de 8 de julho
Sumário: Define os princípios de atuação e deveres das entidades gestoras (EG), as regras aplicáveis aos cadernos de especificações e às menções tradicionais e as regras de utilização e comercialização dos produtos com direito a denominação de origem (DO) e indicação geográfica (IG) do setor vitivinícola.
Os regimes de qualidade na União Europeia (UE), nomeadamente os produtos com denominação de origem ou indicação geográfica protegida (DO/IG), constituem uma das mais importantes políticas públicas de promoção do desenvolvimento e da competitividade dos territórios rurais, sendo um dos pilares da diferenciação e competitividade do setor agroalimentar europeu, gerando mais-valias para os produtores, onde a credibilidade e notoriedade junto dos consumidores constituem um pressuposto base para o alcançar.
O Decreto-Lei 61/2020, de 18 de agosto, procedeu à revisão do regime da organização institucional do setor vitivinícola, que disciplina o reconhecimento, proteção e controlo das denominações de origem (DO) e indicações geográficas (IG) dos vinhos, vinagres, bebidas espirituosas de origem vínica e produtos vitivinícolas aromatizados, bem como o regime de reconhecimento das organizações interprofissionais (OI), estabelecendo os princípios gerais aplicáveis à organização do referido setor.
Torna-se, assim, necessário estabelecer as normas complementares referentes aos princípios de atuação e deveres das entidades gestoras, de forma a uniformizar e clarificar os procedimentos e as regras relativos ao conselho geral, com um conjunto de indicadores comuns onde se destaca a inclusão do conceito de atividade principal de modo a permitir uma adequada definição de produção e comércio e contribuir para clarificar a aplicação do estabelecido no artigo 11.º do Decreto-Lei 61/2020, de 18 de agosto.
Por sua vez também é necessário definir as normas complementares relativas aos cadernos de especificações e menções tradicionais e às regras de utilização e comercialização dos produtos com direito a DO e IG do setor vitivinícola, bem como esclarecer o reconhecimento e a proteção nacional das DO e IG e a designação das EG.
Acerca dos cadernos de especificações, estes constituem o documento principal para regulamentar a produção e o comércio das DO e IG, devendo os restantes procedimentos aplicáveis constar nas regras administrativas complementares das respetivas entidades gestoras.
Por último, no que concerne às menções tradicionais protegidas, estas constituem menções de rotulagem associadas às DO e IG, usufruindo de idêntica proteção. Estas menções representam uma mais-valia na comunicação ao consumidor quanto às características associadas aos produtos, pelo que importa definir de forma clara o processo de reconhecimento e proteção, por forma a evitar a proliferação e banalização destas menções.
Assim:
Manda o Governo, pelo Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, no uso das competências delegadas nos termos da subalínea iv) da alínea a) do n.º 3 do Despacho 203/2021, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 4, de 7 de janeiro de 2021, o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
A presente portaria define os princípios de atuação e deveres das entidades gestoras (EG), as regras aplicáveis aos cadernos de especificações e às menções tradicionais e as regras de utilização e comercialização dos produtos com direito a denominação de origem (DO) e indicação geográfica (IG) do setor vitivinícola.
Artigo 2.º
Princípios de atuação das EG
A atuação das EG é exercida com respeito, nomeadamente, pelos seguintes princípios:
a) Princípio da transparência, consubstanciado no dever de informação aos operadores das decisões tomadas em matéria de gestão e controlo das DO e IG, incluindo o plano de controlo, as fichas de verificação técnica e as deliberações do conselho geral;
b) Princípio da colaboração com as autoridades competentes, exercendo as competências que lhe venham a ser delegadas e submetendo-se aos procedimentos de apreciação prévia e de supervisão ou de auditoria.
Artigo 3.º
Comunicações obrigatórias
1 - As EG devem informar obrigatoriamente ao Instituto da Vinha e do Vinho, I. P. (IVV, I. P.), os seguintes atos:
a) As ações judiciais relacionadas com a proteção jurídica das DO e IG;
b) A composição dos órgãos sociais das EG;
2 - As EG devem notificar previamente ao Instituto da Vinha e do Vinho, I. P. (IVV, I. P.), os estatutos e respetivas alterações e o regulamento eleitoral dos órgãos das EG.
