Sumário: Aprova a Estratégia Nacional para os Semicondutores.
A Estratégia Nacional para os Semicondutores tem como objetivo o compromisso de impulsionar a indústria da microeletrónica e semicondutores em Portugal, através da formulação de diretrizes e da criação de mecanismos que fortaleçam a capacidade empresarial e a investigação e desenvolvimento a nível nacional, assim como a promoção de sinergias com parceiros internacionais e a participação em programas dedicados ao setor a nível europeu.
Os semicondutores são a base material dos circuitos integrados (chips), dispositivos físicos miniaturizados que podem captar, armazenar, processar e atuar sobre os dados, incorporados em essencialmente todos os produtos tecnológicos atuais. Os semicondutores são elementos essenciais para a construção de produtos digitais utilizados em atividades quotidianas como o trabalho, a educação e o entretenimento, para aplicações críticas em automóveis, comboios, aeronaves, satélites, cuidados de saúde e automação, bem como para o funcionamento de infraestruturas essenciais de energia, mobilidade, dados e comunicações. São também cruciais para as tecnologias incontornáveis do futuro, como a inteligência artificial, realidade aumentada e realidade virtual, comunicações móveis 5G/6G, bem como a Internet das Coisas, sendo a sua evolução determinante para o desempenho de supercomputadores, infraestruturas de dados e dispositivos móveis. À medida que a transição digital acelera e a procura mundial de chips aumenta rapidamente, prevendo-se que duplique até ao final da década, ultrapassando um valor de mercado de um trilião de dólares, os semicondutores estão no centro de fortes interesses geoestratégicos e da corrida tecnológica mundial. As principais economias estão assim empenhadas em garantir o seu aprovisionamento de chips avançados, uma vez que isso condiciona cada vez mais a sua capacidade de atuar ao nível económico, industrial e militar, e de impulsionar a transformação digital.
Neste contexto, a 8 de fevereiro de 2022 foi publicada a comunicação da Comissão Europeia propondo um Regulamento dos Circuitos Integrados (European Chips Act). Este Regulamento constitui uma medida-chave do Programa de Trabalhos da Comissão para fazer face à "crise dos semicondutores", resultante da disrupção das cadeias de fornecimento de chips e componentes eletrónicos pós-pandemia e da decisão do Conselho Europeu de reforçar a autonomia estratégica da Europa em determinadas tecnologias críticas. A guerra na Ucrânia veio, ainda em 2022, acentuar o caráter urgente de atrair e reter na União Europeia (UE) capacidade de design, produção e assemblagem de chips.
O Regulamento (UE) 2023/1781 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de setembro de 2023, que estabelece um regime de medidas para reforçar o ecossistema europeu dos semicondutores e que altera o Regulamento (UE) 2021/694 (Regulamento dos Circuitos Integrados) estabelece eixos de atuação que visam contribuir substancialmente para o crescimento da quota europeia do mercado mundial de semicondutores, de 10 % para 20 %, uma das metas digitais para 2030 consagradas no programa Década Digital para 2030, estabelecida na Decisão UE 2022/2481, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de dezembro de 2022.
O Regulamento dos Circuitos Integrados mobiliza um total de 43 mil milhões de euros até 2030, entre fundos da UE, financiamento público dos Estados-Membros e investimento privado. As atividades do Regulamento dos Circuitos Integrados estão estruturalmente organizadas em três pilares de atuação, nomeadamente:
a) Pilar 1, dedicado à iniciativa «Chips for Europe», que apoia a criação de capacidades tecnológicas e a inovação em grande escala em toda a UE, a fim de permitir o desenvolvimento e a implantação de tecnologias de ponta de semicondutores e tecnologias quânticas de próxima geração;
b) Pilar 2, que visa criar um quadro para garantir a produção de chips em solo europeu, visando a atração de investimentos e o reforço das capacidades de produção no fabrico de semicondutores, no encapsulamento avançado, assemblagem e teste de chips;
c) Pilar 3, dedicado à criação de um mecanismo de coordenação e monitorização entre os Estados-Membros e a Comissão no que respeita à resposta a situações de crise ou falta de materiais, equipamento ou produtos críticos.
Enquadrado no panorama global da conceção de chips, o setor da microeletrónica e semicondutores português é caracterizado por um ecossistema empresarial com vastas valências no que toca ao desenho de chips e ao encapsulamento, assemblagem e teste de dispositivos, duas áreas cruciais da cadeia de valor. Ao nível da investigação e desenvolvimento, Portugal possui um ecossistema caracterizado por um conjunto de centros de investigação, laboratórios associados, universidades e laboratórios colaborativos, compostos por instalações dedicadas, capacidade laboratorial e competências técnicas em áreas inovadoras. O desenvolvimento nestas áreas tem vindo a figurar-se crucial para a criação de novas empresas, fomentando o crescimento do tecido empresarial português. As entidades em questão são também responsáveis pela formação de excelência nas áreas enumeradas, através de programas de ensino superior e de especialização, posteriormente complementados por uma estreita ligação com o tecido empresarial português, que promove treino mais focado e especializado.
A participação portuguesa nas parcerias público-privadas implementadas ao abrigo de anteriores Programas-Quadro da Investigação e Inovação da UE, e mais recentemente ao abrigo da Key Digital Technologies Joint Undertaking, foram instrumentais para a construção deste conjunto de competências. O Regulamento dos Circuitos Integrados representa assim uma oportunidade única para impulsionar o crescimento do setor de semicondutores em Portugal tirando máximo partido do financiamento comunitário e da rede de colaboração com parceiros europeus, posicionando o país num dos setores tecnológicos e industriais mais importantes do século xxi. Ao mesmo tempo, representa importantes desafios no que toca à definição de áreas de interesse estratégico para focar os recursos necessários ao cofinanciamento, quer das atividades de investigação e inovação, quer da capacidade de conversão da inovação em produção de chips e dispositivos eletrónicos e, ainda, as medidas necessárias para suprir a escassez de recursos humanos com as qualificações necessárias.
Neste contexto, a Estratégia Nacional para os Semicondutores estabelece objetivos e eixos estratégicos que visam promover o crescimento do setor em Portugal, mobilizando e maximizando a participação portuguesa no Regulamento dos Circuitos Integrados e em futuras iniciativas nacionais e internacionais, potenciando, desta forma, novas oportunidades de cooperação institucional, industrial e de investigação, contribuindo para o desenvolvimento de tecnologias inovadoras e competitivas no mercado internacional.
Assim:
Nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei 197/99, de 8 de junho, na sua redação atual, da alínea a) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei 8/2012, de 21 de fevereiro, na sua redação atual, e da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:
1 - Aprovar a Estratégia Nacional para os Semicondutores (Estratégia), constante do anexo i à presente resolução e da qual faz parte integrante.
2 - Determinar que a Estratégia é revista, com periodicidade anual ou sempre que necessário, por iniciativa do membro do Governo responsável pela área da ciência e tecnologia, em articulação com os membros do Governo responsáveis pelas áreas da economia e da transição digital.
