de 21 de Abril
1. A publicação da legislação penal e de mera ordenação social sobre comportamentos ilícitos que materialmente se inscrevem no âmbito das actividades próprias das sociedades comerciais decorre da ampla reforma centrada no Código das Sociedades Comerciais (CSC).Escalonou-se o processo legislativo em duas fases distintas. Disse a primeira respeito à legislação comercial primária, fundamentalmente integrada no Código.
Tem a segunda a ver com a legislação penal e de mera ordenação social, agora publicada, e com alguma legislação de carácter adjectivo, em curso de preparação.
2. Não se pode dizer que seja nova, ou sequer recente, a necessidade de editar normas penais sobre matéria da vida das sociedades comerciais. É, no entanto, nova a expressão dessa necessidade. Tradicionalmente, as questões penais postas pelas actividades comerciais eram objecto de tratamento nos quadros genéricos do direito penal, por aplicação de normas sobre tipos clássicos de crime, como a burla, a infidelidade, a falsificação, o abuso de confiança. No que fosse tão específico da vida mercantil que extravasasse declaradamente da regulamentação do direito punitivo geral recorria o legislador a disposições de âmbito muito limitado, como as referentes à falência fraudulenta, às infracções contabilísticas, à usura ou às burlas de seguros.
A ideia de um direito penal das sociedades como ramo (ou sub-ramo) especializado do direito punitivo só nos últimos tempos veio a surgir.
3. Põe, no entanto, a sua concretização sensíveis problemas de política criminal.
Desde logo deve estar presente, com particular dominância, o princípio da culpa.
Dele advém não ser admissível que os destinatários das normas penais sejam surpreendidos com medidas punitivas a que não correspondam intuições ético-jurídicas preexistentes na consciência colectiva. A função própria do direito penal não é a de introduzir normas primárias, mas a de punir comportamentos cuja ilicitude e cuja reprovação sejam já acolhidas pela generalidade dos destinatários das normas. Não pode, pois, o direito penal ser pervertido em instrumento de políticas económicas e sociais inovadoras, reformas institucionais e programas de conformação das relações jurídicas segundo modelos novos.
Ora, por assim ser, o direito penal das sociedades deverá confinar-se - salvo os casos não problemáticos de tutela de certas disposições reguladoras da boa ordem dos negócios, previamente ditadas pela lei primária - à punição de comportamentos que sejam já objecto de uma reprovação muito intensa e inequívoca da comunidade.
Quanto a comportamentos menos intensa ou menos inequivocamente reprovados, deve o legislador aguardar o amadurecimento da consciência moral da comunidade e a formação de regras de conduta aceites no meio social com um mínimo de generalidade e de espontaneidade.
Entretanto, e por outro lado, um direito penal especial, ou sectorial, não deve constituir-se à margem do direito penal comum; neste encontram expressão e racionalização as intuições ético-jurídicas básicas da comunidade e muitas das regras de vida mais profundamente interiorizadas pela maioria dos cidadãos. Os direitos punitivos especiais devem ser concebidos como subsistemas do direito penal comum, dele fundamentalmente emanados, numa preocupação de coerência global do sistema.
4. É deste quadro de princípios que se parte para um primeiro passo no direito penal das sociedades. Ele envolve uma decisão de autolimitação, que encara como necessárias e justas certas restrições que até poderão parecer lacunas de punibilidade. Cumpre, porém, aguardar a condensação no tecido social de critérios de conduta mais reconhecíveis pela generalidade dos agentes económicos.
Outro critério de autolimitação dimanou do reconhecimento das dificuldades de ordem prática que se opõem à imediata observância de certas disposições inovadoras do CSC. Acresce que nem sempre os princípios neste introduzidos se encontram já suficientemente especificados por regras instrumentais de interpretação, aplicação e processo. Aliás, muitas dessas regras não poderão sequer ser fixadas por via legislativa; terão de ser deixadas à formação espontânea de usos, deontologias e técnicas específicas das diversas actividades. Deverá o legislador aguardar a constituição dessas regras e práticas, antes de poder decidir da necessidade de recorrer ou não a sanções penais.
Estas condicionantes, a par de óbvias razões de justiça, subjazem também à decisão de estabelecer no presente diploma uma dupla vacatio legis, com prazos distintos para as infracções criminais e para os ilícitos de mera ordenação social.
