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Acórdão 565/2007, de 3 de Janeiro

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Sumário

Não julga inconstitucionais as normas constantes dos artigos 399.º, 432.º e 433.º do Código de Processo Penal, quando interpretadas no sentido de que não é admissível recurso da decisão do Tribunal da Relação proferida em incidente de recusa de juiz de 1.ª instância

Texto do documento

Acórdão 565/2007

Processo 715/07

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

A - Relatório

1 - Ana Maria da Silva Pires Brás recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão, do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29 de Maio de 2007, que rejeitou o recurso interposto pela recorrente do acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 31 de Maio de 2006, pretendendo a apreciação da questão de constitucionalidade das normas constantes dos artigos 399.º, 432.º e 433.º do Código de Processo Penal, quando interpretadas no sentido de que não é admissível recurso da decisão do Tribunal da Relação proferida em incidente de recusa de juiz.

2 - Discorrendo sobre a questão da inadmissibilidade de recurso do acórdão da Relação que decida o incidente de recusa de intervenção de juiz, o acórdão recorrido discreteou do seguinte modo:

«2.2 - A questão da admissibilidade de recurso do acórdão da Relação que decida o incidente de recusa de intervenção de juiz não tem recebido resposta uniforme, por parte do Supremo Tribunal de Justiça. No sentido da inadmissibilidade, pronunciaram-se, desde logo, os acórdãos de 28.09.00, processo 2194/00-5ª e o de 15.05.02-3ª, processo 1267/02 (1), sendo certo, porém, que a maioria das decisões tinha vindo a aceitar a recorribilidade, assentando a solução, fundamentalmente, na obediência ao princípio geral enunciado no artigo 399º, do CPP (2): 'é permitido recorrer dos acórdãos, das sentenças e dos despachos cuja irrecorribilidade não estiver prevista na lei'.

Mas a dúvida voltaria a ser actualizada no âmbito do acórdão de 21.05.05, processo 2818/05 (3), que - apesar de ter admitido o recurso, 'embora no limite das dúvidas, e na perspectiva do critério do favor do recurso' - tornou a sinalizar que 'a admissibilidade do recurso da decisão da Relação no incidente de recusa pode efectivamente, ser questionada, pela natureza da decisão que está em causa e pelo paralelismo com o grau hierárquico de decisão final no incidente relativo a impedimento'.

2.3 - Ao abordar questão de idêntica natureza (recorribilidade de acórdão da Relação que decidiu o incidente previsto no artigo 182º, do C.P.P.), o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de 16.02.05, proc. n.º 4551/04 (4), elaborou o seguinte raciocínio:

[...]

"... Da conjugação das normas dos artigos 400º, 427º e 432º do Código de Processo Penal resulta que decisões de natureza processual ou que não ponham termo ao processo não são recorríveis para o Supremo Tribunal. Pressuposto do recurso para o Supremo Tribunal (salvo casos específicos que a lei especialmente preveja - artigo 433º do Código de Processo Penal) é, pois, a natureza da decisão de que se recorre: decisões finais e não decisões sobre questões processuais avulsas (salvo, por razões de racionalidade intraprocessual, quando o recurso de decisões interlocutórias suba com recurso que deva ser do conhecimento do Supremo Tribunal - artigo 432º, alínea f) do CPP).

É a razão e o sentido da norma do artigo 400º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal. Como pode haver recurso de todas as decisões que não sejam de expediente ou que não dependam da livre discricionariedade do juiz, e, por regra, o recurso é interposto para as relações, as decisões proferidas por estas, em recurso, que não ponham termo à causa, não são recorríveis, pois o processo não termina, podendo ter, na sequência, outras decisões, designadamente a decisão final, submetida, então, às regras gerais dos recursos. Em tais casos, a garantia do recurso não exige e a racionalidade do modelo não seria compatível com a previsão de recurso até ao Supremo Tribunal para decisão de questões processuais intermédias que não definem o direito do caso, mas apenas determinam um certo modo de ordenação e sequência processual.

Mas se é assim, a mesma razão valerá para os casos em que a relação intervenha, não como instância formal de recurso, mas como instância de decisão no processo, em outro grau, para questão incidental cujo conhecimento a lei lhe defira. Na coerência e racionalidade do sistema, não há razão para distinguir entre uns e outros casos.

Deste modo, a decisão que concretamente está em causa [decisão de não tomar conhecimento do incidente previsto no artigo 182º] não se integra em qualquer das hipóteses previstas de recurso para o Supremo Tribunal (artigo 432º do CPP).

Não se trata de decisão proferida pela relação em primeira instância (artigo 432º, n.º 1, alínea a), do CPP), isto é, em que a competência em razão da matéria e da hierarquia para a decisão do caso e do objecto do processo caiba, em primeiro grau de conhecimento, e segundo as leis de organização e competências dos tribunais, aos tribunais da relação,

Não constitui também, é manifesto, situação que se enquadre nas alíneas c), d) e e) do artigo 432º do CPP.

