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Acórdão 499/2009, de 29 de Outubro

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Sumário

Decide não julgar inconstitucionais as normas dos artigos 122.º e 123.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, na interpretação de que o arguido não tem de ser notificado da proposta de resolução final do instrutor do processo disciplinar, salvo quando neste se suscitem questões sobre as quais o interessado não tenha tido anteriormente oportunidade de se pronunciar; decide ainda não julgar inconstitucional a norma da alínea e) do artigo 151.º do mesmo Estatuto, quando interpretada no sentido de permitir a avocação pelo Plenário de processo disciplinar pendente perante o Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura (Processo n.º 669/08 - 3.ªSecção).

Texto do documento

Acórdão 499/2009

Processo 669/08

Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I - Relatório

1 - Joaquim Alfredo de Figueiredo Figueira Salgueiro, juiz de direito, interpôs recurso contencioso de deliberação do Conselho Superior da Magistratura (Plenário) que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva. Por acórdão de 6 de Maio de 2008, o Supremo Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso.

O impugnante interpôs recurso deste acórdão para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro (LTC).

Convidado, ao abrigo do n.º 6 do artigo 75.º-A da LTC, a indicar, com clareza e precisão, o objecto do recurso, o recorrente respondeu do seguinte modo:

"(1) Os artigos 122.º e 123.º EMJ foram interpretados e aplicados, contra o disposto nos artigos 267.º/5 e 269.º/3 CRP, no sentido de excluírem a audição do arguido em processo de responsabilidade disciplinar judicial acerca da proposta de resolução final do inquiridor [disse-se no requerimento de interposição de recurso terem sido aplicados no sentida de vedar a co-decisão do recorrente no que diz respeito à

deliberação do CSM impugnada].

(2) O artigo 134.º EMJ foi interpretado e aplicado em contrário do artigo 268.º/3 CRP, quando o acórdão recorrido decidiu que à deliberação do CSM de acolhimento da proposta do inquiridor, no sentido de o caso não evoluir para processo de avaliação do mérito profissional bastante do juiz para o exercício do cargo, podia ser dado um entendimento diferente e, pelo contrário, permissivo da pena expulsiva [disse-se no requerimento de interposição de recurso admitir - a interpretação levada a cabo pelo acórdão recorrido - que a motivação dos actos administrativos não vincula na exactidão comunicativa do texto próprio e incindível do acto considerado).

(3) O artigo 151.º EMJ foi interpretado e aplicado contra o disposto no artigo 269.º/3 CRP, quando o acórdão recorrido aceitou que o Plenário do CSM pudesse avocar um processo disciplinar que corria perante o Conselho Restrito, eliminando um grau de apreciação recursiva e diminuindo, por consequência, a extensão do sistema de impugnação do acto punitivo do juiz [disse-se no requerimento de interposição de recurso, tão-somente, ter sido aplicada no sentido de reduzir as possibilidades de impugnação do acto, eliminando o duplo grau de apreciação).

(4) Por fim, no requerimento de interposição do recurso ainda se arguiu a inconstitucionalidade do entendimento dado pelo STJ ao sistema normativo dos artigos 168.º - 178.º EMJ, ao reduzi-lo a um estrito modelo de controlo formal administrativo, contra o princípio da justiça - artigos 1.º e 20.º CRP - e as garantias da independência dos tribunais, que não se compadecem senão com uma vigência hegemónica de uma supervisão material do oficio de juiz."

2 - Notificado para alegar, o recorrente concluiu as suas alegações nos seguintes

termos:

"A. O Acórdão do STJ recorrido aplicou ao caso Joaquim Salgueiro vs CSM os artigos 122.º e 123.º EMJ, no sentido de excluírem a audição do arguido em processo de responsabilidade disciplinar judicial acerca da proposta de resolução final do caso

apresentada pelo inquiridor.

B. Aqueles artigos do EMJ, na leitura que assim lhes foi dada, contrariam os artigos 267.º/5, ultima parte, e 269.º/3 CRP, preceitos que autonomizam, por um lado, a Audiência dos visados e, por outro, o direito de defesa, enquanto impõem uma fase pré-decisória ao Estado-Aparelho no despacho da disciplina da magistratura judicial.

C. O Acórdão do STJ recorrido aplicou ao caso sub judice o artigo 134.º EMJ com leitura inconstitucional, quando decidiu ser licita a deliberação do CSM em contrário de outra anterior que tinha incorporado a proposta do inquiridor no sentido de encerramento, favorável ao arguido, da questão da estimativa do mérito profissional

para o exercício da judicatura.

D. Com efeito, o artigo 268.º/3 CRP define também como âmbito e alcance das decisões do Estado-Aparelho os motivos decisórios, o que melhor se compreende no caso de fazerem suas as propostas de linha: aceite uma, não pode a deliberação CSM seguinte negá-la, sob pena de elisão do princípio nec bis in idem e da justiça: artigos 1.º

e 20.º CRP.

