de 16 de Setembro
1. A venda ambulante, que o Decreto-Lei 383/74, de 24 de Agosto, veio regular de modo específico, sofreu vicissitudes várias, derivadas umas da alteração conjuntural em que o diploma surgiu e outras resultantes de meios técnicos que os vendedores ambulantes passaram a utilizar, afastando-se progressivamente do tradicionalismo que caracterizava este modo de actividade.Acresce que a própria necessidade de criar locais higiénicos, de aspecto e condições dignificantes, determinou ainda mais intensamente a revisão daquele diploma.
O referido Decreto-Lei 383/74 foi publicado na previsão de que o acesso à venda ambulante proporcionaria ao público uma oferta complementar da facultada pelo comércio fixo nas localidades em que este se mostrasse insuficiente.
Aconteceu, por razões de vária ordem, que, pelo contrário, os centros urbanos mais populosos foram precisamente os que sofreram um afluxo asfixiante do exercício desta actividade.
2. Outras razões específicas para a reelaboração legislativa residem na necessidade de excluir certos produtos desta forma de comércio e de respeitar as condições sócio-económicas do momento, considerando o emprego e subemprego, bem como as situações respeitáveis do exercício normal e correcto da actividade, que, infelizmente, nos seus aspectos negativos, pode proporcionar o escoamento de artigos cuja proveniência nem sempre será legal.
3. Também está presente no novo diploma a preocupação de aproveitamento de espaços disponíveis nos mercados municipais, onde as condições poderão ser mais aceitáveis, designadamente nos aspectos de higiene e localização.
4. Outro processo de actuação comercial que tem adquirido significativo relevo na venda ambulante tem sido não só a utilização de veículos motorizados (bicicletas e triciclos), mas ainda a utilização de viaturas auto, com ou sem atrelados, realidade para a qual o diploma terá de ser suficientemente versátil.
5. Espera-se que as câmaras municipais, cuja competência na matéria já foi consagrada no anterior diploma, tenham a possibilidade de criar locais onde esta espécie de actividade possa ser exercida em melhores condições de comodidade para o público e de fiscalização por parte das entidades competentes.
6. Os objectivos referidos não esgotam, porém, o que se pretende no diploma, e que se concretizará numa dinamização progressiva da legislação regulamentar em que se condicione a maneira higiénica e sanitária da venda de certos bens, com vista à defesa do consumidor e do público em geral, no sentido de evitar a deterioração dos produtos, a conspurcação dos locais e a degradação do ambiente.
Nestes termos:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º - 1 - A venda ambulante de produtos e mercadorias passa a reger-se pelo presente diploma e pelos que lhe servirem de complemento.
2 - São considerados vendedores ambulantes para os fins e efeitos do presente diploma:
a) Todos aqueles que, transportando produtos e mercadoria, por si ou por qualquer meio adequado, os transaccionem pelos lugares do respectivo trânsito;
b) Todos aqueles que, fora dos mercados municipais e em locais fixos demarcados pelas câmaras municipais, transaccionem os produtos e mercadoria que transportem, utilizando na venda os seus meios próprios ou outros que à sua disposição sejam postos pelas referidas câmaras;
c) Todos aqueles que, transportando os produtos e mercadoria em veículos, neles efectuem as respectivas transacções, quer pelos lugares do seu trânsito, quer em locais fixos, fora dos mercados municipais;
d) Todos aqueles que, utilizando veículos automóveis ou atrelados, neles confeccionem, na via pública ou em locais para o efeito determinados pelas câmaras municipais, refeições ligeiras ou produtos preparados de forma tradicional.
Art. 2.º - 1 - O exercício da venda ambulante é vedado às sociedades, aos mandatários e aos que exerçam actividade comercial por conta de outrem, não podendo ainda ser praticado por interposta pessoa.
2 - Exceptuam-se do âmbito de aplicação do presente diploma a distribuição domiciliária efectuada por conta de comerciantes com estabelecimento fixo, a venda de jornais e de outras publicações periódicas, bem como o exercício da actividade de feirante.
3 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, deverá a venda de jornais e de outras publicações periódicas, quando praticada em locais fixos da via pública, ser efectuada por forma a que a ocupação do solo não cause qualquer embaraço à livre circulação dos peões.
Art. 3.º - 1 - Na exposição e venda dos produtos do seu comércio deverão os vendedores ambulantes utilizar individualmente tabuleiro, em dimensões não superiores a 1 m x 1,20 m e colocado a uma altura mínima de 0,40 m do solo, salvo nos casos em que os meios para o efeito postos à disposição pelas câmaras municipais ou o transporte utilizado justifiquem a dispensa do seu uso.
