Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 181/2019
Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional:
I - Relatório
1 - O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional requereu, nos termos do disposto no artigo 82.º da Lei 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), a organização de um processo, a tramitar nos termos do processo de fiscalização abstrata sucessiva da constitucionalidade, para apreciação da constitucionalidade da norma do n.º 4 do artigo 21.º da Tabela de Taxas, Licenças e Outras Receitas Municipais que consta do Anexo I ao Regulamento 364/2012, de 11 de junho, do Município de Oeiras, com o sentido de que o metro cúbico de «armazenamento de produtos de petróleo (depósitos subterrâneos)» situado em propriedade privada é tributado no valor mensal de 5,09 euros. O requerente afirma que esta norma foi julgada inconstitucional no Acórdão 379/2018, tirado em Plenário, tendo tal juízo sido reiterado pelo Acórdão 568/2018 e pelas Decisões Sumárias n.os 548/2018, 569/2018, 572/2018 e 730/2018. Todas as decisões transitaram em julgado.
2 - Notificada para, querendo, se pronunciar sobre o pedido, nos termos dos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da LTC, a Senhora Presidente da Mesa da Assembleia Municipal de Oeiras não o fez, tendo apenas informado os autos de que havia remetido a notificação para o Senhor Presidente da Câmara Municipal de Oeiras.
3 - Foi discutido em Plenário o memorando previsto no artigo 63.º da LTC, fixando-se a orientação do Tribunal sobre as questões a resolver no âmbito do presente processo. Cabe agora decidir em conformidade com o que então se deliberou.
II - Fundamentação
4 - Segundo o disposto no n.º 3 do artigo 281.º da Constituição, o Tribunal Constitucional aprecia e declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade ou a ilegalidade de qualquer norma que tenha sido por ele julgada inconstitucional em três casos concretos. Este preceito é reproduzido e densificado pelo artigo 82.º da LTC, que determina pertencer a iniciativa a qualquer dos juízes do Tribunal Constitucional ou ao Ministério Público, devendo promover-se a organização de um processo com as cópias das correspondentes decisões, o qual é concluso ao Presidente, seguindo-se os termos do processo de fiscalização abstrata sucessiva da constitucionalidade.
Os pressupostos de admissibilidade do pedido de generalização previsto no artigo 82.º da LTC são a legitimidade do requerente e o facto de a norma cuja declaração de inconstitucionalidade é requerida ter sido julgada inconstitucional em pelo menos três casos concretos. Ambos os pressupostos se verificam nos presentes autos. O pedido foi formulado pelo representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional e a norma cuja declaração de inconstitucionalidade é requerida foi julgada inconstitucional no Acórdão 379/2018, tirado em Plenário, tendo tal juízo sido reiterado pelo Acórdão 568/2018 e pelas Decisões Sumárias n.os 569/2018, 572/2018 e 730/2018, e ainda, com uma fórmula decisória abreviada, mas num juízo substancialmente idêntico, pela Decisão Sumária n.º 548/2018. Todas as decisões transitaram em julgado.
5 - A questão de constitucionalidade colocada nos presentes autos é a de saber se o tributo de 5,09 euros por mês incidente sobre o metro cúbico de «armazenamento de produtos de petróleo (depósitos subterrâneos)» situado em propriedade privada, nos termos do n.º 4 do artigo 21.º da Tabela de Taxas, Licenças e Outras Receitas Municipais do Município de Oeiras (referida adiante pela sigla «TTMO»), constitui uma verdadeira taxa, legitimamente criada ao abrigo da Lei 53-E/2006, de 29 de dezembro (Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais, referido adiante pela sigla «RGTAL») ou se, pelo contrário, não constituindo uma taxa, invade a reserva de lei parlamentar consagrada nos artigos 103.º, n.º 3 e 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição.
A taxa é um tipo de tributo que se caracteriza, nas palavras do Acórdão 539/2015, por ser uma «prestação pecuniária e coativa, exigida por uma entidade pública, em contrapartida de prestação administrativa efetivamente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo, assumindo uma natureza sinalagmática.» A prestação administrativa em contrapartida da qual o respetivo beneficiário ou causador é tributado pode traduzir-se - lê-se aí - «na prestação de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares (artigo 4.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária).»
O tributo em causa nos presentes autos não pode seguramente ser concebido como contrapartida da utilização de um bem do domínio público, na medida em que incide, de modo idêntico, sobre depósitos de armazenamento subterrâneo de combustíveis localizados no domínio público ou em propriedade privada; na verdade, não distinguindo, quanto à incidência objetiva, entre propriedade privada do município e propriedade privada do sujeito passivo, não pode sequer ser concebido como contrapartida da utilização de um bem municipal no mais amplo sentido possível do termo. Resta saber se o tributo pode ser caracterizado como contrapartida de uma outra modalidade de prestação administrativa efetivamente aproveitada ou provocada pelo sujeito passivo, como seja a prestação de um serviço público ou a remoção de um obstáculo jurídico.
6 - No Acórdão 316/2014, tirado em Plenário no âmbito de um recurso de constitucionalidade, o Tribunal Constitucional pronunciou-se sobre a natureza de um tributo municipal incidente sobre equipamentos de abastecimento de combustíveis líquidos instalados em propriedade privada, tendo concluído que o mesmo se situava ainda dentro dos limites do conceito constitucional de taxa.