E. O Acórdão do STJ recorrido aplicou no caso sub judice o artigo 151.º EMJ em contradição com o artigo 269.º/3 CRP, quando aceitou que o plenário do CSM pudesse ter avocado um processo disciplinar que corria perante o Conselho Permanente, eliminando deste modo um grau de reclamação, diminuindo, por consequência, a extensão do sistema adversarial do acto punitivo do juiz.

F. O Acórdão do STJ tirado no caso sub judice, fez aplicação inconstitucional do sistema normativo dos artigos 168.º/178.º EMJ, ao reduzi-la a um estrito modelo de controlo formal administrativo, contra o principio da justiça, consagrado nos artigos 1.º

e 20.º CRP.

G. Principio constitucional da justiça este que joga, nos casos disciplinares da magistratura judicial, com a especificidade da independência dos tribunais de que é funcional a independência dos seus titulares.

H. Com efeito, este estatuto de dupla independência concêntrica, próprio de uma Constituição e, por isso mesmo, particular à CRP, não pode compadecer-se com sequências normativas de discricionariedade, só articuláveis nos poderes dependentes e

hierárquicos.

No sentido destas conclusões, V. Exas., julgaram contrárias à Constituição as normas dos citados artigos 122.º, 123.º, 134.º, 151.º e 168/178.º EMJ, no entendimento em que foram tomadas e aplicadas no Acórdão do STJ sob Recurso.

O Conselho Superior da Magistratura contra-alegou no sentido de que, ao julgar improcedente a impugnação da deliberação punitiva, o Supremo Tribunal de Justiça não fez interpretação contrária à Constituição das normas estatutárias invocadas pelo

recorrente.

3 - Ouvido, por despacho motivado do relator, sobre a eventualidade de não conhecimento de parte do recurso (fls. 1004), o recorrente respondeu nos seguintes

termos:

"1. Segundo o entendimento proposto, conjugado o princípio do pedido com a competência do Tribunal, é colocada a probabilidade de ser liminarmente rejeitada a apreciação do recurso no que diz respeito à solicitação de ser declarado inconstitucional o sistema normativo que vai do artigo 168.º ao 178.º EMJ: ao Tribunal Constitucional só seria permitido por lei conhecer da inconstitucionalidade de cada uma e, só de cada uma, das normas propostas à fiscalização sucessiva.

2 - Concerteza que o recorrente não pode estar de acordo com esta visão do problema: as normas do capítulo disciplinar do EMJ têm um sentido, cada uma a cada uma, contextual e de função, ordenada por um modelo marcante: não são dispersas, nem fragmentárias, como se tivesse havido erro logístico ou dominasse, neste capítulo,

a doutrina penal.

3 - Muito pelo contrário, trata-se de um sistema coerente, interligado e holístico que não permite a cada uma das normas poder ser entendida senão, segundo o hábito do conjunto: estrutura legislativa do controlo jurisdicional disciplinar dos magistrados

judiciais.

4 - Defendeu o recorrente, quanto a este sistema, tratar-se de um estrito modelo de controlo formal administrativo que vai contra o princípio da justiça, proposto nos arts.º

1.º e 20.º CRP.

5 - Com efeito, as normas que regem a disciplina dos magistrados judiciais pressupõem, ou estão a ser interpretadas como não permitindo a crítica de mérito da decisão disciplinar das instâncias, por parte do tribunal ad quem.

6 - Defendeu também o recorrente que este sistema fere as garantias de independência dos tribunais, porque a independência dos juízes está indexada e é funcional à independência do órgão de Estado que servem e, mal subtraídos à garantia de uma apreciação de fundo (de mérito) disciplinar, em recurso, ficam sob a discricionariedade de outrem: solução, por si só, hierárquica, de desigualdade e constringente, portanto,

de dependência.

7 - Com efeito, nas notas de autonomia que integram a independência, está uma supervisão e um controlo paritários; por isso mesmo, sob apreciações de mérito, em todos os degraus do procedimento, incluindo o recurso contencioso.

8 - Por conseguinte, parece indubitável a inconstitucionalidade de todas as normas do capítulo, isto é, que vão do artigo 168.º ao artigo 178.º EMJ, porque unificadas sob esta infracção ao princípio da independência dos tribunais, estrutura primeva da Constituição, a qual, pede, insiste-se, um controlo de mérito de segundo grau da

decisão disciplinar que puna um juiz.

9 - Depois, o artigo 79.º-C da LTC não tem, nem pode ter, o sentido restritivo proposto pelo Excelentíssimo Senhor Conselheiro Relator: se o tribunal pode fundamentar-se na violação de certas normas ou princípios constitucionais, de um agregado, para decidir da inconstitucionalidade normativa em concreto, por maioria de razão, pode decidir, se lhe for pedido, pela inconstitucionalidade de um arco ou sistema

normativo em concreto e identificado.

10 - Esta tem sido, aliás, a posição comum e reiterada do Tribunal Constitucional.

11 - Deve, por tudo isto, ser encarado este problema, com o primeiro e terceiro, no

Acórdão final.

