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Acórdão 505/2012, de 11 de Dezembro

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Sumário

Decidde não conhecer dos pedidos de suspensão de eficácia das deliberações tomadas pela Comissão Nacional do Partido Socialista em 31 de março e em 30 de setembro de 2012. (Processo n.º 694/12)

Texto do documento

Acórdão 505/2012

Processo 694/12

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1 - Aires Abreu Aguiar de Pedro vem, na qualidade de militante do Partido Socialista, e ao abrigo dos artigos 30.º da Lei Orgânica 2/2003, de 22 de agosto (adiante referida como "LPP"), 103.º-E da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei 28/82, de 15 de novembro, adiante referida como "LTC") e 396.º e 397.º do Código de Processo Civil, requerer "a imediata suspensão da deliberação da Comissão Nacional [do Partido Socialista] (a qual aprovou os novos Estatutos do PS em 31 de Março de 2012)" e, "por consequência lógica (atendendo que as mesmas foram aprovadas ao abrigo dos novos Estatutos ilegalmente aprovados)", também "a imediata suspensão da eficácia de todas as deliberações aprovadas pela Comissão Nacional no passado dia 30 de Setembro em reunião por ela realizada".

O requerimento é apresentado "a título preliminar", por referência à impugnação do acórdão da Comissão Nacional de Jurisdição do mesmo Partido, datado de 29 de setembro de 2012, que negou provimento ao recurso (interno) interposto da primeira das deliberações suspendendas. A petição inicial correspondente à citada ação impugnatória veio a ser apresentada na mesma data do requerimento de suspensão de eficácia, razão por que este é processado por apenso ao processo principal (Processo 695/12).

2 - O requerente fundamenta os mencionados pedidos de suspensão de eficácia de deliberações tomadas por órgão de partido político nos termos seguintes:

"1 - Em 31 de Março de 2012 realizou-se uma reunião da Comissão Nacional do PS, na qual foi aprovada douta deliberação pela qual a dita Comissão Nacional aprovou os novos Estatutos do PS que já se encontram em vigor, ao menos, desde Junho do corrente ano (cf. artigo 6 n.º 3 in fine da Lei Orgânica 212008 de 14 de Maio).

2 - Por considerar que a mesma foi ilegal e abusivamente aprovada pela referida Comissão Nacional, o aqui recorrente [sic], apresentou em 12 de Abril de 2012 recurso junto da Comissão Nacional de Jurisdição do PS, impugnando a citada deliberação.

3 - E assim procedeu atenta desde logo a sua legitimidade para o efeito, porquanto é militante do Partido Socialista desde Agosto de 1995, com o n.º 000031664, com as respectivas quotas em dia (aliás com as quotas de 2012), inscrito pela Secção concelhia da Ponta do Sol, Madeira, não tendo exercido qualquer votação na dita reunião da CN (a qual teve lugar no dia 31 03 2012) posto que nem membro é da mencionada CN, assim se verificando os legais requisitos da presente legitimidade conforme resulta do preceituado na parte final do 1.º segmento da norma do artigo 61, n.º 2, do Regulamento de Disciplina e Jurisdicional do PS aprovado em 08 de Novembro de 2003 e arts. 14, al. f), 81, n.º 1, al. b), 117, n.º 1, in fine e 120 dos referidos Estatutos, na sua versão anterior a 31 de Março de 2012.

4 - Conforme então alegou o ora recorrente, perante a Comissão Nacional de Jurisdição do PS, resulta claramente do disposto no artigo 117.º, n.º 1, in fine, que a Comissão Nacional do PS só poderá aprovar alterações aos Estatutos do PS, se e quando "... O Congresso lhe atribuir delegação de poderes para tanto, devendo em qualquer dos casos, a alteração estatutária ter sido previamente inscrita na ordem de trabalhos do Congresso", o que manifestamente ali não aconteceu.

