º - 1. A ANOP é administrada por um conselho de administração constituído por três administradores com mandato por três anos, renovável.2. O Ministro da Comunicação Social nomeará os três administradores, dos quais designará um para exercer as funções de presidente do conselho de administração e outro para substituto do presidente nos impedimentos deste; um dos administradores será nomeado para director-geral da ANOP.
3. No caso de o mandato de um ou mais membros do conselho de administração cessar antes do termo final, os mandatos dos respectivos sucessores cessarão no termo do dos demais membros.
Art. 9.º - 1. Sempre que a nomeação ou designação de qualquer dos três administradores recair em funcionário do Estado, as funções são exercidas em comissão de serviço, contando para todos os efeitos como tempo de serviço prestado ao Estado.
2. Os administradores não podem exercer actividade liberal ou noutras empresas, em acumulação, sem autorização do Ministro da Comunicação Social, e aquela é-lhes sempre vedada quando se trate de empresas ou actividades por qualquer forma relacionadas com o exercício do objecto social da ANOP.
3. A remuneração mensal do administrador com funções de director-geral bem como as dos restantes administradores são fixadas por despacho conjunto do Ministro da Comunicação Social e do Ministro das Finanças.
Art. 10.º - 1. Competem ao conselho de administração os mais amplos poderes para a gestão e a administração da ANOP, com vista à plena realização do objecto social da empresa.
2. Cabe ao director-geral preparar as reuniões do conselho de administração e dar execução às deliberações deste, bem como assegurar a direcção do conjunto de serviços da ANOP e o seu eficiente funcionamento, e ainda representar a Agência por delegação do presidente do conselho de administração, caso os cargos não coincidam na mesma pessoa.
3. Ao presidente do conselho de administração, ou, em caso de impedimento, a quem suas vezes fizer, cabe presidir às reuniões do respectivo conselho, participar nas deliberações com voto de qualidade, se for caso disso, e representar a ANOP, podendo delegar as missões de representação no director-geral.
4. O conselho de administração pode delegar no director-geral o poder para certas deliberações.
5. Não poderá o conselho de administração onerar, por quaisquer formas, os imóveis da ANOP ou obrigar a empresa por empréstimo pecuniário ou outra forma de financiamento a médio ou longo prazo sem aprovação do Ministro da Comunicação Social, com o parecer favorável do conselho fiscal.
6. O conselho de administração reúne ordinariamente, pelo menos, uma vez por semana e extraordinariamente sempre que o presidente, ou quem suas vezes fizer, e o director-geral o convocar.
7. Para o conselho deliberar é indispensável a maioria dos seus membros em exercício.
Art. 11.º Para obrigar ou vincular a empresa aos actos praticados em seu nome são necessárias as assinaturas de, pelo menos, dois dos seus administradores, devendo, porém, um deles ser o director-geral.
Art. 12.º A cessação de funções de director-geral pode ser decidida, antes do termo do seu mandato, pelo Ministro ou Secretário de Estado da Comunicação Social, com base em proposta do conselho de administração, elaborada em reunião de que não participe o director-geral e justificada em falta grave cometida no exercício das respectivas funções ou por acto incompatível com o desempenho do cargo.
SECÇÃO II
O conselho fiscal
Art. 13.º A ANOP é fiscalizada por um conselho fiscal constituído por um presidente, dois vogais efectivos e dois vogais suplentes, com mandato por três anos, renovável, todos nomeados pelo Ministro das Finanças.Art. 14.º O conselho fiscal reúne ordinariamente uma vez por mês e extraordinariamente sempre que seja convocado pelo presidente ou a pedido do conselho de administração.
Art. 15.º Compete ao conselho fiscal, além das obrigações que lhe são cometidas pela lei comercial, no caso das empresas privadas e sempre que aquelas obrigações sejam aplicáveis, os mais amplos poderes de fiscalização e, designadamente:
a) Emitir parecer sobre qualquer questão relativa à ANOP, a pedido do Ministro das Finanças ou Ministro da Comunicação Social, ou do conselho de administração, ou do conselho superior;
b) Emitir parecer, em tempo útil, sobre o plano previsional das receitas e despesas da ANOP, que lhe será submetido anualmente pelo conselho de administração, competindo-lhe examinar se este plano assegura ou não uma situação superavitária ou, pelo menos, um equilíbrio entre as receitas e as despesas.
No caso de não estar assegurada qualquer desta situações, deve o conselho fiscal respeitar o referido plano previsional, provocando uma nova deliberação do conselho de administração em ordem à satisfação de um daqueles requisitos;
c) Acompanhar de forma permanente a gestão financeira da ANOP;
d) Emitir parecer sobre qualquer plano de actividade que envolva gastos ou receitas e não tenha sido considerado no plano previsional anual;
e) Pronunciar-se sobre as condições de empréstimos a contrair, de amortização de bens, de constituição de provisões e reservas de aquisição, de transmissão e constituição de direitos relativos a bens imóveis e de aplicação dos lucros de exercício;
f) Exercer as demais funções de exame em relação aos actos especificados em regulamento e com vista à mais eficiente consecução do objectivo social.
Art. 16.º O conselho fiscal dispõe de todos os poderes para investigação sobre o que entender relativamente à ANOP, devendo remeter, quer ao conselho de administração, quer ao director-geral, todas as observações e recomendações que tiver por convenientes sobre a gestão da empresa, de uma forma geral, e sobre a gestão financeira, em particular.