12 - Aliás, como o segundo, também.

13 - É que o Excelentíssimo Senhor Conselheiro relator dá como seguro que o CSM apenas acolheu a proposta do Exm.º Senhor Inspector Inquiridor, no sentido da instauração de um processo disciplinar, mas não se vinculou à opção não expulsiva do

juiz, por ele referida expressamente.

14 - Contudo, a penalidade benévola, indexada aos factos transcritos no Relatório, constitui fundamento da proposta e, se o CSM não a recusou, aceitou-a, sem dúvida.

15 - Contudo, não é este o aspecto que importa: é questão a debater e não parece ser perfunctória, mas também é certo que o recorrente não enfatizou esse preciso aspecto

da controvérsia.

16 - De certo é que a decisão recorrida considerou não vincular a motivação dos actos administrativos na exactidão comunicativa do texto próprio e incidível do acto

considerado.

17 - E é exactamente por este motivo que a aplicação do artigo 134.º EMJ ao caso, se constitui numa aplicação de norma inconstitucional, porque a leitura do preceito desta maneira contraria o artigo 268.º/3 CRP: para quê exigir a Constituição aos actos administrativos notificados fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos, se não pressupuser como garantia fundamental a incindibilidade fundamentação/decisão no seu modo ontológico e comunicativo.

18 - Por conseguinte, salvo o muito e devido respeito pela posição preliminar do Excelentíssimo Senhor Conselheiro Relator, também nesta parte carecerá de

fundamento.

Em suma: deve seguir o recurso pela totalidade."

II - Fundamentação

3 - Para melhor compreensão das questões suscitadas e resolução da questão prévia suscitada pelo despacho do relator, importa recordar os elementos essenciais do caso, tal como o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça o relata: realizada inspecção aos serviços prestados no TIC (3.º Juízo) e no Tribunal de Família e Menores de Lisboa (1.º Juízo), foi atribuída ao ora recorrente a classificação de "Medíocre", abrindo-se, em consequência disso, inquérito para avaliar da sua eventual inaptidão para o exercício das respectivas funções, nos termos do disposto no artigo 34.º, n.º 2, do Estatuto dos

Magistrados Judiciais.

Concluído o inquérito, foi o mesmo convertido em processo disciplinar, no termo do qual o Conselho Permanente do CSM deliberou que os factos imputados na acusação ao arguido violavam os deveres de administrar justiça, de zelo e de criar no público confiança na acção da administração da Justiça, preenchendo a infracção disciplinar prevista e punida com aposentação compulsiva pelas disposições combinadas dos artigo 3.º, n.os 1, 3, 4, alínea b) e 6, do Decreto-Lei 24/84, de 16 de Janeiro, e 82.º, 85.º, n.º 1, alínea f), 90.º, n.º 1, 95.º, n.º 1, alíneas a) e c), e 106.º, todos do

EMJ.

Notificado da "requalificação" que assim se operou dos factos descritos na acusação o arguido opôs-se-lhe, e, produzida a prova que apresentou, foi elaborado novo relatório

final, no qual se manteve o anterior.

Em 6 de Junho de 2006, o Plenário do CSM deliberou avocar esse processo e apensar-lhe, para apreciação conjunta, outro processo disciplinar pendente contra o mesmo magistrado e já inscrito em tabela para a sessão daquela data.

Na sequência da avocação e apensação assim determinadas, o Plenário do CSM, em sessão de 4 de Julho de 2006, deliberou aplicar ao arguido, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 3.º, 32.º, 34.º, n.º 2, 82.º, 85.º, n.º 1, alínea f), 90.º, n.º 1, 95.º, n.º 1, alíneas a) e c), 106.º e 131.º do EMJ, e 3.º, n.os 3, 4, alíneas b) e g), 6 e 11 do ED, a pena disciplinar de aposentação compulsiva por violação dos deveres profissionais de assiduidade, de zelo, de administrar justiça e de criar no público confiança na acção da administração da Justiça, reveladoras, quer da sua definitiva incapacidade de adaptação às exigências da função, quer de inaptidão

profissional.

4 - Além do mais, o recorrente pretende que o Tribunal aprecie o que diz ser a inconstitucionalidade do entendimento dado pelo Supremo Tribunal de Justiça "ao sistema normativo dos artigos 168.º - 178.º do EMJ, ao reduzi-lo a um estrito modelo de controlo formal administrativo, contra o princípio da justiça - artigos 1.º e 20.º CRP - e as garantias da independência dos tribunais, que não se compadecem senão com uma vigência hegemónica de uma supervisão material do ofício de juiz".

Não é possível retirar deste enunciado - que é retomado nas alegações com variações de formulação que o não melhoram (vid. conclusões F. G. e H.) - uma questão de constitucionalidade normativa que possa constituir objecto idóneo de recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade.