5. A definição dos tipos de crime e a graduação das penas seguem de perto o sistema do Código Penal (CP). Na definição dos tipos de crime serviram de modelo os correspondentes tipos comuns daquele Código, ou, na falta de um género, os tipos comuns de crime que, quer sob o ponto de vista da acção e das circunstâncias da acção, quer sob o dos valores e interesses lesados, apresentam maiores afinidades com o comportamento considerado. Tais modelos transparecem claramente do articulado e poderão constituir guia seguro da ulterior elaboração jurisprudencial. Do mesmo modo, a graduação das penas aplicáveis pautou-se pelo catálogo das sanções que para aqueles crimes são cominadas no CP. Só em casos muito contados se encontrarão divergências, e essas sempre confinadas a limites estreitos.
Quando existe agravação, ainda que em termos tão moderados, ela é justificada por fortes razões de justiça e de política criminal, que têm a ver com circunstâncias específicas da vida das sociedades.
O modelo mais utilizado na graduação das penas aplicáveis foi recebido da incriminação geral da infidelidade, constante do artigo 319.º do CP. Trata-se de uma escolha que se justifica pelas analogias existentes entre a infidelidade e a maioria dos ilícitos compendiados no presente diploma.
6. A preocupação de acompanhar o sistema do CP apontou para cuidado particular na definição de tipos de crime que em algum aspecto constituam inovação ou ampliação relativamente ao tipos comuns. Assim nos casos previstos nos artigos 518.º, 519.º, 520.º, 524.º e 525.º Procurou-se conservar nestas incriminações sem correspondência directa no CP, além da indispensável precisão de linguagem, uma ligação global à estrutura das incriminações clássicas, de modo que o labor da jurisprudência encontre ainda orientação e suporte bastantes no sistema dos conceitos e princípios do direito penal comum.
Será de assinalar que estas disposições, como as demais com análoga repercussão na vida das empresas, partem de uma intencionalidade pedagógica:
pretendem contribuir para a consolidação na vida económica de regras e hábitos de correcção e de ética empresarial. Isto, no entanto, sem produzir inibições e desincentivos, que resultariam moralmente injustos e economicamente desastrosos, da capacidade de iniciativa e do pressuposto de confiança dos empresários. Daí, designadamente, preceitos como os do n.º 4 do artigo 518.º e o do n.º 5 do artigo 519.º 7. Assim:
No uso da autorização legislativa conferida pelo artigo 1.º da Lei 41/86, de 23 de Setembro, o Governo decreta, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º É introduzido no Código das Sociedades Comerciais (CSC), aprovado pelo Decreto-Lei 262/86, de 2 de Setembro, o seguinte articulado, que ficará a constituir o seu título VII:
Disposições penais
Artigo 509.º
Falta de cobrança de entradas de capital
1 - O gerente, administrador ou director de sociedade que omitir ou fizer omitir por outrem actos que sejam necessários para a realização de entradas de capital será punida com multa até 60 dias.
2 - Se o facto for praticado com intenção de causar dano, material ou moral, a algum sócio, à sociedade, ou a terceiro, a pena será de multa até 120 dias, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal.
3 - Se for causado dano grave, material ou moral, e que o autor pudesse prever, a algum sócio que não tenha dado o seu assentimento para o facto, à sociedade, ou a terceiro, a pena será a da infidelidade.
Artigo 510.º
Aquisição ilícita de quotas ou acções
1 - O gerente, administrador ou director de sociedade que, em violação da lei, subscrever ou adquirir para a sociedade quotas ou acções próprias desta, ou encarregar outrem de as subscrever ou adquirir por conta da sociedade, ainda que em nome próprio, ou por qualquer título facultar fundos ou prestar garantias da sociedade para que outrem subscreva ou adquira quotas ou acções representativas do seu capital, será punido com multa até 120 dias.
2 - Com a mesma pena será punido o gerente, administrador ou director de sociedade que, em violação da lei, adquirir para a sociedade quotas ou acções de outra sociedade que com aquela esteja em relação de participações recíprocas ou em relação de domínio.
Artigo 511.º
Amortização de quota não liberada
1 - O gerente de sociedade que, em violação da lei, amortizar, total ou parcialmente, quota não liberada será punido com multa até 120 dias.2 - Se for causado dano grave, material ou moral, e que o autor pudesse prever, a algum sócio que não tenha dado o seu assentimento para o facto, à sociedade, ou a terceiro, a pena será a da infidelidade.
