Decreto Legislativo Regional 18/2000/A
Planeamento familiar e educação afectivo-sexual
No quadro normativo nacional, aplicável à Região Autónoma dos Açores, existe já um complexo legal vigente sobre planeamento familiar e educação sexual que importa dinamizar para uma efectiva aplicação.
Pese embora o quadro legal existente a nível nacional, importa criar legislação regional, com vista a facilitar a operacionalidade dos instrumentos existentes, designadamente nas áreas do planeamento familiar e da educação afectivo-sexual nas escolas.
Neste contexto, deve promover-se o desenvolvimento de acções dirigidas a essa componente educativa, em articulação com outros agentes educativos, designadamente família e profissionais da área da saúde.
Propõe-se concretamente a promoção de acções de sensibilização sobre o planeamento familiar com o objectivo de popularizar informação sobre a fecundação e o direito de decidir livre e responsavelmente o número de filhos e o intervalo entre os mesmos; a criação de uma linha telefónica directa gratuita para aconselhamento; a criação de um site na Internet; a entrega a cada mulher, mãe pela primeira vez, de documentação relativa aos primeiros cuidados com o bebé e com a mãe, e a facultação a cada aluno de documentos informativos, em cada ano escolar, bem como melhorar a oferta de cuidados de saúde, criando-se, onde não existam, consultas específicas de planeamento familiar, no âmbito do quadro jurídico em vigor.
Este desafio requer necessariamente uma aposta na educação sexual com o objectivo de alterar comportamentos, prevenindo assim os riscos de gravidez na adolescência - de tão graves consequências emocionais e sociais para a jovem mãe -, de interrupções voluntárias da gravidez e de doenças sexualmente transmissíveis.
A educação afectivo-sexual deve ser entendida como uma área essencial do processo educativo, não devendo, por isso, ser reduzida às componentes biológica e de prevenção de comportamentos de risco, mas antes promotora do desenvolvimento equilibrado da personalidade no que respeita às suas componentes psíquica, emocional e comportamental. Deve assentar numa plataforma ética e num quadro de valores humanistas e universais partilhados pela nossa cultura.
Em síntese, pretende-se, com o presente diploma, proporcionar uma vivência mais informada, mais gratificante, mais autónoma e mais responsável da sexualidade.
Assim, a Assembleia Legislativa Regional dos Açores decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição da República e da alínea c) do n.º 1 do artigo 31.º do Estatuto Político-Administrativo da Região, o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objecto
O presente diploma estabelece, na Região Autónoma dos Açores, orientações específicas dirigidas à administração regional para a efectiva concretização dos objectivos de informação, formação e implementação do planeamento familiar e da educação afectivo-sexual.
Artigo 2.º
Fins
O presente diploma visa a prossecução dos seguintes fins:a) Concretização da política de planeamento familiar no que concerne ao aconselhamento e divulgação, nomeadamente sobre sexualidade, contracepção, gravidez, infertilidade e prevenção de doenças;
b) Concretização da política de educação da sexualidade que vise assegurar o acesso da comunidade educativa à informação e formação relativas à afectividade e sexualidade.
Artigo 3.º
Âmbito
1 - O presente diploma aplica-se a todos os centros de saúde e hospitais do Serviço Regional de Saúde, bem como ao Sistema Educativo Regional, nas condições adiante previstas.2 - A aplicação deste diploma a outras estruturas de saúde e a outros estabelecimentos de educação e ensino depende de protocolo a celebrar entre a instituição em causa e o Governo Regional.
CAPÍTULO II
Planeamento familiar
Artigo 4.º
Acções de sensibilização
Incumbe à administração regional promover acções de sensibilização para o planeamento familiar, com o objectivo de informar, nomeadamente, sobre fertilidade, cuidados de saúde e o direito de decidir livre e responsavelmente o número de filhos e o intervalo entre o seu nascimento.
Artigo 5.º
Divulgação
1 - Incumbe à administração regional promover a publicação regular e gratuita de edições informativas sobre planeamento familiar onde constem, entre outras, informações sobre locais, horários e regime de funcionamento das respectivas consultas.2 - A administração regional deve promover e colaborar em acções e campanhas de divulgação de métodos e meios de planeamento familiar.
Artigo 6.º
Consultas
Nos centros de saúde da Região e nos serviços de ginecologia e obstetrícia dos hospitais de Ponta Delgada, Angra do Heroísmo e Horta implementar-se-ão consultas específicas de planeamento familiar.
