Decreto Legislativo Regional 30/83/A
Achados no fundo do mar dos Açores
A situação estratégica dos Açores, relativamente à navegação marítima e muito particularmente, entre os séculos XV e XVIII, transformou o arquipélago num ponto de passagem obrigatório para as naus do Índia, Brasil e América do Norte.Naus carregadas de objectos do mais alto valor histórico, artístico e arqueológico naufragaram em grande número contra as costas das ilhas, estando hoje detectados e estudados muitos desses naufrágios.
Essa proliferação de naufrágios, a presunção das riquezas acumuladas no fundo dos mares, a relativamente diminuta profundidade dos mares junto à costa, tudo isso fez já despertar o interesse de diversas entidades nacionais ou estrangeiras, públicas ou privadas, as quais começam, a surgir como potenciais interessadas na exploração de certas zonas do fundo dos mares jurisdicionais da Região.
A maioria dessas entidades dispõe de meios técnicos e científicos adequados a uma sistemática e eficaz prospecção dos fundos dos mares, e a fim de que se não perca o concurso de tais interessados e, ao mesmo tempo, se acautelem os interesses da Região há que estabelecer um conjunto de normas que claramente regulem a situação e os modos de estabelecer acordos entre as partes.
A Assembleia Regional dos Açores, nos termos do artigo 229.º, alínea a), da Constituição e dos artigos 1.º, n.º 2, e 91.º, alínea e), do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, decreta o seguinte:
ARTIGO 1.º
(Património cultural submarino)
Pertencem à Região Autónoma dos Açores todos os objectos, nomeadamente os de valor histórico, arqueológico e artístico, que vierem a ser encontrados nas águas territoriais da Região e da respectiva zona económica exclusiva, os quais não tenham proprietário conhecido ou se possam presumir abandonados.
ARTIGO 2.º
(Concessões)
1 - O Governo Regional poderá celebrar contratos de concessão para pesquisa, nas águas jurisdicionais da Região, dos objectos referidos no artigo 1.º, com entidades públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras.2 - Os contratos serão feitos por concurso público.
ARTIGO 3.º
(Contratos)
As entidades que pretendam celebrar contratos de concessão deverão instruir o respectivo processo junto da Secretaria Regional da Educação e Cultura e dele constarão os seguintes elementos:a) Tipos de embarcação utilizados, assim como a descrição do equipamento científico;
b) Área geográfica exacta em que pretendem realizar tais actividades;
c) Datas previstas para a sua realização;
d) Identificação da entidade responsável, do respectivo director e da pessoa encarregada dos trabalhos;
e) Relatório sobre outros trabalhos já efectuados e bibliografia publicada sobre os mesmos.
(Limites)
1 - As concessões serão limitadas no tempo e no espaço, podendo ser denunciadas ou renovadas nos termos dos respectivos contratos.2 - As concessões serão estritamente limitadas a objectos de valor histórico, artístico e arqueológico, caducando automaticamente caso o concessionário se dedique a outros tipos de pesquisa.
ARTIGO 5.º
(Pesquisa em áreas especiais)
No caso de as áreas a pesquisar terem interesse especial para a defesa nacional, o Governo Regional dará conhecimento do projecto de concurso público referido no artigo 2.º ao departamento competente do Governo da República.
ARTIGO 6.º
(Fiscalização)
O Governo Regional fiscalizará o cumprimento das obrigações decorrentes da execução dos contratos, podendo, para o efeito, designar os delegados que entender necessários para acompanhamento dos trabalhos e examinar tudo o que respeita aos materiais recolhidos.
ARTIGO 7.º
(Avaliação de achados recuperados)
1 - Os achados serão objecto de uma avaliação anual por uma comissão, composta pelos seguintes elementos:a) 1 representante da Presidência do Governo Regional;
b) 1 representante da Secretaria Regional da Educação e Cultura;
c) 1 representante da Secretaria Regional das Finanças;
d) 1 representante da entidade concessionária.
2 - Das decisões da comissão caberá recurso, a interpor no prazo dos recursos cíveis, que se contará a partir da data da notificação, para uma comissão com poderes de decisão final, composta por 3 árbitros, sendo um representante do Governo Regional, outro da entidade concessionária e um terceiro, que exercerá as funções de presidente, nomeado por mútuo acordo.
3 - No caso de não se verificar acordo relativamente à nomeação do presidente, este será nomeado pelo tribunal da comarca respectiva.
4 - Cada parte suportará as despesas do seu árbitro e a parte vencida no recurso as do árbitro de desempate e os encargos gerais resultantes do processo.
5 - Pode, ainda, haver uma avaliação extraordinária, caso os achados corram riscos de se deteriorarem ou perderem valor.
ARTIGO 8.º
(Compensação do concessionário)
1 - O concessionário poderá ser compensado, de acordo com as dificuldades de pesquisa e com a importância dos achados.2 - O contrato de concessão especificará as condições de compensação, as quais podem incluir uma repartição do valor dos achados, que não pertençam a terceiros, entre a Região e o concessionário.
ARTIGO 9.º
(Garantia)
A entidade concessionária prestará uma caução, como garantia do cumprimento do contrato respeitante à responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, decorrente da sua actividade de pesquisa nos mares da Região.
(Arbitragem)
1 - Será decidida por arbitragem qualquer divergência entre as partes que não possa ser resolvida por acordo.2 - Para a escolha do árbitro de desempate e para o funcionamento do tribunal arbitral a competência territorial será a da comarca mais próxima do local onde se houver situado o achado.
3 - Em tudo o que não vai disposto no presente diploma sobre a constituição e funcionamento do tribunal arbitral aplicar-se-ão as disposições do Código de Processo Civil.
ARTIGO 11.º
(Achados ocasionais)
1 - A pessoa que acidentalmente encontrar um objecto em zona na qual não seja titular de concessão nos termos deste diploma deverá, no prazo de 48 horas, entregá-lo à guarda da autoridade aduaneira ou de quem legalmente exerça essas funções.2 - Ao achador é devida compensação, de acordo com as dificuldades de recuperação do achado e valor que lhe for atribuído, nos termos do artigo 8.º deste diploma.
3 - Perde o direito à compensação quem não satisfaça as condições previstas na lei.
Aprovado em Plenário da Assembleia Regional dos Açores em 16 de Junho de 1983.
O Presidente da Assembleia Regional dos Açores, Álvaro Monjardino.
Assinado em Angra do Heroísmo em 17 de Outubro de 1983.
Publique-se.
O Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores, Tomás George Conceição Silva.