Artigo 512.º
Amortização lícita de quota dada em penhor ou que seja objecto de usufruto
1 - O gerente de sociedade que, em violação da lei, amortizar ou fizer amortizar, total ou parcialmente, quota sobre a qual incida direito de usufruto ou de penhor, sem consentimento do titular deste direito, será punido com multa até 120 dias.
2 - Com a mesma pena será punido o sócio titular da quota que promover a amortização ou para esta der o seu assentimento, ou que, podendo informar do facto, antes de executado, o titular do direito de usufruto ou de penhor, maliciosamente o não fizer.
3 - Se for causado dano grave, material ou moral, e que o autor pudesse prever, ao titular do direito de usufruto ou de penhor, a algum sócio que não tenha dado o seu assentimento para o facto, ou à sociedade, a pena será a da infidelidade.
Artigo 513.º
Outras infracções às regras da amortização de quotas ou acções
1 - O gerente de sociedade que, em violação da lei, amortizar ou fizer amortizar quota, total ou parcialmente, e por modo que, à data da deliberação, e considerada a contrapartida da amortização, a situação líquida da sociedade fique inferior à soma do capital e da reserva legal, sem que simultaneamente seja deliberada redução do capital para que a situação líquida se mantenha acima desse limite, será punido com multa até 120 dias.
2 - Com a mesma pena será punido o administrador ou director de sociedade que, em violação da lei, amortizar ou fizer amortizar acção, total ou parcialmente, sem redução de capital, ou com utilização de fundos que não possam ser distribuídos aos accionistas para tal efeito.
3 - Se for causado dano grave, material ou moral, e que o autor pudesse prever, a algum sócio que não tenha dado o seu assentimento para o facto, à sociedade, ou a terceiro, a pena será a da infidelidade.
Artigo 514.º
Distribuição ilícita de bens da sociedade
1 - O gerente, administrador ou director de sociedade que propuser à deliberação dos sócios, reunidos em assembleia, distribuição ilícita de bens da sociedade será punido com multa até 60 dias.
2 - Se a distribuição ilícita chegar a ser executada, no todo ou em parte, a pena será de multa até 90 dias.
3 - Se a distribuição ilícita for executada, no todo ou em parte, sem deliberação dos sócios, reunidos em assembleia, a pena será de multa até 120 dias.
4 - Com a mesma pena será punido o gerente, administrador ou director de sociedade que executar ou fizer executar por outrem distribuição de bens da sociedade com desrespeito de deliberação válida de assembleia social regularmente constituída.
5 - Se, em algum dos casos previstos nos n.os 3 e 4, for causado dano grave, material ou moral, e que o autor pudesse prever, a algum sócio que não tenha dado o seu assentimento para o facto, à sociedade, ou a terceiro, a pena será a da infidelidade.
Artigo 515.º
Irregularidade na convocação de assembleias sociais
1 - Aquele que, competindo-lhe convocar assembleia geral de sócios, assembleia especial de accionistas ou assembleia de obrigacionistas, omitir ou fizer omitir por outrem a convocação nos prazos da lei ou do contrato social, ou a fizer ou mandar fazer sem cumprimento dos prazos ou das formalidades estabelecidos pela lei ou pelo contrato social, será punido com multa até 30 dias.
2 - Se tiver sido presente ao autor do facto, nos termos da lei ou do contrato social, requerimento de convocação de assembleia que devesse ser deferido, a pena será de multa até 90 dias.
3 - Se for causado dano grave, material ou moral, e que o autor pudesse prever, a algum sócio que não tenha dado o seu assentimento para o facto, à sociedade, ou a terceiro, a pena será a da infidelidade.
Artigo 516.º
Perturbação de assembleia social
1 - Aquele que, com violência ou ameaça de violência, impedir algum sócio ou outra pessoa legitimada de tomar parte em assembleia geral de sócios, assembleia especial de accionistas ou assembleia de obrigacionistas, regularmente constituída, ou de nela exercer utilmente os seus direitos de informação, de proposta, de discussão ou de voto, será punido com pena de prisão até dois anos e multa até 180 dias.2 - Se o autor do impedimento, à data do facto, for membro de órgão de administração ou de fiscalização da sociedade, o limite máximo da pena será, em cada uma das espécies, agravado de um terço.
