Decreto-Lei 435/82
de 30 de Outubro
Os aldeamentos turísticos constituem uma componente importante e característica da oferta turística portuguesa, justificando-se a intervenção do legislador para proceder à actualização do respectivo enquadramento jurídico e contribuir para a preservação e manutenção das respectivas infra-estruturas.
Assim, procura-se acautelar a noção de comercialização e de exploração turística integrada e da exclusividade do uso da denominação «aldeamento turístico», de modo a caracterizar este segmento da capacidade de alojamento para-hoteleiro pela complementaridade existente de infra-estruturas e serviços acessórios.
Por outro lado, garantem-se os direitos individuais dos proprietários das várias unidades de alojamento, prevendo-se a respectiva desafectação de uma gestão turística integrada, sem prejuízo de uma correcta repartição dos encargos globais das infra-estruturas e serviços básicos de uso necessário, a definir por critérios supletivos fixados na lei, na falta de acordo entre os interessados.
Consultadas associações de proprietários de aldeamentos turísticos, foi possível recolher sugestões muito úteis e consagrá-las por via legislativa, designadamente a garantia de recurso judicial para controle do exame à escrituração dos documentos relativos a despesas gerais de funcionamento dos aldeamentos turísticos, bem como a consagração de uma entidade arbitral para a fixação da quota-parte de encargos dos proprietários nas despesas gerais e ainda a revogação dos artigos 1.º a 5.º, inclusive, do Decreto Regulamentar 14/78, de 12 de Maio.
Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º - 1 - São classificados como aldeamentos turísticos os conjuntos urbanísticos constituídos por um complexo de instalações interdependentes objecto de uma exploração turística integrada, que se destinem a proporcionar aos seus utilizadores, mediante remuneração, uma forma de alojamento para-hoteleiro, com equipamento complementar e de apoio.
2 - Os aldeamentos turísticos, como tal classificados pela Direcção-Geral do Turismo, são considerados, nos termos do n.º 1 do artigo 10.º do Decreto-Lei 49399, de 24 de Novembro de 1969, estabelecimentos de interesse para o turismo.
3 - Só os empreendimentos classificados pela Direcção-Geral do Turismo como «aldeamentos turísticos» poderão usar esta qualificação ou qualquer outra que com ela se possa confundir, tal como «aldeias turísticas» ou «aldeias de férias».
Art. 2.º A classificação de aldeamento turístico só poderá ser atribuída a um complexo com o mínimo de 100 camas, instalado e explorado segundo o regime estabelecido neste diploma e regulamentos aplicáveis.
Art. 3.º - 1 - A gestão do aldeamento turístico, incluindo a exploração e comercialização dos estabelecimentos e serviços nele existentes, designadamente do serviço de alojamento, terá de ser realizada, globalmente, por uma única entidade, registada na Direcção-Geral do Turismo como entidade exploradora, nos termos da legislação hoteleira.
2 - Só poderão ser registadas como entidades exploradoras de aldeamentos turísticos pessoas que sejam titulares, por qualquer título legítimo, do direito de utilizar as infra-estruturas que, necessariamente e nos termos legais, integram o aldeamento e bem assim do direito de disporem para alojamento de um mínimo de 100 camas.
3 - O disposto no n.º 1 não impede que a entidade exploradora contrate com outras entidades, singulares ou colectivas, a prestação de serviços acessórios e a exploração de quaisquer estabelecimentos ou equipamentos turísticos, sociais, desportivos ou recreativos existentes no aldeamento.
4 - Nos aldeamentos turísticos, a entidade exploradora poderá autorizar a instalação de outros estabelecimentos comerciais, de mera prestação de serviços ou de exercício organizado de profissões liberais além dos que ela própria explore, directa ou indirectamente.
5 - Às relações entre a entidade exploradora e os seus clientes não são aplicáveis as disposições legais relativas à locação, mas o regime jurídico dos estabelecimentos hoteleiros e similares e das respectivas actividades e serviços, designadamente o Regulamento da Indústria Hoteleira e Similares.
Art. 4.º - 1 - A unidade de gestão do aldeamento turístico não é impeditiva da propriedade das várias unidades de alojamento nele existentes por uma pluralidade de pessoas jurídicas.