Para fundamentar tal juízo, articulou argumentos alternativos.
Por um lado, o de que o tributo podia ser caracterizado como contrapartida de uma atividade administrativa gerada pela instalação de postos de abastecimento de combustíveis, ainda que em propriedade privada, em virtude do dever permanente e específico de fiscalização dos postos de abastecimento de combustíveis imposto pela lei aos municípios. Segundo esta perspetiva, o tributo constituía contrapartida de um serviço público provocado pelo sujeito passivo, que se traduzia numa pluralidade de prestações administrativas cuja efetividade pode ser presumida a partir do dever legal dos municípios de fiscalização da atividade que aquele exerce:
«Atento o dever legal permanente e específico de fiscalização dos postos de abastecimento de combustíveis - das instalações e equipamentos e do respetivo funcionamento e utilização - previsto no artigo 25.º do Decreto-Lei 267/2002, de 26 de novembro, com referência ao "Regulamento de Construção e Exploração de Postos de Abastecimento de Combustíveis", imposto às câmaras municipais, não se afigura razoável exigir que estas, para poderem cobrar uma taxa, tenham de fazer prova de todas e de cada uma das ações realizadas em cumprimento de tal dever. Certo é que o cumprimento deste dever - e a responsabilidade associada à sua existência - não está na disponibilidade dos municípios. É a lei que exige a ação continuada de vigilância com carácter preventivo, sem prejuízo de ações pontuais e formais de fiscalização (...). Esta ação continuada de vigilância corresponde ao cumprimento de lei imperativa e traduz o "funcionamento normal do serviço". E a imposição do dever funcional correspondente - um dever de vigilância - traduz-se na assunção de certa responsabilidade. É assim que o Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei 67/2007, de 31 de dezembro, prevê no seu artigo 10.º, n.º 3, a presunção de culpa leve - que é condição suficiente da responsabilidade exclusiva do ente público - "sempre que tenha havido incumprimento de deveres de vigilância".
Em suma, o dever legal de fiscalização dos postos de abastecimento de combustíveis por parte das câmaras municipais cria uma presunção suficientemente forte no sentido de que a simples localização daqueles postos em determinada circunscrição concelhia é causa de uma atividade de vigilância e de ações de prevenção por parte do município correspondente, não só para dar cumprimento à lei, como principalmente para evitar que os riscos quanto à segurança de pessoas e bens, os riscos para a saúde pública e os riscos ambientais associados à existência e funcionamento daquelas instalações se materializem. (...).
Aliás, estes sabem bem e à partida que, por força da lei, a existência de postos de abastecimento de combustíveis "não localizados nas redes viárias regional e nacional" obriga os municípios em cuja circunscrição se localizem a uma ação de vigilância permanente, de modo a verificar o cumprimento permanente dos requisitos técnicos específicos desse tipo de instalações, e que vão para além das vistorias previstas e inspeções periódicas. Com efeito, a fiscalização prevista no artigo 25.º do Decreto-Lei 267/2002, de 26 de novembro, não se esgota nas ações previstas no artigo 22.º do mesmo diploma nem se confunde com o cumprimento do dever geral de polícia. Assim, tal ação fiscalizadora pode ser tida como efetivamente provocada (e, em certo sentido, também aproveitada) apenas pelos proprietários dessas instalações, justificando-se, por conseguinte, o pagamento de uma compensação.
Na verdade, conforme referido no artigo 3.º do RGTAL, "as taxas das autarquias locais são tributos que assentam na prestação concreta de um serviço público local". No caso vertente é razoável e forte a presunção, feila a partir da natureza dos postos de abastecimento de combustíveis e dos deveres legais de fiscalização que incumbem às câmaras municipais (factos indiciários), da existência de uma atividade de vigilância permanente por parte dos serviços camarários dirigida àquele tipo de instalações e ao seu modo de funcionamento. (...).
A implantação dos mesmos postos "inteiramente" em propriedade privada ou em terrenos do domínio público municipal é, para este efeito, irrelevante, já que os riscos e a vigilância legalmente exigida são idênticos nas duas situações. O que releva é o tipo de instalação e não a natureza privada ou pública onde a mesma se encontra implantada. Mais: essa atividade de vigilância é, pela peculiaridade dos requisitos técnicos que visa controlar, exclusivamente imputável às ditas instalações. Nos municípios em que não se localizem lais postos de abastecimento [ou instalações de armazenamento de combustíveis], não há lugar a tal ação de vigilância».
Por outro lado, o Tribunal entendeu que o tributo podia ser caracterizado como contrapartida da permissão do exercício da atividade de exploração de postos de abastecimento de combustíveis, em virtude da qual o município se obriga perante o sujeito passivo a tolerar uma atividade que interfere a título permanente no gozo de determinados bens públicos, como o ambiente, o urbanismo, o ordenamento do território ou a gestão do tráfego. Segundo esta perspetiva, baseada no Acórdão 177/2010, que caracterizou como taxa um tributo incidente sobre a afixação de painéis publicitários em propriedade privada, o tributo constituía a contrapartida da remoção de um obstáculo jurídico à atividade exercida pelo sujeito passivo, através da qual o município se vinculava a uma prestação administrativa de facto negativo:
«Considerando conjuntamente todos estes aspetos, a interrogação que se pode formular é a de saber se um município, obrigado a suportar permanentemente no seu espaço público interferências decorrentes de uma atividade económica sujeita a procedimentos públicos de licenciamento previstos em legislação especial e igualmente aplicável à Administração municipal e à Administração central, que, todavia, não considera nem faz relevar tais impactes negativos para efeitos de fixação das taxas aplicáveis, pode, por sua iniciativa, e em ordem à prossecução das suas atribuições nos domínios afetados pela atividade licenciada, tributá-la, tomando como referência as licenças previamente atribuídas. Noutros termos: será que a "remoção do obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares" a que se refere o artigo 3.º do RGTAL, como pressuposto das taxas, é necessariamente específico de uma dada taxa, ou pode ser comum e, por conseguinte, valer para outras taxas conexionadas com dimensões da atividade licenciada não consideradas na fixação da taxa que remove o obstáculo jurídico em causa?