5 - E assim não aconteceu, porquanto entendemos, contrariamente ao entendimento agora revelado pela CNJ que o Congresso do PS realizado em 09, 10 e 11 de Setembro de 2011, em especial, no dia 10 desse mesmo mês e ano, não houvera nunca concedido expresso ou tácito mandato à Comissão Nacional para em momento posterior proceder à aprovação dos novos Estatutos do PS, razão pela qual, a dita Comissão Nacional não tinha nem legitimidade nem competência estatutária para aprovar tal deliberação.

6 - Desde logo porque tal suposto mandato que ora invoca a CNJ na decisão proferida em 29 de Setembro e da qual fomos notificados em 3 de Outubro de 2012, nunca em momento algum constou da ordem de trabalhos do dito congresso, conforme facilmente se alcança da mesma (Cfr: Doe. n.º 1 que aqui se junta).

7 - Razão pela qual, o aqui recorrente invocou tempestivamente, atento o prazo de 15 dias consagrado no artigo 61 n.º 1 do Regulamento disciplinar do PS aprovado em 08 de Novembro de 2003, a óbvia e gritante ilegalidade de tal deliberação, por clara e ostensiva violação do disposto no artigo 117.º, n.º 1, in fine dos Estatutos do PS, na sua redação anterior àquela que lhe foi dada pela dita deliberação estatutariamente ilegal.

[...] 11 - Por acórdão proferido em 29 de Setembro de 2012 e do qual fomos notificados em 03 de Outubro de 2012, a identificada CNJ, órgão máximo de jurisdição do PS, julgou improcedente tal recurso, alegando em síntese duas concretas questões, a saber:

12 - Considera que o recorrente apresentou recurso intempestivo de tal deliberação, porquanto e segundo se alcança de tão douta fundamentação, "a norma invocada (artigo 61 n.º 1 do Regulamento do Partido Socialista, regulamento esse totalmente focalizado nas questões ligadas à disciplina interna do partido, regulando tudo quanto ao processo disciplinar respeita, desde a fase de instrução até às fases de julgamento e recursos de processos".

"Sendo só de disciplina que trata esse Regulamento não se pode recorrer a ele para regular situações de carácter processual ou outras que não tenham a ver com as questões disciplinares"

Mais refere o dito acórdão que "Assim, estando em causa um situação de eventual violação dos Estatutos, e tendo em conta que da decisão proferida pelo Órgão Jurisdicional do Partido que julga em última instância, cabe recurso para o Tribunal constitucional, é fonte que direito aplicável a Lei de Organização e Funcionamento do Tribunal Constitucional (Lei 28/82, de 15 de Novembro, com as alterações subsequentes) que, no Subcapítulo III intitulado "Processos Relativos a Partidos Políticos", trata das questões relativas ao contencioso partidário".

"Dispõe o n.º 7 do art. 103-C desta lei, aplicável com as necessárias adaptações ao caso concreto ex vi do n.º 3 do art. 103-D que, se os Estatutos do Partido não previrem meios internos de apreciação da validade e regularidade do acto, o prazo para a sua impugnação é de 5 dias a contar da deliberação.

13 - Pelo que doutamente conclui tal acórdão, "sendo o prazo de 5 (cinco) dias a contar da data da deliberação, e considerando as datas de reunião da Comissão Nacional (31 de Março de 2012) e a data de apresentação do recurso/impugnação (12 de Abril de 2012), é manifesto que o prazo de 5 dias foi excedido... "(fIs., 1 a 4 do aludido acórdão).

14 - Ora, não aceitamos pois tal hilariante fundamentação legal que aqui transcrevemos, porquanto e muito contrariamente ao defendido em tal acórdão, jamais o aqui recorrente poderia ter que socorrer-se dos preceitos e prazo (cinco dias) consagrados em tal diploma legal (Lei de Organização e Funcionamento do Tribunal Constitucional), para atacar tal deliberação social, porquanto:

15 - As disposições legais ali citadas, nomeadamente o artigo 103-C, n.º 7, apenas seriam aplicáveis aos presentes autos, caso efectivamente os estatutos do partido não previssem meios internos de apreciação da validade e regularidade das deliberações tomadas pelos respectivos órgãos, o que aqui não é manifestamente o caso.

