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Acórdão DAC1, de 28 de Outubro

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Sumário

Sendo o acto autorizador das contratações contempladas no artigo 18.º, n.º 3, do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde um verdadeiro acto de administração extraordinária, o poder da sua práctica é indelegável por inexistir lei que em especial o permita.

Texto do documento

Acórdão
Recurso extraordinário n.º 11/95
1 - Acordam em plenário geral do Tribunal de Contas:
O Ministro da Saúde vem interpor o presente recurso extraordinário da decisão (tomada em sessão diária de 10 de Agosto de 1995) que recusou o visto aos contratos de trabalho a termo certo celebrados entre o Centro Hospitalar de Coimbra e José António Agostinho Lourenço Cristóvão, José dos Reis, Lídia Madeira Martins, Lúcia Maria Malta Ferreira, Luís Miguel Marques Simões, Maria de Lurdes Jesus Brasio, Maria de Lurdes Cardoso Feitor, Maria de Lurdes de Jesus Branco, Maria Isabel Amaro Rosendo, Maria João Fegueira Mendes Ferreira Pratas, Maria da Anunciação de Oliveira Gonçalves Medina, Maria da Conceição da Nazaré Lopes, Maria de Fátima Ferreira de Almeida e Maria de Lurdes dos Reis Fernandes Gonçalves.

A razão de ser do recurso - refere o recorrente - assenta no facto de tal decisão contrariar uma outra decisão tomada em sessão diária de 25 de Agosto de 1995 (que concedeu o visto a contratos de trabalho a termo certo celebrados entre o dito Centro e Maria Raquel Rodrigues Pereira, Mário João Batista Ribeiro, Ana Isabel Henriques Rosa, Maria Cristina Pires Godinho, Maria Teresa Correia Craveiro, Maria Manuela da Silva Pinto Veiga e Marília Julieta Miranda, sob prévia autorização do mesmo conselho de administração, fundado em delegação de poderes genérica do Ministro da Saúde), encontrando-se em vigor a mesma legislação.

Conclui o recorrente por pedir a procedência do recurso, com a concessão do respectivo visto.

Prossecutivamente, o magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, através do correcto e estudado parecer - aqui no mais dado por reproduzido -, defende o não provimento do recurso e a fixação de assento de molde a ser consignado que as contratações em causa apenas poderão ser autorizadas pelo Ministro ou pelo conselho de administração se para este existir uma disposição legal específica.

Seguiu o processo os devidos trâmites legais.
Inexistem razões ou questões de feição processual que impossibilitem a apreciação de mérito do tema colocado a este Tribunal.

2 - Dos elementos probatórios recolhidos nos autos com interesse para a decisão a tomar aceita-se a verificação dos seguintes sucedâneos:

Através de uma decisão tomada em sessão diária de 25 de Agosto de 1995, o Tribunal concedeu o visto a vários contratos de trabalho a termo por seis meses celebrados entre o Centro Hospitalar de Coimbra e várias pessoas (processos n.os 70791/95, 70792/95, 70793/95, 70794/95, 70795/95, 70796/95, 70797/95, 70798/95 e 70799/95);

Todos esses contratos foram autorizados pelo conselho de administração daquele Centro com base no Despacho, de delegação de competências, n.º 26/93, proferido pelo Ministro da Saúde, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 18, de 22 de Janeiro de 1994;

Para todos os contratos foi invocada a regra expressa no artigo 18.º, n.º 3, do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo Decreto-Lei 11/93, de 15 de Janeiro;

Por decisão deste Tribunal tomada em sessão diária (processos n.os 67102/95 a 67115/95) de 10 de Agosto de 1995, foi recusado o visto a vários contratos de trabalho por seis meses celebrados entre o mesmo Centro e várias pessoas, autorizados pelo referido conselho de administração, fundado em delegação de poderes do Ministro da Saúde consignada no despacho mencionado;

Para todos estes últimos contratos foi invocada a regra expressa no artigo 18.º, n.º 3, do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo Decreto-Lei 11/93, de 15 de Janeiro;

Todos os contratos atrás referenciados foram subscritos em 1 de Junho de 1995 e autorizados pelo conselho de administração na mesma data.