Com efeito, como resulta da Constituição (artigo 280.º da CRP) e da lei (artigo 70.º da LTC), compete ao Tribunal Constitucional apreciar a (in)constitucionalidade das normas que os demais tribunais apliquem (ou a que recusem aplicação com fundamento em inconstitucionalidade, ao abrigo do poder atribuído pelo artigo 204.º da Constituição) nos feitos submetidos a julgamento. O recurso de constitucionalidade português não é um meio ordenado ao escrutínio da constitucionalidade da decisão do tribunal a quo, mas à apreciação da conformidade à Constituição de uma certa norma infraconstitucional que seja relevante para a decisão do caso. E constitui ónus do recorrente definir o objecto do recurso em consonância com essa finalidade da intervenção possível do Tribunal, identificando, com precisão e clareza, a norma de cuja alegada inconstitucionalidade pretende que o Tribunal se ocupe (n.º 1 do artigo

75.º-A da LTC).

Embora a questão de constitucionalidade passível de sujeição ao Tribunal em fiscalização concreta possa respeitar à interpretação ou sentido extraído pelo tribunal da causa de uma dada norma ou, até, de um "bloco legal" constituído por vários preceitos ou normas textuais, incumbe sempre ao recorrente indicar esse sentido normativo, enunciando o seu conteúdo e identificando os referentes textuais de que é extraído, de tal modo que o Tribunal, se o recurso vier a ser provido, possa enunciá-lo na sua decisão em ordem a permitir ao tribunal a quo proceder à reforma da decisão recorrida em conformidade (exemplificativamente, acórdão 178/95 Acórdãos do Tribunal Constitucional, 30.º vol., p. 1118.). O objecto do recurso tem de ser definido pelo recorrente com clareza e precisão. É imposição que serve não só preocupações de racionalidade processual e do trabalho jurisdicional, mas também preocupações com a observância dos limites que da Constituição decorrem quanto à intervenção do Tribunal Constitucional que correria o risco de agir ultra vires se a questão de constitucionalidade lhe pudesse ser apresentada de modo vago. Não é um modo preciso de colocar a questão de constitucionalidade em recurso de fiscalização concreta, maxime quando o pretenso vício seja de inconstitucionalidade material, a indicação como inconstitucionais de todas as normas de um diploma legal ou de um seu capítulo relativamente extenso (cf., por exemplo, acórdãos n.os 266/00 e 377/00, in

www.tribunalconstitucional.pt)

Assim, entende-se não constituir modo processualmente adequado de submeter uma questão ao Tribunal em recurso de fiscalização concreta a censura ao entendimento dado pela decisão recorrida a todo o "sistema normativo" de impugnação das decisões disciplinares respeitantes aos magistrados judiciais, composto pelos artigos 168.º a 178.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, conjunto normativo este que abrange toda a "Secção" que nesse Estatuto regula os recursos das deliberações do Conselho

Superior da Magistratura.

Em primeiro lugar, porque o que com isso se pretende atacar por desconforme à Constituição é, afinal, a decisão judicial. O que, segundo a alegação do recorrente, reduz o conteúdo normativo dos artigos 168.º a 178.º do EMJ "a um estrito modelo de controlo formal administrativo", seja o que for que isso signifique, é a prática do tribunal no exercício dos seus poderes, não a solução legal.

Em segundo lugar, mesmo que se entenda posta em causa a opção legislativa e não a decisão, porque a censura de constitucionalidade não vai dirigida a uma norma precisa, mas a todo o regime de controlo jurisdicional das decisões respeitantes ao exercício da acção disciplinar contra os magistrados judiciais, o qual comporta várias normas e de diversa natureza. A afirmação de que o Supremo reduziu esse sistema a "um estrito controlo formal administrativo" não permite identificar qual o critério normativo e a norma textual que o suporta (ou de que esse critério foi deduzido) e que o recorrente considera contrário ao princípio da independência dos juízes e ao (seu) direito de acesso à justiça quando são sujeitos a decisões disciplinares do respectivo órgão de gestão e pretendem impugná-las.

De acordo com o princípio do pedido, a actividade jurisdicional do Tribunal incide sobre a constitucionalidade de normas perfeitamente determinadas pelo recorrente e que a decisão recorrida, conforme os casos, tenha aplicado ou a que haja recusado aplicação (artigo 79.º-C da LTC) e não sobre sistemas normativos no seu conjunto (Em fiscalização concreta, ainda quando se julga procedente um vício capaz de afectar o diploma legal no seu todo, é uma dada norma que se julga inconstitucional). O papel do Tribunal não é o de apreciação holística dos institutos, mas o de aferir, mediante um procedimento analítico de confronto de normas identificadas (dentro de um objecto hetero-definido) com concretos parâmetros constitucionais.

Não se conhecerá pois da questão que os recorrentes referem aos artigos 168.º a 178.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais.