Resta a alínea b) desta disposição. Mas, a conjugação das normas da alínea b) do artigo 432º e do artigo 400º, n.º 1, alínea c), do CPP tem de ser interpretada em equilíbrio sistémico do regime dos recursos. Nesta perspectiva, a norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 400º, quando se refere a decisões proferidas, em recurso, pelas relações, que não tenham posto termo à causa, quer significar, salvo contradição interna do sistema, que a competência em razão da hierarquia para proferir decisões que não ponham termo à causa cabe às relações, que decidem, em matérias interlocutórias, em última instância - quer seja decisão proferida em recurso, quer seja por ocasião de um recurso ou por intervenção incidental directamente deferida pela lei.

[...]

O artigo 400º, n.º 1, alínea c), do CPP abrange, assim, todas as decisões interlocutórias, subtraindo-as à competência do Supremo Tribunal (salvo, como se referiu e por razões de eficácia e racionalidade processual, quando o recurso de decisões interlocutórias tenha de subir com o recurso para cujo conhecimento seja competente o Supremo Tribunal).

Só assim não será, por razões de conformidade constitucional com a garantia de defesa que o recurso também constitui, quando seja caso de decisões que afectem directa, imediata e substancialmente, direitos fundamentais do arguido, como sejam as decisões relativas à aplicação de medidas de coacção privativas da liberdade (cf. Acórdão do Tribunal Constitucional de 30 de Novembro de 2004, Diário da República, 2.ª série, de 18 de Janeiro de 2005)".

2.3.1 - Posto isto, é altura de concluir como se concluiu no citado Acórdão 2322/06:

"Cremos que esta doutrina se aplica por inteiro à decisão aqui impugnada, em que o Tribunal da Relação indeferiu o requerimento de recusa.

É certo, repete-se, que o artigo 399º do CPP fixou o princípio geral de que é permitido recurso das decisões cuja irrecorribilidade não estiver prevista na lei.

Mas também é verdade que as possibilidades de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça são as taxativamente previstas no artigo 432º ou, por força do artigo seguinte, os 'outros casos que a lei especialmente preveja'.

Norma especial que autorize o recurso deste tipo de decisões da relação ao abrigo do artigo 433º não a encontramos, designadamente no local mais apropriado, no capítulo do CPP que regula a matéria dos impedimentos, recusas e escusas - o que não deixa de ser sintomático quando comparado com o regime do CPP de 1929, em cujo artigo 114º, §7º, se previa expressamente uma hipótese de recurso para o tribunal da relação, no caso de a suspeição ter sido deduzida contra juiz da 1ª instância.

Quanto às possibilidades de recurso abertas pelo artigo 432º, estando inquestionavelmente afastadas, pela própria natureza das coisas, as das alíneas e), d) e e), resta ponderar as das alíneas a) e b).

Como sublinhou o Senhor Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa não constitui decisão proferida em primeira instância porque este Tribunal não funcionou como tribunal de 1ª instância segundo as regras de organização, funcionamento e competência dos tribunais. Enfim, não se trata de decisão proferida em processo que, pelo seu objecto, seja da competência, em 1ª instância, do Tribunal da Relação. Está, assim, igualmente afastada a possibilidade de recurso por via da alínea a).

Por outro lado, embora também não se trate de uma decisão proferida, em recurso, porquanto o Tribunal da Relação não interveio como instância formal de recurso, é sempre uma decisão interlocutória, sobre questão processual avulsa que não pôs termo à causa e, assim, abrangida, de acordo com aquela interpretação, pela alínea c) do n.º 1 do artigo 400º do CPP, que dita a sua irrecorribilidade.

Dir-se-á que, neste modo de ver as coisas, estaremos face a decisão não controlável por via de recurso, o que traduzirá uma solução conflituante com o direito ao recurso, instituído como uma das garantias de defesa que o processo penal tem de assegurar, nos termos do n.º 1 do artigo 32º da CRP, ou até que postergará o direito de acesso aos tribunais, igualmente consagrado na Constituição, no seu artigo 20º.

Bem.

Em relação à primeira garantia, a garantia do duplo grau de jurisdição, relembramos, como o acórdão acima invocado, que apenas tem sido defendida pela jurisprudência do Tribunal Constitucional relativamente a decisões penais condenatórias e a decisões respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição de liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais. "A garantia de um duplo grau de jurisdição tem que ver essencialmente com a definição da situação jurídico-criminal do arguido em matéria que contenda com a privação, limitação ou restrição dos seus direitos e garantias fundamentais da liberdade e segurança [...] e não, directamente, com o cumprimento das regras procedimentais ou processuais a que o legislador subordine as decisões judiciais sobre tal matéria" (Acórdão do TC n.º 390/04, de 2 de Junho, em "Acórdãos do Tribunal Constitucional, 59º vol., 543). Aliás, "sempre se entendeu, na jurisprudência do Tribunal Constitucional que a faculdade de recorrer em processo penal constitui uma tradução da expressão do direito de defesa, correspondendo mesmo a uma imposição constitucional a consagração do recurso de sentenças condenatórias ou de actos judiciais que durante o processo tenham como efeito a privação ou a restrição da liberdade ou de outros direitos fundamentais, mas sempre recusou que a Constituição impusesse a recorribilidade de todos os despachos proferidos em processo penal» (Acórdão também do TC n.º 30/2001, de 30 de Janeiro, Diário da República, 2.ª série, de 23.03.01, pág. 5268 e segs.)

