de 31 de Maio
A Resolução do Conselho n.º 90/CE, de 21 de Dezembro de 1989, relativa a uma abordagem global em matéria de avaliação da conformidade, estabeleceu que em todos os Estados membros da Comunidade deveriam ser criados sistemas de acreditação, visando a promoção de acordos de reconhecimento mútuo, em matéria de certificação e ensaios que permitissem a efectiva realização do mercado interno.Em consequência de tal resolução, a Comissão Europeia ficou incumbida de desencadear as medidas necessárias para pôr em prática os princípios nela previstos, tornando-se obrigatória para todos os Estados membros a adopção e implementação de sistemas nacionais que consubstanciassem o cumprimento das disposições decorrentes da integração na União Europeia.
Mais recentemente, a Resolução do Conselho de 10 de Novembro de 2003 relativa à comunicação da Comissão Europeia «Reforçar a aplicação das directivas da nova abordagem» refere que o desenvolvimento da política de acreditação deve incluir «a independência dos organismos de acreditação das actividades comerciais de avaliação da conformidade e, enquanto serviço de interesse económico geral, deve evitar a concorrência entre os vários organismos».
Conseguir compatibilizar a política económica nacional com a livre concorrência no mercado interno, isto é, criar condições que minimizem o mais possível a colocação de barreiras técnicas ao comércio, implica o uso de instrumentos, tais como a harmonização das regulamentações nacionais e os adequados mecanismos de controlo.
Na maior parte dos países europeus, estes objectivos têm sido concretizados através da criação das respectivas entidades nacionais de acreditação, destacadas da administração directa do Estado e dotadas da necessária autonomia aos níveis orgânico e funcional.
Pretende-se, deste modo, garantir a isenção e imparcialidade de actuação, tornando a actividade de acreditação independente dos ciclos e conjunturas, o que reforça a confiança dos agentes económicos e dos consumidores no funcionamento do mercado.
A necessidade de continuar a preparar a economia portuguesa para um contexto de economia global e consequentemente de mercados abertos e concorrenciais justifica, desde já, que a função nacional de acreditação passe a competir a uma entidade acreditadora isenta, transparente e imparcial na aplicação dos princípios que lhe são imputáveis, por forma a obter pleno reconhecimento dos seus congéneres europeus e internacionais e um fortalecimento da posição negocial do Estado Português, face às economias externas.
Contudo, esta imperatividade de separação da actividade da acreditação de outras actividades potencialmente conflituantes em termos de interesses assume agora uma nova face e decorre da necessidade de Portugal cumprir critérios internacionalmente aceites, baseados em referenciais internacionais.
A confiança entre os agentes económicos, ao nível das relações comerciais transfronteiriças, é, em grande parte, conseguida através do papel desempenhado pelas entidades nacionais de acreditação de cada país, as quais, na prossecução deste objectivo, devem assegurar a assinatura dos vários acordos de reconhecimento mútuo.
Porém, para que tal aconteça torna-se imperativo que as entidades nacionais de acreditação de cada país cumpram e implementem critérios internacionalmente aceites, os quais são emanados pelos organismos de normalização, europeu (CEN) e internacional (ISO), destacando-se, neste contexto, a ISO/IEC FDIS 17011.
De entre estes requisitos, salienta-se o relativo à necessidade de a actividade de acreditação ser exercida por uma entidade com personalidade jurídica própria, com uma direcção autónoma e dotada de total isenção e imparcialidade.
A situação actualmente existente em Portugal, ou seja, a coexistência, dentro da mesma estrutura orgânica - o Instituto Português da Qualidade (IPQ) -, da actividade de acreditação com outras funções, entre elas a metrologia, é violadora daqueles requisitos.
Assim, o presente diploma tem por função a concretização dos princípios e objectivos propostos ao nível da União Europeia e da EA - European Co-operation for Accreditation, de que o IPQ é o membro nacional, e cria, sem acréscimo de custos ou atribuições, o Instituto Português de Acreditação, I. P.
(IPAC), entidade que resulta da cisão dos serviços do IPQ responsáveis pela acreditação.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
CAPÍTULO I
Denominação, natureza, competência territorial, regime, sede e
definições
Artigo 1.º
Denominação e natureza
1 - É criado o Instituto Português de Acreditação, I. P., adiante designado por IPAC.2 - O IPAC é um instituto público, com organização simplificada, dotado de personalidade jurídica, com autonomia administrativa e financeira e património próprio.