16 - E não é o presente caso, justamente porque o Partido Socialista, dispõe de Regulamento disciplinar aprovado em 08 de Novembro de 2003 que não obstante tal designação (Regulamento disciplinar) facto é que a epígrafe do seu art.º 61 intitula-se "Impugnação da validade das deliberações sociais", sendo igualmente verdade, que tal artigo regulamentar, no seu n.º 1 (art.º 61 n.º 1) dispõe textualmente o seguinte:

"As deliberações e decisões tomadas pelos órgãos do Partido podem ser impugnadas com fundamento em ilegalidade ou violação das normas estatutárias ou regulamentares, mediante requerimento apresentado no prazo de quinze (15) dias a contar da data da deliberação ou daquela em que da mesma tomou conhecimento o impugnante, mas nunca depois de decorridos 90 dias da data da deliberação".

17 - Donde, e sem necessidade de mais e alongadas explanações a este respeito, facilmente se compreende e se aceita, que atento tal normativo regulamentar e que tendo a deliberação da Comissão Nacional aprovado tal deliberação em 31 de Março de 2012 (aprovação dos novos Estatutos do PS) e respectiva impugnação da mesma tendo tido lugar no dia 12/04/2012 junto do órgão estatutariamente competente para o respectivo efeito.

18 - Logo, temos assim que concluir que o aqui recorrente impugnou tal deliberação em momento e prazo absolutamente tempestivo, como aliás, ficou confirmado numa das declarações de voto (da autoria de José Manuel Ferreira da Silva, membro da CNJ) que acompanham a referida decisão (acórdão) assim caindo por terra o douto entendimento que a este respeito foi perfilhado pela Comissão Nacional de Jurisdição, conforme resulta de fls., 1 a 4 do Acórdão posto em crise.

19 - Uma segunda razão invocada pelo referido acórdão (a qual não se percebe bem... ao menos do ponto de vista lógico e processual) contribuiu também para o indeferimento do nosso recurso, ficou a dever-se, em síntese ao facto de "O mandato à Comissão Nacional para rever os Estatutos foi conferido, englobado numa deliberação e, como tal, materialmente respeitado o disposto no artigo 117 dos Estatutos do PS" e assim concluindo a CNJ "Resulta, assim, de tudo quanto se deixa dito que a deliberação da Comissão Nacional sobre as alterações dos Estatutos, foi correcta e legitimamente tomada, sem violação de qualquer norma Estatutária".

20 - Ora, e tal como já aqui mencionamos e voltamos a fazê-lo, conforme então alegamos, perante a Comissão Nacional de Jurisdição do PS, resulta pois claramente do disposto no artigo 117.º, n.º 1, in fine, que a Comissão Nacional do PS só poderá aprovar alterações aos Estatutos do PS, se e quando "... o Congresso lhe atribuir delegação de poderes para tanto, devendo em qualquer dos casos, a alteração estatutária ter sido previamente inscrita na ordem de trabalhos do Congresso", o que manifestamente ali não aconteceu.

[...] 26 - Donde, a Comissão Nacional ao ter aprovado tal deliberação, que ora entende a CNJ como tendo sido tomada de forma válida, toma-se para nós, absolutamente óbvio que o dito órgão nacional (CN) cometeu gritante e ostensiva ilegalidade de tal deliberação, por clara e ostensiva violação do disposto no artigo 117.º, n.º 1, in fine dos Estatutos do PS, na sua redação anterior àquela que lhe foi dada pela dita deliberação estatutariamente ilegal.

27 - Ainda muito recentemente (em reunião realizada em 30 de Setembro de 2012 em Mangualde) a dita Comissão Nacional voltou a tomar novas deliberações, nomeadamente, tendo aprovado novo Regulamento de militância e participação, Cargos de Representação Política, Regulamento Financeiro e Regulamento de Quotas, tendo por base estatutária os novos Estatutos (nova redacção) ilegalmente aprovados.