Por outro lado, a garantia constitucional de acesso aos Tribunais apenas demanda que o grau de jurisdição único previsto para determinada situação se possa pronunciar de modo formalmente válido sobre a questão.

No caso, não se vê que Tribunal da Relação não estivesse em condições de se pronunciar validamente sobre o pedido de recusa, sendo de sublinhar, como mais uma vez o fez o Senhor Procurador-Geral Adjunto, que a decisão do incidente concretamente deduzido é, nos termos da lei, da competência do tribunal imediatamente superior, e não do seu presidente, como sucede no âmbito do processo civil, onde, apesar disso, se exclui expressamente o recurso (cf. artigos 130º, n.º 3 e 13.º, n.º 1º, do CPC) - o que sem dúvida constitui garantia processual satisfatória, dado o distanciamento do Tribunal da Relação relativamente ao caso concreto.

Curiosamente, para o caso de impedimento, a lei consagra expressamente o direito ao recurso, na hipótese de o juiz o não reconhecer, no n.º 1 do artigo 42º do CPP - o que se compreende, porquanto, ao contrário da recusa, em que o juiz responde ao requerimento e o tribunal superior decide (artigo 44º) aqui, é o próprio juiz visado que decide se se considera ou não impedido.

Enfim, chegamos à conclusão de que o acórdão por que o Tribunal da Relação [...] decidiu o requerimento de recusa [...] não é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.' (5)

2.3.2 - Na resposta à questão da inadmissibilidade de recurso, suscitada pelo Ministério Público, a arguida veio arguir 'a inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 399º, 432º e 433º do CPP, quando interpretados no sentido de que não é admissível recurso de decisão da Relação proferida em incidente de recusa de juiz, por violação dos artigos 20.º, n.º 1 e 32º, n.º 1 da CRP'.

Para lá do que ficou dito sobre a jurisprudência firme do Tribunal Constitucional, haverá que ter presente o ensinamento de Gomes Canotilho e Vital Moreira, em anotação a tais disposições (6)

[...] "A LC n.º 1/97 incluiu expressamente como candidato positivo das garantias de defesa o direito ao recurso (nº 1, II parte). Trata-se de explicitar que, em matéria penal, o direito de defesa pressupõe a existência de um duplo grau de jurisdição, na medida em que o direito ao recurso integra o núcleo essencial das garantias de defesa constitucionalmente asseguradas. Na falta de especificação, o direito ao recurso traduz-se na reapreciação da questão por um tribunal superior, quer quanto à matéria de direito quer quanto à matéria de facto. Era esta, de resto, a posição já defendida pela doutrina e acolhida pela jurisprudência do Tribunal Constitucional desde sempre (cf., por último, Acórdãos TC n.os 638/98, 202/99 e 415/01)"

[...] "O direito de acesso aos tribunais e à tutela judicial efectiva não fundamenta um direito subjectivo ao duplo grau de jurisdição. Discute-se em que medida o direito de acesso aos tribunais inclui o direito ao recurso das decisões judiciais, traduzido no direito ao duplo grau de jurisdição. A chamada doutrina de '2ª instância em matéria penal' encontra-se expressamente consagrada no artigo 14º-5 do PIDCP e resulta já do artigo 32º-1 da CRP (cf. Acórdãos TC n.os 210/86 e 8/87). Não existe, porém, um preceito constitucional a consagrar a 'dupla instância' ou o duplo grau de jurisdição em termos gerais (cf. Acórdãos TC n.os 31/87, 65/88, 163/90, 259/97 e 595/98). Todavia, o recurso das decisões judiciais que afectem direitos fundamentais, designadamente direitos, liberdades e garantias, mesmo fora do âmbito penal, pode apresentar-se como garantia imprescindível destes direitos. Em todo o caso, embora o legislador disponha de liberdade de conformação quanto à regulação dos requisitos e graus de recurso, ele não pode regulá-lo de forma discriminatória, nem limitá-lo de forma excessiva. [...]'

2.4 - A decisão que admita o recurso [...] não vincula o tribunal superior (nº 3., do artigo 414º, do CPP), sendo que o recurso é rejeitado sempre que [...] se verifique causa que devia ter determinado a sua não admissão nos termos do artigo 414º, n.º 2.

3 - Nos termos expostos - e na procedência da questão suscitada pelo Ministério Público - decide-se rejeitar o recurso interposto por Ana Maria da Silva Brás, por inadmissibilidade.».

