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Acórdão 219/2001/T, de 6 de Julho

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Texto do documento

Acórdão 219/2001/T. Const. - Processo 730/2000. - Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

1 - O Ministério Público, junto do Tribunal da Relação do Porto, vem interpor recurso obrigatório para este Tribunal, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da LTC, do acórdão da Relação do Porto a fl. 184, "uma vez que o acórdão recorrido recusou implicitamente a aplicação das normas contidas no n.º 5 do artigo 24.º e no n.º 9 do artigo 26.º, ambos do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei 438/91, de 9 de Novembro, que excluem que os solos integrados na Reserva Agrícola Nacional e na Reserva Ecológica Nacional, expropriados para a implantação de vias de comunicação, sejam avaliados segundo a sua potencialidade edificativa, nos termos do n.º 2 do artigo 26.º, n.º 2, do mesmo Código das Expropriações, com fundamento na sua inconstitucionalidade por violação dos princípios da igualdade e da justa indemnização, consagrados nos artigos 13.º e 62.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.".

Admitido o recurso, o magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal produziu alegações que concluiu nos seguintes termos:

"1.º O princípio constitucional da justa indemnização visa obviar a que aos expropriados possam ser arbitradas indemnizações manifestamente insuficientes para compensar o dano sofrido com a privação do bem, claramente desajustadas do montante que derivaria da aplicação da 'teoria da diferença', prevista na lei civil, e do valor venal ou de mercado do bem expropriado.

2.º Estando o valor venal do prédio expropriado limitado em consequência da existência de uma legítima restrição legal ao jus aedificandi - resultante da inserção de terrenos especialmente adequados à actividade agrícola na RAN - e não tendo o proprietário qualquer expectativa razoável de os ver desafectados e destinados à construção por particulares, não pode invocar-se o princípio da 'justa indemnização' de modo a ver reflectido no montante indemnizatório arbitrado ao expropriado uma potencialidade edificativa dos terrenos, que se configura como legalmente inexistente.

3.º Na verdade, destinando-se a desanexação da reserva agrícola exclusivamente à construção de uma via de comunicação - e não à transformação de prédio até então legalmente 'rústico' em 'urbano' -, verifica-se que a parcela de terreno expropriado não passou a deter, supervenientemente ao acto expropriativo, qualquer aptidão edificativa, sendo a especial afectação de parcela à construção de tal via pública de comunicação absolutamente incompatível com qualquer vocação edificativa do terreno expropriado.

4.º Não se vislumbra, no caso dos autos, qualquer actuação preordenada da Administração, traduzida em 'manipulação das regras urbanísticas'; com vista a desvalorizar artificiosamente o terreno, reservado ao uso agrícola, para mais tarde o adquirir por um valor degradado, destinando-o então à construção de edificações urbanas de interesse público, o que afasta decisivamente a aplicação da jurisprudência firmada no Acórdão 267/97.

5.º Termos em que deverá proceder o presente recurso."

Não houve contra-alegações.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

2 - Resulta dos autos o seguinte:

Por despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas de 6 de Junho de 1995, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 147, de 28 de Junho de 1995, foi declarada a utilidade pública, com carácter urgente, das expropriações de diversas parcelas de terreno, com vista à construção da EN 224, variante entre Oliveira de Azeméis e Vale de Cambra.

Nessas parcelas de terreno inclui-se a parcela n.º 8.10, propriedade de Manuel Soares de Pinho e mulher, Maria Alice Ferreira Martins.

A referida parcela está integrada em zona de salvaguarda, sendo abrangida simultaneamente pela Reserva Agrícola Nacional (RAN) e pela Reserva Ecológica Nacional (REN), pelo que é considerada non aedificandi.

Após realização da vistoria ad perpetuam rei memoriam e lavrado o auto de posse administrativa, foi atribuída à referida parcela, por unanimidade dos árbitros, o valor de 474 185$00.

Inconformados, os expropriados interpuseram recurso, pretendendo a alteração desse valor para 2 360 000$00, actualizado conforme o artigo 23.º do Código das Expropriações de 1991, defendendo que a parcela é apta para construção; em representação da expropriante Junta Autónoma das Estradas, o Ministério Público sustentou que o terreno se destinava a fins agrícolas, logo, sem capacidade construtiva.

Em nova avaliação, os dois peritos do Tribunal e o perito indicado pelos expropriados atribuíram à parcela expropriada um valor no montante de 1 911 600$00, determinado de acordo com o artigo 26.º, n.º 2, do Código das Expropriações de 1991; o perito da expropriante avaliou a mesma parcela em 512 700$00, atendendo exclusivamente à sua aptidão agrícola.