(...).
No Acórdão 177/2010 este Tribunal entendeu que "a constituição da obrigação passiva de se conformar com essa influência modeladora é justamente a contrapartida específica que dá causa ao pagamento da taxa, estruturando, em termos bilaterais, a relação estabelecida com o obrigado tributário". Mas, como mencionado pelo Tribunal Central administrativo Sul, também aí se considerou que "findo o prazo para o qual tinha sido concedida a remoção da proibição do exercício da atividade publicitária, torna-se necessário proceder à reavaliação da situação, do ponto de vista da permanência das condições legais de licenciamento, o que justifica a cobrança de uma nova prestação tributária. Essa reavaliação é um pressuposto da continuidade da fruição, por um novo período, das utilidades propiciadas por tal atividade, no que o particular se mostra interessado. Não faz sentido, atenta essa relação causal, distinguir o licenciamento da sua renovação, ou a contrapartida devida pelo período inicial das que são exigíveis pelos períodos de renovação da licença. Assim como, noutra dimensão problemática, não há razões para considerar a taxa de publicidade consumida por anteriores quantias devidas para a realização de outros trâmites de que eventualmente depende a utilização de edifícios privados para fins publicitários".
Ora, a grande diferença no caso sujeito é que a taxa a aplicar nos termos do artigo 70.º, n.º 1, 1.1, da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra para 2008 pressupõe já o benefício da remoção do obstáculo jurídico, isto é, a licença de exploração de postos de abastecimento de combustíveis. O que aquela taxa vem valorar é, no quadro de tal licenciamento, aspetos ainda nele não considerados, uma vez que o licenciamento em causa é determinado por lei especial que não tem de tomar em linha de consideração a especificidade dos interesses municipais. Será que, por ser assim, fica a taxa do artigo 70.º, n.º 1, 1.1, desprovida de uma estrutura bilateral?
A resposta deve ser negativa, uma vez que o licenciamento dos postos de abastecimento de combustíveis nos termos do Decreto-Lei 267/2002, de 26 de novembro, removendo embora um obstáculo jurídico, não toma - e, em rigor, nem pode tomar, atento o princípio da autonomia das autarquias locais - em consideração a obrigação passiva do Município de Sintra de se conformar com a influência modeladora da atividade licenciada. E este deve ser o aspeto decisivo: existe um comportamento sujeito a licenciamento que constitui aquele Município numa dada obrigação de suportar impactes negativos da atividade licenciada que pura e simplesmente não são considerados na licença. E a taxa em causa é a contrapartida específica de tal obrigação passiva. Não ocorre dupla tributação, uma vez que a mesma obrigação pura e simplesmente não é considerada nas taxas a pagar por ocasião da emissão ou renovação da licença. Também aqui deve valer a ideia de que as taxas do Decreto-Lei 267/2002, de 26 de novembro não consomem a taxa do artigo 70.º, n.º 1, 1.1, da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra para 2008, uma vez que se reportam a contrapartidas diferentes.»
7 - O Acórdão 316/2014 constitui o «marco geodésico» do conceito de taxa na jurisprudência constitucional. Nesse aresto, acolheram-se dois alargamentos significativos do conceito tradicional de taxa.
Por um lado, admitiu-se que a prestação de um serviço público possa ser presumida a partir de um dever legal específico e permanente de fiscalização da atividade tributada. A este respeito, importa notar que as prestações administrativas em que se traduz a observância de tal dever de fiscalização não correspondem a atos ou comportamentos especificamente previstos na lei - como a apreciação do pedido de licenciamento, as vistorias técnicas prévias ou posteriores ao licenciamento ou a emissão do alvará de utilização -, os quais constituem fundamentos de tributação autónoma, segundo o previsto no artigo 22.º do Decreto-Lei 267/2002, de 26 de novembro. Constituem, pelo contrário, todo o universo - residual e potencial - de atos de fiscalização praticados em observância do dever genérico imposto aos municípios pelo artigo 25.º daquele diploma. De resto, a habilitação legal invocada para a criação destes tributos sobre postos de abastecimento de combustíveis não é qualquer disposição do Decreto-Lei 267/2002, de 26 de novembro, mas o artigo 6.º do RGTAL, que delimita as categorias de incidência objetiva das taxas municipais.