3 - Alegando no Tribunal Constitucional, a recorrente rematou o seu discurso argumentativo com as seguintes conclusões:

«1 - A decisão sobre incidente de recusa de juiz é tomada, como o foi, em sede, em 1ª Instância, pelo Tribunal da Relação.

2 - Segundo a lei ordinária, são recorríveis todos os acórdãos, sentenças e despachos cuja irrecorribilidade não esteja prevista na lei.

3 - Não está prevista na lei a irrecorribilidade da decisão da Relação que tome posição sobre incidentes de recusa. Antes pelo contrário, a mesma está prevista (artigo 42º, n.º 3 do CPP).

4 - Assim, carece de sentido a interpretação que a decisão recorrida fez dos artigos 399º, 432º e 433º, todos do CPP.

5 - Mas, para além disso, tal interpretação é violadora, nomeadamente, dos artigos 20º, n.º 1 e 32º, n.º 1, ambos da CRP, por impedir quer a defesa dos direitos, quer o direito ao recurso e ao duplo grau de jurisdição, que consubstancia aquele, garantido constitucionalmente desde a revisão de 1997.

6 - Impõe-se, pois, que sejam proferidos juízos de inconstitucionalidade da interpretação dos normativos questionados, nos termos reclamados.

7 - Assim se fará justiça.».

4 - Por sua vez o Procurador-Geral Adjunto, no Tribunal Constitucional concluiu as suas contra-ordenações dizendo:

«1 - Não viola a lei Fundamental a interpretação normativa que não admite a impugnação, perante o Supremo Tribunal de Justiça, do acórdão da Relação que haja rejeitado o incidente de recusa do juiz.

2 - Termos em que não deverá proceder o presente recurso.».

B - Fundamentação

5 - Do objecto do recurso de constitucionalidade.

Antes de mais cumpre notar que o objecto do recurso de constitucionalidade surge como um dado para o Tribunal Constitucional.

Na verdade, não cabe na sua competência sindicar o juízo de determinação do direito infraconstitucional que constituiu o fundamento normativo da decisão levado a cabo pelo acórdão recorrido. Se o melhor direito, em face dos preceitos legais, é aquele a que se arrimou a decisão recorrida ou é aquele que a recorrente defende é questão que o Tribunal Constitucional não pode resolver. A sua competência queda-se apenas por saber se o direito aplicado é ou não direito válido à face da Constituição.

Por outro lado, há-de notar-se que a recorrente, conquanto tenha definido correctamente a concreta norma que foi aplicada pelo acórdão recorrido como ratio decidendi do seu julgado, a distraiu de um arco legislativo em parte diverso daquele em que, em rectas contas, se baseou a decisão recorrida.

Na verdade, do discurso desenvolvido pelo acórdão recorrido resulta que o resultado interpretativo aplicado foi por ele inferido, essencialmente, da "conjugação" dos artigos 400.º, n.º 1, alínea c), e 432.º, alínea b), do Código de Processo Penal (CPP) e não, como alegou a recorrente no seu requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade e nas suas alegações, dos artigos 399.º, 432.º e 433.º do CPP".

Tal facto não impede, porém, que se conheça da questão de constitucionalidade. É que, por um lado, não pode deixar de considerar-se como, também, havendo sido aplicados tais preceitos, na medida em que os mesmos foram convocados como instrumentos da actividade hermenêutica desenvolvida tendente à determinação, no âmbito do sistema legal, da concreta norma a aplicar à decisão do caso.

Por outro lado, estando nitidamente recortada a questão de constitucionalidade, não se afigura decisivo o facto de o critério normativo aplicado poder ser inferido de modo mais preciso ou directo de outro ou outros preceitos legais: tal circunstância, para além de contender com a interpretação que a recorrente fez da decisão recorrida, respeita também à bondade da actividade interpretativa levada a cabo, no plano do direito infraconstitucional, e já se disse que essa escapa à competência sindicante do Tribunal Constitucional.

6 - Do mérito do recurso.

6.1 - Como se vê dos autos, a recorrente requereu a declaração de impedimento da juíza de instrução criminal (incidente de recusa de juiz), por considerar verificada uma situação da sua falta de imparcialidade (cf. artigo 41.º, n.º 2, do CPP).

A juíza, por despacho, não reconheceu a existência de um tal impedimento para intervir na instrução criminal.

Inconformada com esta decisão, a recorrente recorreu para o Tribunal da Relação, mas sem êxito porquanto esse tribunal julgou improcedente o pedido de recusa do juiz, "mantendo-se a Sr.ª Juíza como titular da instrução em causa".

Discordando dessa decisão, a ora recorrente recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ).

Esse recurso foi, todavia, rejeitado com base na sua inadmissibilidade legal, nos termos da fundamentação acima transcrita.

A questão que vem posta é, assim, a de saber se "as normas constantes dos artigos 399.º, 432.º e 433.º [e 400.º, n.º 1, alínea c)] do Código de Processo Penal, quando interpretadas no sentido de que não é admissível recurso da decisão do Tribunal da Relação proferida em incidente de recusa de juiz" são conformes ou não à lei fundamental.