Na sentença de 1.ª instância acolheu-se aquele primeiro valor, fixando-se a indemnização devida em 1 911 600$00.

Recorreu, então, o Ministério Público, em representação da expropriante, para o Tribunal da Relação do Porto, pugnando pela aplicação do critério de avaliação contido no n.º 1 do artigo 26.º do Código das Expropriações de 1991 e não no n.º 2 do mesmo preceito.

Pelo acórdão a fl. 184 foi negado provimento ao recurso e é dele que vem interposto o presente recurso de constitucionalidade.

3 - O recurso vem interposto, como se disse, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC e delimitado como tendo por objecto as normas dos artigos 24.º, n.º 5, e 26.º, n.º 1, do Código das Expropriações de 1991 interpretadas no sentido de excluírem da avaliação segundo a sua potencialidade edificativa, nos termos do n.º 2 do artigo 26.º do mesmo Código, os solos, integrados na Rede Agrícola Nacional e na Rede Ecológica Nacional, expropriados para implantação de vias de comunicação, normas essas (com tal interpretação) cuja aplicação foi implicitamente recusada com fundamento na sua inconstitucionalidade, por violação dos princípios da igualdade e da justa indemnização, previstos nos artigos 13.º e 62.º, n.º 2, da CRP.

O recurso foi admitido na Relação do Porto, o que não deixa de ser, desde logo, um indício - embora não mais do que isso - de que se verificou uma tal recusa implícita de normas com fundamento em inconstitucionalidade.

Decisivos são, porém, os termos com que a Relação do Porto, no acórdão impugnado, julgou o recurso para ela interposto.

Nesse recurso, o Ministério Público recorrente sustentou que, classificado um solo como "apto para outros fins", não se poderia recorrer a uma outra classificação para efeitos de determinar o critério da indemnização (no caso, a ponderação da sua aptidão edificativa) a avaliação deveria ser feita de acordo com o critério estabelecido no artigo 26.º, n.º 1, do Código das Expropriações de 1991, e não com o previsto no n.º 2 do mesmo preceito legal.

Ora, não deixa o acórdão recorrido de, aparentemente, aceitar a classificação do solo expropriado como solo "para outros fins", nos termos do artigo 24.º, n.º 5, do Código das Expropriações de 1991, com o que - objectar-se-ia - se não poderia aceitar como objecto do recurso a recusa de aplicação da norma contida naquele preceito.

Simplesmente, nele se diz, logo depois:

"Mas, ponderando que se tais terrenos possuírem potencialidade edificativas só se encontra a constitucional e justa indemnização classificando o terreno como solo apto para construção, que a defesa dos valores do ambiente e correcto ordenamento do território é tarefa de todos e não só do proprietário cujo terreno foi incluído na RAN ou na REN e que, de outra forma, suportaria sozinho o encargo que é de todos, entendemos, como o Exmo. Juiz, que o terreno tem potencialidades edificativas e, por analogia com o disposto no n.º 2 do artigo 26.º do Código das Expropriações, como tal deve ser avaliado." (itálico nosso.)

E, mais adiante:

"Mesmo que estivéssemos amarrados à classificação de solo para outros fins, ainda assim não estaria vedado o recurso a outros factores que não os exclusivamente rústicos.

[...] Se o artigo 26.º, n.º 1, pretendesse impedir a consideração de factores de outra natureza que não os rústicos, maxime as potencialidades construtivas dos terrenos, teríamos de concluir que se estava a afastar o critério do valor do bem expropriado consagrado no artigo 22.º, e, em última instância, a pôr em causa os princípios da justa indemnização e da igualdade (citação de trecho da obra de Osvaldo Gomes, Expropriações por Utilidade Pública, p. 206)."

Quer isto dizer que, em bom rigor, o acórdão recorrido começa por afastar a norma do artigo 24.º, n.º 5. E, depois, supondo-se vinculado à classificação prevista naquele preceito aplica, "por analogia" a norma do artigo 26.º n.º 2.

Quer num quer noutro dos juízos a razão profunda assenta na consideração de que violaria os princípios da justa indemnização e da igualdade a avaliação de um terreno, integrado na RAN e na REN, expropriado para fins não agrícolas (no caso, a construção de uma via de comunicação) sem a ponderação da sua aptidão edificativa.