28 - Tendo igualmente tido lugar recentemente eleições paras as respectivas concelhias e Federações do Partido Socialista, ao abrigo de Regulamentos aprovados também tendo por base estatutária tais novos Estatutos assim ilegalmente aprovados.

29 - Em face do exposto, e porquanto também tais últimas deliberações serão sempre ilegais e nulas por causa dos legais efeitos da nulidade da própria deliberação, pela qual a Comissão Nacional do PS aprovou os novos Estatutos do partido, permitem facilmente ponderar e prever a elevada ocorrência de danos apreciáveis na actividade partidária, perante os seus militantes e o próprio descrédito do PS pelo público em geral, razão pela qual, deverá este Tribunal ordenar a suspensão imediata da deliberação pela qual a Comissão Nacional ilegal e abusivamente aprovou os novos Estatutos do Partido Socialista, bem como ordenar-se a imediata suspensão das deliberações tomadas pela mesma Comissão Nacional em 30 de Setembro de 2012 a fim de evitar-se a sua breve execução".

3 - Citado para o efeito, o requerido respondeu que, desde logo:

"6 - O ora Requerente intentou acção principal de impugnação de deliberação de órgão partidário - Processo 695/12 - a qual foi contestada nos exactos termos que o Tribunal poderá apreciar e conhecer.

7 - Porém, em sede de contestação o Requerido Partido Socialista invocou a inadmissibilidade da impugnação porquanto não tinham sido esgotados os meios impugnatórios internos para apreciação da questão em causa.

8 - Com efeito, a Comissão Nacional de Jurisdição conheceu, em primeira instância de recurso, a impugnação então apresentada o que é violador do artigo 30 n.º 2 da denominada lei dos Partidos Políticos, como este Tribunal reiteradamente tem declarado.

9 - Significa que, sendo inadmissível a acção principal, é igualmente inadmissível o procedimento cautelar que dela depende.

10 - E assim, por falta de um requisito processual na acção principal, devem também os presentes autos cautelares serem julgados liminarmente improcedentes.

11 - Quando assim não se entenda, o que se admite por estrito dever de patrocínio, importa referir que os Estatutos do Partido Socialista dispõem de um mecanismo processual para suspensão da eficácia de deliberação, o qual não foi utilizado pelo aqui Requerente.

12 - Com efeito, dispõe o artigo 70 n.º 1 alínea e) que "Compete à Comissão Nacional de Jurisdição, (e) decretar, por maioria de dois terços, a suspensão da execução de declarações ou deliberações de órgãos do Partido, objecto de recurso, desde que essa execução implique lesão de interesses fundamentais do Partido.".

13 - Sublinha o aqui Requerido que esta norma é de idêntico teor àquela que constava nos Estatutos (art. 81 n.º 1 alínea e) na redacção anterior à revisão aprovada em 31 de Março de 2012).

14 - Ora, o Requerente não lançou mão desse meio;

15 - Aliás, tão pouco o considerou quando apresentou a impugnação objecto do acórdão ora impugnado [sic]. Porém, 16 - De acordo com a jurisprudência reiterada deste Tribunal, a sindicância das deliberações partidárias obedece a uma intervenção mínima e sempre em último grau de recurso, esgotados que estejam todos os meios internos.

17 - Forçoso será concluir que este procedimento cautelar não reúne os requisitos processuais necessários para ser admitido, uma vez que não foram previamente utilizados os meios internos existentes e ao dispor."

Subsidiariamente, o requerido defende não se verificarem in casu os requisitos de que depende a concessão da providência de suspensão de eficácia de deliberações partidárias pelos fundamentos seguintes:

"24 - Dir-se-á que, o impugnante [sic] apenas no artigos 29 do seu articulado, alude à existência de danos resultantes da execução da deliberação impugnada, 25 - Alegando que a mesma "... permite facilmente ponderar e prever a elevada ocorrência de danos apreciáveis na actividade partidária, perante os seus militantes e o próprio descrédito do PS pelo público em geral.", 26 - Pese embora o impugnante não concretize ou qualifique esses danos eles assumem natureza não patrimonial, como é evidente, mas isso não significa que se não imponha, como se disse, a alegação de factos concretizadores desses danos, não bastando para o efeito afirmações vagas e abstractas.