3 - Determinar que a monitorização e avaliação da Estratégia compete à Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I. P. (FCT, I. P.), e à ANI - Agência Nacional de Inovação, S. A. (ANI).
4 - Autorizar a FCT, I. P., e a ANI a realizar a despesa destinada à implementação da Estratégia, até um montante máximo de (euro) 121 116 000,00 entre 2024 e 2027, nos termos do anexo ii à presente resolução e da qual faz parte integrante.
5 - Determinar que o montante referido no número anterior é repartido pelos anos económicos de 2024 a 2027, nos termos do anexo ii à presente resolução, não podendo exceder, em cada ano económico, os montantes aí previstos.
6 - Determinar que os encargos financeiros decorrentes da presente resolução são suportados pelas verbas a inscrever nos orçamentos da FCT, I. P., e da ANI.
7 - Estabelecer que a presente resolução entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Presidência do Conselho de Ministros, 7 de dezembro de 2023. - O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa.
ANEXO I
(a que se refere o n.º 1)
Estratégia Nacional para os Semicondutores
1 - Enquadramento e análise do setor
Para facilitar a compreensão da atual Estratégia, inclui-se uma base conceptual onde são elaborados alguns dos conceitos chave neste contexto, permitindo assim um melhor entendimento do complexo setor em questão e da sua importância no contexto tecnológico, político, social e económico.
A microeletrónica refere-se ao domínio da eletrónica e da tecnologia que trata da conceção, desenvolvimento e aplicação de componentes eletrónicos e circuitos integrados, coloquialmente chamados «chips», normalmente fabricados à micro e nano escala, utilizando como elemento central materiais semicondutores, como por exemplo o silício, dando assim nome a esta indústria. Esta tecnologia permite a criação de sistemas e dispositivos eletrónicos complexos com um elevado nível de integração e miniaturização, capazes de capturar, armazenar e processar informação, sendo ela a base dos microprocessadores, chips de memória e vários sensores utilizados numa vasta gama de aplicações, desde a eletrónica de consumo às telecomunicações, dispositivos médicos, setor automóvel, agricultura inteligente, energia, cidades inteligentes, defesa, espaço, educação e entretenimento.
Estes dispositivos têm impacto não só no desempenho computacional, mas também na segurança e na eficiência energética, com uma ênfase crescente na segurança dos sistemas ligados. As indústrias dependem cada vez mais da tecnologia de semicondutores para se manterem competitivas, com algumas empresas a conceberem os seus próprios chips e a adquirirem conhecimentos especializados na área. Os investimentos em tecnologia de semicondutores não dizem respeito apenas à indústria em si, mas também ao seu papel fundamental na competitividade económica, na segurança nacional e na resposta aos desafios da sociedade.
Recentemente, as cadeias de abastecimento de semicondutores sofreram vastas perturbações, impulsionadas pela pandemia da doença COVID-19, levando, por um lado, ao abrupto aumento da procura de dispositivos eletrónicos, e por outro, ao encerramento e paragem de fábricas especializadas, à disrupção das redes logísticas e à escassez de matérias-primas críticas. Notoriamente, o setor automóvel europeu foi largamente afetado por estas disrupções, com vários fabricantes a reduzirem consideravelmente o seu volume de produção devido à falta de chips. O historial de externalização do mercado de semicondutores para o Extremo Oriente, em particular na produção, assemblagem e teste de dispositivos, juntamente com a tensão geopolítica mundial emergente, vieram salientar a fragilidade da cadeia de valor e os efeitos da centralização de capacidade de produção em determinadas regiões.
a) Cadeia de valor
A cadeia de valor dos semicondutores é um ecossistema altamente intrincado e multifacetado que engloba um vasto espetro de processos e intervenientes. Cada etapa da cadeia de valor envolve numerosas interdependências e complexidades, exigindo conhecimentos altamente especializados e extensa investigação, desenvolvimento e coordenação. De um modo geral, a cadeia de valor pode ser dividida em quatro grandes áreas, nomeadamente o desenho dos chips, a fabricação, o encapsulamento, assemblagem e teste, e a distribuição e vendas.
O desenho dos chips é um processo complexo que se inicia com a conceptualização do circuito, mediante o seu propósito. Durante esta fase, engenheiros e designers identificam as funções específicas que o chip deve desempenhar, tendo em consideração a aplicação desejada, seja para processamento lógico, processamento gráfico, aplicações para memória ou outros circuitos integrados especializados. Definidas as especificações do sistema, os designers determinam a estrutura e desenho lógico do chip, definindo como os diferentes componentes e módulos interagirão, especificando como serão conectados para executar diversas operações. Nesta fase, a verificação lógica é crucial, envolvendo simulações para garantir a funcionalidade inicial. A última etapa é a conceção física, na qual os designers mapeiam o desenho lógico para a disposição física do chip, determinando a posição precisa dos componentes e interligações, otimizando fatores como integridade do sinal, consumo de energia e dissipação de calor. O desenho atravessa um extenso processo de verificação antes de ser enviado para fabricação. As empresas de design podem ser, geralmente, divididas em entidades dedicadas à conceção de blocos de propriedade intelectual, posteriormente licenciados a terceiros, ou em empresas fabless, que desenham e comercializam os seus próprios chips sem possuir instalações fabris próprias, enviando os seus desenhos para serviços especializados de fabricação. Note-se ainda que todo o processo de desenho de chips está vastamente dependente de software de desenho especializado, denominado Electronic Design Automation Tools (EDA).
No que toca à fabricação, o desenho do chip é transferido para as bolachas de silício através de complexos processos de litografia, etching, dopagem e deposição de materiais, desenvolvidos em fábricas dedicadas, conhecidas por fabs, através de processos denominados front-end. Estas fábricas dedicam-se, normalmente, a processos específicos, determinados pelo nível tecnológico (nó de processo ou «node»), que apesar de ser expresso em nanometros, não reflete as dimensões reais dos componentes em questão, mas sim o grau de complexidade e capacidade de operação do chip. A fabricação é a área que requer o maior nível de investimento, podendo uma só fábrica dedicada a nodes mais avançados (5 a 3 nanometros) ultrapassar os 10 mil milhões de euros. Note-se, no entanto, que para a grande maioria das aplicações, especialmente aquelas com requisitos de desempenho menos rigorosos, os chips podem ser fabricados com recurso a nós de processo maiores, proporcionando custos de fabrico mais baixos, melhores taxas de rendimento e processos de fabrico mais simples.
A fabricação de chips envolve ainda a utilização de uma vasta gama de matérias-primas, incluindo bolachas (wafers) de silício, materiais isolantes, semicondutores e metálicos, químicos e gases especializados, assim como equipamento avançado. A conjugação da dependência destes materiais críticos e a sua distribuição geográfica, tanto em termos da localização dos recursos naturais como dos métodos industriais especializados que os processam, levou a uma interdependência crescente a nível mundial. Exemplos da elevada interdependência entre regiões torna-se evidente quando cerca de 70 % da produção de silício está localizado na China e a produção de bolachas de silício e químicos para litografia é dominada pelo Japão. Para além da interdependência ligada às matérias-primas, é ainda identificada uma enorme dependência a nível de produção de ferramentas e processos críticos, onde, por exemplo, o software utilizado para o desenho de chips é maioritariamente detido e desenvolvido por empresas americanas, o equipamento mais avançado de litografia é exclusivamente concebido na Holanda e cerca de 90 % da produção de chips mais avançado estar centralizada em Taiwan.