Certo é que a decisão recorrida busca o seu fundamento no que julga ser a tese do Acórdão deste Tribunal n.º 267/97, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 21 de Maio de 1997, de que transcreve largos trechos, e onde se julgou inconstitucional a norma do n.º 5 do artigo 24.º do Código das Expropriações de 1991, "enquanto interpretada por forma a excluir da classificação de solo apto para construção os solos integrados na RAN expropriados justamente com a finalidade de neles se edificar para fins diferentes de utilidade pública agrícola".

E esta acaba por ser a verdadeira ratio decidendi do acórdão recorrido.

Em suma, pois, o objecto do recurso é aquele que vem delimitado pelo magistrado recorrente.

4 - Dispõe o artigo 24.º, n.º 5, do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei 438/91, de 9 de Novembro:

"Para efeitos da aplicação do presente Código é equiparado a solo para outros fins o solo que, por lei ou regulamento, não possa ser utilizado na construção."

Por seu turno, refere o artigo 26.º, n.º 1, do mesmo diploma:

"O valor dos solos para outros fins será calculado tendo em atenção os seus rendimentos efectivos ou possível no estado existente à data da declaração de utilidade pública, a natureza do solo e do subsolo, a configuração do terreno e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstâncias objectivas susceptíveis de influírem no respectivo cálculo."

A questão que substancialmente está em causa no presente recurso - em particular reportada à norma do artigo 24.º, n.º 5, do Código das Expropriações de 1991 - foi já objecto de três acórdãos deste Tribunal: os Acórdãos n.os 267/97, 20/2000 e 247/2000, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 36.º, p. 759, in Diário da República, 2.ª série, de 28 de Abril de 2000, e inédito, respectivamente.

Não obstante a aparente divergência das soluções neles adoptadas - o primeiro com um juízo de inconstitucionalidade e os outros dois com um juízo de não inconstitucionalidade - entende-se, tal como no Acórdão 20/2000, que a "divergência" resulta tão-só das especificidades dos casos concretos em apreço.

Na verdade, em todos os casos se verificara uma expropriação por utilidade pública de uma parcela de terreno que se encontrava integrada na RAN e se punha em causa a avaliação dessa parcela tendo em conta a sua aptidão edificativa (ou a sua classificação como solo apto para construção). Sendo estes os pontos comuns, ocorrera, porém, no caso do Acórdão 267/97, uma desanexação da RAN da parcela expropriada para efeitos de aí edificar um quartel de bombeiros; diferentemente, no caso do Acórdão 20/2000 (e no do Acórdão 247/2000), a expropriação destinava-se à implantação de uma via de comunicação.

Escreveu-se, a propósito, no Acórdão 20/2000, para evidenciar esta diferença e justificar a não aplicação da tese do Acórdão 267/97 ao caso então em apreço:

"[...] O presente caso nem sequer se afigura igual ao subjacente ao dito aresto [o Acórdão 267/97], no que interessa para a relevância jurídico-constitucional (designadamente à luz dos critérios da 'justa indemnização' e da igualdade) da norma em apreço, cujo julgamento de inconstitucionalidade serviu de ratio decidendi à decisão recorrida.

10 - Na verdade, no presente caso, está em causa a expropriação de uma parcela de terreno integrado na RAN que dela não foi concomitantemente desafectado e que a expropriação destina à implantação, nele, de uma auto-estrada e não à edificação ou construção de qualquer prédio urbano.

Ora, mesmo quem entenda que a interpretação do artigo 24.º, n.º 5, do Código das Expropriações segundo a qual não é indemnizável como 'solo apto para construção' o terreno integrado na RAN expropriado para nele edificar justamente construções urbanas (ou seja, para tais finalidades, diferentes da utilidade agrícola) é inconstitucional, por violação dos princípios da igualdade e da justa indemnização, não é por isso forçado a concluir pela inconstitucionalidade quando a expropriação, com indemnização como 'solo para outros fins' (que não o de construção), não visa a construção de prédios urbanos (ou seja, efectivar desta forma pela expropriante a sua potencialidade edificativa), mas, sim, a construção de uma auto-estrada.

É certo que, em ambos os casos, o prédio expropriado deixa de ter uma utilização agrícola. Todavia, no caso de expropriação para edificação de prédio urbano, a expropriação visa justamente a concretização da aptidão edificativa cujo afastamento estava subjacente à exclusão da classificação como 'solo apto para construção'.