2 - Compete às câmaras municipais dispensar o cumprimento do estabelecido no número anterior relativamente à venda ambulante que se revista de características especiais.
Art. 4.º É interdito aos vendedores ambulantes:
a) Impedir ou dificultar por qualquer forma o trânsito nos locais destinados à circulação de veículos e peões;
b) Impedir ou dificultar o acesso aos meios de transporte público e às paragens dos respectivos veículos;
c) Impedir ou dificultar o acesso a monumentos e a edifícios públicos ou privados, bem como o acesso ou exposição dos estabelecimentos comerciais ou lojas de venda ao público;
d) Lançar no solo quaisquer desperdícios, restos, lixo ou outros materiais susceptíveis de pejarem ou conspurcarem a via pública.
Art. 5.º - 1 - Os tabuleiros, bancadas, pavilhões e veículos ou atrelados utilizados na venda deverão conter afixada, em local bem visível ao público, a indicação do nome, morada e número do cartão do respectivo vendedor.
2 - Os tabuleiros, balcões ou bancadas utilizados para a exposição, venda ou arrumação de produtos alimentares deverão ser construídos de material resistente a traços ou sulcos e facilmente laváveis.
3 - Todo o material de exposição, venda, arrumação ou depósito deverá ser mantido em rigoroso estado de asseio e higiene.
Art. 6.º - 1 - Os indivíduos que intervenham no condicionamento, transporte ou venda de produtos alimentares serão, obrigatoriamente, portadores do boletim de sanidade, nos termos da legislação em vigor.
2 - Sempre que se verifiquem dúvidas sobre o estado de sanidade do vendedor, poderá este ser submetido a inspecção pela autoridade sanitária da respectiva área.
3 - Os vendedores ambulantes deverão comportar-se com civismo nas suas relações com o público.
Art. 7.º Fica proibido o comércio ambulante dos produtos referidos na lista anexa a este diploma, a qual poderá ser alterada, sem prejuízo do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 2.º, por portaria do Secretário de Estado do Comércio Interno.
Art. 8.º - 1 - No transporte, arrumação, exposição e arrecadação dos produtos é obrigatório separar os alimentares dos de natureza diferente, bem como, de entre cada um deles, os que de algum modo possam ser afectados pela proximidade dos outros.
2 - Quando fora da venda, os produtos alimentares devem ser guardados em lugares adequados à preservação do seu estado, e bem assim em condições hígio-sanitárias que os protejam de poeiras, contaminações ou contactos que de qualquer modo possam afectar a saúde dos consumidores.
3 - O vendedor, sempre que lhe seja exigido, terá de indicar às entidades competentes para a fiscalização o lugar onde guarda a sua mercadoria, facultando o acesso ao mesmo.
4 - Na embalagem ou acondicionamento de produtos alimentares só poderá ser usado papel ou outro material que ainda não tenha sido utilizado e que não contenha desenhos, pinturas ou dizeres impressos ou escritos na parte interior.
Art. 9.º Não são permitidas, como meio de sugestionar aquisições pelo público, falsas descrições ou informações sobre a natureza, qualidade ou utilidade dos produtos expostos à venda.
Art. 10.º - 1 - Os preços terão de ser praticados de conformidade com a legislação em vigor.
2 - É obrigatória a afixação, por forma bem visível para o público, de tabelas, letreiros ou etiquetas indicando o preço dos produtos, géneros e artigos expostos.
Art. 11.º O período de exercício da actividade dos vendedores ambulantes será fixado nos termos da legislação em vigor sobre o período de abertura dos estabelecimentos comerciais.
Art. 12.º O vendedor ambulante deverá fazer-se acompanhar, para apresentação imediata às entidades da fiscalização, do cartão de vendedor ambulante devidamente actualizado.
2 - O vendedor ambulante deverá fazer-se acompanhar ainda das facturas ou documentos equivalentes comprovativos da aquisição dos produtos para venda ao público, contendo os seguintes elementos:
a) O nome e domicílio do comprador;
b) O nome ou denominação social e a sede ou domicílio do produtor, retalhista, grossista, leiloeiro, serviço alfandegário ou outro fornecedor aos quais haja sido feita a aquisição, e bem assim a data em que esta foi efectuada;
c) A especificação das mercadorias adquiridas, com indicação das respectivas quantidades, preços e valores ilíquidos, descontos, abatimentos ou bónus concedidos, e ainda, quando for caso disso, das correspondentes marcas, referências e números de série.