Art. 17.º No caso de o conselho fiscal verificar que as suas observações para salvaguarda do equilíbrio financeiro da ANOP não são devidamente tomadas em conta pelo conselho de administração, nomeadamente no que se refere à elaboração do plano previsional anual, perigando o equilíbrio financeiro da empresa, pode, com o parecer favorável do conselho superior, solicitar ao Ministro das Finanças e ao Ministro da Comunicação Social a nomeação de uma comissão administrativa, que será nomeada por despacho conjunto destas duas entidades governamentais e que assumirá os poderes do conselho de administração até à designação de novo conselho de administração, que terá lugar dentro dos seis meses seguintes.
Art. 18.º O parecer do conselho fiscal sobre o plano previsional anual, bem como sobre o relatório e contas do conselho de administração, deve ser dado a conhecer ao conselho superior e aos Ministros da Comunicação Social e das Finanças.
Art. 19.º Deve o conselho fiscal alertar o conselho superior para qualquer facto que considere violação das obrigações fundamentais enunciadas no artigo 6.º Art. 20.º As deliberações do conselho fiscal serão tomadas por maioria dos seus membros em exercício, tendo o presidente voto de qualidade.
CAPÍTULO IV
Gestão financeira
Art. 21.º Os recursos da ANOP resultarão da venda dos documentos e serviços de informação aos seus clientes e do rendimento dos seus bens.Art. 22.º As condições de divulgação do noticiário oficial do Governo Português, bem como as da prestação de serviço ao Estado, serão definidas em contrato entre o Estado e a ANOP, não podendo as taxas de pagamento ser inferiores às gerais do mercado aplicadas por outras agências noticiosas.
Art. 23.º Pode o conselho de administração firmar os contratos que entender convenientes com Governos de países estrangeiros, bem como com outras agências noticiosas internacionais, nas melhores condições do mercado e em ordem à consecução do enunciado no artigo 6.º Art. 24.º - 1. A gestão financeira da ANOP deverá ser baseada em critério de racionalização científica e no respeito pelo princípio da optimização dos resultados.
2. Deve o conselho de administração, através de regulamento próprio, que carece do parecer favorável do conselho fiscal, definir os instrumentos de gestão financeira e estabelecer os mecanismos adequados à consecução do estabelecido no n.º 1 deste artigo.
Art. 25 - 1. Quando a conta «Ganhos e perdas» de um exercício acusar lucros, deverão 5% dos mesmos, pelo menos, ser levados à conta «Reserva geral» e os restantes transitarão para conta nova ou, se a sua importância o justificar e as circunstâncias o aconselharem, destinar-se-ão a:
a) Reserva para novos investimentos; e/ou b) Reservas especiais; e/ou c) Para os fins que o Estado entender.
2. Se a conta saldar com prejuízo, no sentido financeiro, desde que este não implique com o normal equilíbrio da gestão financeira, será levado à conta do exercício seguinte ou coberto pelo Governo, se este assim o entender, baseado em parecer favorável do conselho fiscal, mas, neste caso, sempre a título de subsídio embolsável, salvo nos casos em que aquele prejuízo financeiro resulte de iniciativa da ANOP com vista à sua expansão e irradiação internacional. Nesta última hipótese, tais iniciativas deverão ter merecido o prévio parecer favorável do conselho fiscal e a prévia homologação do Ministro ou Secretário de Estado da Comunicação Social.
Art. 26.º Pode o conselho de administração contrair com a banca empréstimos a curto, médio e longo prazos, mediante parecer favorável do conselho fiscal e com prévia autorização do Ministro da Comunicação Social.
CAPÍTULO V
Do pessoal
Art. 27.º - 1. O pessoal da ANOP ficará sujeito ao contrato individual de trabalho, com as adaptações exigidas pelas características da empresa que forem definidas em decreto regulamentar, referendado pelos Ministros do Trabalho e da Comunicação Social, excepto quando vigorarem convenções colectivas de trabalho.2. Poderão exercer funções na ANOP, em comissão de serviço, funcionários do Estado, dos seus institutos públicos e das autarquias locais, ficando os membros sujeitos:
a) Quanto à prestação de serviço, ao regime próprio dos funcionários das autarquias locais;
b) No que respeita às relações com os quadros de origem, ao regime sobre comissões de serviço aplicável ao respectivo quadro.
Art. 28.º As remunerações do pessoal serão decididas pelo conselho de administração, de acordo com o orçamento aprovado.
CAPÍTULO VI
Disposições finais
Art. 29.º - 1. Carecem de aprovação do Ministro ou do Secretário de Estado da Comunicação Social os planos de actividade e financeiros elaborados pelo conselho de administração para execução no decorrer de um exercício económico.2. Estes planos deverão ser submetidos àquela aprovação até ao último dia do mês de Março de cada ano e deverão ser acompanhados, para o efeito, de parecer favorável do conselho fiscal.
Art. 30.º O relatório e contas do conselho de administração, acompanhado do parecer do conselho fiscal, deverá ser submetido para aprovação ao Ministro da Comunicação Social.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Vasco dos Santos Gonçalves - Mário Luís da Silva Murteira - José Joaquim Fragoso - Jorge Correia Jesuíno.
Promulgado em 23 de Junho de 1975.
Publique-se.O Presidente da República, FRANCISCO DA COSTA GOMES.