Isto enquanto no caso de implantação de uma auto-estrada não se vem a verificar, pelo destino dado ao prédio expropriado, que este tivesse qualquer muito próxima ou efectiva aptidão edificativa de prédios urbanos, ou que fosse assim 'solo apto para construção', sequer para o expropriante.

Apenas no primeiro caso pode dizer-se que a exclusão de uma indemnização como 'solo apto para construção' se apresenta ofensiva dos princípios constitucionais da justa indemnização e da igualdade - apenas nesse caso a não consideração do valor do terreno como 'solo apto para construção' é injusta e conduz a uma desigualdade (em relação a outros expropriados), por ser desmentida pela utilização visada com a expropriação.

Deve, pois, entender-se que a ratio decidendi no Acórdão 267/97 se baseou (não na desvinculação de uma utilização agrícola pela expropriação de prédios impostos na RAN, mas) na circunstância de, nesse caso, a interpretação normativa em apreço conduzir à não consideração como 'solo apto para construção' de prédios expropriados justamente com a finalidade de neles construir prédios urbanos, em que, portanto, a 'muito próxima ou efectiva' potencialidade edificativa fica demonstrada pelo facto de a expropriação - aliás desacompanhada de desafectação da RAN - ser efectuada para construções urbanas.

Em lugar da eliminação da utilização agrícola é, pois, relevante para tal juízo de inconstitucionalidade da não qualificação do terreno como 'solo apto para construção' a potencialidade edificativa efectiva, que se vai actualizar na construção visada pela própria entidade expropriante.

O que interessa, para efeitos de 'justa indemnização' não é o facto de o terreno deixar de ter aptidão agrícola - como acontece quer na construção de um prédio urbano, quer com os terrenos nos quais se constrói uma auto-estrada -, pois isso não afecta a necessidade da sua qualificação como 'solo apto para construção'. Relevante para esse efeito é, sim, o facto de terem ou não uma muito próxima ou efectiva aptidão edificativa, que resulta do facto de o expropriante lhe dar uma utilização para construção.

11 - Não pode, pois, acompanhar-se a ideia de que a ratio decidendi do Acórdão 267/97 esteve simplesmente na ideia de ilegitimidade de imposição de um novo sacrifício pela não indemnização como 'solo apto para construção', em acréscimo à integração do terreno na RAN (aliás, tal proibição de imposição de um sacrifício excessivo deveria antes, em rigor, conduzir à proibição da própria expropriação, não se compreendendo por que razão o sacrifício apenas seria excessivo se a expropriação não fosse acompanhada de indemnização em que se reflectisse o valor como 'solo apto para construção'. [...]"

A verdade é que foi esta última ideia sobre a ratio decidendi do Acórdão 267/97 que o acórdão ora impugnado acolheu e que levou ao juízo implícito de inconstitucionalidade.

Mas sem razão, como se demonstrou no Acórdão 20/2000, na parte que acabou de se transcrever e a que inteiramente se adere.

Resultando, para o Acórdão 267197, a "injustiça" da indemnização e a violação do princípio da igualdade da conjugação da expropriação para fins de construção de um prédio urbano sem indemnização como solo apto para construção com o ónus a que o expropriado ficara sujeito (proibição de construção) pela integração da parcela de terreno, já isso se não verifica - repete-se - quando "a expropriação visa prosseguir não a finalidade cujo afastamento estava subjacente à exclusão do solo como 'apto para construção' mas uma outra com a implantação de uma via de comunicação" (Acórdão 20/2000).

Acrescenta-se ainda no Acórdão 20/2000:

"É certo que no Acórdão 267/97 não deixa de fazer-se referência à ilegitimidade da imposição de uma nova desvantagem a quem já viu o seu prédio onerado com a sua integração na RAN. Todavia, tal referência tem de compreender-se em ligação com a impossibilidade de a Administração desvalorizar o terreno, impondo-lhe limitações, para mais tarde o adquirir por expropriação, pagando por ele um valor correspondente ao de solo não apto para construção, embora o destine a construção.

O princípio da igualdade foi, na verdade, tido por violado no Acórdão 267/97, mas enquanto impunha à Administração Pública o tratamento igual do titular do prédio que estava integrado na RAN (portanto, sendo proibido nele construir) e de outras pessoas titulares de prédios não integrados na RAN, pois que, sendo ambos expropriados para edificação de construções urbanas, por aqui mesmo se confirma a 'muito próxima ou efectiva' aptidão edificativa dos terrenos."