Fabricado o chip, o processo de encapsulamento, assemblagem e teste do mesmo é conduzido, ou pela fábrica que produziu o chip, denominadas Integrated Device Manufacturer (IDM) ou em fábricas dedicadas, conhecidas como Outsource Semiconductor Assembly and Test (OSAT), em processos denominados back-end. Nesta fase, as bolachas de silício, já com os circuitos integrados, são cortadas em pequenos chips, denominados «dies», que são fixados de forma organizada num substrato. Os dies são conectados eletricamente, através de um diverso número de técnicas especializadas, que permitirão a sua conexão com outros componentes, possibilitando a posterior integração no produto final. Os dies são encapsulados, proporcionando proteção ambiental, física e assegurando a integridade estrutural do chip, atravessando depois um vasto número de testes e verificações antes de serem enviados para o cliente final.
Considerando o exigente grau tecnológico destas tecnologias, torna-se crucial uma interação recorrente entre o desenho, a fabricação e a assemblagem, encapsulamento e teste, notoriamente com o crescente interesse em soluções como o encapsulamento heterogéneo e tecnologias chiplet, conceitos modulares onde um único chip contém no seu interior diversos chips interligados, maximizando a performance e especialização de dispositivos futuros.
Finalmente, os chips são integrados na cadeia de fornecimento para distribuição aos fabricantes de equipamento original (OEM) e outros clientes. A logística adequada e a gestão de inventário são cruciais para garantir que os chips estão prontamente disponíveis para utilização em dispositivos eletrónicos, tais como computadores, smartphones e sistemas automóveis.
b) Panorama europeu
Em termos do seu papel na cadeia de valor e de abastecimento global do setor de semicondutores, a Europa destaca-se na investigação e desenvolvimento (I&D) e no fornecimento de materiais especializados, produtos químicos e equipamento avançado. Alguns processos avançados de fabrico de bolachas, como os que utilizam equipamento de litografia Extreme Ultraviolet (EUV) da ASML, empresa sediada na Holanda, dependem inteiramente de tecnologia desenvolvida em solo europeu. A Europa possui ainda fabricantes de bolachas líderes nos mercados automóvel e da automação industrial, detendo quotas de mercado substanciais a nível mundial. No entanto, apesar destes pontos fortes, existem lacunas e dependências notáveis em áreas críticas da cadeia de abastecimento, em especial, no que toca à propriedade intelectual (PI) e ferramentas para desenhar chips, tendo a quota de mercado europeu diminuído de 4 % em 2010 para menos de 1 % atualmente, para atividade de empresas fabless.
A Europa alberga mais de 50 fábricas de semicondutores, distribuídas por vários Estados-Membros, onde a maioria possui capacidade produtiva em nós maduros e em bolachas com uma dimensão de 150 mm e 200 mm. Existe um número limitado de fábricas que dispõe de capacidade de processar bolachas de 300 mm, o standard industrial, como é o caso da Intel em Leixlip (Irlanda), a GlobalFoundries em Dresden (Alemanha) e a ST Microelectronics em Crolles (França). Nesta área, a fabricação de chips encontra-se vastamente concentrada na Ásia, com uma grande porção das receitas de mercado a serem capitalizadas em Taiwan, Coreia do Sul e China. A mesma situação é observada para o encapsulamento, assemblagem e teste, estando os processos mais avançados concentrados na Coreia do Sul e China, enquanto processos standard terem vindo, ao longo dos anos, a ser instalados no Sudeste Asiático, detendo a Europa cerca de 5 % das receitas de mercado.
Por último, o vibrante ecossistema europeu de startups e pequenas e médias empresas (PME) está espalhado por vários Estados-Membros, mas as dificuldades de acesso a capitais próprios e de risco têm vindo a impedir perspetivas de crescimento acelerado, especialmente para as empresas produtoras de chips, que enfrentam desafios na obtenção de financiamento que suporte o longo processo de demonstração tecnológica até à comercialização de produtos neste setor.
2 - Enquadramento do Regulamento dos Circuitos Integrados
É neste contexto que a UE lança, em 2023, o Regulamento dos Circuitos Integrados, através do Regulamento (UE) 2023/1781, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de setembro de 2023 [Regulamento (UE) 2023/1781] com o intuito de recuperar capacidades que vão da conceção à produção e montagem de chips, permitindo recuperar o gradual declínio da sua quota de mercado no setor de semicondutores.
O Regulamento dos Circuitos Integrados está organizado em três pilares de ação:
a) Pilar 1 (Chips for Europe Initiative), que visa o desenvolvimento e construção de infraestruturas em sinergia com atividades de investigação, desenvolvimento e inovação e o apoio a startups, PME e grandes empresas.
De modo a executar o Pilar 1, o Regulamento da Parceria Chips JU, originalmente definido segundo o Regulamento (UE) 2021/2085, do Conselho, de 19 de novembro de 2021, foi implementado e reforçado através de um aumento significativo no que diz respeito aos objetivos e orçamento para o período 2021-2027, comparativamente à anterior parceria, a Key Digital Technologies Joint Undertaking (KDT JU). A Chips JU dá assim continuidade aos objetivos desta parceria, sendo alargado para englobar as seguintes ferramentas e programas:
i) Rede de centros de competências nacionais de semicondutores, definida segundo os considerandos (18), (28) e (29) e o artigo 11.º do Regulamento (UE) 2023/1781, dinamizando o acesso às infraestruturas da Chips JU, contribuindo para a criação de competências na área de semicondutores, para a transferência de conhecimento e tecnologia e para o contacto entre entidades participantes da parceria.
ii) Plataforma de Design, definida segundo os considerandos (15) e (30) do Regulamento (UE) 2023/1781, oferecendo acesso facilitado às diferentes ferramentas de desenho (EDA), bibliotecas de PI, ferramentas de estandardização e outros recursos, para entidades públicas e privadas em solo europeu;
iii) Linhas Piloto, definidas segundo o considerando (16) do Regulamento (UE) 2023/1781, com diferentes níveis de maturidade tecnológica, mas tendencialmente com vista à industrialização à escala europeia através do teste, experimentação, prototipagem e validação de novos dispositivos eletrónicos, com o lema «do laboratório para a fábrica» (lab-to-fab). O Regulamento dos Circuitos Integrados identifica desde logo três áreas de atuação, para as quais se poderão constituir três linhas piloto a nível europeu: novos materiais semicondutores, integração heterogénea e encapsulamento avançado, tecnologias FD-SOI (Fully-Depleted Silicon-on-Insulator) com processos para além dos 10 nm e nós avançados através de processos para além dos 2 nm;
iv) Quantum, visando o desenvolvimento de capacidade de I&D no desenvolvimento de chips quânticos, bem como de algoritmos e software para chips quânticos e a sua interface com tecnologias computacionais convencionais;
v) Chips Fund, definido segundo o considerando (19) do Regulamento (UE) 2023/1781, um novo mecanismo financeiro implementado através de instrumentos do European Investment Fund e do European Innovation Council, na forma de capitais próprios («equity») e empréstimos para apoiar o crescimento de startups, PME e mid-caps;
vi) Os objetivos originalmente definidos na KDT JU, assegurando continuidade das atividades à luz da Agenda Estratégica de Investigação & Inovação (ECS SRIA) definida pelos Membros Privados da Chips JU;
b) Pilar 2, dedicado ao aumento da segurança e resiliência das cadeias de fornecimento.