5 - Também não poderá conhecer-se da questão de inconstitucionalidade do artigo 134.º do EMJ, quando interpretado no sentido de que "a deliberação do Conselho Superior da Magistratura de acolhimento da proposta do inquiridor, no sentido de o caso não evoluir para processo de avaliação do mérito profissional do juiz, permitia, ainda assim, a aplicação de uma pena expulsiva" ou, na versão inicialmente apresentada e que o recorrente tem por equivalente, o mesmo preceito interpretado no sentido de que "a motivação dos actos administrativos não vincula na exactidão comunicativa do texto próprio e incindível do acto em causa", que o recorrente considera violar o n.º 3

do artigo 268.º da Constituição.

Com efeito, o artigo 134.º do EMJ limita-se a dispor que "terminada a instrução, o inquiridor ou sindicante elabora relatório, propondo o arquivamento ou a instauração de

procedimento, conforme os casos".

A interpretação que o recorrente pretende ver sindicada é manifestamente estranha ao teor dispositivo deste preceito e à interpretação dele efectuada pelo acórdão recorrido.

A esse propósito o Supremo Tribunal de Justiça limitou-se a considerar evidente que "a deliberação do Conselho Permanente do CSM que, na sequência dessa proposta [a proposta do inquiridor], mandou instaurar contra o recorrente um processo disciplinar não implicou qualquer adesão (ou auto-vinculação) da entidade recorrida à não aplicação duma sanção expulsiva, sugerida na proposta do inspector. No contexto global da actuação disciplinar - e no âmbito do procedimento administrativo especial em que o processo disciplinar se traduz - o único acto decisório produtor de efeitos jurídicos externos é a deliberação recorrida (de 4.07.06); as deliberações que a antecederam, nomeadamente a que mandou instaurar o inquérito, a que ordenou a conversão do inquérito em processo disciplinar e a que requalificou os factos [...], não são mais do actos meramente acessórios e instrumentais, preparatórios da decisão final, que é a recorrida; actos, por consequência, que não integram o conceito de acto administrativo consagrado no artigo 120.º do CPA e a que são inaplicáveis, por isso, os artigos 140.º e 141.º do mesmo diploma legal, respeitantes à revogabilidade dos actos

administrativos válidos e inválidos".

Portanto, contrariamente ao que o recorrente alega, o acórdão recorrido interpretou a deliberação que, na sequência da proposta do inspector judicial no termo do inquérito, mandou instaurar processo disciplinar contra o recorrente como não implicando adesão às considerações do inquiridor quanto à não aplicação de pena expulsiva. Isso é matéria de interpretação do acto administrativo, o que escapa ao poder cognitivo deste Tribunal e só por si exclui a possibilidade de considerar aplicado o artigo 134.º do EMJ com o sentido que o recorrente pretende ver sindicado, que supõe que tivesse havido adesão às considerações do inquiridor quanto à pena que poderia vir a ser aplicável no processo disciplinar subsequente ao inquérito.

6 - O recorrente arguiu a inconstitucionalidade dos artigos 122.º e 123.º do EMJ quando interpretados no sentido de que o arguido não tem de ser ouvido acerca da proposta de decisão constante do relatório final do instrutor do processo disciplinar.

Recorde-se que o processo disciplinar contra magistrados judiciais se encontra regulado nos artigos 110.º a 124.º do EMJ, sendo-lhe aplicáveis supletivamente as normas do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central Regional e Local (artigo 131.º do EMJ), estatuto este que, aliás, tradicionalmente se considera conter o que pode considerar-se o modelo geral dos procedimentos disciplinares e continha regime semelhante ao que aqui está em causa (cf. artigos 65.º e 66.º do ED aprovado pelo Decreto-Lei 24/84, de 16 de Janeiro, que ao tempo vigorava). Dispõe o artigo 117.º do EMJ que, concluída a instrução, o instrutor deduz acusação, articulando discriminadamente os factos constitutivos da infracção disciplinar e os que integram circunstâncias agravantes ou atenuantes, que repute indiciados, indicando os preceitos legais no caso aplicáveis. O arguido é notificado da acusação, fixando-se-lhe prazo entre 10 a 20 dias para apresentar a defesa (artigo 118.º).

Durante o prazo de apresentação de defesa o arguido, por si ou através do defensor nomeado ou do mandatário constituído, pode examinar o processo (artigo 120.º). Com a defesa, o arguido pode indicar testemunhas, juntar documentos ou requerer diligências

(artigo 121.º).

Terminada a produção da prova, o instrutor elabora um relatório, do qual devem constar os factos cuja existência considere provada, a sua qualificação e a pena aplicável (artigo 122.º). O processo entra, então, na fase de decisão. O relatório do instrutor só é comunicado ao arguido com a notificação da decisão final (artigo 123.º).