Sustenta a recorrente que elas violam "nomeadamente, os artigos 20.º, n.º 1 e 32.º, n.º 1, ambos da CRP, por impedir[em] quer a defesa dos direitos, quer o direito ao recurso e ao duplo grau de jurisdição, que consubstancia aquele, garantido constitucionalmente desde a revisão de 1997".

6.2 - Mas tal posição não merece acolhimento. É certo que o artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP) consagra, agora expressamente depois da revisão de 1997, o direito ao recurso como uma garantia fundamental própria do processo criminal inserida na garantia constitucional de asseguramento de todos os meios de defesa.

O preceito limitou-se, assim, a acolher a tese que a jurisprudência anterior do Tribunal Constitucional, bem como a doutrina, tinham vindo a desenvolver sobre a matéria.

Nesta medida a explicitação densificou eo nomine, neste domínio do processo criminal, um dos postulados normativos constitucionais que já decorriam, de acordo com o princípio da máxima expansividade e efectividade dos direitos e garantias constitucionais, da garantia constitucional do asseguramento de "todas as garantias de defesa", conferindo-lhe, todavia, por esta via, uma expressão própria.

O Tribunal Constitucional tem, porém, construído uma sólida jurisprudência no sentido de que o direito constitucional ao recurso que é postulado pela garantia do asseguramento de todas as garantias de defesa se basta com a existência de um duplo grau de jurisdição relativamente a decisões penais condenatórias e a decisões respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição de liberdade ou a quaisquer outros direitos fundamentais (cf., entre outros, os Acórdãos n.º 265/94, publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional 27.º vol., p. 751, n.º 189/01, publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 50º vol., p. 285, n.º 369/01 (inédito), n.º 435/01 (inédito), n.º 49/03, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 16 de Abril de 2003), n.º 377/03 (inédito), e n.º 390/04, publicado no Diário da República 2.ª série, de 7 de Julho de 2004, e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 59.º vol., p. 543.

Como se escreveu no último aresto:

"A consagração de um duplo grau de jurisdição em matéria penal decorre essencialmente da exigibilidade constitucional de se conferir um grau elevado de asseguramento, de concretização e de realização aos direitos e garantias fundamentais da liberdade e segurança dos cidadãos (sendo igualmente invocável relativamente a outros direitos e garantias fundamentais), dado que estes são directamente atingidos pelas decisões condenatórias e outras decisões judiciais que limitem ou restrinjam a liberdade. A existência de um segundo grau de reexame jurisdicional das medidas de privação, limitação ou restrição desses direitos fundamentais corresponde assim ao patamar que a Constituição tem como minimamente tolerável para que se possam haver por arredados os perigos de uma ofensa inconsistente de tais direitos".

Posicionando-se dentro desta linha de pensamento, o Tribunal Constitucional reconheceu, por outro lado, a não obrigatoriedade constitucional da existência de um duplo grau de jurisdição relativamente a determinadas normas processuais que denegam a possibilidade de o arguido recorrer de determinados despachos ou decisões proferidas na pendência do processo (v. g., quer de despachos interlocutórios, quer de outras decisões, Acórdãos n.º 259/88, n.º 118/90 e n.º 353/91, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 12º vol., p. 735; 15º vol., p. 397, e 19º vol., p. 563, Acórdão 30/01, publicado no Diário da República 2.ª série, de 23 de Março de 2001 - também in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 49º vol., pp. 171 - relativo à irrecorribilidade da decisão instrutória que pronuncie o arguido pelos factos constantes da acusação particular quando o Ministério Público acompanhe essa acusação particular).

Abordando a questão na perspectiva da resposta a dar ao caso de arguição da nulidade do acórdão de 2.ª instância, escreveu-se no referido Acórdão 390/04:

«O Tribunal Constitucional sempre entendeu a garantia do duplo grau de jurisdição enquanto respeitando ao direito ao recurso relativo a decisões penais condenatórias e ainda quanto às decisões penais respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais.

Paradigmático de uma tal leitura da Constituição é o discurso expendido no Acórdão 265/94 (Diário da República, 2.ª série, de 19 de Julho de 1994), mas cujo sentido informa igualmente a fundamentação, entre outros, dos Acórdãos n.º 610/96, n.º 468/97, n.º 216/99 e n.º 113/00 (todos disponíveis em www.tribunal constitucional.pt/jurisprudencia, estando ainda o primeiro e o terceiro publicados, respectivamente, no Diário da República, 2.ª série, de 6 de Julho de 1996 e 6 de Agosto de 1999):

"A garantia do duplo grau de jurisdição existe quanto às decisões penais condenatórias e ainda quanto às decisões penais respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais.