3 - Se o autor do impedimento for, à data do facto, empregado da sociedade e tiver cumprido ordens ou instruções de algum dos membros dos órgãos de administração ou de fiscalização, o limite máximo da pena será, em cada uma das espécies, reduzido a metade, e o juiz poderá, consideradas todas as circunstâncias, atenuar especialmente a pena.
4 - A punição pelo impedimento não consumirá a que couber aos meios empregados para o executar.
Artigo 517.º
Participação fraudulenta em assembleia social
1 - Aquele que, em assembleia geral de sócios, assembleia especial de accionistas ou assembleia de obrigacionistas, se apresentar falsamente como titular de acções, quotas, partes sociais ou obrigações, ou como investido de poderes de representação dos respectivos titulares, e nessa falsa qualidade votar, será punido, se pena mais grave não for aplicável por força de outra disposição legal, com prisão até seis meses e multa até 90 dias.
2 - Se algum dos membros dos órgãos de administração ou fiscalização da sociedade determinar outrem a executar o facto descrito no número anterior, ou auxiliar a execução, será punido como autor, se pena mais grave não for aplicável por força de outra disposição legal, com prisão de três meses a um ano e multa até 120 dias.
Artigo 518.º
Recusa ilícita de informações
1 - O gerente, administrador ou director de sociedade que recusar ou fizer recusar por outrem a consulta de documentos que a lei determine sejam postos à disposição dos interessados para preparação de assembleias sociais, ou recusar ou fizer recusar o envio de documentos para esse fim, quando devido por lei, ou enviar ou fizer enviar esses documentos sem satisfazer as condições e os prazos estabelecidos na lei, será punido, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal, com prisão até três meses e multa até 60 dias.2 - O gerente, administrador ou director de sociedade que recusar ou fizer recusar por outrem, em reunião de assembleia social, informações que esteja por lei obrigado a prestar, ou, noutras circunstâncias, informações que por lei deva prestar e que lhe tenham sido pedidas por escrito, será punido com multa até 90 dias.
3 - Se, no caso do n.º 1, for causado dano grave, material ou moral, e que o autor pudesse prever, a algum sócio que não tenha dado o seu assentimento para o facto, ou à sociedade, a pena será a da infidelidade.
4 - Se, no caso do n.º 2, o facto for cometido por motivo que não indicie falta de zelo na defesa dos direitos e dos interesses legítimos da sociedade e dos sócios, mas apenas compreensão errónea do objecto desses direitos e interesses, o autor será isento da pena.
Artigo 519.º
Informações falsas
1 - Aquele que, estando nos termos deste Código obrigado a prestar a outrem informações sobre matéria da vida da sociedade, as der contrárias à verdade, será punido com prisão até três meses e multa até 60 dias, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal.2 - Com a mesma pena será punido aquele que, nas circunstâncias descritas no número anterior, prestar maliciosamente informações incompletas e que possam induzir os destinatários a conclusões erróneas de efeito idêntico ou semelhante ao que teriam informações falsas sobre o mesmo objecto.
3 - Se o facto for praticado com intenção de causar dano, material ou moral, a algum sócio que não tenha conscientemente concorrido para o mesmo facto, ou à sociedade, a pena será de prisão até seis meses e multa até 90 dias, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal.
4 - Se for causado dano grave, material ou moral, e que o autor pudesse prever, a algum sócio que não tenha concorrido conscientemente para o facto, à sociedade, ou a terceiro, a pena será de prisão até um ano e multa até 120 dias.
5 - Se, no caso do n.º 2, o facto for praticada por motivo ponderoso, e que não indicie falta de zelo na defesa dos direitos e dos interesses legítimos da sociedade e dos sócios, mas apenas compreensão errónea do objecto desses direitos e interesses, poderá o juiz atenuar especialmente a pena ou isentar dela.
Artigo 520.º
Convocatória enganosa
1 - Aquele que, competindo-lhe convocar assembleia geral de sócios, assembleia especial de accionistas ou assembleia de obrigacionistas, por mão própria ou a seu mandado fizer constar da convocatória informações contrárias à verdade será punido, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal, com pena de prisão até seis meses e multa até 150 dias.2 - Com a mesma pena será punido aquele que, nas circunstâncias descritas no número anterior, fizer maliciosamente constar da convocatória informações incompletas sobre matéria que por lei ou pelo contrato social ela deva conter e que possam induzir os destinatários a conclusões erróneas de efeito idêntico ou semelhante ao de informações falsas sobre o mesmo objecto.