A fim de incentivar a criação das capacidades necessárias de fabrico em solo europeu, o Pilar 2 do Regulamento dos Circuitos Integrados define dois possíveis modelos: «Open EU foundries», que visam oferecer capacidade de produção a outras empresas, e «Integrated production faciliteis», que produzem para os seus próprios fins comerciais e podem integrar no seu modelo empresarial outras etapas da cadeia de valor para além do fabrico, como o desenho e a venda de produtos.
Independentemente do modelo, novas fábricas deverão fornecer capacidades de fabrico de semicondutores, de produção de equipamento ou de componentes essenciais para esse equipamento, predominantemente utilizados no fabrico de semicondutores, que sejam pioneiras na União Europeia (UE) e contribuam para a segurança do aprovisionamento disponível e para a resiliência do ecossistema de semicondutores no mercado interno europeu. Entende-se por «pioneira» o facto de trazer um elemento inovador para o mercado interno, no que diz respeito aos processos de fabrico ou ao produto final, que pode ser baseado em nós tecnológicos novos ou já existentes. Os elementos de inovação relevantes podem dizer respeito ao nó tecnológico, ao material da bolacha, a abordagens que conduzam a melhorias na capacidade de computação ou noutros atributos de desempenho, como a eficiência energética, o nível de segurança, segurança ou fiabilidade, bem como a integração de novas funcionalidades, como a IA, a capacidade de memória, entre outras. A integração de diferentes processos que levam a ganhos de eficiência, ou a automatização de atividades de encapsulamento, assemblagem e teste são também exemplos de inovação. No que respeita aos ganhos ambientais, os elementos de inovação incluem a redução, de forma quantificável, da quantidade de energia, água ou produtos químicos utilizados, ou a melhoria da reciclabilidade. Uma vez mais, estes elementos de inovação podem aplicar-se tanto a nós tecnológicos maduros como a nós tecnológicos de ponta.
É estritamente indicado que, para um projeto industrial se enquadrar no Pilar 2, o tipo de inovação que traz não pode estar já substancialmente presente ou comprometida a ser desenvolvida na UE.
c) Pilar 3, dedicado à monitorização e resposta a crises
Criação de um sistema de monitorização e resposta a crises para antecipar a escassez de abastecimento de semicondutores (chips, equipamentos, materiais críticos) e dar respostas em caso de crise, através de ações conjuntas de intercâmbio de informações e de coordenação, de sistemas de alerta antecipado para detetar problemas de stock, de métodos de estimativa da procura liderados pela indústria, e da melhoria da compreensão do panorama mundial. Para assegurar a execução eficiente do Pilar 3, será criado o European Semiconductor Board (ESB), que dará continuidade às atividades do European Semiconductor Expert Group. Os trabalhos deste Pilar serão ainda largamente conjugados com parceiros estratégicos fora da UE.
3 - Panorama nacional
O ecossistema industrial e panorama de I&D na área da microeletrónica e semicondutores em Portugal foi detalhadamente analisado com recurso ao contacto direto com as respetivas comunidades, ao workshop organizado durante o Encontro Ciência 2023, dedicado à discussão da presente Estratégia, bem como ao mapeamento prévio desenvolvido pela Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal, E. P. E. (AICEP, E. P. E.), e a Direção-Geral das Atividades Económicas.
a) Ao nível empresarial
De um modo geral, foi identificada uma forte presença empresarial especialmente direcionada às áreas do desenho de chips e encapsulamento avançado, como representado na figura 1.
Portugal conta com mais de 30 anos de experiência no desenvolvimento da microeletrónica, fomentada por uma excelente formação universitária, por startups reconhecidas a nível mundial e por centros dedicados de caráter internacional. O conhecimento acumulado na conceção e desenho de circuitos integrados, em particular circuitos analógicos e de modo misto, consolidado ao longo deste período, permitiu atrair um volume significativo de investimento estrangeiro, atraindo várias multinacionais, como é o exemplo da Synopsys, Renesas, Aurasemi, Nanopower e, mais recentemente, a Monolithic Power Systems e AMD/Xilinx. Ao longo deste tempo, o ecossistema de startups portugueses foi também crescendo, contando neste momento com sete empresas, entre elas a SiliconGate, PICadvanced, PETsys Electronics, Powertools Technologies, Koala Tech, IOBundle e IPblop. No seu todo, o ecossistema emprega cerca de 600 pessoas, focando-se nas mais diversas áreas, passando por módulos de gestão de energia, protocolos de comunicação, conversores de dados, interfaces para sensores e atuadores, ferramentas de desenho personalizadas, circuitos integrados reconfiguráveis e circuitos fotónicos integrados.
Na área do encapsulamento, montagem, assemblagem e teste de chips, Portugal conta com a presença da ATEP Amkor, empresa situada em Vila do Conde, a única OSAT dedicada a encapsulamento avançado de alto volume na Europa, suportando toda a cadeia de valor, desde o desenho até à implementação de múltiplas soluções tecnológicas, servindo principalmente o mercado automóvel, de telecomunicações e de segurança. A ATEP Amkor conta com 750 colaboradores, dos quais 200 são engenheiros, e instalações compostas por áreas técnicas e sociais de 36 900 m2 e uma sala limpa de 20 600 m2, dedicando-se ao encapsulamento e teste de chips em alto volume e à I&D na área. Os serviços oferecidos pela ATEP Amkor incluem várias técnicas de Wafer Level Packaging, incluindo Wafer Level Chip Scale Packaging, Wafer Level Fan-out e sistemas microeletromecânicos (MEMS) e sensores em Wafer Level, bem como uma nova linha de Flip Chip Ball Grid Array (FCBGA). O plano de crescimento passa pelo desenvolvimento de novas linhas dedicadas a técnicas avançadas de encapsulamento e assemblagem de alta densidade e em formato de painel, oferecendo maior eficiência de processo, à integração de sensores e encapsulamento heterogéneo, possibilitando a integração de vários módulos interligados no interior de um só chip, e a módulos de potência baseados em materiais emergentes para além do silício, para dispositivos de alta potência, de extrema importância para veículos elétricos e tecnologias renováveis.