Por outro lado, o Tribunal admitiu, na linha do decidido no Acórdão 177/2010, que a mera inação administrativa em face de uma atividade que interfere no gozo de determinados bens públicos - como o ambiente, o urbanismo, o ordenamento do território ou a gestão do tráfego - possa consubstanciar uma contrapartida da respetiva tributação, satisfazendo o requisito, essencial ao conceito de taxa, de bilateralidade ou comutatividade. Ao fazê-lo, incluiu no domínio das taxas por remoção de um obstáculo jurídico todo o vasto conjunto das prestações de «deixar fazer» que constituem objeto das obrigações ditas de pati. Segundo este entendimento, o obstáculo jurídico removido é o direito municipal de gozo exclusivo daqueles bens, por analogia com a situação do proprietário que, mediante contrapartida pecuniária, se obriga perante terceiro a consentir na interferência no gozo do seu bem. Ou ainda com a situação do proprietário ao qual a lei impõe excecionalmente uma obrigação dessa natureza - por exemplo, caso se verifique um estado de necessidade -, ao mesmo tempo que lhe atribui o direito a uma compensação pelos prejuízos sofridos.
A aparente analogia entre o tributo municipal sobre os postos de abastecimento de combustíveis apreciado no Acórdão 316/2014 e o tributo sobre o armazenamento de produtos de petróleo (depósitos subterrâneos) no Município de Oeiras parece colocar o Tribunal na posição de ter de decidir se mantém ou repudia o alargamento do conceito tradicional de taxa preconizado naquele aresto. Porém, e como se decidiu nos Acórdãos n.os 33/2018 e 379/2018, ainda que se acolha - arguendo - um conceito alargado de taxa, no duplo sentido referido, relevantes diferenças entre os dois tributos justificam plenamente juízos divergentes quanto à sua natureza.
O tributo apreciado no Acórdão 316/2014 incidia sobre a titularidade de «equipamento de abastecimento de combustíveis líquidos», fixando um valor por cada unidade de abastecimento e um valor suplementar variável consoante os equipamentos estivessem instalados em domínio público ou em propriedade privada. O tributo criado pelo Município de Oeiras, por outro lado, insere-se numa constelação tributária em matéria de «unidades de abastecimento de combustível e tomadas de ar» que compreende vários tributos incidentes sobre diferentes parcelas ou equipamentos de um posto de abastecimento de combustíveis. O elenco desses tributos está contido no artigo 21.º da TTMO, com o seguinte teor:
Artigo 21.º
Unidades de Abastecimento de Combustível e Tomadas de Ar (Lei 53-E/2006, de 29/12, artigo 6.º)
1 - Instalados em domínio público
a) Por bomba e por mês
b) Ao disposto na alínea anterior acresce, por cada espécie de carburante, mais 50 % do valor base
c) Edifício de apoio/espaço comercial, por m2 e por ano
d) Área de lavagem, por m2 e por ano
e) Ocupação do espaço público, por m2 e por ano
2 - Instaladas em domínio privado
a) Por bomba e por mês
b) Unidades ou tomadas de ar ou água, por unidade e por mês
3 - Bombas volante, por unidade e por mês
4 - Armazenamento de produtos de petróleo (depósitos subterrâneos), por m3 e por mês
A desagregação da «unidade de abastecimento de combustível» em diversos componentes, sobre os quais incidem tributos autónomos, torna inviável a transposição para este caso dos fundamentos do Acórdão 316/2014. Com efeito, quer o dever de fiscalização municipal da atividade, quer a obrigação de suportar os respetivos inconvenientes, reportam-se necessariamente à unidade funcional constituída pelas diversas partes. O dever de fiscalização do município tem por pressuposto a instalação e por referente a operação de um posto de abastecimento de combustível, e não de qualquer parte específica do mesmo, como uma bomba, uma tomada ou um depósito. E a interferência no gozo de determinados bens públicos, nomeadamente ambientais e urbanísticos, decorre da unidade de abastecimento, sem que seja possível discernir o contributo relativo de cada componente para esse efeito. Não é absurdo presumir que os custos administrativos da fiscalização municipal e da obrigação de suportar a atividade cresçam na proporção da dimensão da unidade de abastecimento, seja ela definida em termos de área ocupada ou de número de equipamentos do mesmo tipo; mas já é arbitrária e ininteligível a segregação e quantificação de diversas partes integrantes da unidade, como seria a atribuição de importância relativa a cada família de instrumentos musicais numa orquestra sinfónica, a decomposição do preço de um bilhete de teatro pelas várias personagens da peça ou a quantificação do contributo para a saúde individual de cada um dos órgãos do corpo humano. Não há, na verdade, nenhuma prestação administrativa, ainda que meramente hipotética, específica e comprovadamente associada à componente «depósitos subterrâneos» de uma unidade de abastecimento de combustíveis. Na medida em que pretenda revestir forma comutativa, um tributo com tal incidência objetiva não pode deixar de se ter por arbitrário; a prestação administrativa não chega a ser presumida, sendo simplesmente ficcionada.
Esta conclusão é reforçada pela análise da «fundamentação económico-financeira» incluída na TTMO. Segundo a mesma, o tributo tem dois fundamentos: «o benefício obtido com a ocupação de um espaço público» e o «objetivo de racionalizar a proliferação destas ocupações».
Quanto ao primeiro - a ocupação de um espaço público -, é manifesto que não se aplica aos casos em que os equipamentos estão situados em propriedade privada (ou, pelo menos, em propriedade não-municipal), sendo certo que o regime do tributo nem sequer distingue uns e os outros casos para efeitos de determinação dos montantes a pagar. Isto, está claro, se por «espaço público» não se entender qualquer espaço, independentemente da sua titularidade, «aberto ao público»; mas tal conceito não tem qualquer conexão relevante com o de prestação administrativa aproveitada ou causada pelo sujeito passivo da relação tributária, pelo que é, por essa razão, insuscetível de traduzir a comutatividade própria das taxas.