3 - Se o facto for praticado com intenção de causar dano, material ou moral, à sociedade ou a algum sócio, a pena será de prisão até um ano e multa até 180 dias.
Artigo 521.º
Recusa ilícita de lavrar acta
Aquele que, tendo o dever de redigir ou assinar acta de assembleia social, sem justificação o não fizer, ou agir de modo que outrem igualmente obrigado o não possa fazer, será punido, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal, com multa até 120 dias.
Artigo 522.º
Impedimento de fiscalização
O gerente, administrador ou director de sociedade que impedir ou dificultar, ou levar outrem a impedir ou dificultar, actos necessários à fiscalização da vida da sociedade, executados, nos termos e formas que sejam de direito, por quem tenha por lei, pelo contrato social ou por decisão judicial o dever de exercer a fiscalização, ou por pessoa que actue à ordem de quem tenha esse dever, será punido com prisão até seis meses e multa até 120 dias.
Artigo 523.º
Violação do dever de propor dissolução da sociedade ou redução do capital
O gerente, administrador ou director de sociedade que, verificando pelas contas de exercício estar perdida metade do capital, não der cumprimento ao disposto no artigo 35.º, n.os 1 e 2, deste Código será punido com prisão até três meses e multa até 90 dias.
Artigo 524.º
Abuso de informações
1 - Aquele que, sendo membro de órgão de administração, fiscalização ou liquidação de sociedade anónima, revelar ilicitamente a outrem factos relativos à sociedade aos quais não tenha sido dada previamente publicidade, e que sejam susceptíveis de influir no valor dos títulos por ela emitidos, será punido com prisão até seis meses e multa até 120 dias.2 - Com a mesma pena será punido aquele que, sendo membro de órgão de administração ou de órgão de fiscalização de sociedade anónima, revelar ilicitamente a outrem factos relativos à fusão desta com outras sociedades, aos quais não tenha sido dada previamente publicidade, e que sejam susceptíveis de influírem no valor dos títulos das sociedades que participarem na fusão, ou de sociedades que com elas estejam em relação de domínio.
3 - Se o facto for cometido com intenção de causar dano, material ou moral, a algum sócio que para o mesmo não concorrer conscientemente, à sociedade, ou a terceiro, a pena será de prisão até um ano e multa até 150 dias.
4 - Aquele que revelar ilicitamente a outrem factos de que haja tomado conhecimento em razão de serviço permanente ou temporário prestado à sociedade, ou por ocasião dele, ocorrendo quanto aos factos revelados as circunstâncias descritas nos n.os 1 e 2, será punido com prisão até três meses e multa até 90 dias.
Artigo 525.º
Manipulação fraudulenta de cotações de títulos
1 - O administrador, director ou liquidatário de sociedade que, mediante simulação de subscrição ou de pagamento, difusão pública de notícias falsas ou qualquer outro artifício fraudulento, der causa a que aumente ou diminua a cotação de acções ou de obrigações, ou de outros títulos com cotação na bolsa, emitidos pela sociedade, ou para o mesmo fim receber ou tentar receber, pessoalmente ou por outrem, subscrição ou pagamento de título, será punido com prisão até seis meses e multa até 120 dias.
2 - Se o facto for praticado com intenção de causar dano, material ou moral, a algum sócio que para o mesmo facto não concorrer conscientemente, à sociedade, ou a terceiro, a pena será de prisão até um ano e multa até 150 dias.
3 - O administrador, director ou liquidatário que, tendo conhecimento de factos praticados por outrem nas circunstâncias e para os fins descritos no n.º 1, omitir ou fizer omitir por outrem as diligências que forem convenientes para evitar os seus efeitos será punido, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal, com prisão até três meses e multa até 90 dias.
Artigo 526.º
Irregularidades na emissão de títulos
O administrador ou director de sociedade que apuser, fizer apor, ou consentir que seja aposta, a sua assinatura em títulos, provisórios ou definitivos, de acções ou obrigações emitidos pela sociedade ou em nome desta, quando a emissão não tenha sido aprovada pelos órgãos sociais competentes, ou não tenham sido realizadas as entradas mínimas exigidas por lei, será punido com prisão até um ano e multa até 150 dias.