3 - Os atos das EG referidos no n.º 1 do presente artigo não dependem de pronúncia do IVV, I. P., e devem ser remetidos no prazo de 30 dias.
4 - Nos atos das EG referidos no n.º 2 do presente artigo, o IVV, I. P., pronuncia-se no prazo de 30 dias pelo deferimento, pelo convite ao aperfeiçoamento ou pelo indeferimento liminar.
5 - Decorrido o prazo previsto no número anterior sem que ocorra pronúncia do IVV, I. P., os atos são tacitamente deferidos.
6 - Tendo sido proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento, o requerente dispõe de um prazo máximo de 60 dias para corrigir ou completar o processo, sob pena de indeferimento liminar.
7 - São ainda deveres das EG:
a) Efetuar o registo da adesão à DO ou IG dos operadores e das respetivas explorações e instalações no Sistema de Informação da vinha e do vinho (SIvv) gerido pelo IVV, I. P., ou em suportes informáticos que permitam a total interoperabilidade;
b) Comunicar ao IVV, I. P., até ao dia 30 de abril de cada ano, o orçamento, o plano e o relatório de atividades e contas de cada exercício, bem como o relatório anual de execução do plano de controlo do ano anterior.
Artigo 4.º
Cadernos de especificações
1 - Sem prejuízo do procedimento previsto no quadro legal da União Europeia, no caderno de especificações deve constar, pelo menos:
a) O nome da DO ou da IG;
b) A descrição elencada dos produtos vitivinícolas:
i) No que diz respeito à DO, as principais características analíticas e organoléticas;
ii) No que diz respeito à IG, as principais características analíticas, bem como uma avaliação ou indicação das suas características organoléticas;
c) Se for caso disso, as práticas enológicas específicas utilizadas para a produção dos produtos vitivinícolas;
d) A demarcação da zona geográfica em causa;
e) O rendimento máximo por hectare;
f) Uma indicação da casta ou castas de uva de vinho a partir das quais o ou os produtos vitivinícolas são obtidos;
g) A identificação do organismo certificador (OC) ao qual compete verificar a observância das disposições do caderno de especificações;
h) As regras restritivas em matéria de produção ou de comércio, desde que sejam objetivas, não discriminatórias e compatíveis com o direito da União e nacional;
i) As regras e os respetivos procedimentos de avaliação em matéria de apresentação e rotulagem, incluindo:
i) Menções reguladas ao nível nacional ou da UE;
ii) Designações de rotulagem não protegidas ao nível nacional ou da UE, mas de aplicação harmonizada apenas no seio da DO ou IG.
2 - Das regras administrativas complementares aos cadernos de especificações devem ainda constar o elenco das seguintes obrigações e procedimentos:
a) As obrigações dos operadores em matéria de inscrição das suas explorações e instalações;
b) Os procedimentos de autocontrolo que devem ser seguidos pelos operadores;
c) Os registos internos e demais informações relevantes para efeitos da realização dos controlos físicos e administrativos, a prestar à EG ou ao OC;
d) As regras e obrigações em matéria de circulação e documentação de acompanhamento;
e) Os procedimentos inerentes à cobrança de taxas e outros encargos devidos à EG ou ao OC.
3 - O caderno de especificações só deve incluir regras, procedimentos ou obrigações que sejam verificáveis e que constem do respetivo plano de controlo oficial associado à certificação.
4 - Qualquer restrição ao engarrafamento fora da região delimitada deve estar devidamente fundamentada no caderno de especificações, nomeadamente quando existir uma forte reputação associada ao local onde as operações têm lugar ou a necessidade de preservar a qualidade dos produtos, devendo ser demonstrado o risco de degradação da reputação da DO ou IG ou dos parâmetros físico-químicos e organoléticos relacionados com os requisitos do produto ou de segurança alimentar.