Sendo embora a faculdade de recorrer em processo penal uma tradução da expressão do direito de defesa (veja-se nesse sentido o Acórdão 8/87 do Tribunal Constitucional, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 9º volume, pág. 235), a verdade é que, como se escreveu no Acórdão 31/87 do mesmo Tribunal, "se há-de admitir que essa faculdade de recorrer seja restringida ou limitada em certas fases do processo e que, relativamente a certos actos do juiz, possa mesmo não existir, desde que, dessa forma, se não atinja o conteúdo essencial dessa mesma faculdade, ou seja, o direito de defesa do arguido". E, mais à frente, lê-se no mesmo aresto:

"Ora, a salvaguarda desse direito de defesa impõe seguramente que se consagre a faculdade de recorrer da sentença condenatória, como se determina, aliás, de forma expressa no n.º 5 do artigo 14º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, aprovado para ratificação pela Lei 29/78, de 12 de Junho: «Qualquer pessoa declarada culpada de crime terá o direito de fazer examinar por uma jurisdição superior a declaração de culpabilidade e a sentença, em conformidade com a lei»; como imporá, também, que a lei preveja o recurso dos actos judiciais que, durante o processo, tenham como efeito a privação ou a restrição da liberdade ou de outros direitos fundamentais do arguido. Mas já não impõe que se possibilite o recurso de todo e qualquer acto do juiz" (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 9º vol., págs. 467-468; no mesmo sentido, veja-se o Acórdão 178/88, in Acórdãos, vol. 12º, págs. 569 e seguintes).".

A garantia de um duplo grau de jurisdição traduz-se, deste modo, na possibilidade de a situação de eventual ofensa ao direito de liberdade e segurança poder ser reexaminada, concernentemente a todos os fundamentos que poderão determinar a decisão da causa, por um tribunal diferente hierarquicamente superior. Dito de uma forma simplista, a garantia de um duplo grau de jurisdição tem que ver essencialmente com a definição da situação jurídico-criminal do arguido em matéria que contenda com a privação, limitação ou restrição dos seus direitos e garantias fundamentais da liberdade e segurança (como é, por exemplo, o caso das decisões condenatórias ou aplicação de medidas de coacção), e não, directamente, com o cumprimento das regras procedimentais ou processuais a que o legislador subordine as decisões judiciais em tal matéria.

Sendo assim, não decorre forçosamente da garantia constitucional de um duplo grau de jurisdição que haja de ser sempre admissível o recurso para o tribunal superior nos casos em que o tribunal de recurso se pronuncie, pela primeira vez, sobre questões que influam na decisão da causa (ressalvando-se o recurso de constitucionalidade para o órgão jurisdicional específico não enquadrado na hierarquia dos tribunais) ou nos de, ao proferir a decisão, incorrer na violação de lei processual ou procedimental que seja sancionada com o estigma da nulidade.

Nada impõe que se leve a autonomização da questão da nulidade da decisão em relação à questão de fundo tão longe que seja constitucionalmente exigível a existência de um 2º grau de jurisdição especificamente para esta questão, considerando o regime de arguição e conhecimento das nulidades em processo penal por via de recurso, a possibilidade de arguir as nulidades perante o órgão que proferiu a decisão, quando aquele recurso não existir, e, como no presente caso, a existência de duas decisões concordantes em sentido condenatório (o Tribunal da Relação confirmou a decisão da 1ª instância nesse sentido).

É claro que o legislador poderia, na sua discricionariedade legislativa, admitir esse recurso, mesmo nas hipóteses em que o fundamento deste resida na arguição de nulidades processuais, assim ampliando o âmbito material do direito de recurso, mas a sua inadmissibilidade não será constitucionalmente intolerável.».

De notar, ainda, é a posição tomada no recente Acórdão 589/05, publicado no Diário da República 2.ª série, de 4 de Janeiro de 2006, e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 62.º vol. p. 223, em que tal, como no presente caso, estava em causa uma questão incidental relativa não ao arguido no processo mas a outro interveniente (aqui refere-se à recusa de juiz, aí referia-se à quebra de sigilo profissional de testemunha jornalista), tendo o Tribunal Constitucional entendido que a matéria não respeitava sequer às garantias de defesa do arguido, por a recorrente não ser arguida e por isso não estava abrangida pelo âmbito normativo do artigo 32.º, n.º 1, da CRP, e que o segundo grau de jurisdição também não decorria do direito de acesso aos tribunais em qualquer das dimensões retratadas no artigo 20.º, n.os 1, 4 e 5, da CRP.

Segundo resulta do recorte normativo da situação em causa no presente recurso, a questão do impedimento do juiz no processo penal é decidida em primeira mão pelo próprio juiz cujo impedimento haja sido arguido e só no caso de ele não reconhecer o seu impedimento legal é que cabe recurso para o tribunal imediatamente superior (artigo 41.º e 42.º do CPP).

Porém, - e tal como se passa no caso decidido pelo referido Acórdão 589/05 - trata-se de matéria que não diz respeito especificamente aos meios de defesa do arguido.