Artigo 527.º
Princípios comuns
1 - Os factos descritos nos artigos anteriores só serão puníveis quando cometidos com dolo.2 - Será punível a tentativa dos factos para os quais tenha sido cominada nos artigos anteriores pena de prisão ou pena de prisão e multa.
3 - O dolo de benefício próprio, ou de benefício de cônjuge, parente ou afim até ao 3.º grau, será sempre considerado como circunstância agravante.
4 - Se o autor de um facto descrito nos artigos anteriores, antes de instaurado o procedimento criminal, tiver reparado integralmente os danos materiais e dado satisfação suficiente dos danos morais causados, sem outro prejuízo ilegítimo para terceiros, esses danos não serão considerados na determinação da pena aplicável.
Artigo 528.º
Ilícitos de mera ordenação social
1 - O gerente, administrador ou director de sociedade que não submeter, ou por facto próprio impedir outrem de submeter, aos órgãos competentes da sociedade, até ao fim do terceiro mês do ano civil, o relatório da gestão, as contas do exercício e os demais documentos de prestação de contas previstos na lei, e cuja apresentação lhe esteja cometida por lei ou pelo contrato social, ou por outro título seja seu dever, será punido com coima de 10000$00 a 300000$00.2 - A sociedade que omitir em actos externos, no todo ou em parte, as indicações referidas no artigo 171.º deste Código será punida com coima de 50000$00 a 300000$00.
3 - A sociedade que, estando a isso legalmente obrigada, não mantiver livro de registo de acções nos termos da legislação aplicável, ou não cumprir pontualmente as disposições legais sobre registo e depósito de acções, será punida com coima de 100000$00 a 10000000$00.
4 - O accionista que, estando a isso legalmente obrigado, não cumprir as disposições legais sobre registo e depósito de acções será punido com coima de 5000$00 a 200000$00.
5 - Aquele que estiver legalmente obrigado às comunicações previstas nos artigos 447.º e 448.º deste Código e as não fizer nos prazos e formas da lei será punido com coima de 5000$00 a 200000$00, e, se for membro de órgão de administração ou de fiscalização, com coima de 10000$00 a 300000$00.
6 - Nos ilícitos previstos nos números anteriores será punível a negligência, devendo, porém, a coima ser reduzida em proporção adequada à menor gravidade da falta.
7 - Na graduação da pena serão tidos em conta os valores do capital e do volume de negócios das sociedades, os valores das acções a que diga respeito a infracção e a condição económica pessoal dos infractores.
8 - A organização do processo e a decisão sobre aplicação da coima caberão ao conservador do registo comercial territorialmente competente na área da sede da sociedade.
Artigo 529.º
Legislação subsidiária
1 - Aos crimes previstos neste Código são subsidiariamente aplicáveis o Código Penal e legislação complementar.2 - Aos ilícitos de mera ordenação social previstos neste Código é subsidiariamente aplicável o regime geral do ilícito de mera ordenação social.
Art. 2.º O actual título VII do CSC, aprovado pelo Decreto-Lei 262/86, de 2 de Setembro, passa a ter a designação «Título VIII», e os artigos 509.º a 524.º passam a ser, respectivamente, os artigos 530.º a 545.º Art. 3.º São revogados os artigos 35.º, 38.º, 39.º e 40.º do Decreto-Lei 408/82, de 29 de Setembro, na parte em que sejam incompatíveis com o disposto no artigo 528.º introduzido pelo presente diploma no CSC.
Art. 4.º - 1 - As disposições penais dos artigos 509.º a 527.º, inclusive, do CSC, na redacção que agora lhes é dada, entram em vigor 30 dias após a publicação do presente diploma.
2 - As disposições sobre ilícitos de mera ordenação social do artigo 528.º do CSC, na redacção que agora a este preceito é dada, entram em vigor um ano após a publicação do presente diploma.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 19 de Março de 1987. - Aníbal António Cavaco Silva - Miguel José Ribeiro Cadilhe - Mário Ferreira Bastos Raposo - Fernando Augusto dos Santos Martins.
Promulgado em 7 de Abril de 1987.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 8 de Abril de 1987.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.