de 17 de Outubro
As matérias respeitantes à educação sexual, ao planeamento familiar e à saúde reprodutiva têm vindo a merecer, nos últimos anos, particular atenção da sociedade portuguesa, no quadro de uma progressiva afirmação dos direitos cidadãos à educação e à saúde.Acompanhando esta evolução, o Estado vem assumindo, desde 1984, deveres objectivos e promovendo medidas concretas na efectivação desses direitos, reforçando a protecção à maternidade e à paternidade, introduzindo formação e informação sobre sexualidade humana nos currículos escolares, criando consultas de planeamento familiar nos serviços de saúde, fornecendo gratuitamente meios anticoncepcionais e desenvolvendo medidas de protecção contra doenças transmitidas por via sexual. Paralelamente, os processos em curso de reorganização do ensino básico e de revisão curricular do ensino secundário têm vindo a dar uma especial atenção à necessidade de uma abordagem integrada desta temática, enquanto dimensão essencial do percurso educativo e formativo dos jovens.
Na esteira desta evolução e continuando a acompanhar as necessidades especialmente sentidas pelos jovens e adolescentes nestas matérias, a Lei 120/99, de 11 de Agosto, consagrou medidas de promoção da educação sexual, da saúde reprodutiva e da prevenção de doenças transmitidas por via sexual, bem como relativas à efectivação da interrupção voluntária da gravidez nos casos que esta é legalmente admissível.
A aplicação das medidas previstas na Lei 120/99 é da competência dos estabelecimentos de ensino e de saúde, quer através de intervenções específicas quer desenvolvendo acções conjuntas, em associação ou parceria.
Tal é o quadro que o presente diploma visa regulamentar. O diploma incorpora matérias referentes à organização da vida escolar, com especial relevância para a intervenção dos serviços especializados de apoio educativo das escolas, à organização curricular, favorecendo uma abordagem integrada e transversal da educação sexual, ao envolvimento dos alunos e dos encarregados de educação e das respectivas associações e à formação de professores.
A regulamentação da lei estabelece um quadro normativo de intervenção dos estabelecimentos de saúde em matéria de planeamento familiar e de saúde reprodutiva, corporizado em medidas que vêm sendo desenvolvidas neste âmbito.
Foram ouvidos os órgãos de Governo próprio das Regiões Autónomas e a Confederação Nacional das Associações de Pais.
No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela Lei 120/99, de 11 de Agosto, e nos termos das alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta, para valer como lei geral da República, o seguinte:
CAPÍTULO I
Promoção da educação sexual
Artigo 1.º
Promoção da educação sexual em meio escolar
1 - A organização curricular dos ensinos básico e secundário contempla obrigatoriamente a abordagem da promoção da saúde sexual e da sexualidade humana, quer numa perspectiva interdisciplinar, quer integrada em disciplinas curriculares cujos programas incluem a temática.
2 - O projecto educativo de cada escola, a elaborar nos termos do artigo 3.º do regime de autonomia, administração e gestão das escolas, aprovado pelo Decreto-Lei 115-A/98, de 4 de Maio, deve integrar estratégias de promoção da saúde sexual, tanto no desenvolvimento do currículo, como na organização de actividades de enriquecimento curricular, favorecendo a articulação escola-família, fomentar a participação da comunidade escolar e dinamizar parcerias com entidades externas à escola, nomeadamente com o centro de saúde da respectiva área, de acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 2.º da Lei 120/99, de 11 de Agosto.
3 - O plano de trabalho de turma, a elaborar nos termos do artigo 36.º do regime de autonomia, administração e gestão das escolas referido no número anterior, deve ser harmonizado com os objectivos do projecto educativo de escola e compreender uma abordagem interdisciplinar da promoção da saúde sexual, por forma a garantir uma intervenção educativa integrada.
Artigo 2.º
Apoio aos alunos
1 - O apoio aos alunos no domínio da educação para a saúde, particularmente sobre sexualidade humana e saúde reprodutiva, previsto no n.º 1 do artigo 3.º da Lei 120/99, de 11 de Agosto, deve ser promovido no âmbito da intervenção dos serviços especializados de apoio educativo das escolas, nos termos do disposto nos artigos 38.º e 39.º do regime de autonomia, administração e gestão das escolas, aprovado pelo Decreto-Lei 115-A/98, de 4 de Maio.2 - Cabe às direcções regionais de educação do Ministério da Educação, no âmbito das suas competências na área da educação para a saúde, acompanhar e apoiar as escolas na organização das acções referidas no número anterior.
3 - Para efeitos do disposto nos números anteriores, as escolas e as direcções regionais de educação devem estabelecer parcerias com os centros de saúde e com as administrações regionais de saúde, respectivamente.