2 - Quando as unidades de alojamento não forem propriedade da entidade exploradora, deve o direito à exploração turística dessas unidades constar de contrato escrito.
3 - A desafectação de uma ou mais unidades de alojamento da exploração e comercialização do aldeamento não prejudica a sua qualificação como tal, salvo se, por esse facto, deixar de existir o número mínimo de 100 camas em exploração.
Art. 5.º - 1 - É vedado aos proprietários das diferentes unidades de alojamento alterarem, por qualquer meio, o volume, as características arquitectónicas e as cores externas dos edifícios definidos nos projectos do aldeamento, licenciados pela respectiva câmara municipal.
2 - Os proprietários também não poderão prejudicar a continuidade dos jardins e zonas verdes, a implantação dos acessos e a unidade urbanística do aldeamento turístico, nomeadamente pela prática de actos que pretendam demarcar, murar, valar, rodear de sebes rígidas ou tapar as suas unidades de alojamento.
3 - A entidade exploradora tem a faculdade de embargar as obras realizadas em infracção ao disposto nos números anteriores, nos mesmos termos do proprietário comum.
Art. 6.º - 1 - Os proprietários das diferentes unidades de alojamento integradas no aldeamento turístico deverão manter um nível de conservação exterior dos edifícios e dos jardins próprios semelhante ao da entidade exploradora.
2 - Se o proprietário estiver em mora quanto à obrigação de fazer essa conservação e se esta, pela sua urgência, se não compadecer com o normal procedimento judical, poderá a entidade exploradora requerer à comissão regional de turismo a respectiva autorização para a executar.
3 - A decisão de mandar efectuar essas obras só pode ser tomada depois de ouvido o proprietário, devendo este, para esse efeito, ser notificado pela comissão regional de turismo respectiva para, em 10 dias, responder ao requerimento da entidade exploradora.
4 - Nas áreas não abrangidas por comissões regionais de turismo, a competência atribuída pelos números anteriores cabe à Direcção-Geral de Turismo.
5 - Caso a entidade exploradora seja autorizada a efectuar as obras de conservação a que se refere o n.º 2 deste artigo, terá direito ao reembolso das respectivas despesas, a exigir ao proprietário.
Art. 7.º - 1 - Os aldeamentos turísticos serão dotados de infra-estruturas e de serviços básicos de urbanização adequados ao fim específico a que se destinam e complementares dos exigidos no alvará de loteamento a que se refere o Decreto-Lei 289/73, de 6 de Junho.
2 - As infra-estruturas e serviços próprios dos aldeamentos definidos no número anterior não são qualificáveis como serviços públicos.
3 - Consideram-se infra-estruturas e serviços básicos de urbanização e de uso necessário:
a) Arruamentos, passagens, acessos e logradouros;
b) Espaços verdes;
c) Parques de estacionamento;
d) Estações de tratamento e bombagem de águas e esgotos;
e) Redes gerais de água, esgotos, gás e electricidade;
f) Postos de transformação;
g) Instalações sanitárias;
h) Instalações de serviço de incêndio;
i) Recolha de lixo;
j) Portaria e recepção;
l) Segurança e vigilância.
Art. 8.º - 1 - As despesas de manutenção, substituição e funcionamento das infra-estruturas e serviços básicos de urbanização e de uso necessário, quer transitoriamente os exigidos pelo alvará de loteamento até serem recebidos pelos municípios, quer os complementares e específicos do aldeamento, serão suportadas por todos os proprietários das unidades imobiliárias existentes, sejam ou não de alojamento.
2 - A comparticipação dos proprietários definir-se-á nos termos do contrato de exploração com a entidade exploradora, ou nos usos com base no número de camas, ou, na falta de um e outro, na proporção equitativa da sua participação na área construída no aldeamento.
3 - A entidade exploradora poderá recusar aos proprietários ou utentes das unidades de alojamento que não procedam à liquidação da sua comparticipação nas despesas, nos termos previstos neste diploma, o acesso e a utilização das instalações e serviços próprios do aldeamento que possam considerar-se de uso não necessário.
4 - O contrato de exploração turística das unidades de alojamento referido no n.º 2 do artigo 4.º poderá isentar os respectivos proprietários do pagamento das despesas previstas neste artigo.