Quanto ao segundo fundamento - a racionalização da atividade -, trata-se do que habitualmente se designa de «objetivo extrafiscal», no sentido em que um tributo é criado, não com o propósito exclusivo de angariar receita, mas com o fito de dissuadir a aquisição de determinados bens ou o ingresso em determinadas atividades reputadas indesejáveis ou lesivas de interesses difusos. Ora, um tributo cuja finalidade exclusiva é a de orientar comportamentos não é, por definição, um tributo comutativo, visto que não é cobrado como contrapartida de uma prestação administrativa aproveitada ou provocada pelo sujeito passivo.
Impõe-se, por estas razões, a conclusão de que o tributo sobre o «armazenamento de produtos de petróleo (depósitos subterrâneos)», criado pelo n.º 4 do artigo 21.º da TTMO, não constitui uma taxa.
8 - Firmada a conclusão de que o tributo aqui apreciado não é uma taxa - por lhe faltar a qualidade essencial da comutatividade -, pode o mesmo, ainda assim, constituir uma contribuição e não um imposto. De facto, encontra-se perfeitamente estabilizada na jurisprudência do Tribunal Constitucional posterior à revisão constitucional de 1997 a conceção tripartida e gradativa dos tributos públicos - por ordem decrescente de bilateralidade: taxas, contribuições e impostos -, sintetizada do seguinte modo no Acórdão 539/2015:
«O imposto constitui uma prestação pecuniária, coativa e unilateral, exigida com o propósito de angariação de receitas que se destinam à satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas, e que, por isso, tem apenas a contrapartida genérica do funcionamento dos serviços estaduais. O que permite compreender que os impostos assentem essencialmente na capacidade contributiva dos sujeitos passivos, revelada através do rendimento ou da sua utilização e do património (artigo 4.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária). A taxa constitui uma prestação pecuniária e coativa, exigida por uma entidade pública, em contrapartida de prestação administrativa efetivamente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo, assumindo uma natureza sinalagmática. A taxa pressupõe a realização de uma contraprestação específica resultante de uma relação concreta entre o contribuinte e a Administração e que poderá traduzir-se na prestação de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares (artigo 4.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária).
A taxa tem igualmente a finalidade de angariação de receita. Mas enquanto que nos impostos esse propósito fiscal está dissociado de qualquer prestação pública, na medida em que as receitas se destinam a prover indistintamente às necessidades financeiras da comunidade, em cumprimento de um dever geral de solidariedade, nas taxas surge relacionado com a compensação de um custo ou valor das prestações de que o sujeito passivo é causador ou beneficiário. Assim, "a bilateralidade das taxas não passa apenas pelo seu pressuposto, constituído por dada prestação administrativa, mas também pela sua finalidade, que consiste na compensação dessa mesma prestação. Se a taxa constitui um tributo comutativo não é simplesmente porque seja exigida pela ocasião de uma prestação pública mas porque é exigida em função dessa prestação, dando corpo a uma relação de troca com o contribuinte" (Sérgio Vasques, em "Manual de Direito Fiscal", pág. 207, ed. de 2011, Almedina).
Entretanto, a revisão constitucional de 1997 introduziu, a propósito da delimitação da reserva parlamentar, a categoria tributária das contribuições financeiras a favor das entidades públicas, dando cobertura constitucional a um conjunto de tributos parafiscais que se situam num ponto intermédio entre a taxa e o imposto (artigo 165.º, n.º 1, alínea i)). As contribuições financeiras constituem um tertium genus de receitas fiscais, que poderão ser qualificadas como taxas coletivas, na medida em que compartilham em parte da natureza dos impostos (porque não têm necessariamente uma contrapartida individualizada para cada contribuinte) e em parte da natureza das taxas (porque visam retribuir o serviço prestado por uma instituição pública a certo círculo ou certa categoria de pessoas ou entidades que beneficiam coletivamente de um atividade administrativa) (Gomes Canotilho/Vital Moreira, em "Constituição da República Portuguesa Anotada", I vol., pág. 1095, 4.ª ed., Coimbra Editora).
As contribuições distinguem-se especialmente das taxas porque não se dirigem à compensação de prestações efetivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, mas à compensação de prestações que apenas presumivelmente são provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, correspondendo a uma relação de bilateralidade genérica. Preenchem esse requisito as situações em que a prestação poderá beneficiar potencialmente um grupo homogéneo ou um conjunto diferenciável de destinatários e aquelas em que a responsabilidade pelo financiamento de uma tarefa administrativa é imputável a um determinado grupo que mantém alguma proximidade com as finalidades que através dessa atividade se pretendem atingir (sobre estes aspetos, Sérgio Vasques, ob. cit., pág. 221, e Suzana Tavares da Silva, em "As taxas e a coerência do sistema tributário", pág. 89-91, 2.ª edição, Coimbra Editora).
Por via da nova redação dada à norma do artigo 165.º, n.º 1, alínea i), a Constituição autonomizou uma terceira categoria de tributos, para efeitos de reserva de lei parlamentar, relativizando as diferenças entre os tributos unilaterais e os tributos comutativos e obrigando a uma reformulação da discussão sobre a exigência da reserva de lei, relativamente às contribuições especiais que não se pudessem enquadrar no preciso conceito de taxa.