Artigo 2.º
Regime jurídico e tutela
1 - O IPAC rege-se pelo disposto no presente diploma, pelos seus estatutos e regulamentos internos, bem como pelo regime jurídico constante da lei quadro dos institutos públicos, aprovado pela Lei 3/2004, de 15 de Janeiro.2 - Os estatutos do IPAC, contendo a sua estrutura e organização, são aprovados por portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Economia.
3 - O IPAC exerce a sua actividade sob a tutela do Ministro da Economia.
Artigo 3.º
Jurisdição territorial e sede
1 - O IPAC é um organismo de jurisdição nacional, com sede no Monte de Caparica, município de Almada, podendo, mediante autorização do Ministro da Economia, ser deslocada para outra localidade dos municípios limítrofes.2 - A criação de delegações, núcleos ou outras formas de representação no País ou no estrangeiro está sujeita a autorização do Ministro da Economia.
Artigo 4.º
Definições
Para efeitos do presente diploma, considera-se:a) «Acreditação» o procedimento através do qual o organismo nacional de acreditação (ONA) reconhece, formalmente, que uma entidade é competente tecnicamente para efectuar uma determinada função específica, de acordo com normas internacionais, europeias ou nacionais, baseando-se, complementarmente, nas orientações emitidas pelos organismos internacionais de acreditação de que Portugal faça parte;
b) «Agentes de avaliação da conformidade» todas as entidades que desenvolvem actividades de realização de ensaios, calibrações, inspecções e certificações;
c) «Organismo nacional de acreditação (ONA)» a entidade à qual o Estado Português confere, por lei, as atribuições relativas ao desenvolvimento das actividades de acreditação; o ONA é o Instituto Português de Acreditação (IPAC);
d) «Organismo regulamentar» a entidade competente em razão da matéria de acreditação;
e) «Sistema Português da Qualidade (SPQ)» a estrutura que engloba, de forma integrada, as entidades que congregam esforços para a dinamização da qualidade em Portugal e que assegura a coordenação dos três subsistemas - da normalização, da qualificação e da metrologia, com vista ao desenvolvimento sustentado do País e ao aumento da qualidade de vida da sociedade em geral.
CAPÍTULO II
Fins e atribuições
Artigo 5.º
Fins
O IPAC é o organismo nacional de acreditação que tem por fim reconhecer a competência técnica dos agentes de avaliação da conformidade actuantes no mercado de acordo com referenciais normativos pré-estabelecidos.
Artigo 6.º
Atribuições
1 - São atribuições do IPAC como organismo nacional de acreditação:a) Reconhecer a competência técnica dos laboratórios de ensaio e calibração, bem como dos organismos de inspecção e de certificação;
b) Garantir a representação de Portugal, designadamente na Cooperação Europeia para a Acreditação (EA), Cooperação Internacional para a Acreditação de Laboratórios (ILAC) e Fórum Internacional para a Acreditação (IAF);
c) Propor ao Governo o estabelecimento e o funcionamento dos acordos de reconhecimento mútuo destinados a suportar as relações económicas entre Portugal e os mercados com os quais são efectuadas transacções comerciais.
2 - Quando estejam em causa áreas da atribuição de organismos regulamentares, o IPAC deve solicitar parecer obrigatório aos mesmos antes de proferir a decisão de acreditação, que deve ser emitido no prazo de 20 dias, findo o qual se entende haver parecer favorável.
CAPÍTULO III
Pessoal
Artigo 7.º Estatuto
Ao pessoal do IPAC aplica-se o regime do contrato individual de trabalho.
Artigo 8.º
Protecção social
Os trabalhadores do IPAC são abrangidos pelo regime geral da segurança social.
Artigo 9.º
Formação
1 - O IPAC promove a formação dos seus colaboradores através de cursos, estágios e outras acções.2 - No âmbito das suas atribuições, o IPAC pode promover cursos ou estágios, ou conceder bolsas de formação, nos termos da legislação aplicável.
Artigo 10.º
Segredo profissional
1 - Os membros dos órgãos sociais do IPAC, o respectivo pessoal e as pessoas ou entidades que lhe prestem, a título permanente ou ocasional, quaisquer serviços ficam sujeitos a segredo profissional sobre os factos e documentos cujo conhecimento lhes advenha do exercício das suas funções ou da prestação de serviços referidos e, seja qual for a finalidade, não podem divulgar nem utilizar, em proveito próprio ou alheio, directamente ou por interposta pessoa, o conhecimento que advenha de tais factos.2 - O dever de segredo profissional mantém-se ainda que as pessoas ou entidades a ele sujeitas nos termos do número anterior deixem de prestar serviços ao IPAC.