3 - a) Numa perspectiva de delegação de poderes, o artigo 35.º, n.º 2, do Código do Procedimento Administrativo determina que as denominadas «habilitações genéricas» - as respeitantes a um conjunto (mesmo que determinável) de actos - só são possíveis quanto aos actos de administração ordinária.

E como definir tal tipo de actos frente àqueles que devem ser havidos como de administração extraordinária?

Escreve a tal propósito o Prof. Rebelo de Sousa, in Lições de Direito Administrativo, pp. 240 e segs.:

«Parece ser de aplicar à distinção entre actos de administração ordinária e actos de administração extraordinária não a distinção nominalmente idêntica, comum, em direito privado, mas em larga medida a lógica da distinção entre gestão corrente e gestão plena própria do direito constitucional (por exemplo, adoptada em relação aos governos ou executivos).

Assim, são actos de administração ordinária ou de gestão corrente os que preparam ou executam actos definitivos, os definitivos, nos quais exista vinculação de pressupostos e elementos, e os actos com áreas de discricionariedade, mas que não corporizem inovação ou alteração na conduta administrativa anterior.

São, ao invés, actos de administração extraordinária aqueles que sejam definitivos, não totalmente vinculados e traduzam inovação ou alteração do comportamento precedente da pessoa colectiva.»

Deste conjunto de pressuposições chega-se à conclusão de que, numa óptica de actos definitivos - actos que no exercício do poder administrativo definem a situação jurídica de um particular perante a Administração ou desta perante um particular (v. g., Freitas do Amaral, in Direito Administrativo, vol. III, p. 214) -, poder-se-á acatar que o critério divisório dos actos de administração ordinária e extraordinária assenta na inovação da actuação administrativa em relação a comportamentos anteriores (Rebelo de Sousa, ob. cit.).

b) No preâmbulo do Decreto-Lei 11/93, de 15 de Janeiro, que aprovou o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, escreveu-se:

«A flexibilidade na gestão de recursos impõe não apenas a adopção de mecanismos especiais de contratação de pessoal [sublinhado nosso] como o incentivo a métodos e práticas concorrenciais.»

Este trecho preambular com o seu sentido unívoco vai, claramente, iluminar o disposto no referido artigo 18.º, n.º 3, do dito Estatuto, que menciona certo tipo de contratação de pessoal.

Na verdade, consigna-se nesse normativo que para ocorrer a «situações de urgente necessidade» pode ser autorizada, por despacho do Ministro da Saúde, a admissão de pessoal por período de seis meses com sujeição ao regime geral do contrato individual de trabalho.

Que dizer?
Tratando-se, como se trata, de um acto administrativo de cariz definitivo (contratar alguém produz, sem dúvida, uma alteração na situação jurídica integrável nesse conceito), com áreas de discricionariedade, a indagação tendente a saber se o mesmo se integra na administração ordinária ou extraordinária assentará na resposta à seguinte pergunta:

Esse género de contratação é ou não inovador em relação ao comportamento precedente da administração da saúde, mesmo tendo em conta a prática usada na área da contratação?

A contratação do artigo 18.º, n.º 3, é, desde logo (pelo preâmbulo do Decreto-Lei 11/93), apelidada de especial.

Mas porque essa especialidade (reflectindo, embora, a regra de ser restrito a um certo número de casos) não possui natureza oposta à contratação por prazo certo em geral, poder-se-á questionar se ela terá feição inovadora na perspectiva referenciada.

Como solucionar?
A hipótese em análise serve «para ocorrer a situações de urgente necessidade».
Em tal circunstancialismo - afirma a lei -, fica o Ministro da Saúde com o poder de realizar contratações de pessoal por seis meses.