27 - Ora, traço comum à invocação dos danos referidos, é, precisamente o do seu carácter vago e abstracto, já que o impugnante não indica um só acto especialmente relevante da vida interna do partido que, até à decisão final da acção de impugnação, se venha a realizar e em que, por via da deliberação impugnada, esteja impedido de participar, ou que veja coarctado o seu direito bem como dos demais militantes de intervir e participar na actividade partidária.

28 - Limitando-se a afirmações vagas e abstractas não pode deixar de se concluir que não está preenchido o requisito da provável ocorrência de danos apreciáveis;

29 - Pelo que não se pode dar como verificado o requisito da provável ocorrência de danos apreciáveis decorrentes da execução da deliberação impugnada, o que, como se disse, basta para indeferir a medida cautelar requerida.

30 - De resto do deferimento da medida cautelar resulta para o PS relevantes prejuízos. Com efeito, 31 - A revisão dos Estatutos decorre da necessidade de os adaptar à realidade actual, de responder aos desafios decorrentes da participação dos cidadãos não militantes na vida do Partido, de agilizar procedimentos entre outras inovações.

32 - As alterações estatutárias são já do conhecimento e do domínio público, tendo sido objecto de referência na imprensa escrita e falada, sendo certo que as mesmas foram anotadas, em tempo, junto do Tribunal Constitucional.

33 - Acresce que, foram já impressos e distribuídos alguns milhares de exemplares com a reformulação dos Estatutos decorrentes das alterações em causa. Mas, 34 - Mais importante do que isso: foram já aprovados novos regulamentos que visam concretizar normas de organização e funcionamento do Partido ao abrigo dos Estatutos na redacção em vigor, ou seja, aquela que resultou da revisão aprovada em 31 de Março p. p. Aliás, 35 - É do conhecimento público que o PS assumiu o compromisso de, até 31 de Dezembro do corrente ano, proceder à apresentação dos seus candidatos autárquicos, os quais serão designados nos termos das normas aprovadas, tendo-se iniciado já esse procedimento interno que passa, entre outras fases, por eleições denominadas primárias, circunscritas aos militantes do Partido.

36 - Ora, a suspensão da deliberação para além do prejuízo material resultante do dispêndio com a publicação, e da diminuição da capacidade de intervenção na vida pública em consequência, por exemplo, da falta de enquadramento da participação dos não militantes na vida activa do partido, constitui um dano muito superior ao prejuízo resultante da não suspensão da eficácia da deliberação impugnada, pelo que, também por esta razão, a mesma não deve ser deferida (artigo 397.º, n.º 2, do CPC por remissão do disposto no artigo 103.º-E, n.º 2, da LTC). Acresce que, 37 - E, caso assim não se entenda, sempre se dirá que a deliberação em causa não enferma de ilegalidade, nem viola a lei ou os estatutos.

38 - O impugnante repete nestes autos a argumentação que serviu de fundamento ao recurso da deliberação ora impugnada, não acrescentando novos argumentos que justifiquem uma nova abordagem da questão por parte do impugnado [sic].

39 - Deste modo, limitar-se-á o impugnado a reproduzir em grande parte os fundamentos de direito que fundamentaram a sua decisão.

[arts. 40. a 129, concluindo pela legalidade da "decisão impugnada, por conforme aos Estatutos do Partido Socialista"]."