Como sublinha Cardoso da Costa, a este propósito, por via dessa autonomização, o teste da bilateralidade, no sentido preciso que lhe era atribuído como característica essencial do conceito de taxa, deixou de poder ser sempre decisivo para resolver os casos duvidosos ou ambíguos quanto à natureza do tributo; e deixou de poder manter-se, também, a orientação jurisprudencial que tendia a qualificar como imposto, mormente para efeito da aplicação do correspondente regime de reserva parlamentar, as receitas parafiscais que não pudessem ser qualificadas tipicamente como taxas (em "Sobre o Princípio da Legalidade das Taxas e das demais Contribuições Financeiras", in "Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Marcelo Caetano", vol. I, pág. 806-807, ed. de 2006, Coimbra Editora; sobre a jurisprudência mencionada, cf. o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 152/2013).»
Ora, atentas as diferenças de regime constitucional, em matéria de competência para a respetiva criação, entre contribuições e impostos, pode porventura pensar-se que a eventual qualificação do tributo em causa nos presentes autos como contribuição é suficiente para evitar o juízo de inconstitucionalidade da norma do n.º 4 do artigo 21.º da TTMO.
Porém, tal conclusão revela-se inexata, pelas razões aduzidas no Acórdão 848/2017, no qual o Tribunal Constitucional declarou inconstitucionais, com força obrigatória geral, as normas respeitantes à criação, pelo Município de Lisboa, da denominada Taxa Municipal de Proteção Civil.
Como se escreveu nesse aresto:
«[O] tributo em apreço encontra-se previsto exclusivamente num regulamento municipal habilitado por uma lei que apenas prevê a aprovação de taxas (o RGTAL). Deste modo, e tal como já afirmado no Acórdão 581/2012, "[...] uma vez que inexiste qualquer outro diploma legal que contenha uma habilitação genérica para a aprovação pelos municípios de outro tipo de tributos, das duas uma: ou o tributo [em análise] se pode reconduzir ao conceito de 'taxa' consagrado no citado RGTAL, e, por conseguinte, aquele preceito regulamentar não é inconstitucional; ou, diversamente, correspondendo o [mesmo] tributo a um 'imposto' ou a uma 'outra contribuição tributária com contornos paracomutativos', o mesmo preceito não poderá deixar de ser tido como incompatível com o artigo 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição [...]", designadamente por violação da reserva de lei parlamentar.
É certo que, no Acórdão 539/2015, o Tribunal afastou a existência de uma reserva de lei parlamentar relativamente a toda a matéria das contribuições ("[c]onfiguram-se assim dois tipos de reserva parlamentar: um relativo aos impostos, que abrange todos os seus elementos essenciais, incluindo a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes (artigo 103.º), outro restrito ao regime geral, que é aplicável às taxas e às contribuições financeiras, e relativamente às quais apenas se exige que o parlamento legisle ou autorize o governo a legislar sobre as regras e princípios gerais e, portanto, sobre um conjunto de diretrizes orientadoras da disciplina desses tributos que possa corresponder a um regime comum. Com esta alteração deixou de fazer qualquer sentido equiparar a figura das contribuições financeiras aos impostos para efeitos de considerá-las sujeitas à reserva da lei parlamentar, passando o regime destas a estar equiparado ao das taxas. O princípio da legalidade, relativamente às contribuições financeiras, tal como o das taxas, apenas exige que o parlamento legisle ou autorize o governo a legislar sobre as regras e princípios gerais comuns às diferentes contribuições financeiras, não necessitando de uma intervenção ou autorização parlamentar para a sua criação individualizada, enquanto que, relativamente a cada imposto, continua a exigir-se essa intervenção qualificada, a qual deve determinar a sua incidência, a sua taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes.").
Porém, o regime das finanças locais continua a ser reservado à competência legislativa da Assembleia da República (artigos 165.º, n.º 1, alínea q), e 238.º, n.os 2 e 4), verificando-se que o Regime Financeiro das Autarquias Locais e Entidades Intermunicipais (Lei 73/2013, de 3 de setembro) não prevê, sequer, as contribuições financeiras como receitas municipais - o que comprova, também por esta via, que o RGTPRML, na parte respeitante às normas em análise, e ainda que se pudesse entender que as mesmas contemplam uma contribuição financeira, teria invadido a reserva de competência da Assembleia da República.»
Segundo esta linha de argumentação, que aqui se reitera, é inútil decidir se o tributo em causa nos presentes autos constitui uma contribuição ou um imposto, na medida em que tal qualificação não interfere no juízo de que o Município de Oeiras invadiu a reserva parlamentar, viciando a norma do n.º 4 do artigo 21.º do TTMO de inconstitucionalidade orgânica.
III - Decisão
Pelo exposto, o Tribunal Constitucional decide declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, por violação do disposto no n.º 2 do artigo 103.º e na alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, da norma do n.º 4 do artigo 21.º da Tabela de Taxas, Licenças e Outras Receitas Municipais que consta do Anexo I ao Regulamento 364/2012, de 11 de junho, do Município de Oeiras, com o sentido de que o metro cúbico de «armazenamento de produtos de petróleo (depósitos subterrâneos)» situado em propriedade privada é tributado no valor mensal de 5,09 euros.