Foi, com efeito, a impossibilidade de avaliação de terrenos expropriados, situados fora dos aglomerados urbanos ou em zonas diferenciadas desses aglomerados, no domínio do Código das Expropriações de 1976, tendo em conta a "muito próxima ou efectiva capacidade edificava" daqueles terrenos, que conduziu aos juízos de inconstitucionalidade formulados, entre outros, nos Acórdãos n.os 341/86, 131/88, 52/90, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 8.º vol., p. 507, vol. 11.º, p. 465, e vol. 15.º, p. 49, respectivamente

Com o Código de 1991 e a nova classificação dos solos (e respectivos critérios de avaliação), adoptado "um critério concreto de potencialidade edificativa" (Alves Correia, "Introdução", in Código das Expropriações e Outra Legislação sobre Expropriações por Utilidade Pública), foi ultrapassada aquela objecção, no plano da constitucionalidade, permitindo o novo diploma a avaliação dos solos expropriados de acordo não com uma possibilidade abstracta de edificação mas com uma potencialidade edificativa concreta (cf. o Acórdão 194/97, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 36.º, p. 407).

Sobre a matéria escreveu aquele autor (A Jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre Expropriações por Utilidade Pública e o Código das Expropriações de 1999, p. 51):

"Ora, só quando os terrenos expropriados envolvam uma muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa [...] é que se impõe constitucionalmente que, na determinação do valor do terreno expropriado, se considere o jus edificandi entre os factores de valorização. Tal, porém, só acontece quando essa potencialidade edificativa seja uma realidade, e não quando seja uma simples possibilidade abstracta, sem qualquer concretização nos planos municipais de ordenamento, num alvará de loteamento ou numa licença de construção."

Daí que um terreno integrado na RAN, com as inerentes limitações do jus edificandi, não conferindo ao proprietário qualquer expectativa de edificação (não existe, assim, uma muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa), possa ser avaliado, para efeitos de indemnização por expropriação, como solo apto para outros fins (artigos 24.º n.º 5, e 26.º, n.º 1, do Código das Expropriações de 1991), sem violação da Constituição, máxime dos princípios da justa indemnização e da igualdade (artigos 62.º, n.º 2, e 13.º da Constituição da República Portuguesa) - sempre com a ressalva de o fim da expropriação não revelar a aptidão edificativa, cuja ponderação é recusada na avaliação.

Salienta-se, aliás, que, no caso, o fim da expropriação é precisamente uma das formas lícitas de utilização de solos integrados na RAN [artigo 9.º, n.º 2, alínea d), do Decreto-Lei 196/89, de 14 de Junho] e que não revela qualquer aptidão edificativa do solo.

Impondo o princípio da justa indemnização que as indemnizações devidas por expropriação constituam uma compensação da desigualdade entre os cidadãos (perante os encargos públicos) determinada pela expropriação e assegurem uma adequada restauração da lesão patrimonial sofrida pelo expropriado - o que se obtém pelo critério do valor de mercado do bem expropriado -, nenhuma destas exigências constitucionais é posta em causa quando o terreno expropriado, integrado numa zona em que, por lei, não é lícita a construção, é avaliado de acordo com a sua aptidão (agrícola) conforme à norma do n.º 1 do artigo 26.º do Código das Expropriações de 1991. Ponderar-se a sua aptidão edificativa (?), com ou sem classificação do solo como apto para outros fins, como se faz no acórdão recorrido, por pretensos ditames da lei fundamental, lançando mão da norma do n.º 2 do mesmo artigo 26.º - que rege para uma situação muito específica, alheia à que se verifica com os solos integrados na RAN - é, pois, recusar, sem fundamento constitucional, a aplicação daquela primeira norma.

Em suma, pois, não enfermam de inconstitucionalidade as normas contidas nos artigos 24.º, n.º 5, e 26.º, n.º 1, do Código das Expropriações aprovado pelo Decreto-Lei 438/91, de 29 de Novembro, quando interpretadas no sentido de excluírem da avaliação segundo a sua potencialidade edificativa nos termos do n.º 2 do artigo 26.º do mesmo Código os solos, integrados na RAN e na REN, expropriados para implantação de via de comunicação.

5 - Decisão. - Pelo exposto e em conclusão, decide-se conceder provimento ao recurso, devendo o acórdão recorrido ser reformado em conformidade com o presente juízo de constitucionalidade.

Sem custas.

Lisboa, 22 de Maio de 2001. - Artur Maurício (relator) - Vítor Nunes de Almeida - Maria Helena Brito - Luís Nunes de Almeida - José Manuel Cardoso da Costa.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1918102.dre.pdf .

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