II. Fundamentação

4 - Como preliminar ou incidente de ações de impugnação de deliberação tomada por órgãos de partidos políticos a intentar junto do Tribunal Constitucional, podem os militantes para tanto legitimados requerer também a suspensão de eficácia das deliberações impugnáveis com fundamento na probabilidade de ocorrência de danos apreciáveis causados pela sua execução, sendo aplicável o disposto nos arts. 396.º e 397.º do Código de Processo Civil (cf. o artigo 103.º-E da LTC). Tal possibilidade, porém, não pode deixar de se articular com a exigência da exaustão dos meios internos prevista no artigo 103.º-C, n.º 3, da LTC, aplicável ex vi do artigo 103.º-D, n.º 3, do mesmo diploma, com referência ao meio principal, ou seja, às ações de impugnação. É assim, desde logo, por força da acessoriedade própria dos meios cautelares em relação ao meio principal, e, também, por identidade (ou, porventura, mesmo por maioria de razão), em virtude do princípio da intervenção mínima do Tribunal Constitucional no domínio dos «processos relativos a partidos políticos, coligações e frentes». Ponto é que tal exigência de exaustão não belisque a garantia constitucional de tutela jurisdicional efetiva (v. os arts. 20.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, ambos da Constituição), também aplicável no citado domínio.

Pelo exposto, impõe-se começar por apreciar a admissibilidade dos pedidos de suspensão de eficácia, averiguando se no ordenamento do Partido Socialista - Estatutos e demais regulamentação - existe um qualquer meio interno que garanta ou proporcione ao militante interessado a possibilidade de obter medio tempore - isto é, até que o órgão máximo de jurisdição do partido se pronuncie - a suspensão de eficácia da deliberação que repute lesiva. Na verdade, uma resposta positiva a tal questão - a existência de um meio interno que satisfaça a mencionada garantia constitucional - prejudica não só o conhecimento dos pedidos de suspensão, como das demais questões suscitadas na resposta do requerido, já que, atenta a acessoriedade ou instrumentalidade do pedido cautelar relativamente ao pedido principal, é evidente a precedência de tal questão sobre a da análise de pressupostos do pedido cautelar conexos com a admissibilidade do pedido principal (v. arts. 6.

a 10 da resposta do requerido) e, por maioria de razão, sobre a apreciação dos requisitos de procedência das requeridas suspensões de eficácia (v. o requerimento inicial e os arts. 24. a 129 da resposta do requerido).

5 - Os Estatutos do Partido Socialista preveem expressamente a competência da Comissão Nacional de Jurisdição para "decretar, por maioria de dois terços, a suspensão da execução de declarações ou de deliberações de órgãos do Partido, objecto de recurso, desde que essa execução implique lesão de interesses fundamentais do Partido" (v. os arts. 81.º, n.º 1, al. e), e 70.º, n.º 1, al. e), respetivamente, das versões anterior e posterior à deliberação da Comissão Nacional, de 31 de março de 2012). Acresce que o «Regulamento Disciplinar do Partido Socialista», aprovado pela Comissão Nacional em 8 de novembro de 2003 - trata-se do diploma em vigor à data em que o ora requerente recorreu da deliberação da Comissão Nacional de 31 de março de 2012 para a Comissão Nacional de Jurisdição do mesmo Partido, e com base no qual o mesmo requerente sustenta a tempestividade daquele recurso (cf. o art. 16. do requerimento inicial) - contém uma norma de teor idêntico [v. o artigo 3.º, n.º 1, al. e)].

Conforme resulta do requerimento inicial, o requerente pretende acautelar no presente procedimento a "elevada ocorrência de danos apreciáveis na actividade partidária, perante os seus militantes e o próprio descrédito do PS pelo público em geral" (v. o art. 29.). O requerente não alega nem invoca a lesão de quaisquer outros interesses que não os de simples «militante de base», os quais, por dizerem respeito à generalidade dos militantes, se podem reconduzir aos interesses do próprio partido. Em especial, o requerente não alega que a deliberação da Comissão Nacional, datada de 31 de março de 2012, assim como as demais deliberações suspendendas, afetem direta e pessoalmente os seus direitos de participação nas atividades do partido. Aliás, as suas iniciativas processuais, a cautelar e a correspondente à ação principal, dirigem-se exclusivamente à tutela da legalidade estatutária: é apenas por considerar que a deliberação da Comissão Nacional de 31 de março de 2012 foi ilegal e abusivamente aprovada, que o requerente apresentou em 12 de abril de 2012 recurso junto da Comissão Nacional de Jurisdição do Partido Socialista, impugnando a citada deliberação (cf. os arts. 2 e 3 do requerimento inicial). Trata-se, assim, de uma espécie de ação popular partidária dirigida exclusivamente à defesa da legalidade interna do Partido Socialista. De resto, o artigo 103.º-D, n.º 2, da LTC legitima este tipo de iniciativas: "pode ainda qualquer militante impugnar as deliberações dos órgãos partidários com fundamento em grave violação de regras essenciais relativas à competência ou ao funcionamento democrático do partido".