Art. 13.º A venda ambulante de artigos de artesanato, frutas, produtos hortícolas ou quaisquer outros de fabrico ou produção próprios fica sujeita às disposições do presente diploma, com excepção do preceituado no n.º 2 do artigo anterior.
Art. 14.º - 1 - O Secretário de Estado do Comércio Interno poderá, por portaria, estabelecer as normas que se mostrem necessárias à execução do disposto neste diploma em matéria da sua competência.
2 - Quando as normas a estabelecer abrangerem matéria que caiba igualmente na competência de outras Secretarias de Estado ou Ministérios, deverá a correspondente portaria ser emitida conjuntamente com esses departamentos.
Art. 15.º Compete à Direcção-Geral de Coordenação Comercial assegurar o expediente e conceder a autorização para o exercício do comércio exigida no Decreto-Lei 22/78, de 25 de Janeiro.
Art. 16.º Ao abrigo deste diploma e legislação complementar, podem as câmaras municipais:
a) Restringir, condicionar ou proibir a venda de produtos, tendo em atenção os aspectos hígio-sanitários, estéticos e de comodidade para o público;
b) Interditar zonas ao exercício do comércio ambulante, atendendo às necessidades de segurança e de trânsito de peões e veículos;
c) Estabelecer zonas e locais fixos para neles ser exercida, com meios próprios ou fornecidos pelas mesmas câmaras municipais, a actividade de vendedor ambulante;
d) Delimitar locais ou zonas a que terão acesso os veículos ou reboques utilizados na venda ambulante;
e) Estabelecer zonas e locais especialmente destinados ao comércio ambulante de certas categorias de produtos.
Art. 17.º - 1 - Nas localidades dotadas de mercados com instalações próprias só será permitido o exercício da actividade de vendedor ambulante se, para o respectivo ramo, não existirem lugares vagos nos mercados municipais.
2 - Havendo lugares vagos nos mercados referidos no número anterior, mas verificando-se em determinadas áreas insuficiente abastecimento do público, poderão as câmaras municipais fixar lugares ou zonas, dentro das mesmas áreas, para o exercício do ramo de comércio ambulante limitado no número anterior.
Art. 18.º - 1 - Compete às câmaras municipais emitir o cartão para o exercício da venda ambulante, o qual será válido apenas para a área dos respectivos concelhos e para o período de um ano.
2 - O cartão de vendedor ambulante será obrigatoriamente do modelo anexo a este diploma.
3 - Para a concessão do cartão deverão os interessados apresentar na câmara municipal requerimento, elaborado em impresso próprio, no qual será aposto o selo fiscal correspondente à taxa do papel selado, e, bem assim, a autorização prévia para o exercício do comércio e, quando se trate da venda de produtos alimentares, o boletim de sanidade, considerado indispensável.
4 - Compete ao Ministro da Administração Interna aprovar, por despacho publicado no Diário da República, 1.ª série, os modelos do impresso de requerimento referido no número anterior.
5 - Do requerimento constará, para além da conveniente identificação dos interessados, a indicação da situação pessoal destes no que concerne à sua profissão actual ou anterior, habilitações, emprego ou desemprego, invalidez ou assistência, e composição, rendimentos e encargos do respectivo agregado familiar.
6 - A indicação da situação pessoal dos interessados poderá ser dispensada em relação aos que tenham exercido, de modo geral e continuado durante os últimos três anos, a actividade de vendedor ambulante.
7 - A renovação anual do cartão de vendedor ambulante, se os interessados desejarem continuar a exercer essa actividade, deverá ser requerida até final do mês de Novembro do ano anterior.
8 - O pedido de concessão do cartão deverá ser deferido ou indeferido pela câmara municipal competente no prazo máximo de trinta dias, contados a partir da data da entrega do correspondente requerimento, de que será passado o respectivo recibo.
9 - Na falta de comunicação da decisão no prazo fixado no número anterior, considerar-se-á que o pedido foi deferido, substituindo-se o cartão de vendedor ambulante pelo duplicado do requerimento, com recibo de apresentação do original.
Art. 19.º - 1 - O cartão de vendedor ambulante será pessoal e intransmissível.
2 - As câmaras municipais deverão organizar um registo dos vendedores ambulantes que se encontrem autorizados a exercer a sua actividade na área do respectivo concelho.
Art. 20.º - 1 - A prevenção e acção correctiva sobre as infracções das normas constantes do presente diploma, bem como da respectiva regulamentação e legislação conexa, são da competência da Direcção-Geral de Fiscalização Económica, da Inspecção do Trabalho, da Polícia de Segurança Pública, da Guarda Nacional Republicana, da Guarda Fiscal, das autoridades sanitárias e das demais entidades policiais, administrativas e fiscais.