O recorrente reconhece que o direito de defesa no processo disciplinar lhe foi assegurado. Mas, sustenta que uma coisa é o direito de defesa em processo disciplinar e outra é o direito de participação dos cidadãos na formação das decisões que lhes dizem respeito, consagrado no n.º 5 do artigo 267.º da Constituição, sendo inconstitucional uma norma - no caso, a que se extrai da conjugação dos artigos 122.º e 123.º do EMJ - que exclua a notificação ao arguido para se pronunciar sobre a proposta de decisão presente ao órgão decisor. Dito de outro modo, o recorrente entende que o processo disciplinar deve ser estruturado de tal modo que comporte, além da fase de defesa quanto à acusação, uma subfase pré-decisória ou de audiência final sobre a proposta de decisão submetida pelo instrutor ao órgão decisor, à semelhança da instituída no artigo 100.º e segs. do Código de Procedimento Administrativo, interpretado no sentido de consagrar o modelo de elaboração obrigatória e de notificação de um "projecto de decisão" (cf. Pedro Machete, A Audiência dos Interessados no Procedimento Administrativo, págs. 496-501).

Dispõe o artigo 267.º, n.º 5, da Constituição que "O processamento da actividade administrativa será objecto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito".

É duvidosa a natureza constitucional desta imposição de estruturação do procedimento administrativo geral com um momento ou fase de participação dos interessados.

Enquanto uns Autores perspectivam a participação dos interessados como direito análogo aos direitos fundamentais (cf. Sérvulo Correia, «O direito à informação e os direitos de participação dos particulares no procedimento», in Cadernos de Ciência de Legislação, 9/10, Janeiro-Junho de 1994, pp. 156-157; Vasco Pereira da Silva, Em Busca do Acto Administrativo Perdido, 1996, pp. 426 e segs.; Marcelo Rebelo de Sousa, «Regime do Acto Administrativo», in Direito e Justiça, vol. VI, 1992, p. 45;

David Duarte, Procedimentalização, Participação e Fundamentação: Para uma Concretização do Princípio da Imparcialidade Administrativa como Parâmetro Decisório, 1996, pp. 143 e segs.), outros autores negam-lhe essa natureza (cf. Freitas do Amaral, «Fases do procedimento decisório de 1.º grau, in Direito e Justiça, Vol. VI, 1992, p. 32; Pedro Machete, A Audiência dos Interessados no Procedimento Administrativo, Universidade Católica Editora, 1995, pp. 511 e segs.; José Manuel da S. Santos Botelho, Américo J. Pires Esteves e José Cândido de Pinho, Código do Procedimento Administrativo, Anotado, Comentado, Jurisprudência, 3.ª edição actualizada e aumentada, p. 352), concebendo-o como uma garantia institucional na conformação do procedimento administrativo.

Para decisão da questão colocada no presente recurso, não é decisiva a posição quanto à natureza (direito subjectivo fundamental ou garantia institucional objectiva) da exigência imposta ao legislador pela parte final do n.º 5 do artigo 267.º da Constituição.

Esta norma constitucional não vincula a um modo necessário e único de organização do procedimento administrativo para assegurar a participação dos administrados, não impondo que, em todos os tipos de procedimento administrativo, o princípio geral da participação dos interessados seja maximizado com a consagração de uma audiência formal, especificamente incidente sobre a proposta final submetida ao órgão decisor ou sobre o projecto de decisão que este se proponha adoptar, designadamente naqueles procedimentos especiais que já comportem, por imposição constitucional, uma fase de intervenção necessária do interessado com funções de contraditório.

Com efeito, no processo disciplinar o direito de participação assume, quanto ao arguido, a modalidade qualificada de direito de audiência e defesa, consagrado no n.º 3 do artigo 269.º da Constituição, que dispõe que "em processo disciplinar são garantidas ao arguido a sua audiência e defesa". Esta garantia, referida no texto constitucional a propósito do "processo disciplinar" público, replicando o que, de modo mais geral já consta do n.º 10 do artigo 32.º, para os processos sancionatórios, encerra um verdadeiro direito fundamental, devendo ser entendida como expressando um princípio geral de audiência prévia dos interessados e de reconhecimento do seu direito de defesa relativamente a quaisquer decisões que comportem um efeito punitivo ou equiparável. Como se disse no acórdão 1010/96, disponível em www.tribunalconstitucional.pt. "trata-se de princípio intimamente conexionado com a ideia de "Estado de direito democrático" [artigos 2.º e 9.º alínea b) da Constituição] e que não pode deixar de ser entendido como o assegurar de possibilidades reais, face a todo e qualquer procedimento com fim punitivo ou equiparável, de o interessado ser ouvido de modo a poder demonstrar a própria inocência ou reduzir a responsabilidade a termos justos, enfim, o "right to be heard" caracterizador do "due process" (cf.

Norman Vieira, Constitutional Civil Rights, St. Paul, Minnesota 1990, pp. 36 e ss.)".

Trata-se de uma participação com fins garantísticos, que se materializa através da técnica de atribuição de um direito fundamental (de audiência e defesa), cuja substancialidade exige que o regime do processo disciplinar proporcione ao arguido a possibilidade efectiva de se pronunciar sobre todos os factos, sobre todas as provas e sobre todas as questões jurídicas a ponderar na decisão final. O que desde logo se cumpre com a notificação da acusação, a possibilidade de contestá-la e de produzir prova. Mas que também exige que, se surgirem elementos novos na fase de defesa do arguido ou na fase de decisão, seja dada ao arguido a possibilidade de sobre eles se pronunciar, contraditando-os, infirmando-os ou negando-lhes relevância ou atendibilidade, se necessário com oportunidade de produção de prova complementar.