Quanto ao desenvolvimento de equipamentos, ferramentas e subsistemas relevantes para o setor de semicondutores, a Critical Manufacturing dedica-se a capacitar os fabricantes de produtos complexos e de alta tecnologia com sistemas de execução e inteligência de fabrico, que rastreia, documenta e fornece informações para a gestão das condições na linha de produção, otimizando a sua eficiência. A empresa atua nos setores do fabrico de semicondutores, montagem de dispositivos eletrónicos, fabrico de dispositivos médicos e fabrico de produtos discretos. Adicionalmente, a EMEA Electro Solutions desenvolve equipamento para processos back-end de semicondutores, permitindo o ensaio/aprovação de processos de fabrico, a escolha de materiais e a produção de protótipos em colaboração com fabricantes de equipamento.
Figura 1 - Mapeamento e distribuição geográfica das empresas com atividade direta no setor da microeletrónica e semicondutores, incluindo a principal área de atividade.
b) Ao nível da investigação, desenvolvimento, inovação e formação
Portugal conta ainda com uma rede de entidades dedicadas à I&D, atuando em áreas emergentes, como a eletrónica de potência, eletrónica flexível e transparente, integração de circuitos emergentes, MEMS e sensores, circuitos integrados analógicos e de sinal misto, fotónica e computação quântica, como destacado na Figura 2. O desenvolvimento nestas áreas tem vindo a ser diretamente transferido e a dinamizar o setor de semicondutores a nível nacional, bem como o setor automóvel, energia e IoT, vigilância e cidades inteligentes, redes de comunicações, cibersegurança e dispositivos biomédicos.
Das instituições sinalizadas, cinco delas possuem salas limpas, infraestruturas com um ambiente rigorosamente controlado para minimizar a presença de partículas e contaminantes que podem afetar a produção de componentes à micro e nano escala. No seu todo, esta rede de infraestruturas oferece produção de bolachas até 200 mm, projetos em bolachas multi-projeto (MPW), modelação e conceção de dispositivos, deposição de materiais, litografia por feixe de eletrões, UV, laser e nanoimprint, etching, encapsulamento avançado e processos de back-end, metrologia, inspeção e ensaio de dispositivos à escala da bolacha. Estas instalações são complementadas com uma rede de laboratórios dedicados aos domínios da eletrónica, física, química e materiais, oferecendo serviços de caracterização de microscopia eletrónica de varrimento, microscopia eletrónica de transmissão, espetroscopia e análise de raios X, caracterização elétrica e caracterização morfológica.
Figura 2 - Principais áreas de investigação e desenvolvimento presentes em universidades, centros de investigação e laboratórios colaborativos portugueses.
Figura 3 - Mapeamento e distribuição geográfica das universidades, centros de investigação e laboratórios colaborativos com atividade direta no setor da microeletrónica e semicondutores, incluindo informação das entidades com infraestrutura de sala limpa.
A formação académica desempenha um papel crucial na indústria de semicondutores, sendo um dos pilares fundamentais para impulsionar a inovação e o desenvolvimento tecnológico neste setor altamente especializado. Profissionais com uma base sólida em disciplinas como a eletrónica, física, materiais e nanotecnologia são pilares essenciais para enfrentar os desafios complexos associados à conceção, fabricação e melhoria contínua de dispositivos eletrónicos. Neste sentido, a ação colaborativa de universidades, centros de investigação e laboratórios colaborativos em Portugal tem sido responsável pela formação de excelência nas áreas identificadas. Na Figura 4, pode ser evidenciado o crescente número de formados, incluindo licenciaturas, mestrados, doutoramentos e cursos profissionais, nas áreas da eletrónica, engenharia física e materiais (e nanotecnologia), englobando todos os cursos presentes em Portugal com valências diretamente aplicáveis e relevantes para o setor da microeletrónica e semicondutores.
Figura 4 - Número de formados em Portugal, entre 2017/18 e 2021/22, nas áreas da a) eletrónica; b) engenharia física; e c) materiais, com programas curriculares diretamente relevantes para o setor de microeletrónica e semicondutores.
c) Dotação financeira e parcerias internacionais
Ao nível do apoio financeiro dedicado ao setor, foi iniciada em 2022 a Agenda da Microeletrónica, financiada pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), uma iniciativa que inclui 17 parceiros com o propósito de fortalecer a posição portuguesa no mercado de gestão, produção, distribuição e reciclagem de semicondutores. O consórcio é liderado pela ATEP Amkor, contando com um investimento elegível total de 67,5 milhões de euros.
Adicionalmente, Portugal assinou, em 2022, um Memorando de Entendimento com o Ministério dos Assuntos Económicos e Transformação Digital e o Ministério da Ciência e Inovação de Espanha, no âmbito do desenvolvimento de uma estratégia ibérica para a microeletrónica e semicondutores, dos quais resultaram já várias reuniões bilaterais, definindo os seguintes pontos estratégicos:
i) Intercâmbio de talento (doutorados, pós-doutorados e outros cientistas) em áreas críticas e estratégicas para ambos os países, em particular nas áreas da fotónica, desenho de chips e encapsulamento avançado, estando em processo de avaliação veículos de colaboração dedicados para facilitar este intercâmbio;
ii) Alargar a colaboração com as entidades espanholas, e respetiva infraestrutura, dedicadas ao fabrico de chips fotónicos, facilitando o acesso e colaborações com entidades portuguesas. Da mesma maneira, aumentar a colaboração entre entidades fabris, atuais e futuras, localizadas em Espanha, que poderão requerer serviços back-end especializados, atualmente presentes em Portugal;
iii) Estabelecer na península ibérica um cluster back-end, no seguimento do anúncio do investimento da Broadcom em Espanha para uma nova fábrica dedicada a este tipo de processos, complementares às atividades já desenvolvidas em Portugal através da ATEP Amkor.
Ainda em 2022, a AICEP, E. P. E., assinou um Memorando de Entendimento com a multinacional sul-coreana SK hynix, a segunda maior empresa de semicondutores da Coreia do Sul e sexta maior do mundo, para o desenvolvimento de um investimento na área de semicondutores em 2024, em Portugal. A colaboração com a Coreia do Sul será ainda estendida ao nível académico e de I&D, com novas parcerias entre entidades de ensino portuguesas e coreanas, dedicadas à área da microeletrónica e semicondutores.
4 - Objetivos estratégicos
Capacitar Portugal no setor da microeletrónica e semicondutores, garantindo uma contribuição para a resiliência conjunta da UE e uma maior autonomia estratégica, beneficiando e impulsionando o sistema científico e tecnológico nacional, para a criação de valor acrescentado pelo nosso sistema produtivo.
Criar um centro de competências que agregue a capacidade distribuída pelo país, criando uma interface entre instituições de ensino, investigação, desenvolvimento e empresas, utilizando esta rede para uma melhor definição da formação técnica e avançada nas áreas da microeletrónica e semicondutores, que possa dar resposta ao crescimento do ecossistema português.
Envolver a indústria no processo de desenvolvimento estratégico, mobilizando os recursos humanos e tecnológicos necessários para assegurar a capacidade nacional de contribuir para cadeias de valor e produção industrial internacionais.