2 - Sempre que, no exercício das funções referidas no número anterior, o agente fiscalizador tome conhecimento de infracções cuja fiscalização seja da competência de outra autoridade, deverá participar a esta a respectiva ocorrência.
Art. 21.º - 1 - Cabe às entidades referidas no artigo anterior exercer uma acção educativa e esclarecedora dos interessados, podendo, para a correcção de situações anómalas, fixar prazo não superior a vinte dias.
2 - Considera-se regularizada a situação anómala quando, dentro do prazo fixado pela autoridade fiscalizadora, o interessado se apresente na sede ou posto indicado na intimação com os documentos ou objectos em conformidade com a norma violada.
Art. 22.º - 1 - As infracções ao disposto neste diploma e normas regulamentares que venham a ser publicadas em sua execução serão puníveis com a multa de 500$00 a 2500$00, se outra pena mais grave não for aplicável nos termos da lei geral ou especial.
2 - A utilização do duplicado do requerimento mencionado no n.º 3 do artigo 17.º para comprovar a autorização tácita para o exercício da actividade de vendedor ambulante, nos casos em que o pedido tenha sido indeferido, é punida com a multa de 7500$00, sem prejuízo de responsabilidade criminal a que haja lugar.
3 - As câmaras municipais deverão fixar os casos de apreensão dos instrumentos da contravenção, móveis ou semoventes, os quais caucionarão a responsabilidade do infractor.
Art. 23.º - 1 - A instrução preparatória e julgamento das infracções às normas deste diploma, das portarias previstas no artigo 14.º e dos regulamentos aludidos no artigo 25.º, n.º 2, bem como a graduação de responsabilidade dos arguidos e o destino das respectivas multas, regem-se pelo disposto na legislação sobre infracções económicas.
Art. 24.º As dúvidas que se suscitarem na aplicação das disposições deste diploma serão resolvidas por despacho conjunto dos Ministros do Comércio e Turismo e da Administração Interna, e de outros Ministros quando as matérias respeitem à sua competência.
Art. 25.º - 1 - Este diploma entra em vigor no prazo de sessenta dias a contar da sua publicação.
2 - No termo do prazo referido no número anterior, deverão as câmaras municipais publicar regulamento das normas deste diploma que se contenham no âmbito da sua competência.
3 - Os cartões de vendedor ambulante emitidos ao abrigo do disposto no Decreto-Lei 383/74 são válidos até 31 de Dezembro de 1978, devendo a sua substituição ser feita com subordinação ao que se encontra estabelecido no n.º 7 do artigo 18.º 4 - O prazo a que se refere o número anterior não poderá exceder noventa dias, e findo ele caducarão os cartões emitidos nos termos da legislação revogada por este diploma.
Art. 25.º A partir da entrada em vigor deste diploma ficam revogados o Decreto-Lei 383/74, de 24 de Agosto, e os respectivos diplomas regulamentares.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Mário Soares - Jaime José Matos da Gama - Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Promulgado em 26 de Agosto de 1978.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.
ANEXO 1
Lista a que se refere e artigo 7.º
1 - Carnes verdes, ensacadas e fumadas.
2 - Bebidas, salvo nos casos referidos na alínea d) do n.º 2 do artigo 1.º 3 - Medicamentos e especialidades farmacêuticas.
4 - Desinfectantes, insecticidas, fungicidas, herbicidas, parasiticidas, raticidas e semelhantes.
5 - Plantas e ervas medicinais.
6 - Móveis, artigos de mobiliário, colchoaria e antiguidades.
7 - Tapeçarias, alcatifas, carpetes, passadeiras, tapetes, oleados e artigos de estofador.
8 - Aparelhagem radioeléctrica, máquinas e utensílios eléctricos ou a gás, candeeiros, lustres e material para instalações eléctricas.
9 - Instrumentos musicais, discos e afins e outros artigos musicais.
10 - Materiais de construção, metais e ferragens.
11 - Automóveis, motociclos, bicicletas com ou sem motor e acessórios.
12 - Combustíveis líquidos, sólidos e gasosos, com excepção do petróleo, carvão e lenha.
13 - Instrumentos profissionais e científicos e aparelhos de medida e verificação.
14 - Material para fotografia e cinema e artigos de óptica, oculista e relojoaria.
15 - Borracha e plásticos em folha ou tubo.
16 - Armas e munições.
17 - Moedas.
ANEXO 2
Modelo do cartão a que se refere o n.º 2 do artigo 18.º (ver documento original) O Ministro da Administração Interna, Jaime José Matos da Gama. - O Ministro do Comércio e Turismo, Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.