3 - Sem prejuízo da responsabilidade civil e criminal que dela resulte, a violação do dever de segredo profissional estabelecido no presente artigo, quando cometida por um dos membros dos órgãos do IPAC ou pelo seu pessoal, implica para o infractor as sanções disciplinares correspondentes à sua gravidade, que podem ir até à destituição ou à rescisão do respectivo contrato de trabalho e, quando praticada por pessoa ou entidade vinculada ao IPAC por um contrato de prestação de serviços ou de avença, confere ao director o direito de resolver imediatamente esse contrato.
Artigo 11.º
Registo de interesses
1 - O pessoal que tenha interesses financeiros, participações ou outros em entidades acreditadas pelo IPAC, que sejam susceptíveis de afectar a sua imparcialidade, devem proceder ao respectivo registo junto do IPAC.2 - O pessoal referido no número anterior não pode intervir em processos em que as entidades ali referidas sejam parte.
CAPÍTULO IV
Regime patrimonial e financeiro
Artigo 12.º
Património
O património do IPAC é constituído pela universalidade dos seus bens, direitos e obrigações.
Artigo 13.º
Receitas
Constituem receitas do IPAC:a) As quantias cobradas por trabalhos ou serviços prestados pelo IPAC;
b) As quantias devidas pelo uso de certificados e marcas nacionais e internacionais de acreditação ou de certificados e marcas nacionais e internacionais de acreditação que o IPAC represente;
c) As quantias cobradas por venda ou assinatura de publicações editadas ou distribuídas pelo IPAC;
d) Os montantes resultantes de serviços prestados a organismos nacionais, regionais ou internacionais representados pelo IPAC;
e) Quaisquer outras receitas que lhe possam advir no exercício do seu objecto social;
f) O produto da venda de bens patrimoniais;
g) O produto de aplicações financeiras no Tesouro;
h) Quaisquer outras receitas que lhe sejam atribuídas por lei, por contrato ou a qualquer outro título, incluindo doações, heranças ou legados;
i) Os valores previstos em contratos-programa anuais e plurianuais celebrados com o Ministério da Economia, com outros ministérios ou com outras entidades para a execução de funções determinadas;
j) As dotações atribuídas pelo Orçamento do Estado para eventuais projectos especiais a cargo do IPAC.
Artigo 14.º
Despesas
Constituem despesas do IPAC as que resultem do exercício normal das suas funções.
CAPÍTULO V
Funcionamento
Artigo 15.º
Princípios e instrumentos de gestão
A actividade do IPAC obedece às normas gerais estabelecidas para o regime financeiro dos serviços dotados de autonomia administrativa e financeira, sendo utilizados os seguintes instrumentos de gestão:a) O plano anual de actividades;
b) O orçamento anual, elaborado com base no respectivo plano de actividades e suas actualizações;
c) O relatório anual de actividades;
d) A conta de gerência anual;
e) O balanço social;
f) Uma contabilidade analítica, por actividades;
g) Outros documentos de acompanhamento regular da actividade e da execução orçamental.
Artigo 16.º
Serviços de apoio
Os serviços de apoio do IPAC, nomeadamente serviços financeiros, de informática, de recursos humanos e logísticos, são desenvolvidos pelo Instituto Português da Qualidade, I. P., mediante protocolo a celebrar entre estes dois organismos, aprovado por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Economia.
Artigo 17.º
Colaboração com outras entidades
1 - Para prossecução das suas atribuições, o IPAC promoverá, sempre que se justifique, a articulação com os serviços e organismos do Ministério da Economia e de outros ministérios nas áreas das respectivas competências, bem como com outras entidades nacionais e internacionais.2 - O IPAC estabelece relações de colaboração com os demais órgãos desconcentrados do poder central de incidência regional e com outras entidades públicas ou privadas, com vista à melhor prossecução dos seus fins.