Estamos perante matéria que não diz respeito propriamente ao objecto da causa, ao thema do processo, mas à legitimidade substantiva de um dos sujeitos ou intervenientes na relação processual penal, à legitimidade substantiva do juiz para exercer as suas funções no processo, e que, como tal tanto se pode configurar em relação ao arguido como em relação ao ofendido ou pessoa com a faculdade de se constituir assistente, seja directamente, seja mediatamente, aqui por referência a um determinado leque de pessoas que com eles poderão estar em relação familiar ou análoga.

Assim sendo, tem de concluir-se que, pela sua natureza, a situação normativa em causa não cabe no âmbito de protecção de um segundo grau de jurisdição postulado pelo artigo 32.º, n.º 1, da CRP.

6.3 - Sustenta, ainda, a recorrente que norma em causa no presente recurso viola, também, o artigo 20.º, n.º 1, da CRP, "por impedir quer a defesa dos direitos, quer o direito ao recurso e ao duplo grau de jurisdição".

Mas mais uma vez sem razão.

Discorrendo sobre este parâmetro constitucional, a propósito do caso aí analisado, afirmou-se, no já referido Acórdão 589/05, o seguinte:

«Como o Tribunal Constitucional afirmou no acórdão 163/90, de 23 de Maio (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 16º volume, 1990, p. 301 e segs.), o direito de acesso aos tribunais para defesa dos direitos e interesses legítimos "é, entre o mais, o direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se deve chegar em prazo razoável e com observância das regras da imparcialidade e independência, possibilitando-se, designadamente, um correcto funcionamento do contraditório". Mas esse acesso aos tribunais não tem que ser assegurado sempre em mais de um grau de jurisdição: mesmo no domínio do processo penal, "[a] Constituição não impõe [...] que o legislador consagre a faculdade de recorrer de todo e qualquer acto do juiz".

Por outro lado, disse este Tribunal, no acórdão 673/95 (Diário da República, 2.ª série, n.º 68, de 20 de Março de 1996, p. 3786 segs.):

"[...]

Que não há aí violação do artigo 20º e mais rigorosamente do seu n.º 1, da Constituição - [...] - é um dado que ressalta de posições ditas e reafirmadas por este Tribunal Constitucional, apoiando-se na doutrina e na sua já vasta jurisprudência a propósito tirada, no sentido de que o direito de acesso aos tribunais postulado pelo artigo 20º, n.º 1, da lei Fundamental não garante, necessariamente, em todos os casos e por si só, o direito a um duplo ou a um triplo grau de jurisdição, sendo que a garantia de um duplo grau de jurisdição referentemente a réus condenados em processo criminal não é imposta por aquele normativo constitucional, antes decorrendo do que se preceitua no n.º 1 do artigo 32º da Constituição.

E, igualmente, tem defendido que aquela lei não consagra um direito geral de recurso das decisões judiciais (afora aquelas de natureza criminal condenatória, recurso esse, porém, que deflui da necessidade de previsão de um segundo grau de jurisdição, necessidade essa, repete-se, imposta pelo n.º 1 do artigo 32º). Acrescenta, todavia, com suporte na própria doutrina, que, uma vez que a Constituição prevê «a existência de tribunais de recurso na ordem dos tribunais judiciais» - o mesmo acontecendo na ordem dos tribunais administrativas e fiscais - e que lei infraconstitucional, designadamente os diplomas adjectivos fundamentais e os que regem a organização judiciária, [...], também prevêem esses órgãos de administração de justiça funcionando como tribunais também vocacionados para decidir em sede de impugnação das decisões emanadas de tribunais de hierarquia inferior, então não será lícito ao legislador ordinário suprimir em bloco os tribunais de recurso e os próprios recursos ou ir até ao ponto de limitar de tal modo o direito de recorrer, que, na prática, se tivesse de concluir que os recursos tinham sido suprimidos (as expressões em itálico são extraídas da obra Recursos em Processo Civil, de Armindo Ribeiro Mendes, Lisboa 1992, pp. 100, 101 e 102; cf., como exemplo da jurisprudência do Tribunal, e com mais recente publicação, quanto ao tema em análise, o Acórdão 447/93, no Diário da República, 2.ª série, de 23 de Abril de 1994).

[...].".

É, portanto, entendimento pacífico na jurisprudência constitucional que o direito de acesso à justiça não comporta o sistemático exercício do direito ao recurso, visando assegurar o duplo grau de jurisdição perante todas as decisões que afectem determinado interveniente processual.

Logo, não é possível sustentar que do artigo 20º, n.º 1, da Constituição decorre, sem mais, o direito do titular do direito ao sigilo profissional, a quem foi ordenada a prestação de depoimento em processo penal com quebra desse mesmo sigilo, de interpor recurso da correspondente decisão judicial, para obter a reapreciação dessa decisão.».

Estas considerações são totalmente transponíveis para o caso dos autos. Mesmo configurando o problema como uma questão de defesa ou de reconhecimento de um direito do arguido [como de outros sujeitos do processo] - o direito à decisão da causa por um órgão independente, imparcial e isento (cf. artigo 202.º e 203.º da CRP) - sempre terá de concluir-se que essa pretensão ou esse direito é apreciado, na situação dos autos, pelo menos, por um órgão dotado dessas exigências constitucionais.