Qual o exacto significado disto?
Que nos situamos perante actos que têm de ser havidos como inovadores, pois não é normal nem habitual (como sugere o fundamento de «urgente necessidade») tal actuação.

Daí que esses actos tenham de ser qualificados como actos de administração extraordinária; daí que os mesmos necessitem (na óptica de delegação de poderes) de uma norma específica de habilitação; daí que, inexistindo este último tipo de norma, seja ilegal o acto praticado pelo órgão delegado à base de uma delegação fundada no artigo 35.º do Código do Procedimento Administrativo.

4 - Terão agora de se aplicar os princípios atrás explanados à questão em análise.

Em síntese, trata-se de saber se a autorização dada pelo conselho de administração do Centro Hospitalar de Coimbra para a celebração de contratos de trabalho por seis meses nos demais termos do disposto no artigo 18.º, n.º 3, do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde foi ou não legal.

Como decidir então?
Ficou afirmado que os actos de autorização desse tipo de contratações têm natureza de actos de gestão extraordinária.

Por outro lado, a delegação de competência foi feita nos termos gerais do artigo 35.º do Código do Procedimento Administrativo, inexistindo qualquer disposição legal específica que consinta tal delegação.

De tudo resulta que de facto no caso o poder de autorização desse género de contratos era indelegável.

Donde a invalidade da delegação invocada; donde a ilegalidade das contratações realizadas.

5 - Por todo o exposto nega-se provimento ao recurso, mas, considerando verificados os condicionantes para tal, fixa-se o seguinte assento:

«Sendo o acto autorizador das contratações contempladas no artigo 18.º, n.º 3, do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde um verdadeiro acto de administração extraordinária, o poder da sua prática é indelegável por inexistir lei que em especial o permita.»

Comunique-se.
Lisboa, 25 de Setembro de 1996. - Alfredo José de Sousa, Presidente - José Manuel Peixe Pelica (relator) - Manuel Cruz Pestana de Gouveia - José de Oliveira Moita - Alfredo Jaime Menéres Correia Barbosa (vencido, nos termos da declaração de voto junta) - Carlos Manuel Botelheiro Moreno (vencido, nos termos da declaração de voto junta) - Alípio Duarte Calheiros - João Manuel Fernandes Neto - Manuel Raminhos Alves de Melo - José Alves Cardoso - José Faustino de Sousa - Arlindo Ferreira Lopes de Almeida - João Pinto Ribeiro - Ernesto Luís Rosa Laurentino da Cunha (vencido, nos termos da declaração de voto junta pelo Exmo. Conselheiro Carlos Moreno) - Manuel Marques Ferreira (vencido, nos termos da declaração de voto junta pelo Exmo. Colega Carlos Moreno) - Adelino Ribeiro Gonçalves - António José Avérous Mira Crespo (vencido, nos termos da declaração de voto idêntica à do Exmo. Conselheiro Carlos Moreno). - Fui presente, Francisco Teodósio Jacinto.


Declaração de voto
1 - Das decisões integradoras do conflito em que assentou o presente pedido de fixação de jurisprudência resulta a existência de duas posições contrárias: uma relativa à natureza dos contratos celebrados ao abrigo do artigo 18.º, n.º 3, do Decreto-Lei 11/93, de 15 de Março - que a primeira dessas decisões considerou um acto de administração extraordinária e a segunda de administração ordinária -, e outra, necessariamente decorrente da solução a adoptar quanto àquela, respeitante à validade do Despacho ministerial, de delegação de competência, n.º 26/93, de 14 de Dezembro.

2 - No que toca à primeira das questões suscitadas, entendemos que os contratos celebrados ao abrigo do artigo 18.º, n.º 3, do citado decreto-lei, contrariamente à posição que fez vencimento, constituem verdadeiros actos de administração ordinária, já que deverão ser entendidos como actos definitivos nos quais existe vinculação de pressupostos e de elementos.