Artigo 3.º
Acesso a preservativos em estabelecimentos de ensino secundário
A instalação de dispositivos mecânicos para acesso a preservativos em estabelecimentos de ensino secundário, prevista no n.º 2 do artigo 3.º da Lei 120/99, de 11 de Agosto, deve decorrer de um amplo consenso na comunidade escolar, competindo aos respectivos órgãos de direcção executiva desencadear o processo de audição das associações representativas dos pais e encarregados de educação e dos alunos, fazendo incluir tal medida, se for caso disso, nos planos anuais de actividades das suas escolas.
Artigo 4.º
Intervenção dos pais e encarregados de educação
Nas escolas em que não tenha sido constituída uma organização, representativa dos pais e encarregados de educação, o processo de audição estabelecido nos n.os 1 e 2 do artigo 3.º da Lei 120/99, de 11 de Agosto, realiza-se em assembleia geral de pais e encarregados de educação, especialmente convocada para o efeito.
Artigo 5.º
Formação de docentes
Para efeitos do disposto no n.º 5 do artigo 2.º da Lei 120/99, de 11 de Agosto, os serviços competentes do Ministério da Educação devem integrar nas suas prioridades a concessão de apoios à realização de acções de formação contínua de professores no domínio da promoção da saúde e da educação sexual.
CAPÍTULO II
Saúde reprodutiva e planeamento familiar
Artigo 6.º
Consulta de planeamento familiar de referência
1 - Em todos os hospitais com serviço de ginecologia e ou obstetrícia integrados no Serviço Nacional de Saúde devem funcionar consultas de planeamento familiar que constituam referência para os centros de saúde da área de influência, através de protocolos estabelecidos no âmbito das unidades coordenadoras funcionais (UCF) já existentes para as áreas materna e perinatal.
2 - As consultas de planeamento familiar referidas no número anterior devem garantir a prestação de cuidados, nomeadamente:
a) Em situações de risco, designadamente diabetes, cardiopatias e doenças oncológicas;
b) Em situações com indicação para contracepção cirúrgica, mediante laqueação de trompas e vasectomia;
c) Em situações tratadas no serviço de urgência ou com internamento por complicações resultantes de aborto;
d) A puérperas de alto risco;
e) A adolescentes.
3 - Os hospitais devem assegurar a existência de contraceptivos para distribuição gratuita aos utentes no âmbito das consultas de planeamento familiar.
Artigo 7.º
Contracepção cirúrgica
Os hospitais referidos no artigo anterior devem assegurar a resolução das situações com indicação para contracepção cirúrgica, nos termos da Lei 3/84, de 24 de Março, e que envolvam mulheres com risco obstétrico acrescido, no prazo máximo de três meses, ponderado o grau de urgência.
Artigo 8.º
Saúde reprodutiva nos centros de saúde
Em todos os centros de saúde deve existir uma equipa multiprofissional que polarize as motivações e as iniciativas no campo da saúde reprodutiva e que promova e garanta:
a) O atendimento imediato nas situações em que haja um motivo expresso que o justifique;
b) O encaminhamento adequado para uma consulta a realizar no prazo máximo de 15 dias, ponderado o grau de urgência;
c) Consulta de planeamento familiar a utentes que não disponham, à data, de resposta dos serviços, no âmbito da medicina geral e familiar, como recurso complementar e concertado desta actividade;
d) A existência de contraceptivos para distribuição gratuita aos utentes.
Artigo 9.º
Adolescentes
1 - Os adolescentes são considerados grupo de intervenção prioritária no âmbito da saúde reprodutiva e da prevenção das doenças sexualmente transmissíveis.2 - Devem ser tomadas medidas que permitam adequar e melhorar as condições de acesso e atendimento dos adolescentes nos centros de saúde e hospitais, quer sejam do sexo feminino quer sejam do sexo masculino.
Estatísticas
1 - Os relatórios semestrais das situações de interrupção voluntária da gravidez e de aborto espontâneo previstos no artigo 11.º da Lei 120/99, de 11 de Agosto, são elaborados de acordo com impresso modelo aprovado pela Direcção-Geral da Saúde.2 - Os relatórios são enviados ao Ministério da Saúde através da Direcção-Geral da Saúde.
Artigo 11.º Avaliação
Compete às administrações regionais de saúde e às unidades coordenadoras funcionais, no respectivo âmbito de intervenção, avaliar anualmente o grau de execução das medidas constantes do presente capítulo, remetendo os respectivos relatórios à Direcção-Geral da Saúde até 31 de Janeiro de cada ano.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 10 de Agosto de 2000. - António Manuel de Oliveira Guterres - Augusto Ernesto Santos Silva - Maria Manuela de Brito Arcanjo Marques da Costa - Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina.
Promulgado em 28 de Setembro de 2000.
Publique-se.O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 4 de Outubro de 2000.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.