CAPÍTULO VI
Disposições transitórias e finais
Artigo 18.º
Transição de pessoal
1 - Os funcionários do quadro de pessoal do IPQ, sujeitos ao regime da função pública, que à data da entrada em vigor do presente diploma estejam afectos aos serviços de acreditação e pergunta-resposta transitam para o quadro de pessoal transitório a que se refere o artigo 20.º, nos termos do Decreto-Lei n.º 193/2002, de 25 de Fevereiro, sem prejuízo do direito de opção pelo regime do contrato individual de trabalho.2 - A transição e a colocação do pessoal previstas no número anterior fazem-se por lista nominativa a aprovar pelo Ministro da Economia.
Artigo 19.º
Opção pelo contrato individual de trabalho
1 - Os funcionários que transitem nos termos do artigo anterior podem optar pelo regime do contrato individual de trabalho, no prazo de um ano a contar da data da entrada em vigor do presente diploma.
2 - O direito de opção é exercido mediante declaração escrita, individual e irrevogável, dirigida ao director do IPAC, no prazo previsto no número anterior.
3 - A opção pelo contrato individual de trabalho é concretizada mediante acordo com o director, fundamentado na avaliação curricular e experiência profissional, tendo em consideração as exigências correspondentes ao conteúdo funcional da categoria do funcionário.
4 - A celebração de contrato individual de trabalho implica a exoneração do lugar de origem e a cessação do vínculo à função pública, que se torna efectiva com a publicação no Diário da República.
5 - O pessoal que exerça o direito de opção pelo regime de contrato individual de trabalho, nos termos dos números anteriores, é integrado no regime geral da segurança social.
6 - O cálculo das pensões do pessoal que tenha exercido o direito de opção pelo contrato individual de trabalho, bem como a repartição dos encargos correspondentes, processa-se nos termos do regime legal da pensão unificada.
Artigo 20.º
Quadro de pessoal transitório
1 - É criado no IPAC um quadro de pessoal transitório, onde são integrados os funcionários a que se refere o n.º 1 do artigo 18.º, a aprovar por portaria dos Ministros das Finanças e da Economia no prazo de 90 dias a contar da data da entrada em vigor do presente diploma.2 - Os lugares do quadro a que se refere o número anterior extinguem-se da base para o topo à medida que vagarem.
3 - Com a integração a que se refere o n.º 1 são extintos os correspondentes lugares do quadro de pessoal do IPQ, aprovado pelo Decreto Regulamentar 56/91, de 14 de Outubro.
Artigo 21.º
Manutenção do vínculo à função pública
1 - Os funcionários integrados no quadro de pessoal transitório do IPAC, nos termos do n.º 1 do artigo 18.º, continuam sujeitos ao regime da função pública, sem perda de direitos, incluindo os de progressão e promoção na carreira.
2 - Na dinâmica das carreiras dos funcionários a que se refere o número anterior, os concursos seguem os regimes legais aplicáveis.
3 - O director do IPAC exerce, relativamente ao pessoal na situação prevista nos números anteriores, os poderes próprios dos cargos de direcção superior de 1.º grau, sem prejuízo de delegação de poderes.
Artigo 22.º
Estatuto remuneratório do director
Até à entrada em vigor do diploma a que se refere o n.º 2 do artigo 25.º da Lei 3/2004, de 15 de Janeiro, o estatuto remuneratório do director é fixado por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Economia.
Artigo 23.º
1 - Sem prejuízo de outras contribuições previstas na lei, o IPAC contribui para o financiamento da Caixa Geral de Aposentações com uma importância mensal de montante igual ao das quotas pagas pelos trabalhadores ao seu serviço abrangidos pelo regime de protecção social da função pública.2 - Compete às entidades onde o pessoal do IPAC seja autorizado a desempenhar funções em regime de comissão de serviço ou requisição satisfazer os encargos a que se refere o número anterior.
Artigo 24.º
Direitos, obrigações e compromissos
1 - As referências feitas na legislação nacional ao IPQ, em termos de acreditação, passam a considerar-se feitas ao IPAC.2 - Todos os direitos, obrigações e compromissos do IPQ constantes, designadamente, de acordos, contratos e protocolos, bem como a titularidade de direitos de propriedade industrial, no âmbito da acreditação, são transferidos por contrato para o IPAC.
Artigo 25.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 15 de Abril de 2004. - José Manuel Durão Barroso - Maria Manuela Dias Ferreira Leite - Carlos Manuel Tavares da Silva - António José de Castro Bagão Félix - Amílcar Augusto Contel Martins Theias.
Promulgado em 19 de Maio de 2004.
Publique-se.O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 21 de Maio de 2004.
O Primeiro-Ministro, José Manuel Durão Barroso.