Artigo 7.º
Áreas das consultas de planeamento familiar
As consultas específicas de planeamento familiar abrangerão as seguintes áreas:
a) Informação sobre os direitos sexuais e reprodutivos do indivíduo, incluindo os fenómenos de violência e abuso sexuais;
b) Informação sobre os métodos contraceptivos que permita uma decisão livre e responsável sobre o número de filhos e o intervalo entre o seu nascimento;
c) Fornecimento gratuito de meios contraceptivos;
d) Detecção e orientação dos indivíduos com problemas genéticos e de infertilidade;
e) Promoção da saúde sexual, nomeadamente através da informação sobre sexualidade, aconselhamento do casal, rastreio do cancro genital e prevenção das doenças sexualmente transmissíveis, designadamente as transmitidas pelo HIV e pelos vírus das hepatites B e C;
f) Informação sobre a adopção em colaboração com os serviços especializados.
Artigo 8.º
Aconselhamento
Na prossecução do objectivo de promoção do aconselhamento, incumbe à administração regional entre outras tarefas:a) Instalação progressiva nos centros de informação juvenil ou centros de saúde de um gabinete técnico de atendimento de jovens na área do planeamento familiar e sexualidade;
b) Criação de uma linha telefónica directa e gratuita e de um site informativo com possibilidade de conversação, para aconselhamento sobre sexualidade, gravidez, planeamento familiar, infertilidade e prevenção de doenças.
Artigo 9.º
Tratamento da infertilidade
1 - Compete aos centros de saúde a detecção e encaminhamento para os serviços e consultas especializadas das situações de infertilidade ou de doenças genéticas.2 - Sempre que se constate a insuficiência dos recursos humanos, técnicos e científicos existentes na Região, os utentes serão encaminhados para centros ou serviços especializados, de acordo com as regras instituídas para os restantes cuidados de saúde.
Artigo 10.º
Informação dos cuidados pós-parto
A cada mulher, mãe pela primeira vez, a administração regional garante a entrega de documentação relativa aos primeiros cuidados com o bebé e com a mãe, bem como sobre os métodos recomendados para a contracepção pós-parto.
Artigo 11.º
Formação
1 - As acções de formação para o pessoal a exercer funções nas consultas específicas de planeamento familiar e nos centros de informação juvenil devem, nomeadamente, incidir sobre os seguintes temas:a) Anatomia e fisiologia da reprodução;
b) Mecanismos de actuação dos métodos contraceptivos, grau de eficácia, contra-indicações e efeitos secundários;
c) Informação sobre sexualidade humana e suas disfunções;
d) Aspectos psicológicos e sociológicos do planeamento familiar;
e) Noções gerais de infertilidade e doenças genéticas;
f) Doenças sexualmente transmissíveis e aquisição de comportamentos para a sua prevenção;
g) Técnicas de informação, educação e comunicação em planeamento familiar.
2 - Para além dos temas constantes das alíneas do número anterior, as acções de formação para o pessoal a exercer funções nos centros de informação juvenil devem incluir ainda:
a) Desenvolvimento psicológico e sócio-cultural do adolescente;
b) Desenvolvimento e comportamento sexuais;
c) Problemas de comportamento social dos adolescentes;
d) Prevenção de comportamentos sexuais de risco.
CAPÍTULO III
Educação afectivo-sexual
Artigo 12.º
Formação e aconselhamento
1 - O Sistema Educativo Regional deve assegurar a formação adequada nas áreas da afectividade e da sexualidade ao pessoal docente, não docente, aos alunos e aos pais, na qualidade de educadores.
2 - Médicos, enfermeiros e outros técnicos de saúde podem ser chamados para apoio à docência ou para a orientação individual necessários, através de contratos-programa.
Artigo 13.º
Projecto educativo
A administração regional deve assegurar a inclusão no plano anual de actividades, através do projecto educativo da escola, a concretização na Região dos artigos 2.º e 3.º da Lei 120/99, de 11 de Agosto, com a respectiva calendarização e identificação dos responsáveis pela sua implementação.
Artigo 14.º
Documentação
A administração regional assegura que, em cada ano escolar, seja entregue aos alunos documentação, adequada a cada grupo etário, sobre comunicação e relações humanas, ética, cidadania e planeamento familiar.
CAPÍTULO IV
Disposições finais
Artigo 15.º
Informação à Assembleia Legislativa Regional
O Governo Regional informa a Assembleia Legislativa Regional sobre a aplicação do quadro legal vigente na Região Autónoma dos Açores, relativo ao planeamento familiar e à educação afectivo-sexual, em cada ano, durante o 1.º semestre do ano seguinte.
Artigo 16.º
Regulamentação
A boa execução do disposto no presente diploma é assegurada pela regulamentação que se mostrar necessária.
Artigo 17.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.Aprovado pela Assembleia Legislativa Regional dos Açores, na Horta, em 7 de Junho de 2000.
O Presidente da Assembleia Legislativa Regional, Humberto Trindade Borges de Melo.
Assinado em Angra do Heroísmo em 6 de Julho de 2000.
Publique-se.
O Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores, Alberto Manuel de Sequeira Leal Sampaio da Nóvoa.