Lisboa, 20 de março de 2019. - Gonçalo Almeida Ribeiro - Maria José Rangel de Mesquita - João Pedro Caupers - Joana Fernandes Costa - Lino Rodrigues Ribeiro - José Teles Pereira - Maria de Fátima Mata-Mouros - Maria Clara Sottomayor (vencida de acordo com declaração de voto apresentada no Acórdão 379/2018) - Fernando Vaz Ventura (vencido, pelas razões exaradas no Acórdão 379/2018) - Catarina Sarmento e Castro (vencida, pelas razões constantes do Acórdão 379/2018, votei o anterior acórdão 316/2014 cujo sentido da decisão e fundamentos considero aplicáveis a esta situação) - Claudio Monteiro (vencido, conforme declaração anexa) - Pedro Machete (vencido conforme declaração junta) - Manuel da Costa Andrade (vencido nos termos da declaração de voto junta).
Declaração de voto
Votei vencido, na linha do entendimento que tenho expresso em outros acórdãos que se pronunciaram sobre o conceito constitucional de taxa, por entender que a atividade de fiscalização e prevenção de riscos implicada no controlo do armazenamento de produtos de petróleo em depósitos subterrâneos a que o município está legalmente obrigado constitui suficiente contrapartida do pagamento da taxa prevista no artigo 21.º, n.º 4 da Tabela de Taxas, Licenças e Outras Receitas Municipais do Município de Oeiras.
Acresce que também me parece inequívoco que os referidos depósitos fazem parte da universalidade de bens que integram o conceito de «posto de abastecimento de combustíveis», pelo que não vejo razão para estabelecer distinções hermenêuticas que subtraiam aqueles depósitos do âmbito de aplicação da respetiva taxa, tal como entendida no Acórdão 316/2014. - Claudio Monteiro.
Declaração de voto
Vencido, no essencial, pelas razões indicadas na declaração junta ao Acórdão 379/2018, considerando, em todo o caso, conveniente precisar alguns aspetos relacionados com o sentido e alcance da norma agora declarada inconstitucional, com força obrigatória geral.
1 - Entendo, com efeito, que a tributação específica incidente sobre «unidades de abastecimento de combustível» prevista no artigo 21.º da Tabela de Taxas, Licenças e Outras Receitas Municipais do Município de Oeiras («TTMO») não pode deixar de tomar em consideração a legislação especial que vigora sobre tal matéria, com particular destaque para o regime constante do Decreto-Lei 267/2002, de 26 de novembro.
Ora, de acordo com o conceito legal de instalações de abastecimento de combustíveis (expressão equivalente a postos de abastecimento de combustíveis), os diferentes componentes considerados no citado artigo 21.º são técnica e juridicamente indissociáveis: um equipamento ou instalação correspondente a um posto de abastecimento de combustíveis constitui uma universalidade de que fazem parte necessariamente, além das vias de acesso e de circulação e dos edifícios de apoio, as unidades de abastecimento (vulgo, «bombas de gasolina» com as respetivas mangueiras) e os reservatórios subterrâneos (cf. o artigo 3.º, alínea h), do Decreto-Lei 267/2002; v., também, o artigo 3.º, alínea b), do Decreto-Lei 87/2014, de 29 de maio). Tais instalações de abastecimento correspondem a um tipo particular de estabelecimento comercial. A atribuição de um coeficiente ou valor a cada componente para efeitos de tributação deve, por isso, ser entendida como meramente instrumental, não revestindo outro significado que não o de uma técnica utilizada para cálculo do valor total do tributo.
Assim, a interpretação do artigo 21.º da TTMO feita na presente decisão, atribuindo relevância autónoma aos diversos componentes de uma instalação de abastecimento de combustíveis enquanto bases de incidência de diferentes tributos, é puramente formal e artificial, porquanto desconsidera a unidade essencial do todo correspondente à própria instalação. Com efeito, e sem prejuízo da especificidade e diferença dos riscos associados a cada componente e, bem assim, do distinto impacto visual, urbanístico e em termos de tráfego rodoviário, certo é que a mera existência de um posto de abastecimento de combustíveis é, por si só, condição suficiente da atividade fiscalizadora, específica e permanente, a desenvolver obrigatoriamente, nos termos legais, pelos municípios e, outrossim, da interferência permanente com o gozo de bens públicos como o ambiente, o ordenamento do território, o urbanismo ou a gestão do tráfego - as duas ordens de razões, que, de acordo com a jurisprudência do Acórdão 316/2014, justificam a natureza sinalagmática da tributação municipal incidente sobre postos de abastecimento de combustíveis.
2 - Que se trata de uma questão de perspetiva e de interpretação dos dados normativos relevantes acaba por ser implicitamente reconhecido pela própria decisão, no seu n.º 7:
«Não é absurdo presumir que os custos administrativos da fiscalização municipal e da obrigação de suportar a atividade cresçam na proporção da dimensão da unidade de abastecimento, seja ela definida em termos de área ocupada ou de número de equipamentos do mesmo tipo; mas já é arbitrária e ininteligível a segregação e quantificação de diversas partes integrantes da unidade, como seria a atribuição de importância relativa a cada família de instrumentos musicais numa orquestra sinfónica, a decomposição do preço de um bilhete de teatro pelas várias personagens da peça ou a quantificação do contributo para a saúde individual de cada um dos órgãos do corpo humano. Não há, na verdade, nenhuma prestação administrativa, ainda que meramente hipotética, específica e comprovadamente associada à componente "depósitos subterrâneos" de uma unidade de abastecimento de combustíveis».