5 - As modificações aos cadernos de especificações e às regras administrativas complementares requeridas pelas EG, nos termos do artigo 7.º, n.º 6, do Decreto-Lei 61/2020, de 18 de agosto, requerem deliberação por maioria dos votos presentes dos interesses profissionais representados no conselho geral e são avaliadas e aprovadas pelo IVV, I. P.
6 - As modificações aos cadernos de especificações requeridas por quem demonstre ter interesse legítimo na produção dos produtos, nos termos do artigo 7.º, n.º 6, do Decreto-Lei 61/2020, de 18 de agosto, são avaliadas e aprovadas pelo IVV, I. P., mediante parecer prévio da respetiva EG.
7 - Qualquer regra, procedimento ou obrigação estipulada em violação dos números anteriores é nula.
Artigo 5.º
Reconhecimento das menções tradicionais
1 - As menções tradicionais do setor vitivinícola são reconhecidas e extintas por portaria do membro do governo responsável pela área da agricultura, mediante procedimento nacional preliminar.
2 - Os pedidos de reconhecimento de menções tradicionais carecem de fundamentação quanto à sua real necessidade e contributo para uma significativa valorização dos produtos e proteção dos interesses dos consumidores e, quando aplicável, quanto à necessidade de obter a proteção ao nível da UE.
3 - O reconhecimento e a proteção preliminar podem ser requeridos, ao IVV, I. P., exclusivamente pelas seguintes entidades:
a) Pela EG da respetiva DO ou IG, quando a proteção for requerida exclusivamente para esses produtos, os designativos de rotulagem constarem do caderno de especificações e estarem em uso há mais de três anos e ser demonstrado que, no espírito dos consumidores, existe uma associação exclusiva e inequívoca à DO ou IG.
b) Por duas ou mais entidades gestoras, quando a proteção for requerida para grupos de DO ou IG, cumpridas as regras da alínea anterior.
4 - Para garantir condições de concorrência equitativas e melhorar a informação ao consumidor, o IVV, I. P., pode definir regras comuns de utilização das menções tradicionais protegidas aplicáveis a duas ou mais DO ou IG.
Artigo 6.º
Utilização e comercialização das DO ou IG
1 - A DO ou a IG só pode ser utilizada em produtos do setor vitivinícola que respeitem a regulamentação vitivinícola aplicável e tenham sido certificados pelo respetivo OC, devendo figurar na rotulagem, consoante os casos e sem prejuízo do disposto na regulamentação europeia, as seguintes menções:
a) «Denominação de Origem Protegida», «Denominação de Origem Controlada», «DOC», «Denominação de Origem» ou «D.O.»;
b) «Indicação Geográfica Protegida», «Indicação Geográfica», «I.G.», «Vinho Regional» ou «Vinho da Região de».
2 - Os produtos certificados e pré-embalados só podem ser introduzidos no consumo exibindo o selo de garantia definido pela EG e publicado na 2.ª série do Diário da República, sendo numerados sequencialmente para permitir um controlo adequado.
3 - A EG não pode colocar restrições adicionais à utilização da marca Wines Of Portugal (WOP), na rotulagem dos produtos certificados.
4 - Os nomes das DO e IG e respetivas sub-regiões e as menções tradicionais que entrem na composição de uma marca associada a produtos vitivinícolas, bem como as menções a que se refere o n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei 61/2020, de 18 de agosto, não são considerados de uso exclusivo dos seus titulares.
5 - Os operadores cujos produtos satisfaçam todos os requisitos previstos nos cadernos de especificações não podem ser impedidos de utilizar a DO ou IG nesses produtos, salvo em consequência de medidas cautelares determinadas pelo OC ou decisões de condenação proferidas no âmbito de processos decorrentes da prática de infração.
Artigo 7.º
Conselho geral da entidade gestora
1 - As entidades a que reporta a alínea a) do n.º 4 do artigo 11.º do Decreto-Lei 61/2020, de 18 de agosto, devem refletir nos seus estatutos a representação dos interesses profissionais ligados à produção e/ou ao comércio dos produtos do setor vitivinícola.