Art. 9.º - 1 - A entidade exploradora elaborará e enviará a cada um dos proprietários das diferentes unidades de alojamento, até 15 de Novembro de cada ano, memória justificativa e orçamento das despesas a que se refere o artigo anterior relativos ao ano civil seguinte, indicando a quota-parte da comparticipação que a cada um caberá.
2 - Os proprietários das diferentes unidades de alojamento, através dos respectivos órgãos representativos, têm direito a pronunciar-se sobre os documentos enviados pela entidade exploradora.
3 - O orçamento apresentado pela entidade exploradora considerar-se-á aprovado se os proprietários sobre ele não se pronunciarem no prazo previsto no número seguinte.
4 - A não aceitação do orçamento e da memória justificativa deverá ser fundamentada e constar de documento escrito, que deverá ser enviado à entidade exploradora até 15 de Dezembro.
5 - As divergências entre a entidade exploradora e os proprietários nesta matéria poderão ser decididas por arbitragem da comissão regional de turismo da região em que se localizar o aldeamento.
6 - Pretendendo-se o recurso à arbitragem da comissão regional de turismo, a entidade exploradora requerê-lo-á, remetendo-lhe cópias do orçamento, da memória justificativa e do parecer emitido pelo órgão representativo dos proprietários.
7 - A comissão regional de turismo deverá pronunciar-se no prazo de 15 dias, a contar da data do requerimento, tendo em conta os princípios da equidade, da justa composição dos interesses das partes, da classificação do aldeamento e da sua relevância para o turismo.
8 - Da decisão da comissão regional de turismo não cabe recurso.
9 - Nas áreas não abrangidas por comissões regionais de turismo aplica-se o estatuído no n.º 4 do artigo 6.º
Art. 10.º - 1 - Os proprietários deverão satisfazer a sua quota-parte de comparticipação nos termos acordados com a entidade exploradora ou, se o não houver, deverão proceder ao pagamento da comparticipação orçamentada.
2 - A comparticipação orçamentada poderá ser paga até ao máximo de 4 prestações, vencíveis em Março, Junho, Setembro e Dezembro do ano a que respeita.
3 - As prestações em dívida vencerão juros à taxa que, por aplicação do disposto no artigo 559.º do Código Civil, em cada ano vigorar.
Art. 11.º - 1 - As despesas a que se refere o artigo 8.º terão sempre suporte documental e deverão ser contabilizadas, em conta própria, pela entidade exploradora.
2 - Os proprietários gozam do direito de examinar a escrituração e os documentos concernentes àquelas despesas, e à recusa da entidade exploradora será aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1497.º e seguintes do Código de Processo Civil.
3 - No final de cada ano, a entidade exploradora remeterá a todos os proprietários o mapa dos custos apurados, acompanhado da factura relativa à quota-parte a suportar por cada um, nos termos do disposto no presente diploma.
4 - Os proprietários procederão ao pagamento do saldo das respectivas facturas no prazo de 30 dias a contar da sua recepção.
5 - Decorrido esse prazo, a importância em dívida passa a vencer juros à taxa que, por aplicação do disposto no artigo 559.º do Código Civil, em cada ano vigorar.
Art. 12.º - 1 - O regulamento dos aldeamentos turísticos será aprovado, até 31 de Dezembro de 1982, por portaria dos membros do Governo que superintendam nos sectores do turismo, ordenamento territorial e habitação e obras públicas.
2 - Enquanto não for publicado o regulamento referido no número anterior mantém-se em vigor, na parte não revogada pelo artigo 13.º deste decreto-lei, o Decreto Regulamentar 14/78, de 12 de Maio.
Art. 13.º São revogados o Decreto Regulamentar 83/80, de 23 de Dezembro, e os artigos 1.º a 5.º, inclusive, do Decreto Regulamentar 14/78, de 12 de Maio.
Art. 14.º As dúvidas suscitadas pela aplicação do presente diploma serão resolvidas por despacho individual ou conjunto dos membros do Governo que superintendam nos sectores do turismo, ordenamento territorial e habitação e obras públicas quando estiverem em causa matérias das respectivas competências.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 24 de Junho de 1982. - Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Promulgado em 21 de Setembro de 1982.
Publique-se.
O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.