Estas considerações são exatas.
Mas, justamente por isso, o artigo 21.º da TTMO deve ser lido - e só pode sê-lo - como aquilo que pretende significar: a definição da contrapartida a pagar ao município pela sua ação fiscalizadora realizada com referência a «Unidades de Abastecimento de Combustível e Tomadas de Ar» - é esta a epígrafe do preceito em causa -, entendidas as mesmas de acordo com a legislação aplicável neste domínio, ou seja, na sua integralidade, como um todo. Consequentemente, os «depósitos subterrâneos» referidos no n.º 4 desse artigo 21.º constituem um componente necessário de tais «unidades de abastecimento», visto que fazem parte de qualquer posto de abastecimento de combustíveis.
O valor relativo de tais depósitos, para efeitos de cálculo da medida da taxa mensal aplicável à unidade de abastecimento de combustível no seu todo, que o autor da norma entendeu atribuir-lhes é fixado no referido artigo 21.º em função da respetiva capacidade, independentemente desses depósitos subterrâneos fazerem parte de unidades de abastecimento de combustível instaladas em domínio público (n.º 1) ou instaladas em domínio privado (n.º 2). Eis a justificação para a autonomização em número próprio (o n.º 4) da referência aos aludidos «depósitos subterrâneos».
Em suma, a consideração dos elementos de interpretação literal, sistemático e teleológico impõem um diferente entendimento do artigo 21.º, n.º 4, da TTMO.
3 - Acresce que, contrariamente ao que se afirma na presente decisão, a atividade fiscalizadora a desenvolver pelos municípios em relação aos postos de abastecimento de combustíveis, justamente por corresponder a um dever legal específico que o artigo 25.º do Decreto-Lei 267/2002 atribui apenas a certos municípios - aqueles em cuja circunscrição territorial se encontrem postos de abastecimento de combustíveis «não localizados nas redes viárias e nacional» (artigo 5.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei 267/2002) -, não se pode reconduzir à observância de um mero «dever genérico» nem reveste natureza «residual e potencial». Conforme referido no Acórdão 316/2014, os municípios em causa sabem bem que, por força da lei, estão obrigados a «uma ação de vigilância permanente, de modo a verificar o cumprimento permanente dos requisitos técnicos específicos desse tipo de instalações» e que vai para além, quer das vistorias previstas e inspeções periódicas, quer do cumprimento do dever geral de polícia. Aos mesmos municípios incumbe um específico dever de proteção a que vai associada a correspondente responsabilidade em caso de acidente. A aludida atividade de vigilância é, pela peculiaridade dos requisitos técnicos que visa controlar, exclusivamente imputável às ditas instalações e aos riscos associados à existência e funcionamento das mesmas. Daí considerar-se «razoável e forte a presunção, feita a partir da natureza dos postos de abastecimento de combustíveis e dos deveres legais de fiscalização que incumbem às câmaras municipais (factos indiciários), da existência de uma atividade de vigilância permanente por parte dos serviços camarários dirigida àquele tipo de instalações e ao seu modo de funcionamento».
4 - Esta necessária unidade da ação fiscalizadora correspondente à contraprestação municipal - que, por sua vez, é consequência da unidade das próprias instalações de abastecimento de combustíveis, atenta a indissociabilidade dos respetivos componentes - determina que a quantificação da tributação municipal incidente sobre tais instalações deva ser, por razões de objetividade, considerada globalmente. Não o fazer - como decidiu a maioria - implica um afastamento da realidade material que se está a considerar para efeitos de tributação. Ou seja: se a simples localização de um posto de abastecimento de combustíveis na circunscrição de um dado município obriga este último a suportar determinados custos, em termos de se estabelecer uma relação comutativa entre aquela instalação e estes custos, então o que se deverá discutir é, não a bilateralidade em si mesma - que, na linha da jurisprudência do Acórdão 316/2014, existe sempre -, mas antes a proporcionalidade ou equilíbrio entre os custos de vária ordem suportados pelo município e o custo financeiro global por este exigido ao titular do alvará do posto de abastecimento de combustíveis mediante a cobrança de uma taxa.
Deste modo, e a menos que o presente acórdão pretendesse afastar a jurisprudência do Acórdão 316/2014 - e não é isso que resulta explicitamente da sua fundamentação -, o mesmo deveria ter avaliado, do ponto de vista material, o eventual excesso da taxa (tributo) aplicável a uma «unidade de abastecimento de combustível» em resultado da consideração isolada, entre as várias componentes mencionadas no artigo 21.º da TTMO, do «armazenamento de produtos de petróleo (depósito subterrâneo)». Com efeito, ao valor parcelar correspondente a esse componente, há que somar os valores resultantes da incidência do tributo sobre outros componentes do posto de abastecimento de combustíveis autonomamente identificados nos n.os 1 a 3 do artigo 21.º da TTMO. Nessa perspetiva, o que está em causa, e importaria apreciar, é tão-somente o quantum da tributação (a medida da taxa), nomeadamente a respetiva proporcionalidade, e não a sua natureza jurídica (o tributo considerado em si mesmo, ou seja, enquanto taxa). - Pedro Machete.
Declaração de voto
Votei vencido nos termos da declaração de voto por mim apresentada e junta ao processo 379/18. - Manuel da Costa Andrade.
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