A legalidade interna é decerto um dos "interesses fundamentais" de qualquer partido político, razão por que o artigo 24.º, al. a), da LPP prevê a existência obrigatória de um órgão de jurisdição com âmbito nacional. O Partido Socialista não é exceção e, por isso, o respetivo órgão jurisdicional máximo - a Comissão Nacional de Jurisdição - tem competência para "instruir e julgar os processos de impugnação da validade das deliberações e decisões dos órgãos nacionais e das federações do Partido" (v. os arts. 81.º, n.º 1, al. b), e 70.º, n.º 1, al. b), respetivamente, das versões anterior e posterior à deliberação da Comissão Nacional de 31 de março de 2012). No caso sub iudicio tal apreciação é ainda reforçada por estar em causa a legalidade de uma deliberação de um órgão nacional que modifica os próprios Estatutos do Partido Socialista.

Sendo assim, não existem dúvidas de que a possibilidade de a Comissão Nacional de Jurisdição do Partido Socialista "decretar, por maioria de dois terços, a suspensão da execução de declarações ou de deliberações de órgãos do Partido, objecto de recurso, desde que essa execução implique lesão de interesses fundamentais do Partido", prevista nos Estatutos do Partido e no «Regulamento Disciplinar do Partido Socialista», seja um meio interno que proporciona aos militantes interessados a oportunidade de obterem uma tutela cautelar equivalente à que o requerente agora vem pedir ao Tribunal Constitucional. E, existindo essa possibilidade, tem o requerente o ónus de começar por aí, em homenagem ao princípio da intervenção mínima do Tribunal Constitucional - princípio enformador da exigência de exaustão dos meios internos (cf. o artigo 103.º-C, n.º 3, da LTC, aplicável ex vi do artigo 103.º-D, n.º 3, do mesmo diploma).

6 - No tocante às deliberações da Comissão Nacional de 30 de setembro de 2012, a única ilegalidade que o requerente lhes vem imputar é uma ilegalidade consequencial - a que resulta de as mesmas deliberações se basearem em normas estatutárias ilegais porque ilegalmente aprovadas pela deliberação da Comissão nacional de 31 de março de 2012 (cf. o art. 29. do requerimento inicial). Contudo, até ser suspensa a eficácia desta última deliberação, ou até que a mesma seja declarada ilegal, nada justifica que as alterações estatutárias por si aprovadas não devam ser observadas. De resto, e significativamente, o requerente não alega ter recorrido autonomamente das deliberações da Comissão Nacional de 30 de setembro de 2012 para a Comissão Nacional de Jurisdição.

III. Decisão

Pelo exposto, decide-se não admitir o requerimento inicial e, em consequência, não conhecer dos pedidos de suspensão de eficácia das deliberações tomadas pela Comissão Nacional do Partido Socialista em 31 de março de 2012 e em 30 de setembro de 2012.

Lisboa, 25 de outubro de 2012. - Pedro Machete - Fernando Vaz Ventura - João Cura Mariano - Ana Maria Guerra Martins - Joaquim de Sousa Ribeiro.

206571282

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/2012/12/11/plain-305325.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/305325.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 2003-08-22 - Lei Orgânica 2/2003 - Assembleia da República

    Aprova a lei dos Partidos Políticos.

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Este documento é referido no seguinte documento (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

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NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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