Com efeito, a celebração de contratos nos referidos termos encontra-se vinculada à verificação das condições previstas e dos pressupostos fixados nas disposições legais que a autorizam.

Não podem por isso ser considerados «actos não totalmente vinculados» nem traduzem inovação ou alteração do comportamento precedente da pessoa colectiva, características essas próprias de actos de administração extraordinária.

E a circunstância de o Decreto-Lei 11/93 introduzir a possibilidade de uma forma de contratação distinta das anteriormente previstas no Decreto-Lei 427/89, de 7 de Dezembro, não pode constituir, só por si, razão suficiente para considerar como actos de administração extraordinária os contratos celebrados ao abrigo do mesmo.

3 - Concluiríamos, assim, que, considerando tais contratos como actos de administração ordinária, sempre seria possível a delegação de competência para a sua celebração ao abrigo do disposto no artigo 35.º, n.º 2, do Código do Procedimento Administrativo, ou seja, nos inferiores hierárquicos do delegante.

Surgiria, então, a necessidade de se resolver a outra questão suscitada - a da existência ou não de uma relação de subordinação hierárquica entre o Ministro da Saúde e os conselhos de administração dos centros hospitalares.

É que, a concluir-se pela existência dessa relação, seria legalmente permitida a delegação de competência para a celebração de actos de administração ordinária, sendo, por isso, legal o Despacho ministerial 26/93, acima referido.

4 - Concluindo, por entender, em primeiro lugar, que o acto autorizador das contratações contempladas no artigo 18.º, n.º 3, do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde é um acto de administração ordinária e por considerar, em segundo lugar, que o presente acórdão não resolveu na totalidade as questões decididas de forma contraditória nas decisões invocadas, votei vencido o mesmo acórdão. - Alfredo Jaime Menéres Correia Barbosa.


Declaração de voto
Votamos a decisão na parte em que conclui pela indelegabilidade do acto autorizador dos contratos a termo certo contemplados no artigo 18.º, n.º 3, do Decreto-Lei 11/93, de 15 de Março, por inexistir lei que em especial o permita, conforme exige o artigo 35.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo.

Discorda-se da parte da decisão em que se qualifica como «verdadeiro acto de administração extraordinária» o acto autorizador deste tipo de contratos a termo certo, embora aceitando que os mesmos revestem carácter mais excepcional do que os previstos no Decreto-Lei 427/89, de 7 de Dezembro, que igualmente apresentam características de excepcionalidade face à normal contratação para a função pública.

O carácter mais ou menos frequente com que se pratica determinado acto ou contrato ou as condições mais ou menos exigentes para a sua celebração não podem, por si, transformar um acto de gestão corrente - logo, administração ordinária -, como sucede com a contratação de pessoal, em acto de administração extraordinária.

Quanto muito, retirar-se-ia do que antecede que os actos de administração ordinária, analisados sob o ponto de vista jurídico-económico, aceitam diferentes densificações sem se descaracterizar a sua natureza, nomeadamente em função da frequência da sua prática e da necessidade de verificação de maior ou menor número de pressupostos que os justifiquem.

Não obstante, como afirmamos inicialmente, votou-se a decisão, porquanto, mesmo caracterizando estes actos como de administração ordinária, a exigência da lei habilitante para a delegação em órgãos ou agentes não inseridos numa relação hierárquica é imposta pelo citado artigo 35.º, n.os 1 e 2, este a contrario sensu, do Código do Procedimento Administrativo. - Carlos Manuel Botelheiro Moreno.

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1989-12-07 - Decreto-Lei 427/89 - Presidência do Conselho de Ministros

    Define o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na administração pública.

  • Tem documento Em vigor 1993-01-15 - Decreto-Lei 11/93 - Ministério da Saúde

    Aprova o estatuto do Serviço Nacional de Saúde.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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