Sucede, porém, que não é uma dimensão normativa que contrarie a substancialidade do direito de audiência e defesa assim concebido que o recorrente põe em causa. O que sustenta é que da Constituição decorre a exigência de que o arguido seja sempre ouvido sobre o relatório final do instrutor do processo disciplinar, como direito de participação no procedimento de conteúdo autónomo relativamente ao direito de defesa, independentemente de haver ou não elementos novos a ponderar.

Mas sem razão.

Em primeiro lugar, a garantia de audiência e defesa no processo disciplinar (artigo 268.º, n.º 3, da CRP) já é um modo qualificado do princípio geral de participação (n.º 5 do artigo 267.º), não impondo este, exigências ao legislador ordinário que daquela modalidade de participação qualificada no procedimento sancionatório não decorressem. Em segundo lugar, porque o n.º 5 do artigo 267.º da Constituição não impõe ao legislador ordinário, como mínimo necessário de realização do princípio de participação, a notificação de uma pré-decisão. Para satisfazer a exigência constitucional, mesmo na dimensão garantística da participação que é mais exigente - a participação dos interessados é multifuncional, além de finalidades garantísticas (participação defesa), assumindo fins instrutórios (participação instrutória) e de participação democrática ou funcional na condução dos negócios públicos (v. gr. a participação na actividade regulamentar) -, é suficiente (embora também necessário) que o interessado tenha sido colocado em posição de fazer valer perante o órgão decisor a sua perspectiva sobre todos os elementos do procedimento (de direito ou de

facto) que sejam relevantes para a decisão.

Aliás, foi este mesmo entendimento que esteve presente no acórdão 516/03, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 11 de Fevereiro de 2004, também em recurso de constitucionalidade trazido pelo ora recorrente. Nesse acórdão veio a julgar-se inconstitucional, por violação do artigo 32.º da Constituição, a norma do artigo 122.º do EMJ, na interpretação segundo a qual não impõe a comunicação ao arguido do relatório final, mas numa dimensão particular: quando a notificação da acusação ao arguido não tenha incluído a indicação das normas tidas por violadas e da natureza da pena que lhe é aplicável e a decisão final seja no mesmo sentido do relatório. Mas considerou-se que "a imposição de uma obrigação geral de comunicação do relatório final em todos os processos disciplinares introduziria uma espécie de reclamação de uma decisão ainda não formalizada (no primeiro caso), ou um direito de audição sobre o conteúdo de um formalismo processual que umas vezes pode ser relevante, mas outras vezes é irrelevante para a decisão final. E, em qualquer das alternativas, não lograria realizar melhor a garantia dos direitos de audiência e defesa dos arguidos do que a sua pronúncia sobre o conteúdo e enquadramento legal da acusação, ao menos nos casos em que a decisão do processo não esteja vinculada ao relatório final (obviamente, se este circunscrevesse aquela, aumentariam as garantias do arguido - mas à custa da limitação dos poderes decisórios e da criação de uma forma anómala de reclamação de uma espécie de "protodecisão"), e, evidentemente, desde que esta acusação contenha os elementos necessários para o exercício do direito de defesa". E foi apenas porque a acusação, com as características mencionadas, não proporcionava a salvaguarda dos direitos constitucionais de audiência e defesa, que se entendeu necessária a notificação do relatório final do instrutor. Mas como aí também se disse e agora se reafirma, "sendo, aliás, corrente a existência desse relatório final e a sua não notificação ao arguido, sem que, até ao momento, tal tenha suscitado dúvidas de constitucionalidade -, desde que a acusação - ou "nota de culpa", ou "nota de ilicitude" - comunicada ao arguido contenha os factos que lhe são imputados, o seu enquadramento legal e a indicação da sanção aplicável, de forma a permitir o exercício do contraditório e a audiência e defesa do arguido, uma exigência geral de renovação da sua audição após o relatório final da entidade instrutora - que, de resto, não vincula a entidade decisória - não se afigura, porém, resultar da Constituição".

Consequentemente, não se julga inconstitucional a norma extraída dos artigos 122.º e 123.º do EMJ na interpretação, adoptada no acórdão recorrido, de que o arguido não tem de ser notificado da proposta de resolução final do instrutor do processo disciplinar, salvo quando neste se suscitem questões sobre as quais o interessado não tenha tido anteriormente oportunidade de se pronunciar.

7 - Resta apreciar a constitucionalidade do artigo 151.º do EMJ interpretado no sentido de que o Plenário do Conselho Superior da Magistratura pode avocar um processo disciplinar que corra perante o Conselho Permanente, interpretação que o recorrente entende violar o n.º 3 do artigo 269.º da Constituição ao suprimir um grau

de impugnação administrativa.