Identificar complementaridades e sinergias ao nível nacional, no âmbito do desenvolvimento de uma capacidade coordenada e mobilizada em torno desta Estratégia, potenciando a investigação, desenvolvimento, inovação e produção orientada às necessidades tecnológicas da cadeia de valor global.
Potenciar o sistema científico e tecnológico nacional, estabelecendo linhas estratégicas de ação em áreas inovadoras, para a sua transição e implementação em contextos industriais e de produção, enriquecendo o nível tecnológico e capacidade produtiva do ecossistema empresarial nacional.
5 - Eixos de intervenção
Eixo 1 - Reforço da formação especializada e competências específicas na área da microeletrónica e semicondutores
Embora exista em Portugal uma forte base educativa, há uma necessidade crescente de talentos especializados e de formação específica que reforce o crescente ecossistema nacional, tanto a nível empresaria e industrial, como de I&D.
Historicamente, o ritmo acelerado da evolução tecnológica nesta área, justificado pela complexidade da conceção, do fabrico e da integração de dispositivos, juntamente com uma falta de revisão ou atualização atempada da formação nas entidades de ensino, são fatores que têm vindo a contribuir para a falta de competências no setor dos semicondutores em todo o mundo.
A escassez é particularmente acentuada em áreas especializadas, como a conceção de circuitos integrados, a fabricação e o encapsulamento e assemblagem de dispositivos, culminando numa situação onde empresas enfrentam uma enorme concorrência por um conjunto limitado de profissionais qualificados, levando assim que as mesmas atravessem desafios no recrutamento e retenção de talentos de topo, colocando em risco a sua capacidade de inovar e satisfazer as necessidades do mercado e da sociedade.
A avaliação da formação em entidades de ensino portuguesas, descrita no ponto 3 da presente Estratégia, demonstra que o número de formados em áreas chave para a indústria de semicondutores, como a eletrónica, física, materiais e nanotecnologia, tem vindo a subir nos últimos 5 anos. Estes dados revelam que a falta de talento qualificado, reportado por empresas no setor durante a consulta às entidades relevantes nacionais, poderá ser colmatada através de uma maior ênfase em cursos de especialização, direcionados a áreas críticas e estratégicas para o ecossistema português, como o desenho de chips e o encapsulamento avançado.
Deste modo, considera-se imperativo que, no âmbito do Regulamento dos Circuitos Integrados, seja criado em Portugal um centro de competências dedicado às áreas da microeletrónica e semicondutores, capacitando-o como entidade nacional responsável pela:
a) Avaliação das necessidades, imediatas e a médio/longo prazo, ao nível de talento e formação específica, das empresas nacionais com atividade no setor, permitindo às universidades e institutos um foco na formação futura e a definição das formações profissionais baseada nas necessidades do ecossistema existente;
b) Promoção e conceção de estágios profissionais em empresas nacionais e internacionais, através de parcerias, protocolos e acordos estratégicos, complementares aos currículos académicos ou em formato de estágios abertos à comunidade com capacidades em áreas adjacentes (reskilling) ou já relevantes para o setor (upskilling);
c) Identificação de experts nacionais em áreas críticas, tanto a nível teórico como aplicado, com experiência em I&D e/ou em contexto industrial, que possam providenciar contributos técnicos e prestar formação;
d) Monitorização do panorama nacional, de modo a atualizar recorrentemente o panorama de empresas, centros de investigação e unidades dedicadas à formação com atividade na área e presentes em Portugal. Detalhar o tipo de atividade, área concreta, dimensão, entre outros parâmetros relevantes, que possam ser continuamente utilizados pelas entidades competentes para uma melhor organização, estruturação e financiamento das atividades nacionais;
e) Estabelecimento de grupos de trabalho que revejam regularmente as necessidades da indústria, facilitando a rápida deteção de oportunidades de colaboração entre empresas do setor e instituições de ensino portuguesas, aumentando a probabilidade de identificação de interesses comuns para o lançamento de programas de investimento conjunto, fortalecendo assim o ecossistema e ampliando a visibilidade da área no meio académico, para uma maior mobilização e atração de talento;
f) Promoção das áreas da microeletrónica e semicondutores ao nível do ensino primário e secundário, através de pequenos projetos e demonstrações práticas, cativando desde cedo o interesse dos jovens para este setor;
g) Apoio de atividades na área da microeletrónica e semicondutores, auxiliando as empresas e o meio académico a desenvolver e/ou integrar tecnologias nos seus processos;
h) Apoio às entidades nacionais competentes na procura de investidores e competências locais existentes;
i) Representação a nível nacional como ponto de acesso à rede europeia de Centros de Competências no domínio da microeletrónica e semicondutores, auxiliando as empresas e/ou as entidades académicas nacionais a obterem apoio de outros centros europeus, caso as competências necessárias não se enquadrem nas suas áreas de especialização. Formar ainda um ponto de ligação com os Polos de Inovação Digital (DIH) ou com outros ecossistemas de inovação relevantes e já existentes, tanto a nível nacional como internacional. Utilização desses mesmo canais para fomentar o intercâmbio de peritos;
j) Prestação de serviços que facilitem o acesso e utilização das Linhas Piloto europeias, permitindo a criação de protótipos e a experimentação de tecnologias inovadoras, atribuindo-lhes um maior potencial de comercialização a custos reduzidos;
k) Prestação de serviços que facilitem o acesso à Plataforma de Design europeia, proporcionando formação e desenvolvimento de competências para a sua eficaz utilização;
l) Promoção, apoio e organização do acesso a instalações internacionais de fabricação de chips, para agregação e execução de projetos (tape-out) ágil e eficiente;
m) Promoção do acesso ao Chips Fund, facilitando o acesso a capital de risco;
n) Criação e organização de workshops técnicos, fóruns de discussão e outras iniciativas que reúnam regularmente o ecossistema internacional em Portugal;
o) Sensibilização da comunidade, através da promoção das ferramentas criadas ao nível nacional e oportunidades de colaboração e financiamento europeu e internacional relevantes, da promoção de serviços e tecnologia desenvolvida em Portugal e da promoção de histórias de sucesso.
Ao nível da formação avançada, entidades nacionais poderão já beneficiar do programa da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I. P. (FCT, I. P.), que promove doutoramentos em ambiente não académico, através de parcerias entre empresas e universidades. Os estudantes de doutoramento que participam no programa têm a oportunidade de receber formação avançada em ambientes académicos e industriais, acrescendo a esta experiência um benefício salarial, suportado pela FCT, I. P., e pela entidade não académica colaboradora. Simultaneamente, as entidades não académicas envolvidas na iniciativa beneficiam da atração de talentos de topo, que, ao acolherem investigadores com elevado perfil científico, podem abordar problemas específicos com um nível de inovação significativo. Além disso, as entidades académicas envolvidas no programa desempenharão um papel crucial na solidificação e no reforço das colaborações, cujo envolvimento assegura a transferência efetiva de conhecimento e tecnologia para o ambiente empresarial.