Na verdade, mesmo descaracterizando a decisão do juiz cuja intervenção se recurso de negação da existência do impedimento alegado, sempre ocorre a intervenção de um tribunal superior [ou no caso do n.º 2 do artigo 42.º do CPP, de uma formação judicial do Supremo Tribunal de Justiça sem intervenção do juiz visado].

E não decorrendo do artigo 20.º, n.º 1, da CRP uma exigência de acautelamento, em todos os casos, da existência de um segundo grau de jurisdição, há-de concluir-se caber na discricionariedade do legislador ordinário admiti-lo ou não em função dos diversos interesses concorrentes, como a celeridade na obtenção de uma decisão definitiva, a natureza e valor dos direitos a que respeita, a capacidade de resposta dos tribunais, etc.

Assim sendo, a norma em causa, ao não admitir, na dimensão interpretativa aplicada como ratio decidendi, recurso do acórdão da relação que decidiu o incidente de recusa do juiz de instrução criminal de 1.ª instância, não viola o convocado parâmetro constitucional.

C - Decisão

7 - Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional decide:

a) Não julgar inconstitucionais as normas constantes dos artigos 399.º, 432.º e 433.º do Código de Processo Penal, quando interpretadas no sentido de que não é admissível recurso da decisão do Tribunal da Relação proferida em incidente de recusa de juiz de 1.ª instância;

b) Negar provimento ao recurso.

c) Condenar a recorrente nas custas, fixando a taxa de justiça em 25 UC.

(1) Citados no Acórdão de 27.09.06, processo 2322/06 (relatado pelo Cons. Sousa Fonte), e que, aqui, se seguirá de perto.

(2) Como anota Maia Gonçalves (Código de Processo Penal, Anotado e Comentado), 'neste artigo estabelece-se o princípio geral da admissibilidade de recurso das sentenças e dos despachos judiciais, sempre que a irrecorribilidade não esteja prevista na lei

Trata-se de uma norma idêntica à do artigo 654º do CPP de 1929. Porém, se as normas são idênticas, sucede que os casos de irrecorribilidade previstos na lei são agora mais numerosos que aqueles que a lei anterior previa. ...'

(3) Dúvidas retomadas, por exemplo, nos acórdãos de 31.05.06, proc. n.º 1597/06 e 03.05.06. processo 3894/06: 'é duvidosa a admissibilidade do recurso da decisão que conheça do incidente de recusa, por já ter sido conhecido pelo tribunal imediatamente superior àquele em que o incidente é deduzido'

(4) Com o seguinte sumário:

1ª A decisão do tribunal da Relação proferida, não como instância formal de recurso, mas como instância de decisão no processo, em outro grau, sobre questão incidental cujo conhecimento a lei lhe defira, não se integra em qualquer das hipóteses de recurso para o Supremo Tribunal do Justiça previstas no artigo 432º do Código de Processo Penal (CPP).

2ª Não se trata de decisão proferida pela relação em primeira instância (artigo 432º, n.º 1 alínea a), do CPP), isto é, em que a competência em razão da matéria e da hierarquia para a decisão do caso e do objecto do processo caiba, em primeiro grau de conhecimento, e segundo as leis de organização e competências dos tribunais, aos Tribunais da relação, e não constitui também situação que se enquadre nas alíneas c), d) e e) do artigo 432º do CPP.

3ª A alínea b) do artigo 432º do CPP tem de ser interpretada em equilíbrio sistémico com o artigo 400º, n.º 1, alínea c) do CPP.

4ª A norma da alínea e) do n.º 1 do artigo 400º, quando se refere a decisões proferidas, em recurso, pelas relações, que não tenham posto termo à causa, quer significar que a competência em razão da hierarquia para proferir decisões que não ponham termo à causa cabe às relações, que decidem, em matérias interlocutórias, em última instância - quer seja decisão proferida em recurso, quer seja por ocasião de um recurso ou por intervenção incidental directamente deferida pela lei.

(5) No mesmo sentido decidiu, por exemplo, o Acórdão de 11.04.07, processo 1130/07.

(6) Constituição da República Portuguesa, Anotada, 4ª Ed., p. 516 e 418.

Lisboa, 13 de Novembro de 2007. - Benjamim Rodrigues - João Cura Mariano - Joaquim Sousa Ribeiro - Mário José de Araújo Torres - Rui Manuel Moura Ramos.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1636025.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1978-06-12 - Lei 29/78 - Assembleia da República

    Aprova, para ratificação, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1987-02-09 - Acórdão 8/87 - Tribunal Constitucional

    Declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 561.º e 651.º, § único, do Código de Processo Penal, e do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 605/75, de 3 de Outubro, e do Assento do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/79, de 28 de Junho, segundo a qual, em processo sumário, o recurso restrito à matéria de direito tem de ser interposto logo depois da leitura da sentença.

Aviso

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