Dispõe o n.º 1 do artigo 217.º da Constituição que a nomeação, a colocação, a transferência e a promoção dos juízes dos tribunais judiciais e o exercício da acção disciplinar competem ao Conselho Superior da Magistratura, nos termos da lei.

A Constituição remete para o Estatuto dos Magistrados Judiciais, o qual dispõe que o Conselho Superior da Magistratura funciona em Plenário ou em Conselho Permanente (artigo 150.º). Compõe o Plenário todos os membros do Conselho (o Conselho é presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e composto ainda pelos seguintes vogais: a) dois designados pelo Presidente da República; b) sete eleitos pela Assembleia da República; c) sete eleitos de entre e por magistrados judiciais). O Conselho Permanente é uma formação mais reduzida, integrada pelo presidente e pelo vice-presidente, por um juiz da relação, dois juízes de direito, um dos vogais designados nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 137.º, dois vogais de entre os designados pela Assembleia da República e o vogal do CSM a quem o processo

estiver distribuído como relator.

Compete ao Conselho Permanente praticar os actos da competência do CSM não reservadas ao Plenário (n.º 1 do artigo 152.º). O exercício da acção disciplinar, excepto quando respeite a juízes dos tribunais superiores, é uma das matérias cuja competência se considera tacitamente delegada no Conselho Permanente (artigo

152.º).

Dos actos do Conselho Permanente cabe reclamação para o Plenário (artigo 165.º e alínea b) do artigo 151.º), reclamação que tem o efeito de suspender a decisão e devolver ao Plenário a competência para decidir definitivamente (artigo 167.º-A). Está, por esta via, sempre assegurada a intervenção do órgão de gestão da magistratura judicial com a composição que a Constituição estabelece (artigo 218.º da

Constituição).

Além das matérias que lhe legalmente são reservadas, o Conselho Permanente pode, nos termos da alínea e) do artigo 151.º, "apreciar e decidir os assuntos [...] que sejam avocados por sua iniciativa, por proposta do conselho permanente ou a requerimento fundamentado de qualquer dos seus membros".

Entende o recorrente que a interpretação desta norma - o recorrente refere o artigo 151.º in totum, mas só esta alínea releva - no sentido de permitir ao Plenário avocar um processo disciplinar pendente no Conselho Permanente diminui inconstitucionalmente as garantias de defesa do arguido, na medida em que reduz a "extensão do sistema

adversarial do acto punitivo do juiz".

Esta pretensão é manifestamente infundada.

É certo que a circunstância de o acto punitivo ser proferido pelo Conselho Permanente faculta ao magistrado arguido a oportunidade de reclamação para o Plenário e, nessa medida, permite-lhe obter a reapreciação graciosa do acto punitivo, solicitando a sua revogação ou modificação com qualquer fundamento perante um órgão com uma composição parcialmente diversa daquela que praticara o acto primário. Mas isso é um efeito secundário ou colateral de uma medida legal que é primacialmente destinada a agilizar o funcionamento do Conselho no exercício das suas competências correntes.

Nenhuma regra ou princípio constitucional impõe, seja em geral, seja quanto aos magistrados judiciais em especial, que o exercício da competência disciplinar seja organizado de molde a permitir sempre um duplo grau de decisão ou apreciação administrativa quanto aos actos punitivos. Seguramente que não o impõe os artigos 216.º e 217.º da Constituição, que se limitam a reservar para o Conselho Superior da Magistratura a competência disciplinar relativa aos juízes dos tribunais judiciais, remetendo para a lei a regulação dessa matéria. E também não se vislumbra apoio para essa exigência no n.º 3 do artigo 269.º da Constituição. A garantia de defesa impõe, como já se referiu, que o regime do processo disciplinar faculte ao arguido a possibilidade de contestar a pretensão punitiva antes da adopção do acto sancionatório, mas não que os procedimentos sejam organizados de molde a salvaguardar sempre um meio de atacar o exercício primário da competência disciplinar perante um órgão administrativo diverso ou diversamente constituído.

Não se julga, pois, inconstitucional a norma da alínea e) do artigo 151.º do EMJ quando interpretada no sentido de permitir a avocação pelo Plenário de processo disciplinar pendente perante o Conselho Permanente do Conselho Superior da

Magistratura.

8 - Decisão

Por tudo o exposto, decide-se:

a) Não tomar conhecimento do objecto do recurso no que respeita às questões que o recorrente reporta aos artigos 167.º a 178.º e ao artigo 134.º do Estatuto dos

Magistrados Judiciais;

b) Negar provimento ao recurso, na parte em que dele se conhece;

c) Condenar o recorrente nas custas com 25 (vinte e cinco) UCs de taxa de justiça.

Lisboa, 30 de Setembro de 2009. - Vítor Gomes - Carlos Fernandes Cadilha - Ana Maria Guerra Martins - Maria Lúcia Amaral - Gil Galvão.

202487919

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/2009/10/29/plain-263464.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/263464.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1984-01-16 - Decreto-Lei 24/84 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Administração Interna

    Aprova o Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local.

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