Por último, identificadas as áreas já presentes e a expandir em Portugal, será feito um reforço nas parcerias estratégicas com entidades de ensino internacionais, cujas valências sejam complementares às existentes em Portugal, levando a uma transferência de conhecimento direcionada, ao nível da investigação fundamental e de desenvolvimento de novos processos e tecnologias com impacto industrial.
Eixo 2 - Expansão do ecossistema nacional de desenho de chips e encapsulamento avançado
A análise dos setores de desenho de chips e encapsulamento avançado em Portugal revelaram pontos chave a reforçar, que assegurarão o crescimento do ecossistema português nestes dois setores.
Nas últimas décadas, várias empresas diretamente ligadas ao setor da microeletrónica e semicondutores foram criadas em Portugal, fruto do trabalho desenvolvido em universidades e centros de investigação, culminando numa panóplia de produtos de grande impacto a nível internacional e da atração de capital de risco internacional, crucial para o lançamento de novas empresas que permitam o desenvolvimento económico e impulsionem a próxima vaga de sistemas microeletrónicos. A qualidade do ecossistema tem ainda levado à aquisição de startups e PME portuguesas por multinacionais, sendo este um bom indicador da qualidade dos engenheiros nacionais e do trabalho desenvolvido em instituições de ensino, laboratórios associados e unidades de investigação, levando, no entanto, a uma transferência do conhecimento desenvolvido em Portugal para empresas estrangeiras.
No enquadramento do Eixo 1, fomentar a produção de talento nacional altamente qualificado em design de chips, tecnologias front-end e back-end em nós mais avançados, prototipagem, encapsulamento avançado e teste de chips, é um elemento crucial desta Estratégia. Assim, mediante as necessidades já expostas pelo ecossistema português, estima-se que, nos próximos 5 a 10 anos, o reforço das competências destas áreas estratégicas a nível nacional se traduza num aumento do número de engenheiros em 10 a 20 vezes na área do desenho de chips, e de 2 a 3 vezes na área de encapsulamento avançado e teste, sendo crucial recorrer ao leque de ferramentas apontadas no Eixo 1.
Adicionalmente, no que respeita ao desenho de chips, as empresas envolvidas enfrentam dificuldades relativas ao acesso a capital de risco, que acaba por limitar as suas perspetivas de crescimento, em particular no que toca ao suporte do elevado custo de ferramentas EDA, que permite o desenho e teste de novos chips. Neste sentido, a Plataforma de Design, a ser criada a nível europeu no enquadramento do Regulamento dos Circuitos Integrados, prevê a disponibilização de um conjunto de ferramentas críticas e bibliotecas de PI a empresas europeias, providenciadas colaborativamente por um consórcio de organizações internacionais relevantes.
Neste sentido, para além das responsabilidades atribuídas no Eixo 1, o centro de competências nacional deverá promover ainda as seguintes ações, que se preveem cruciais para suportar o crescimento do ecossistema de desenho de chips em Portugal:
a) Facilitar o acesso a ferramentas EDA, via Plataforma de Design, criando um ponto de conexão entre entidades portuguesas e autoridades gestoras da plataforma;
b) Facilitar o acesso a serviços de prototipagem e de ensaio de pequenos volumes de produção através da infraestrutura europeia existente, bem como novas Linhas Piloto noutros Estados-Membros a serem desenvolvidas no enquadramento do Regulamento dos Circuitos Integrados;
c) Aconselhar novas empresas em fase de arranque neste setor, mediando a sua necessidade de capital e fatores operacionais, junto das autoridades nacionais relevantes;
d) Promover atividades no âmbito de soluções customizáveis de software e hardware baseados na arquitetura de instruções de código aberto RISC-V.
Quanto à área de encapsulamento avançado, as capacidades desenvolvidas em Portugal encontram-se bem enquadradas com a estratégia europeia, permitindo um apoio crucial ao número crescente de iniciativas europeias de fabricação de chips, previstas no âmbito do Regulamento dos Circuitos Integrados. Enfatiza-se aqui que, estando previsto um aumento considerável da capacidade de produção de chips a nível europeu, a ausência de plataformas industriais de encapsulamento, assemblagem e teste acabarão por limitar a resiliência europeia, particularmente numa área que, como mencionado anteriormente, se encontra vastamente presente na Ásia.
Nesse sentido, adicionam-se ao campo de ação do centro de competências os seguintes pontos:
a) Facilitar parcerias estratégicas com empresas europeias e internacionais no domínio do encapsulamento avançado, assemblagem e teste de dispositivos, promovendo as capacidades atuais e futuramente presentes em Portugal;
b) Promover a conexão entre as atividades back-end em Portugal e atividades das Linhas Piloto a nível europeu, em particular, no âmbito de projetos ligados ao encapsulamento heterogéneo e tecnologia chiplet.
No enquadramento da colaboração com Espanha, bem como do recente anúncio de investimento da empresa Broadcom em Espanha, destinado a uma operação em larga escala para produção de dispositivos semicondutores, prevê-se um aumento da concentração de processos back-end na península ibérica, solidificando assim a posição estratégica portuguesa nesta área.
Eixo 3 - Aumento da transferência tecnológica em áreas emergentes
No enquadramento das atividades organizadas pela Comissão Europeia no âmbito da definição de projetos emergentes a nível europeu, com capacidade de escalar tecnologia do laboratório para um contexto de produção, Portugal sinalizou quatro vertentes estratégicas, enquadradas em novos projetos e linhas piloto dedicadas a circuitos fotónicos integrados, à cointegração de tecnologias emergentes, à eletrónica flexível e sustentável, e à produção de sensores de nova geração em larga escala.
a) Linha Piloto para Circuitos Fotónicos Integrados
A eletrónica e a fotónica desempenham papéis cruciais no panorama europeu de investigação, desenvolvimento e inovação, com um leque de aplicações relevantes, como conetividade, computação de alto desempenho, segurança, saúde, mobilidade, espaço e eletrónica de consumo. Os PIC (circuitos integrados fotónicos) contribuíram significativamente para o progresso da fotónica integrada, permitindo a incorporação de tecnologias ligadas à eletrónica, fotónica e ótica passiva em sistemas compactos, com o potencial de trazer grandes benefícios para as indústrias e setores europeus em várias áreas de aplicação. Uma Linha Piloto dedicada a circuitos integrados fotónicos visa enfrentar os seguintes desafios de integração:
Computação de alto desempenho: Interligações óticas e soluções óticas para paradigmas de computação emergentes, como a computação neuromórfica e quântica;
Proteção e segurança: Monitorização do estado de infraestruturas civis e de infraestruturas críticas, como pontes, túneis, centrais elétricas e condutas;
Deteção e automatização industrial: Sensores fotónicos miniaturizados e sistemas de imagiologia para medição da composição, espessura, forma, rugosidade, distâncias, velocidades, temperaturas e pressões em ambientes industriais;
Saúde e bem-estar: Imagiologia ótica médica, biossensores fotónicos e monitorização contínua da saúde para deteção precoce de doenças e monitorização da progressão fora das instalações médicas;
Mobilidade e espaço: Deteção ambiental avançada, essencial para a condução autónoma e a prevenção de acidentes;
Eletrónica de consumo: Integração de tecnologias fotónicas em sistemas de realidade virtual ou aumentada, para experiências de consumo melhoradas.