2 - O presidente do conselho geral deve fixar um prazo para que as entidades referidas no artigo 11.º, n.º 4, do Decreto-Lei 61/2020, de 18 de agosto concorram ao conselho geral, devendo estas fornecer os seguintes elementos:
a) Cópia da certidão permanente atualizada ou o seu código de acesso informático, ou cópia da escritura de constituição e das eventuais alterações estatutárias;
b) Cópia da ata de eleição dos órgãos sociais para o mandato em curso;
c) Cartão de pessoa coletiva;
d) Indicação do interesse profissional que pretendem representar;
e) A listagem dos respetivos sócios ou associados, inscritos na EG, em suporte informático e que inclua os respetivos nomes ou designações sociais e números de contribuinte fiscal;
f) Balanços e relatórios de atividade comprovativos dos últimos três anos, devidamente aprovados pela assembleia geral.
3 - De forma a garantir a representação paritária, transparente, objetiva e não discriminatória do conselho geral da EG, os operadores económicos devem ser representados no conselho geral de acordo com a sua atividade principal.
4 - No caso de dois ou mais operadores económicos que estejam sujeitos a uma influência comum, porque um participa no outro, ou nos demais ou porque todos eles se subordinam à orientação de um deles ou de uma terceira entidade, estes devem ser representados de acordo com a atividade principal da sua junção, exceto quando o operador económico tenha uma atividade principal diferente da junção, sendo que, nesse caso, pode optar pela sua atividade principal, que não é aferida para efeitos da representatividade da junção.
5 - A atividade principal será aferida tendo em conta a média dos últimos três anos da produção de uvas aptas a DO e IG, de acordo com as respetivas declarações de colheita e produção (produção) e a média dos últimos três anos em litros do produto certificado introduzido no consumo, contabilizados de acordo com os selos de certificação (comércio), devendo ser excluídos os produtos desclassificados até à primeira venda.
6 - Considera-se como atividade principal a que representa os valores mais elevados, na proporção de que a 1 kg de uvas correspondem 0,75 l de vinho.
7 - Sem prejuízo do previsto no n.º 2, o presidente do conselho geral deve solicitar os elementos necessários para aferir o cumprimento dos números anteriores.
Artigo 8.º
Avaliação
No âmbito do estabelecido no artigo 23.º do Decreto-Lei 61/2020, de 18 de agosto, compete ao IVV, I. P., acompanhar, avaliar e tomar as medidas corretivas necessárias sobre a constituição e representatividade plasmada no conselho geral das EG.
Artigo 9.º
Reconhecimento das organizações interprofissionais do setor vitivinícola
O pedido de reconhecimento como OI a que reporta o n.º 2 do artigo 15.º do Decreto-Lei 61/2020, de 18 de agosto, é efetuado mediante deliberação favorável aprovada por maioria qualificada de dois terços.
Artigo 10.º
Reconhecimento e proteção nacional das DO e IG, das menções tradicionais e designação das EG
As DO e IG vitivinícolas, as menções tradicionais e as EG reconhecidas e designadas por diplomas legais anteriores à publicação do Decreto-Lei 61/2020, de 18 de agosto, mantêm o reconhecimento e a designação respetiva, mas ficam doravante sujeitas ao regime estabelecido no referido decreto-lei e no presente diploma.
Artigo 11.º
Disposição transitória
1 - No prazo de 12 meses a contar da entrada em vigor da presente portaria, as EG devem proceder às alterações estatutárias e nomeação dos órgãos sociais em conformidade com o disposto no presente diploma.
2 - A regulamentação relativa à produção e comércio das DO e IG vitivinícolas reconhecidas por diplomas legais anteriores à publicação deste diploma mantêm a sua vigência, ficando doravante as suas alterações sujeitas ao regime estabelecido no presente diploma.
3 - Os pedidos de alteração aos cadernos de especificações ou de proteção de menções tradicionais que estejam pendentes de decisão seguem os procedimentos instituídos pela presente portaria, devendo os requerentes proceder à sua adaptação em conformidade.
Artigo 12.º
Entrada em vigor
A presente portaria entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
O Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, Rui Manuel Costa Martinho, em 1 de julho de 2021.
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