O desenvolvimento desta Linha Piloto prevê um novo enquadramento com o objetivo de reforçar o ecossistema europeu de investigação, desenvolvimento e inovação nas áreas da microeletrónica e fotónica, complementando as iniciativas existentes em Portugal, nomeadamente a Agenda da Microeletrónica, enquadrada no PRR.
Adicionalmente, esta Linha Piloto prevê uma forte integração com a Linha Piloto proposta a nível europeu na área da integração heterogénea, bem como com outras Linhas Piloto adjacentes que possam vir a ser criadas, especificamente para plataformas de fabrico baseadas em materiais como InP, SiP e SiN, com um novo ecossistema correspondente de desenho de chips fotónicos e encapsulamento, assemblagem e teste.
b) Linha Piloto para a cointegração de tecnologias emergentes
As tecnologias de micro e nanofabricação complementares às tecnologias CMOS (Complementary Metal-Oxide-Semiconductor) standard existentes representam uma importante via para a transição de investigação fundamental para dispositivos inovadores. A criação de uma Linha Piloto para a cointegração de plataformas tecnológicas emergentes complementares beneficiará uma vasta gama de agentes industriais, incluindo empresas que desenvolvem dispositivos inovadores, proporcionando ainda uma via direta para a exploração e transição de projetos de investigação para um contexto de produto.
Ao alargar drasticamente a gama de novas funcionalidades e princípios de funcionamento em relação aos disponíveis nos dispositivos convencionais CMOS, a cointegração destas tecnologias emergentes proporcionará meios para enfrentar vários desafios em termos de escala, energia, arrefecimento, ruído e outros obstáculos práticos encontrados no desenvolvimento de hardware emergente, tanto ao nível de computação como para sensores e outros dispositivos. Neste âmbito, o teste e validação destas tecnologias figura-se um passo crucial para a sua futura implementação. No entanto, muitas delas têm requisitos de fabrico, ou utilizam materiais que são incompatíveis com os processos convencionais CMOS atuais.
Uma Linha Piloto dedicada à cointegração de tecnologias emergentes prevê a criação de uma nova plataforma tecnológica, que inclui a cointegração de componentes nas áreas da fotónica, spintrónica, memristores, materiais 2D, MEMS, bem como outras funcionalidades e materiais não convencionais. Nestes novos dispositivos, um ou mais elementos têm obrigatoriamente de ser integrados com tecnologias atuais CMOS, podendo esta cointegração ser monolítica, por exemplo, em estruturas híbridas, ou através de cointegração física, via encapsulamento heterogéneo ou chiplets.
A Linha Piloto poderá beneficiar das infraestruturas de acesso livre já existentes em Portugal e na UE, proporcionando uma plataforma essencial para o teste e validação destas novas tecnologias e aplicações disruptivas, podendo ser explorada por investigadores, startups, PME altamente inovadoras e grandes empresas que necessitam de desenvolver novos processos com elevado rendimento e uniformidade.
c) Linha Piloto para Eletrónica Flexível e Sustentável
Uma Linha Piloto dedicada à eletrónica flexível e sustentável tem por objetivo enfrentar os principais desafios relacionados com o desenvolvimento e a síntese adequada para a utilização de «materiais responsáveis», abundantes, recicláveis e não tóxicos, explorando processos e tecnologias à nanoescala, compatíveis com baixo consumo de energia. Num novo paradigma para lá dos processos convencionais de silício, convencionalmente com requisitos energéticos e de investimento elevados, novas tecnologias atuais permitem considerar materiais e processos alternativos que melhor servem a conceção de vários tipos de aplicações. No entanto, existem ainda desafios no que toca à heterogeneidade destes processos, levando a uma importância acrescida relativa à simulação e conceção de novas técnicas de fabrico.
Assim, a realização de tecnologias à base de eletrónica flexível e sustentável exige novos substratos, bem como novos materiais biocompatíveis e biodegradáveis para o seu encapsulamento, que garantam uma redução do impacto ambiental da indústria eletrónica, para além de abrirem novas aplicações em áreas como a eletrónica implantável e eletrónica em vestuário. O desenvolvimento de materiais para componentes ativos inclui ainda tintas extensíveis, imprimíveis, condutoras e isolantes, bem como a sua hibridização com circuitos integrados convencionais.
Esta Linha Piloto abrange ainda o desenvolvimento de sistemas inovadores, utilizando sensores miniaturizados, materiais não tóxicos e moduláveis de alta densidade. Estes sistemas visam, entre outras aplicações, a captação de energia através de diferentes fontes, explorando materiais com um desempenho superior, que possam aprimorar a capacidade de dispositivos de armazenamento de energia.
d) Linha Piloto para fabricação de sensores em larga escala
Os sensores avançados desempenham um papel fundamental no panorama tecnológico moderno, proporcionando uma maior precisão, facilitando a aquisição de dados em tempo real e melhorando a eficiência operacional de processos, sendo a sua importância relevante para diversos setores industriais, incluindo setor automóvel, energético e de manufatura, transportes e cidades inteligentes, cuidados de saúde, monitorização ambiental, entre outros. O resultado é um impacto transformador nos processos, sistemas e serviços, promovendo a inovação, melhorando a tomada de decisões e otimizando a utilização de recursos.
Uma Linha Piloto para o desenvolvimento da capacidade de fabricação de sensores à escala de bolacha estabelece um importante avanço que colmata a procura crescente de tecnologias de ponta nesta área. Com o aumento da procura deste tipo de dispositivos nos mais variados setores, a necessidade de infraestruturas de produção fiável e eficiente torna-se fundamental. Para além de proporcionar capacidade de execução de produção de soluções tecnológicas que sirvam as necessidades atuais e futuras do mercado, o conceito desta Linha Piloto serve ainda um propósito intermediário crucial, entre a investigação e a produção, constituindo uma plataforma inestimável para investigadores e engenheiros avaliarem a viabilidade da produção de sensores a larga escala, assegurando a relação custo-eficácia, a otimização do rendimento e a integração de técnicas de fabrico inovadoras. O desenvolvimento desta área e capacidade de execução subjacente resulta ainda num aumento das competências técnicas em Portugal, promovendo a inovação e assegurando uma vantagem nacional competitiva no panorama tecnológico global.
ANEXO II
(a que se referem os n.os 4 e 5)
Ano | Montante (Em euros) | |||
---|---|---|---|---|
PT (Em Euros) | UE | |||
Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I. P. | ANI - Agência Nacional de Inovação, S. A. | Montante total | ||
2024... | 5 342 000 | 33 931 000 | 39 273 000 | 69 515 000 |
2025... | 5 225 000 | 30 977 000 | 36 202 000 | 63 463 000 |
2026... | 4 718 000 | 18 139 000 | 22 857 000 | 37 162 000 |
2027... | 4 715 000 | 18 069 000 | 22 784 000 | 37 018 000 |
Total... | 15 282 000 | 101 116 000 | 121 116 000 | 207 158 000 |
117212098